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terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Sobre a defesa da beleza - Roger Scruton

DEXTRA
SEGUNDA-FEIRA, 3 DE JANEIRO DE 2011


Roger Scruton: The American Spectator, 15 de maio de 2010
Tradução e linksDextra

Para o bem e para o mal, eu sou identificado pelas elites britânicas como a pessoa com quem se pode contar para defender o indefensável e que se pode permitir defender o indefensável, mesmo em uma televisão estatal (quer dizer, a BBC), desde que a defesa seja suficientemente diluída por outros defendendo o óbvio. No código oficial, "indefensável" quer dizer "conservador", enquanto que "óbvio" quer dizer "liberal-esquerdista". Assim sendo, quando a BBC me pediu para participar de uma série de televisão sobre a beleza, esperava-se que eu sustentasse que uma tal coisa realmente existe, que não é só uma questão de gosto, que ela está ligada ao nobre, àquilo que se deve aspirar e ao que há de sagrado em nossos sentimentos, e que a cultura pós-moderna, que enfatiza a feiura, o desalento e a profanação, é uma traição a um chamado divino. Então, foi isso o que eu disse, já que, afinal de contas, era para isto que eles estavam me pagando. Para alcançar o equilíbrio que a BBC é obrigada por seu regimento a apresentar, dois outros programas foram encomendados, reafirmando as ortodoxias. Eles afirmaram que a arte não tem a ver com a beleza, mas com a originalidade e a originalidade quer dizer você se exibir com a língua (ou algum outro órgão apropriado) para fora. 

Em "Por que a beleza importa", eu falei um pouco sobre arte, mas estava mais preocupado em chamar atenção para o lugar da beleza na vída cotidiana -- nas maneiras, nas roupas, na decoração de interiores e em edifícios vernaculares comuns. Eu critiquei tanto a arquitetura funcional de concreto e vidro, que destruiu cidades em todo o mundo, quanto as maneiras egocêntricas que fizeram o mesmo com a vida doméstica. Tentei explicar por que os filósofos do Iluminismo acompanharam Shaftesbury ao colocarem a beleza no centro do novo código de valores secualres. Para Shaftesbury, Burke, Kant, Schiller e seus seguidores, sugeri eu, a beleza era o caminho de volta para o mundo que eles estavam perdendo, com a perda do Deus cristão -- o mundo do sentido, da ordem e da trasncendência, que deve ser constantemente emulado neste mundo se quisermos que nossas vidas sejam verdadeiramente humanas e verdadeiramente plenas de significado. E afirmei em seguida que desde as piadas pueris de Marcel Duchamp, repetidas reiteradas vezes em toda mostra de faculdade de graduação em artes na Grã-Bretanha, um hábito de sarcasmo e profanação tinha se apoderado do exercício das artes visuais. 

Por isto, os artistas britânicos de hoje -- pelo menos os reconhecidos pela cultura oficial -- não têm muito mais a nos mostrar além do quanto são repulsivos. Me parecia óbvio que a pintura de Delacroix mostrando sua cama por fazer ( na Maison Delacroix, em Paris) era uma verdadeira obra de arte, que mostra algo sobre a condição espiritual humana, enquanto que a famosa cama de Tracey Emin (na galeria Tate Modern, em Londres) é só uma cama desarrumada. Podemos deduzir, pela visão desta cama, um bocado a respeito da pessoa que a desarrumou, mas isto não a distingue de nenhum outro entulho deixado no rastro de uma vida humana. O sentido superior que é a meta da arte -- o sentido que mostra por que a vida importa -- é algo que esta cama não alcança nem tem como meta. 

Eu recebi mais de 500 e-mails de telespectadores, todos eles, exceto por um, dizendo: "Graças a Deus alguém está dizendo o que é preciso ser dito," metade deles acrescentando, "mas como é que deixaram você dizer isso na BBC?" Enquanto isto, os colunistas juntaram-se em bandos para lamentar o caráter triste, anômalo e reacionário do pobre Scruton, e agradecer à BBC por mostrar o absurdo e o anacronismo das opiniões do professor, já bem idoso. Waldemar Januszczak, que fez um outro dos episódios da série sobre a beleza, preparou um verdadeiro libelo para assassinato de caráter no Sunday Times, a fim de aconselhar a seus leitores, antes da exibição de meu episódio, a desconsiderarem o que quer que eu pudesse tentar lhes dizer. 

