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quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Ex-traficante colombiano conta sua história

CONTEÚDO LIVRE



El País
Alexander Bühler 

O comércio de drogas na América do Sul está se tornando cada vez mais sofisticado à medida que as quadrilhas colombianas usam submarinos fabricados artesanalmente para levar a cocaína para o México. As tripulações precisam lidar com um calor inacreditável, condições sanitárias precárias e a falta de espaço. Um ex-capitão de submergível contou a Spiegel as suas experiências.

O dia em que a vida de Gustavo Alonso como transportador de drogas chegou ao fim começou com o ruído de um helicóptero. Ele estava voando diretamente sobre sua cabeça, e Alonso podia ouvir ele se aproximando rapidamente. De repente, o helicóptero parou e começou a pairar sobre ele.

Alonso, três outros tripulantes e um guarda da máfia colombiana estava espremidos num espaço de cerca de 15 metros quadrados dentro de um veículo semi-submergível a 600 milhas náuticas da costa do México. A embarcação também carregava 3,5 toneladas de cocaína, com um preço de atacado de US$ 8 milhões, o equivalente a mais de US$ 60 milhões nas ruas de Miami ou Washington.

Os contatos mexicanos que deveriam receber a entrega de cocaína já estavam quatro dias atrasados. Eles haviam informado que seu navio estava com problemas no motor. A tripulação já tinha viajado por 12 dias no pequeno submarino, que mal tinha espaço para os homens se levantarem e andaram. As ondas passavam constantemente por cima do domo de vidro que permitia a eles o único contato visual com o mundo lá fora. Os homens tinham que se espremer o tempo todo para passar uns pelos outros e passavam a maior parte do tempo jogando cartas ou cochilando.

Por volta de 10h, eles ouviram um baque repentino. O atirador do helicóptero havia jogado uma rede de aço na embarcação. Ela se enroscou nas hélices do motor, evitando que o submarino se locomovesse.

Eles ouviram alguém falando num megafone. Sabiam que armas pesadas estavam sendo apontadas para eles e que não tinham nenhuma chance. Eles desligaram os motores, saíram do submarino e se renderam à Guarda Costeira dos EUA.

Escapando dos narcotraficantes

“Primeiro eu quis me matar”, disse Alonso, “mas percebi que agora eu podia finalmente escapar dos 'narcos', os traficantes de drogas”. Se estivesse numa prisão dos EUA, eles não teriam mais nenhum poder sobre ele e não poderiam enviá-lo para o próximo transporte de drogas, como vinham fazendo há anos.

Alonso foi condenado por tráfico de drogas e passou anos na prisão, os primeiros dois em confinamento solitário. Ele voltou à sua cidade natal depois de ser solto, mas desde então deixou sua antiga vida para trás. As pessoas com as quais ele costumava interagir no comércio de droga estão mortas ou atrás das grades.

Alonso, 53, um homem baixo e forte, está sentado no terraço do Hotel Estación na cidade portuária de Buenaventura na Colômbia. Ele observa a baía à sua frente, um labirinto de ilhas, manguezais de raízes torcidas e estuários.

Alonso não é seu nome verdadeiro. A máfia das drogas não gosta quando ex-funcionários começam a falar. E aqui em Buenaventura, o ponto de encontro de traficantes de droga na costa do Pacífico, falar é especialmente perigoso. Há anos as quadrilhas de drogas como a Rastrojos e a Aguilas Negras vêm guerreando na cidade para controlar as rotas de transporte.
As quadrilhas de drogas recrutam seus integrantes nos bairros pobres de Buenaventura, onde as pessoas vivem em precários barracos de madeira. Nesses bairros, há pouco trabalho e o abastecimento de água e eletricidade e esporádico. A máfia das drogas controla essas áreas, de onde retira os seus soldados rasos.

Uma mulher foi assassinada lá há algumas semanas, e duas outras pessoas desapareceram sem deixar pistas – numa atitude de vingança cometida pelos narcos depois de um transporte de drogas mal feito. A tripulação do barco havia jogado parte de sua carga para fora enquanto fugia da guarda costeira. Alguns dias depois, a polícia mostrou a carga confiscada com orgulho. Para os narcotraficantes, o incidente foi uma atitude de traição, que precisa ser seguida por uma retaliação.

Incapaz de dizer não

Há duas formas de entrar no comércio de drogas, explica Alfonso. Alguns fazem isso para ganhar dinheiro rápido, dando o golpe de uma vida, por dinheiro suficiente para pagar uma casa ou a educação dos filhos. Outros fazem porque são chantageados depois de receber ajuda prévia da máfia das drogas, como no caso de Alonso.

Alonso, um capitão licenciado, trabalhou durante anos em grandes barcos de pesca antes de pilotar barcos com cocaína através do oceano. Ele morava em Buenaventura com sua mulher e suas três filhas quando sua mulher ficou gravemente doente. “Os médicos disseram que ela precisava urgentemente de uma cirurgia, mas a operação custaria US$ 40 mil”, lembra-se.

