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domingo, 19 de outubro de 2008

Entrevista com Nivaldo Cordeiro, um dos palestrantes do FORTE 2008, da FEBRATEL, em São Paulo

NIVALDO CORDEIRO
14/07/2008 :: João Carlos Fonseca

A Federação Brasileira de Telecomunicações – FEBRATEL – promove no dia 18 de agosto, em São Paulo, a edição 2008 do Fórum de Relações do Trabalho em Telecomunicações, com o tema "Liderança Empresarial do Brasil e os BRICS". José Nivaldo Cordeiro é economista e mestre em Administração de Empresas pela FGV-SP. É homem de idéias e seus recados são diretos. Na qualidade de fórum, o evento promete um debate ativo sobre a contemporaneidade. 

A sigla BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China – traduz o coletivo de países emergentes que disputam lugar no privilegiado clube do Primeiro Mundo. A liderança empresarial, sua formação e a dinâmica política são importantes fatores nessa disputa. A entrevista com o economista José Nivaldo Cordeiro foi feita por e-mail. As perguntas foram editadas para fins de publicação, mas as respostas estão reproduzidas em sua íntegra, tal como nos foram enviadas pelo entrevistado.

FEBRATEL – Em que consiste a liderança empresarial, tema do FORTE 2008? É a liderança dos empresários perante a sociedade ou é a liderança de pessoas nas empresas?

Nivaldo Cordeiro – A liderança, enquanto tal, consiste nas duas coisas. No meio empresarial, há que emergir vozes que representem seus pares junto à sociedade civil e ao governo. Da mesma forma, há que liderar as ações dentro da empresa. Uma das acepções do verbo “liderar” é “conduzir”. Um dos sentidos dado pelos dicionários ao termo é “ir junto com ou dentro de (algo), de um lugar para outro, dando-lhe direção e/ou comando”. Portanto, há o movimento que deve ser orientado em direção a uma meta.

FBT – Fale-nos da figura do líder.

NC – O líder é como o proverbial pastor que sabe aonde vai e o caminho certo, se porta da maneira correta, com a linguagem correta, faz as coisas no tempo certo. É a figura do spoudaios, o homem que amadurece com sabedoria e é respeitado pelos pares e pelos mais jovens. Na empresa, essa figura é representada pelo gerente, seja ele o administrador ou o técnico, o que sabe fazer e sabe organizar o trabalho.

FBT – A liderança empresarial é um fenômeno comum para o sucesso de todos o BRICS (Brasil, Rússia, China, Índia)?

NC – Sim. É comum em toda parte, embora cada cultura imprima a sua própria característica à liderança. Confesso que me fascina saber como se dá a liderança em uma sociedade como a chinesa, tão distante de nós em termos culturais e políticos. Certamente que o viés autoritário seja uma constante, em face do sistema político. Mas, a recente abertura ao ocidente impactou nas técnicas administrativas, de sorte de a busca da cooperação e do exemplo, algo tão importante, para nós, devem ter sido incorporados nos últimos anos. Mas, liderança não é apenas uma técnica, vai além.

Liderança na China, Rússia e Índia.

FBT – O que acontece na China?

NC – A China, enquanto sociedade fechada e comunista, tende a produzir um tipo de líder que eu chamaria de “negativo”, não obstante ele conseguir obter os melhores resultados técnicos e empresariais, tão bons quanto os nossos. O fato é que liderar transcende a empresa, impacta a sociedade e a própria estrutura de poder. Uma sociedade que não tem a liberdade como valor tende a produzir líderes que não a valorizam e, por isso, enquanto homens, falham. Um spoudaios é, antes de tudo, um defensor da liberdade.

FBT – Vamos falar da Rússia?

NC  Na Rússia, vemos emergir uma sociedade conturbada com o fim do regime comunista, cujo regime democrático ainda não está consolidado. Então temos fenômenos interessantes, como uma grande agressividade empresarial casada com os males da sociedade ocidental do século XIX. As estatísticas mostram que em 2007 houve queda na população russa, pela mortalidade dos velhos e de pessoas jovens. Uma coisa selvagem. A redução de população em uma unidade política será sempre uma tragédia. Há, aqui, uma clara indicação de que houve uma escassez de bons condutores, de bons líderes; e não apenas de líderes políticos.

FBT – Só lhe falta comentar sobre a Índia...

NC – A Índia, por sua vez, conseguiu adaptar sua cultura milenar ao que de melhor tem o ocidente. Seus jovens invadiram as universidades ocidentais e levaram para o seu país inovações importantes, tanto que criaram centros de excelência notáveis.

FBT – Quais as vantagens competitivas do Brasil?

NC – O Brasil tem grande vantagem por estar próximo dos mercados consumidores do ocidente, ter fartura de matéria prima, fuso horário compatível com os EUA.

FBT – As vantagens da China?

NC – A China, por sua vez, tem mão de obra barata, o que tem o lado ruim, o dos indicadores sociais.

FBT – E as vantagens da Índia e Rússia?

NC – A Índia conseguiu ter centros de excelências tecnológicas; a Rússia, fartura de petróleo.