O evento foi, para mim, revelador e instrutivo a respeito de meu país e sua cultura. Eu não digo que meu episódio tivesse qualquer outro mérito além de sua honestidade. Mas ele gerou provas esmagadoras de que sua visão da arte e da estética é compartilhada por muitos espectadores britânicos e que a cultura oficial não está só divorciada destas pessoas, mas é profundamente hostil ao que elas acreditam, o que elas sentem e ao que elas aspiram. A arte nihilista de nossa época é repassada ao povo britânico como uma reprimenda, que ele deve aceitar com toda humildade e em um espírito de desculpas por ter querido algo de "superior."  Não há nada de superior -- esta é a lição a ser aprendida com a  Arte Jovem Britânica , e com as pilhas de lixo sem nexo que ela manda para nossos museus e galerias. Só podemos entender a condição humana, ela nos diz, se adotarmos uma postura de grosseria e confrontação e se pusermos a língua para fora.
ESTE É SÓ UM ASPECTO DE algo que os americanos em visita à Grã-Bretanha notam cada vez mais. Nos anos 50 e 60, quando minha geração estava crescendo, os britânicos eram ativamente engajados pelo sistema educacional e os mundos da arte e da religião em um cultura da aspiração. Esta foi a época de Henry Moore eBenjamin Britten, de Graham Sutherland e Michael TippettW. H. Auden era uma voz importante, assim como era o ex-americano T. S. Eliot. A Grã-Bretanha era um lugar de grande significação hístórica e religiosa. Era um privilêgio pertencer a esta terra e por toda a parte a história nacional tinha deixado as marcas e os prodígios de um modo de vida superior. Correndo o risco de exagerar, pode-se dizer que meu país, naquela época em que a geração do baby boom avançava em direção a uma perpétua imaturidade, era um ensaio da redenção. Sua arte, cultura e religião eram devotadas ao ideal de uma comunidade na qual a decência, a curiosidade e a abnegação mandavam em tudo. E lá permanecia, como uma espécie de sobra da propaganda do período da guerra, a crença no gentleman, que encara a vida com uma postura de devoção em auto-sacrifício a ideais sem sentido -- quer dizer, sem sentido segundo o ponto de vista do observador cínico, mas que não eram sem sentido de forma alguma, dado o espírito com que eram aceitos.
The American visitor to Britain today, and especially the visitor who retains a memory of that extraordinary world in which decency, self-deprecation, and the stiff upper lip were the ruling principles, often recoils in shock at what he finds. The public culture is one of appetite and satire, and the whole country seems to be "in your face," as though sticking out a collective tongue. Many American friends tell me this, and speak sorrowfully of the change from the Britain that they used to visit with a sense of coming home, to the Britain that they visit today, which is a land of strangers. The interesting thing, however, and the response to my film seems to confirm this, is that many of the British people agree with them. The British people too are in a land of strangers, and the culture that rules over them is one to which many of my countrymen cannot in their hearts belong.

The official ethos, which prevails in schools and universities, and also in the Labour Party, is one of scorn and repudiation toward the old ideals. Official British culture is accurately portrayed by Tracey Emin's bed. It is a culture of emotional chaos and random affections, in which traditional loyalties play no part. Emin herself is the illegitimate daughter of a Turkish Cypriot, and her situation is typical of her generation. Unable to identify with a country or a way of life, educated by a curriculum of multicultural fairy tales, and learning in art school that you find your place in the world through transgression, and through putting the self on display, she has had the good sense to be a publicly visible and authentic mess. Her works may not be works of art, in the sense that my generation was brought up to understand this honorific label, but they show a world that the official culture of Britain has chosen to endorse.

The circumstantial evidence of the response to my film proves nothing. All I know is that a lot of people out there feel as I do. They agree with me that beauty matters, that desecration and nihilism are crimes, and that we should find the way to exalt our world and to endow it with a more than worldly significance. But perhaps just as many or more believe the official "multicultural" story, which tells us that there is nothing special about Britain, that the old ideals and dignities are mere illusions, and that the purpose of art is to pour scorn on the values of antiquated people. And if the impression of American visitors is right, it is not the official culture only, but also the rising generation of New Brits, which has settled for facetiousness against dignity and transgression against the norms of social life. If this is so, then at least one part of the message of my film has been vindicated: namely that beauty matters, and that you cannot pour scorn on beauty without losing sight of the meaning of life.

Leia também de Roger Scruton: Soletrando o inefávelSentimentalismo totalitário.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
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" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".