Ele não tinha o dinheiro. Ele conta que um conhecido garantiu a ele que tudo daria certo e que ele não precisava se preocupar com nada. Depois da operação, o suposto amigo aproximou-se de Alonso e pediu para ele fazer um favor em troca. Alonso concordou em ajudar o homem, embora tivesse uma ideia do que seria o pedido. Será que ele poderia ter dito não? “Se eu tivesse, não estaria aqui hoje”, disse ele.

Ele começou uma carreira de dois anos como traficante de drogas, durante a qual concluiu um total de quatro viagens. Ele fez sua primeira viagem num barco fornecido pelos traficantes, com cinco toneladas de cocaína escondidas debaixo de muitos peixes. Alonso, que era um capitão bem conhecido, passou pela guarda costeira sem incidentes. Ele entregou as drogas num ponto de encontro arranjado próximo à costa mexicana e voltou para casa.

Convocado à noite

Ele ainda esperava que os traficantes o deixassem em paz. Mas eles já estavam esperando por ele quando chegou no porto. “Eles nunca o esquecem, a menos que a polícia o pegue ou você seja morto durante um transporte”. Eles colocaram algum dinheiro em suas mãos e o levaram para casa. Então disseram a ele para esperar pela próxima missão, e não sair de casa. Durante semanas, ele ficou com medo de sair de casa.

Ele se sentiu quase aliviado quando foi convocado uma noite. De manhã, depois de viajar por várias horas de carro e barco a motor, o grupo chegou a seu destino: uma ilha na região costeira de mangue. Do barco, Alonso pode ver a marina sobre a qual as pessoas sempre especulavam em Buenaventura, onde eram construídos submarinos de fibra de vidro na selva, ao ar livre, para serem usados no transporte de cocaína.

Os traficantes haviam desenvolvido um sistema confiável. As embarcações eram quase invisíveis na água, e não apareciam nos radares. A única forma de localizar as embarcações é através de imagens térmicas feitas por tripulações de vigilância aérea. Mas as quadrilhas de drogas logo descobriram uma forma de superar esse problema.

Elas colocaram canos largos no casco do submergível, permitindo que os gases de exaustão fossem para a água, o que os resfria. Um terço da cocaína destinada ao mercado norte-americano é transportada hoje por submarinos.
“Fiquei com medo quando eles me mostraram o barco”, diz Alonso. Ele conhecia embarcações. Num barco, você sempre pode sair no convés e olhar para o mar. Mas agora ele estava olhando para um submergível minúsculo e frágil, e podia ver como era apertado por dentro. Dez toneladas de combustível, água engarrafada e galões de água já estavam armazenados na embarcação – além de três toneladas e meia de cocaína pura. A tripulação inteira recebeu ordens para embarcar ao cair da noite.

“Você sente o tempo todo que está sufocando”

O barco estava dividido em três seções. Uma escotilha na proa levava ao compartimento de carga, que tinha pouco mais de um metro de altura. A tripulação tinha que engatinhar pelo compartimento de carga, passando por pacotes de cocaína, para chegar à estação de controle e aos leitos. Alonso se posicionou no leme, próximo a um dispositivo de GPS para navegação e um rádio. Os tanques de diesel ficavam debaixo das camas. A sala do motor, contendo dois motores turbo a diesel, ficava atrás de Alonso. Não havia iluminação, banheiros e mal havia espaço suficiente para ficar em pé ou deitar para dormir.

Por volta das 20h, a maré estava alta e a noite escura o suficiente, enquanto a água do mar batia no submarino. Uma lancha puxou a embarcação para o mar, onde a tripulação ligou os motores. Eles aceleraram a 12 nós e partiram numa rota a 270 graus a oeste, em direção ao mar aberto. O guarda fornecido pela máfia das drogas para cada operação de transporte, armado com um revólver e um rifle de assalto, ficou parado na porta da sala dos motores.

Fazia um calor inacreditável dentro do submergível, onde os motores retiravam oxigênio do ar e o enchiam de monóxido de carbono, apesar dos tubos de ventilação. “O tempo todo você sentia que estava sufocando”, diz Alonso. “A cada quatro horas, nós reduzíamos a velocidade de 12 para seis nós. Então abríamos a escotilha na frente por exatamente um minuto, deixávamos o ar fresco entrar e acelerávamos novamente.”

A equipe de quatro homens trabalhava em turnos, enquanto Alonso continuava monitorando a rota. Uma vez que estavam em mar aberto, o homem com o rifle de assalto deu a ele um pedaço de papel mostrando o destino. Suas instruções eram para chegar num dia e horário específicos.

Cada um dos homens tentava dormir depois de seu turno, mas o mau-cheiro e o barulho a bordo tornavam isso impossível. Eles tinham que beber muita água para compensar os baldes de suor que escorriam o tempo todo de seus corpos. Sua principal fonte de alimentação era leite condensado, da marca peruana “Leche Gloria”. O mau-cheiro de matéria fecal, que não podia ser descartada durante a viagem, logo se tornou insuportável.

