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sexta-feira, 30 de julho de 2010

Comunismo e narcotráfico

DIÁRIO DO COMÉRCIO

No início do processo, quando as FARC começaram a ser chamadas de narco-guerrilheiras, a esquerda reagia indignada, como se fosse uma armação midiática dos conservadores .

Denis Lerrer Rosenfield - 29/7/2010 - 20h59

O que mais surpreende na discussão atual sobre as relações entre as FARC e o narcotráfico, em suas repercussões no "socialismo bolivariano" e em tendências do PT e nos ditos movimentos sociais, é a dissociação que se procura estabelecer entre a idéia de socialismo/comunismo e o tráfico de drogas. No fundo, o que se procura defender é a idéia pura do socialismo/comunismo como se fosse uma idéia de tipo religioso, imune aos acidentes de sua história ou de seu percurso de realização.

As FARC foram historicamente consideradas como um grupo guerrilheiro, que retomava as posições que foram do maoísmo e do castrismo, com a ocupação de áreas ditas liberadas no campo. Eram, nesse sentido, consideradas herdeiras do marxismo-leninismo em suas versões chinesa e cubana, estando, assim, legitimadas junto à opinião pública de esquerda. Eram recebidas em fóruns internacionais, companheiras do PT na fundação do Foro de São Paulo nos anos 90 e elogiadas no Brasil até muito recentemente.

O governo Olívio Dutra, no Rio Grande do Sul, durante o I Fórum Social Mundial, em 2001, recebeu-as no Palácio Piratini. As relações do Padre Medina – espécie de representante internacional dessa organização revolucionária –com o PT são também sobejamente conhecidas.

Contudo, à medida que as atividades de tráfico de drogas foram sendo cada vez mais de domínio público, surgiu uma espécie de reação que se aproximaria da "indignação" moral, como se isso fosse uma questão de princípio da esquerda. No início desse processo, quando as FARC começaram a ser chamadas de narco-guerrilheiras, essa mesma esquerda reagia indignada, como se fosse uma armação midiática dos conservadores ou, por que não, do "imperialismo". Os fatos, porém, foram avassaladores, tornando-se indubitáveis.

Aí começou um outro processo, o de dissociar a idéia de socialismo/comunismo do narcotráfico, como se uma fronteira tivesse sido transposta, algo historicamente novo, inconcebível. Ora, a pergunta que cabe é a seguinte: será que estamos diante de algo historicamente novo para esse tipo de esquerda?

Na tradição socialista/comunista, áreas liberadas, como as das FARC na Colômbia, são áreas onde impera a lei da força, a lei do partido, em um completo desrespeito a algo como igualdade de todos ou estado de igualdade jurídica. Rege a violência dos chefes, que não medem meios para a realização de seus objetivos.

Do ponto de vista discursivo, trata-se do melhor dos mundos, o do caminho da igualdade futura entre todos os homens. Do ponto de vista real, trata-se do império da violência, a ausência completa de liberdades, as aulas de doutrinação, a fome e os mais diferentes tipos de violência cometidos pelos chefetes e pelos líderes principais.

A revolução chinesa é um bom precedente histórico. Nas áreas "liberadas", sob controle de Mao, vigorava a expropriação dos camponeses, reduzidos à mais completa miséria, à fome, às epidemias e à violência do partido que de tudo se apropriava. Os privilégios da hierarquia comunista iam das mulheres à disposição dos chefes aos alimentos extraídos de agricultores famintos.

Tudo era legitimado em função do objetivo "socialista" maior. Os que discordavam eram "pequenos burgueses", "direitistas", "agentes do imperialismo" e assim por diante. Os revolucionários de ontem tornavam-se os inimigos de hoje.

Jon Haliday e Jung Chang, em seu livro Mao: a História Desconhecida, fornecem preciosas informações sobre o que foi a dominação totalitária maoísta. Em particular, nos anos de 1941-1942, Mao – precisando de recursos para armamentos, em uma de suas zonas "liberadas"– recorreu ao comércio e cultivo de ópio.

