Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro concede Medalha Tiradentes a Olavo de Carvalho. Aqui.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Ainda a liberdade e a ordem

Ainda a liberdade e a ordem
Olavo de Carvalho

Diário do Comércio
, 18 de março de 2010
http://www.olavodecarvalho.org/semana/100318dc.html





Meu artigo “Liberdade e ordem” suscitou na internet um vendaval de discussões que, se revelam uma saudável agitação de idéias, demonstram, na mesma medida, que muita confusão ainda prevalece entre os liberais e conservadores brasileiros quando tratam de acertar suas diferenças e buscar, ao menos em hipótese, uma estratégia comum.

As palavras “liberdade” e “ordem” são com freqüência usadas comoslogans, denotando o apego dos grupos políticos aos valores que lhes são caros. Mas, como já ensinava Aristóteles, a ciência política começa com a distinção entre o discurso do agente que expressa uma vontade política e o do estudioso que descreve ou analisa um dado da realidade. No Brasil, quem quer que diga alguma coisa sobre a política é interpretado automaticamente como um agente e respondido na clave dos valores e preferências, por mais frio e objetivo que tenha tentado ser. 

Esse fenômeno reflete, de um lado, o clássico verbalismo nacional, onde as palavras despertam reações emocionais diretas sem a mínima intermediação dos objetos reais que designam, e, de outro lado, a hegemonia do pensamento marxista, onde a distinção entre o agir e o conhecer é considerada ilegítima e o que se busca não é analisar o mundo, mas transformá-lo, sobretudo por meio da confusão deliberada entre teoria e praxis(falei disso no meu livro de 1996, O Jardim das Aflições). Se a primeira dessas doenças é endêmica no Brasil, a segunda não seleciona suas vítimas por ideologia, afetando até mesmo os cérebros mais hostis ao marxismo. Foi assim que a minha afirmação de uma hierarquia lógica entre dois conceitos – e entre as realidades histórico-sociais que lhes correspondem – acabou sendo interpretada como expressão de uma preferência pela ordem em detrimento da liberdade.

Ora, só tomadas como palavras-de-ordem partidárias podem a ordem e a liberdade ser ocasião de preferência e escolha. Usadas como sinais descritivos de realidades objetivas, não há entre elas nem oposição nem confluência, mas uma relação de conjunto e subconjunto: a liberdade é um elemento da ordem, não havendo portanto escolha entre “mais liberdade” e “mais ordem”, mas sim apenas entre ordens que fomentam a liberdade e ordens que a estrangulam.

Em todo sistema político, a liberdade é sempre e exclusivamente a margem de manobra repartida entre os vários agentes dentro da ordem jurídica existente; que a ordem é a condição possibilitadora da liberdade, e não esta daquela, como se vê pelo simples fato de que pode existir uma ordem sem muita liberdade, mas nenhuma liberdade fora da ordem, exceto num hipotético e aliás autocontraditório “estado de natureza”. A ordem pode inspirar-se no desejo de ampliar a margem de liberdade até o máximo possível, mas não há por que confundir entre o ideal inspirador de uma construção e os elementos substantivos que a compõem. Por definição, a ordem, qualquer ordem, da mais libertária à mais autoritária, não é um sistema de franquias e sim de obrigações, restrições e controles. Simone Weil já observava, com razão, que cada direito assegurado a um cidadão nada mais é do que uma obrigação imposta a outros e fora disso é apenas um flatus vocis. Uma ordem liberal, ou mais ainda libertária, só pode ser concebida como um sistema complexo de controles idealmente recíprocos (checks and balances) destinado a limitar a liberdade de todos de modo que a de um não se sobreponha à dos outros: a liberdade do agente individual é a margem que sobra no fim de todas as subtrações de parte a parte. Que a noção é problemática e um tanto paradoxal, revela-o o fato de que o mesmo processo legisferante necessário à preservação das liberdades pode se tornar opressivo quando os direitos proclamados são muitos e os controles criados para a sua manutenção geram o crescimento ilimitado da burocracia judicial, policial e administrativa. Mas, afinal, nenhuma ordem é perfeita nos seus próprios termos. A ordem totalitária, oprimindo os de baixo, concede aos de cima uma liberdade ilimitada que desemboca no caos e na destruição mútua dos potentados.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
"Para conseguir sua maturidade o homem necessita de um certo equilíbrio entre estas três coisas: talento, educação e experiência." (De civ Dei 11,25)
Cuidado com seus pensamentos: eles se transformam em palavras. Cuidado com suas palavras: elas se transformam em ação. Cuidado com suas ações: elas se transformam em hábitos. Cuidado com seus atos: eles moldam seu caráter.
Cuidado com seu caráter: ele controla seu destino.
A perversão da retórica, que falseia a lógica e os fatos para vencer o adversário em luta desleal, denomina-se erística. Se a retórica apenas simplifica e embeleza os argumentos para torná-los atraentes, a erística vai além: embeleza com falsos atrativos a falta de argumentos.
‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".