| 24 FEVEREIRO 2010
ARTIGOS - CIÊNCIA
Le Fanu traz os aportes do conhecimento adquirido pela neurociência desde a Década do Cérebro (1990), que evidenciam a impossibilidade de explicar a mente a partir do cérebro.
A leitura de um artigo do rabino Jonathan Sacks, que recomendei num post de 3 de fevereiro, me levou a descobrir o livro Why Us - How sience rediscovered the mistery of ourselves, do médico e escritor inglês James Le Fanu. A obra ainda não chegou ao Brasil, mas existe uma tradução para o português de Portugal e, tanto em inglês quanto na última flor do Lácio, ela está disponível pela internet (ver Livraria Cultura). Direto ao assunto, Le Fanu é um médico formado em Cambridge e no Royal London Hospital, que se tornou escritor e jornalista especializado em temas científicos, colaborando com veículos de prestígio junto à comunidade acadêmica internacional, como o British Medical Journal, a Lancet, o Journal of the Royal Society of Medicine, bem como periódicos de interesse geral, como o Sunday Telegraph, The Spectator, o New Satesman e a GQ.
Não falta a Le Fanu a credibilidade de seus pares, ou não faltava até o momento, pois a tese de Why Us?certamente há de estigmatizá-lo entre os cientistas e fazer dele uma ovelha negra. O que diz o livro? Diz, com todas as letras, que já está na hora de jogar teoria de sir Charles Darwin na lata de lixo da ciência, bem como na da história e, nesta, juntamente com Marx e Freud. Alguns podem se perguntar o que há de novidade nisso. Será que eu nunca havia ouvido mestre Olavo de Carvalho a dizer que as idéias do naturalista inglês não tinham nenhum fundamento? Ouvi, sim, mas nunca o havia ouvido justificar essa tese com outros argumentos que não os da fé, eu queria mesmo era ouvir os argumentos da razão (como aqueles que Olavo emprega ao analisar o marxismo). Enfim, fides quaerens intellectum, nas palavras de Santo Anselmo.
Partindo das descobertas científicas promovidas pela genética e pela neurociência nos últimos 15 anos, Le Fanu demonstra como os furos na teoria de Darwin estão se transformando em buracos negros. Ou, pior, como eles sempre foram buracos negros que, beneficiados por uma série de circunstâncias histórico-políticas, erigiram-se em verdades científicas. Entre vários outros fatos, o autor mostra como as descobertas do projeto Genoma Humano contradizem, no que se refere ao ser humano, a ideia de evolução tal qual postulada pelo darwinismo, de vez que a imensa semelhança entre os genes de um chimpanzé e o de um homem, não sustentam nenhuma possibilidade de variabilidade e mutação ao longo do tempo. Por que nossos genes são tão iguais entre si, se havíamos nos afastado um do outro, transformando-nos em espécies distintas, num processo que se estendeu por milhares de anos?
Há várias outras questões em Why Us? que simplesmente refutam a idéia de que ter ficado de pé e ter desenvolvido um cérebro grande se constituíram em vantagens que nos fez passar pelo implacável teste da seleção natural. Ao lado delas, Le Fanu traz os aportes do conhecimento adquirido pela neurociência desde a Década do Cérebro (1990), que evidenciam a impossibilidade de explicar a mente a partir do cérebro. Tudo indica que, de fato, há uma relação entre os dois, mas nada permite supor que a mente tenha o cérebro como sua causa, exceto a vontade de comprovar as teses de um paradigma materialista que se tornou hegemônico a partir do século XIX, depois de Darwin. A partir do que revelam as imagens obtidas por meio da tomografia computadorizada do cérebro, a mente continua um imenso mistério, no qual se pode divisar apenas uma luz: a de que a realidade é dual, pois não se esgota na matéria. O fenômeno humano só pode ser conhecido a partir da admissão do lado imaterial dessa realidade.
A contribuição de Le Fanu não se encontra somente no fato de ele, um membro respeitado da comunidade científica, romper abertamente com o paradigma darwinista, numa obra de divulgação científica. Também está em que seu livro não avança, propositalmente, em direção a um paradigma religioso. É no plano científico e não no religioso ou filosófico especulativo que a obra quer trazer certezas. O escritor põe em xeque o que diz a ciência estabelecida, refuta as hipóteses com que o conhecimento se fazia até a atualidade, mas evita a infértil discussão entre evolucionismo e criacionismo, que, tendo se conduzido até agora in partibus infidelium, no estádio que pertence à (pseudo)ciência darwinista, só tem ajudado esta a reiterar sua aparência de verdade. Sem pretender fazer a apologia da religião e sem bancar o filósofo, Le Fanu se limitou somente a pôr o dedo na ferida: as evidências de que a ciência de hoje dispõe desmentem definitivamente o materialismo. O resto é mistério.
Publicado originalmente com o título
Le Fanu: ou como a ciência redescobriu o mistério da nossa existência.
http://observatoriodepiratininga.blogspot.com
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