MÍDIA A MAIS
13 | 07 | 2012
Cinema fechado em SP
Por: Felipe Atxa
Bilhões de reais destinados anualmente para a “cultura” revelam-se totalmente inócuos quando um cidadão comum resolve sair de casa em busca de “atrações culturais” pelas quais já pagou quando contribuiu com seus impostos.
Nove de julho é feriado em SP e a data ideal para conferir o que os governos têm feito com o dinheiro dos contribuintes que seria pretensamente investido em “cultura para todos”. O Ministério da Cultura tem algo próximo a 1,5 bilhão para gastar anualmente [1]; o Estado de SP, 1 bi [2]; a Prefeitura, quase 300 milhões [3]. É de se supor que ao menos uma parcela desse quinhão bilionário reverta-se para os cidadãos comuns, que não militam nem vivem diretamente da produção cultural. Mas isso está longe de acontecer. A cidade conta com pouco menos de 300 salas de cinema [4]; entre elas, somente oito podem ser consideradas “culturais” , ou seja, teoricamente não guiadas pelas leis de mercado e funcionando segundo alguma diretriz “social”. No dia da comemoração da Revolução de 32, a Caixa Cultural, o Centro Cultural Banco do Brasil, o Cine Olido (municipal), o Cine Segall, a Sala Cinemateca (mantida por uma fundação) e o Cinusp (da Universidade de SP) estavam fechados ou não ofereciam filmes para exibição. A sala do Centro Cultural SP permanece desde o ano passado interditada para reformas e só o Cinesesc estava aberto – cobrando pelos ingressos como qualquer sala comercial, apesar de ser mantido pelo Sistema S que se mantém através das contribuições sociais recolhidas de trabalhadores e empresas de forma compulsória.
Se estivessem abertas, as salas do CCBB, do CCSP, do Olido, do Segall e da Cinemateca também cobrariam pelos ingressos (com preços variando entre um e oito reais, diferentemente do Cinesesc, que chega a cobrar até 12). Dependendo do dia e da sessão, é possível pagar menos em algumas salas do circuito comercial.
A situação pode ser menos grave mas certamente guarda semelhanças no circuito teatral, de música e nas bibliotecas – cada uma a sua maneira, refletindo o insucesso das políticas públicas de cultura. Se pretendesse assistir a um concerto, por exemplo, o paulistano não teria nenhuma opção para o feriado. No restante da semana, teria de desembolsar entre 13 a 600 reais para usufruir de alguma das atrações – ou acotovelar-se nas raríssimas e disputadas sessões gratuitas, oferecidas pela Fiesp e pelo CCSP, por exemplo, muitas vezes em eventos únicos (falando mais precisamente, o Guia da Folha previa apenas cinco deles durante a semana inteira). Muito pouco para uma cidade com tanto dinheiro supostamente destinado à cultura.
Pela exposição de Modigliani, o paulistano desembolsaria 15 reais (exceto na terça-feira gratuita). Para conhecer as invenções do pioneiro do cinema George Meliès, quatro (mais oito de estacionamento se resolvesse cometer o crime de usar seu próprio automóvel). Ambos os eventos ocorrem em museus públicos. E que tal um teatrinho? São 50 reais no mínimo para ver o Macbeth produzido através da Lei Rouanet ou 30 para “O Libertino” patrocinado pelos Correios. Esqueça despesas com garagem ou flanelinha: os contribuintes podem usar o teletransporte para economizar seu dinheiro. Caso usem o metrô, é bom testar os 500 metros rasos para não perder o último trem da noite.
Os bilhões da cultura pública têm sido igualmente incapazes de evitar a desmontagem da estrutura física que fornece cultura: cinemas de rua fecham ou são abandonados até a ruína dia após dia [5]. Bibliotecas com livros novos? Boa sorte. [6]
A despeito de toda essa situação, o orçamento da cultura cresce junto com a arrecadação de um país também em crescimento e, ao menor sinal de corte, a categoria mobiliza-se para que as medidas de austeridade não atinjam o setor. Não é difícil resolver a equação misteriosa: em vez de atender a uma eventual demanda da sociedade por cultura (especialmente por cultura gratuita e amplamente acessível), o foco está em satisfazer os produtores, que não vivem nem comem de sessões gratuitas, reformas de cinemas antigos ou livros novos: vivem precisamente de produzir. Entre enfrentar as lamúrias e panelaços de estudantes de artes e clowns agressivos e dar uma satisfação para as pessoas comuns, ou simplesmente fingir que a grana da cultura tem real destinação social, os políticos não têm dúvida em optar pela encenação da segunda alternativa.
Sustentar artistas e burocratas é a real prioridade de tais políticas. Dos bilhões gastos todo ano, a parcela que retorna diretamente para a população é inexpressiva e pode ser contada em eventos que ocupam os dedos das mãos. Mãos dos contribuintes (sempre vazias), porque as dos produtores estão ocupadas você sabe muito bem com o quê.
[1] http://www.cultura.gov.br/site/2012/01/06/minc-executa-quase-100-do-orcamento-de-2011/
[2] http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1294433
[3] http://www.nossasaopaulo.org.br/observatorio/regioes.php?regiao=33&tema=9&indicador=86
[4] http://www.visitesaopaulo.com/dados-da-cidade.asp
[5] http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,windsor-outro-cinema-fechado-no-centro-de-sp,897745,0.htm
[6] http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u690859.shtml
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