Foi um amplo e florescente negócio, patrocinado por ele mesmo, em nome, evidentemente, da causa comunista. A área cultivada de ópio foi estimada em 12 mil hectares das melhores terras da região.

Para o seu círculo mais próximo, Mao apelidou a operação de "Guerra do Ópio Revolucionária". Assim, transplantando a situação para os dias atuais, podemos também ter a "cocaína revolucionária", tão em voga nas áreas controladas pelas FARC e abertamente cultivada na Bolívia "bolivariana" de Evo Morales.

Tais fatos foram ocultados para não denegrir a causa, a ideia de socialismo/comunismo. Assim, em nome dessa mesma ideia, milhões de pessoas foram exterminadas, sendo que qualquer contestação era imediatamente identificada a uma ação contrarrevolucionária.

Sob o domínio de Evo Morales, as razões apresentadas são "culturais", como se se tratasse somente do consumo de um chá inofensivo, quando a produção é muito maior do que as necessidades do consumo interno desse país.

Já há várias suspeitas de que a ditadura castrista esteve ou mesmo está comprometida com o tráfico de drogas. Generais revolucionários já foram acusados por essas atividades e executados supostamente por essas razões.

Assim funcionam os regimes totalitários. Patrocinam uma atividade e, para livrar-se de seus oponentes internos, dentro do próprio partido e do exército, os acusam de desviantes. É a forma mesma comunista de operação dos expurgos, modo de exercício do terror, para deixar todos os súditos subjugados, evitando qualquer contestação, qualquer abertura. Quando o regime castrista cair, saberemos a verdadeira história.

Enquanto isso, os seus defensores continuam defendendo a ideia da pureza socialista/comunista, modo de sustentar suas próprias posições, com cobertura midiática inclusive.

O problema é que, nos casos da China e de Cuba, a verdade apareceu ou aparecerá décadas depois, quando o estrago do ponto de vista de formação da opinião pública e dos jovens em particular já tiver sido feito. O que, porém, incomoda atualmente a esses mesmos setores é que estamos presenciando ao vivo, contemporaneamente aos fatos, a realização dessa ideia do socialismo/comunismo.

A indignação é pela contemporaneidade, pois essa afeta a opinião pública atual. Eis porque todos correm atrás da dissociação entre o socialismo/comunismo e o narcotráfico.

Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na UFRS

2 comentários:

Arlindo Montenegro disse...

Será que o professor ainda não leu o "Red Cocaine". Este blog, o CT, de conteúdo excelente, deve recomendar esta leitura ao professor. Ele vai conhecer a documentação sobre a disseminação das drogas por iniciativa da URSS, para abater a moral do mundo ocidental. Ele vai saber como, a partir de uma negociação de armas que Raul Castro foi fazer com os comunistas checos, Cuba transformou-se no entreposto de drogas para a América do Norte, desde os anos 60. "Os fins justificam os meios".

Cavaleiro do Templo disse...

Aproveitando a deixa, o link para o livro: http://www.4shared.com/get/FhdfVN65/DOUGLASS_Joseph_D_-_Red_Cocain.html.

O professor Olavo acaba, neste instante, de fazer este adendo: http://cavaleirodotemplo.blogspot.com/2010/08/indio-pode-virar-o-jogo.html.

Abraços, irmão.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
"Para conseguir sua maturidade o homem necessita de um certo equilíbrio entre estas três coisas: talento, educação e experiência." (De civ Dei 11,25)
Cuidado com seus pensamentos: eles se transformam em palavras. Cuidado com suas palavras: elas se transformam em ação. Cuidado com suas ações: elas se transformam em hábitos. Cuidado com seus atos: eles moldam seu caráter.
Cuidado com seu caráter: ele controla seu destino.
A perversão da retórica, que falseia a lógica e os fatos para vencer o adversário em luta desleal, denomina-se erística. Se a retórica apenas simplifica e embeleza os argumentos para torná-los atraentes, a erística vai além: embeleza com falsos atrativos a falta de argumentos.
‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".