Uma missão perigosa

A máfia colombiana das drogas já teve centenas de barcos similares construídos nos últimos anos. A polícia só conseguiu capturar 53 deles, 20 só no último ano. O negócio de transporte de drogas é extremamente lucrativo. Custa cerca de meio milhão de dólares para construir um submarino, mas o valor de mercado da carga pode ser cem vezes maior. Os traficantes costumam afundar suas embarcações uma vez que a entrega é feita. Acredita-se que existam dúzias de embarcações afundadas no fundo do mar na costa mexicana.

As autoridades estão impondo multas altas sobre qualquer um que seja pego construindo ou usando esses barcos. Se a guarda costeira também encontra drogas a bordo, os traficantes podem esperar de oito a 14 anos na prisão. Apesar disso, não é difícil encontrar traficantes para trabalhar nos barcos.

Os que o fazem estão se comprometendo com uma missão perigosa. A mínima falha no projeto pode ser fatal numa embarcação que passa a maior parte de sua jornada a 1.500 quilômetros distante da costa. Se o casco fino quebrar, tudo se acaba, diz Alonso. Ele ouviu histórias de várias tripulações de traficantes de drogas que afundaram. “Mesmo que você consiga passar pela escotilha e chegar à superfície, você está no meio do oceano, sem um colete salva-vidas ou bote de resgate.”

A primeira viagem de Alonso no submergível durou dez dias, e ele chegou ao destino sem incidentes, passando pelo radar e pelo sonar da guarda costeira colombiana. Alonso sabia onde encontrar as falhas na vigilância. Eles chegaram ao destino na costa mexicana, onde transmitiram palavras em código para uma frequência previamente combinada. Quando o iate dos traficantes mexicanos chegou, a tripulação abriu a escotilha e pulou na água para se livrar do mau-cheiro dos últimos dias.

Grandes quantias

Eles passaram quatro horas carregando pacotes de cocaína, cada um pesando entre 20 e 40 quilos, para o outro barco. Em troca, receberam 20 pacotes de notas de dinheiro, num total de US$ 8 milhões em notas de US$ 20, dinheiro que deveria ser entregue para seus chefes colombianos.

O valor normal para a viagem vai de US$ 30 mil a US$ 100 mil. Alonso recebeu bem menos, porque a quadrilha ainda estava deduzindo sua dívida antiga. Para ele, os transportes nunca foram lucrativos.

O dinheiro é o que move este negócio, muito dinheiro. Um quilo de cocaína custa cerca de US$ 2.500 na Colômbia, mas na Europa é vendido por US$ 30 mil. Há poucos meses, as autoridades encontraram somas de US$ 29 milhões e 17 milhões de euros quando vasculhavam um dos locais em que o chefe das drogas “El Loco” Barrera escondia seu dinheiro.

Estima-se que 5 milhões de colombianos estejam envolvidos direta ou indiretamente no comércio de drogas. É por isso que o governo está lutando numa frente tão ampla contra os rebeldes das Farc, que não são apenas os adversários do governo, mas também os maiores fornecedores de drogas do país. A luta inclui o uso de helicópteros da polícia que queimam laboratórios de cocaína na floresta, assim como aviões que lançam o herbicida glifosato em nuvens azuis sobre as plantações de coca. Com esse método, os colombianos já destruíram 7.500 hectares de plantações de coca numa área controlada pelas FARC desde novembro de 2009.

Durante anos, o governo cooperou com a Agência de Luta contra as Drogas dos EUA (DEA). Em troca, os norte-americanos forneceram ao país bilhões em ajuda financeira e administrativa. Um imenso progresso foi feito na luta contra o comércio de drogas na Colômbia, diz um alto oficial do DEA. De fato, diz ele, os colombianos se tornaram tão eficientes que a máfia das drogas provavelmente transferirá sua produção para a Bolívia, Peru e Equador em breve. “As autoridades desses países não têm experiência suficiente ainda com os métodos dos traficantes, equipamento técnico e nível de sofisticação”, disse o oficial.

O próximo passo

Uma operação recente no vizinho Equador confirmou as previsões do oficial. Em julho, a polícia equatoriana encontrou um submarino próximo à fronteira com a Colômbia. Ele tinha 30 metros de comprimento, era equipado com um periscópio e motores elétricos e aparentemente era capaz de submergir até 20 metros. Diferente dos submarinos que Alonso usou, essa embarcação foi construída por engenheiros e só podia ser pilotada por um capitão com experiência em submarinos. O custo estimado da construção era de US$ 4 milhões.

Ele perdeu tudo, sua existência inteira, por causa do tráfico de drogas, diz Alonso hoje. Agora ele sobrevive da pensão de seu pai de 80 anos. O telhado de sua casa em Buenaventura está apodrecendo e precisa ser trocado, mas Alonso não tem dinheiro. Ele está fazendo redes agora e espera se tornar um pescador. Será a sua terceira vida, depois de sua carreira como capitão e depois como transportador submarino de drogas.

Ele não acredita nos supostos sucessos das unidades anti-drogas de seu país. “Enquanto houver alguém consumindo, haverá alguém produzindo cocaína, alguém transportando, e alguém vendendo a droga”, diz ele. “E idiotas como eu, que são estúpidos o suficiente para fazer isso.”

Traduzido do alemão por Christopher Sultan
Tradução: Eloise De Vylder

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" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".