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quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Conversa de cabeleireiras

CONTEÚDO LIVRE

JOÃO PEREIRA COUTINHO

Por conta da WikiLeaks, o jornalismo transformou-se no latão de lixo de um delinquente cibernético


SOU UM crédulo. A culpa é da literatura. Alimentado a Graham Greene e seu discípulo Le Carré durante a adolescência, afiei os caninos quando ouvi falar da WikiLeaks.

Que maravilha! Um site publicava as maiores conspirações mundiais das maiores potências mundiais! Salivei, como um cachorro amestrado. Não existe bom jornalismo sem bons vazamentos de informação. Não existem bons leitores sem carne proibida e suculenta para mastigar.

Desilusão. Indigestão. A WikiLeaks soltou mais de 250 mil telegramas do Departamento de Estado norte-americano, e a comida é rançosa. Eu esperava um complô de Washington para dominar o mundo. O império do mal é o império do mal.

Encontro conversa de cabeleireiras. Cristina Kirchner é mentalmente instável (bocejo). Chávez é louco (idem). Berlusconi gosta de orgias (abençoado homem). Gaddafi é "hipocondríaco" (bem-vindo ao clube) e gosta de viajar acompanhado por uma "voluptuosa" enfermeira ucraniana (partilha, irmão, partilha). Sarkozy é "irritadiço" e "autoritário" (é sério?). Putin e Medvedev são o "Batman" e o "Robin" da política internacional (mas que gay!).

Quero o meu dinheiro de volta. Se os segredos da diplomacia americana se resumem a isso, eu começo a temer pelo futuro do império do mal. Ou será do bem?

Aliás, não temo apenas pelo futuro da América. Temo pelo futuro do próprio jornalismo. Tempos houve em que os jornalistas tinham a nobre função de vigiar e criticar o poder. Uma tarefa necessária, solitária, tantas vezes perigosa, que implicava "pesquisa", "filtragem", "interpretação". Uma fonte era uma fonte. O início do processo, não o seu fim preguiçoso.

Com a WikiLeaks, o jornalismo transformou-se no latão de lixo de um delinquente cibernético. Não existe "pesquisa", "filtragem" ou "interpretação" alguma. Os jornalistas foram cúmplices da pirataria e da espionagem de um foragido. De Watergate para a WikiLeaks: o meu reino não é mais deste mundo.

Alguns dirão que exagero. Que existem informações "relevantes", para usar o termo preferido dos apedeutas. Saber que a China não se opõe à unificação das Coreias é "relevante". Saber que os Estados Unidos espiam nas Nações Unidas é "relevante". Saber que os países árabes temem o Irã e pedem a Washington, privadamente, para bombardear os aiatolás é "relevante".

Será? Mas nada disso é novidade. Que os árabes e, em especial, os sauditas, temem um Irã nuclear tanto ou mais que Israel é o básico da política internacional do Oriente Médio. Que a China, desde Deng Xiaoping, vê com bons olhos uma "reunificação pacífica" das Coreias, eis um truísmo que se encontra em qualquer livro de relações internacionais para principiantes.

E que os Estados Unidos espiam nas Nações Unidas, enfim, nem merece comentário: não existe país com pretensões de hegemonia global, ou até regional, que não faça o mesmo, ou pior. E, quando o assunto é o manicômio das Nações Unidas, criminoso seria não espiar.

Infelizmente, é pouco provável que a WikiLeaks nos informe sobre os pecadilhos das outras potências. A WikiLeaks, três anos atrás, prometia revelar todos os abusos nos mais variados cantos do mundo. Aplaudi. Precocemente. Pelo visto, a coragem justiceira de Julian Assange parou nos Estados Unidos.

Conclusões? A melhor delas foi resumida por James Rubin, antigo membro da administração Bill Clinton, que escreveu na revista "The New Republic" sobre a ironia da WikiLeaks. Que ironia é essa?

Simples: a WikiLeaks acredita que a transparência total é o único caminho para um mundo mais seguro e pacífico. Fatalmente, a WikiLeaks ignora que um mundo mais seguro e pacífico passa, muitas vezes, pelos esforços secretos da diplomacia. E não há diplomacia sem confidencialidade, lembra Rubin. (Cavaleiro - acrescento que, para variar - pois estamos em um mundo sociopatoplástico - o WikiLeaks faz segredo de seus segredos, se é que o site possue de fato algum. Por que mundo sociopatoplástico? Você já viu um sociopata aplicar em si mesmo o mesmo "tratamento" que impôe aos outros, as suas vítimas?)

Ao destruir a confidencialidade, a "pacifista" WikiLeaks está convidando o mundo para se calar em privado. E para resolver as suas discórdias e conflitos em público. Por meios, digamos, menos civilizados. E mais primitivos.

Faz parte da mentalidade radical ver a realidade em preto e branco, sem notar que a salvação, às vezes, se pinta com cores mais cinzentas.

jpcoutinho@folha.com.br

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
"Para conseguir sua maturidade o homem necessita de um certo equilíbrio entre estas três coisas: talento, educação e experiência." (De civ Dei 11,25)
Cuidado com seus pensamentos: eles se transformam em palavras. Cuidado com suas palavras: elas se transformam em ação. Cuidado com suas ações: elas se transformam em hábitos. Cuidado com seus atos: eles moldam seu caráter.
Cuidado com seu caráter: ele controla seu destino.
A perversão da retórica, que falseia a lógica e os fatos para vencer o adversário em luta desleal, denomina-se erística. Se a retórica apenas simplifica e embeleza os argumentos para torná-los atraentes, a erística vai além: embeleza com falsos atrativos a falta de argumentos.
‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".