Liderança no mundo empresarial.

FBT – Há alguma diferença entre "empresa pequena, média ou grande" para a "liderança empresarial do Brasil no contexto dos BRICS?

NC – Veja. A função de liderar tem um fundo comum, que é a inteireza de alma, o compromisso de vida com seus liderados, com a família, com a pátria. É uma responsabilidade muito grande ser líder, em qualquer contexto, seja numa pequena, numa média ou grande empresas. O desempenho mais das vezes é medido no processo competitivo, que leva em conta inovações tecnológicas, técnicas de comercialização, organização no processo produtivo e motivação das pessoas envolvidas no processo. Então, há um fundo comum. Cada líder tem que saber tirar proveito daquilo que tem à mão.

FBT – Como deve agir o Brasil?

NC – O estrategista que “toca” negócios no Brasil precisa saber os pontos fortes e fracos dos competidores, e não apenas daqueles que vendem no mercado mundial. O mercado mundial também é aqui, na medida em que os produtos importados chegam às prateleiras de nossos supermercados. Compreender o processo como um todo pode ser a chave do sucesso empresarial.

FBT – Há diferença entre "empresa multinacional" e "empresa nacional" para a "liderança empresarial do Brasil, no contexto dos BRICS?

NC – Essencialmente, não. Certos setores multinacionais têm grandes desvantagens quando vêm para o Brasil. Veja o caso de bancos de varejo. Não conseguiram entrar. É difícil, muito regulamentado. Veja o setor de TI. As multinacionais fabricantes tiveram que desenvolver uma rede de parceiros para entrar no nosso mercado, por muitas razões, o que abriu um leque de oportunidades para pequenas e médias empresas do setor.

FBT – O que distingue uma multinacional?

NC – As multinacionais têm várias vantagens, como um conhecimento amplo do mercado mundial, facilidades de financiamentos mais baratos, produção própria de tecnologia e um padrão competitivo de classe mundial. Elas são muito cuidadosas com o desenvolvimento de seus quadros gerenciais, seus líderes. E têm também a vantagem de importar talentos, quando esses faltam, com algum perfil específico.

O sistema sindical.

FBT  Qual sua visão sobre o sistema sindical praticado no Brasil, visto em perspectiva histórica?

NC – Eu não gosto desse sistema, de concepção fascista. Sou favorável ao livre mercado, ao livre sindicalismo; sou pelo fim do imposto sindical. Penso que associações desse tipo devem ser voluntárias e custeadas pelos interessados.

FBT – Qual a importância dos sindicatos patronais?

NC – Os sindicatos patronais são muito importantes para representar os setores e cuidar para que os interesses coletivos não sejam ameaçados, seja por medidas legislativas, seja por medidas arbitrárias do Poder Executivo.

FBT – E dos sindicatos laborais?

NC – Já os sindicatos laborais são de grande importância para manter o equilíbrio na relação capital/trabalho.

A presença do Estado.

FBT – No contexto dos BRICS (Brasil, Rússia, índia, China), como o Sr. percebe a presença e a atuação do Estado?

NC – Aqui está a questão central. Esses países têm em comum o fato de viverem ou vive de experiência com algum grau de socialização. Como a literatura prova à exaustão, a ingerência do Estado é perniciosa para a produtividade e para o desenvolvimento econômico, além de prejudicar a justa distribuição da renda.

FBT – Sr., então, vê a redução do Estado como algo positivo?

NC – Sim; aquele que conseguir reduzir o Estado e a regulamentação e patrocinar as livres trocas internacionais irá proporcionar o maior institucional para que as empresas alcancem seu apogeu.

FBT – Poderia citar um exemplo?

NC – É esse o segredo da China, que, não obstante manter o regime político fechado, abriu largas zonas para o livre comércio. Está crescendo a taxas espetaculares, semelhante às alcançadas pelo Brasil nos tempos do “milagre”. Livre mercado é o combustível desse processo.

FBT – E o caso do Brasil?

NC – No Brasil estamos na contramão, com o crescimento da regulamentação, da carga tributária, da ingerência estatal. Nossos líderes empresariais precisam fazer-se também líderes políticos para fazer mudar essa realidade. Estado Mínimo é o essencial para tornar nossas empresas competitivas.

Os BRICS no cenário mundial.

FBT – Os BRICS competem ou se aliam no cenário internacional?

NC – Depende do tema. Nos mercados, eles competem ferozmente. O crescimento da China, por exemplo, em alguns mercados, está sendo feito à custa da nossa indústria. Por outro lado, abriu enormes mercados para os produtos que não chocam com nossa matriz industrial.

FBT – E quando se trata de política?

NC – Na arena política, há um certo alinhamento dos governos contra os EUA, que eu considero um erro. O Brasil não tem porque hostilizar aquele que é nosso maior mercado e tem uma democracia que é exemplo para o mundo. Entendo a postura da China e da Rússia que têm pretensões geopolíticas diferente das nossas. Entrar nesse coro, todavia, só nos trará perdas.

FBT – Sr. acha que o Brasil, que é o "B" dos BRICS, tem vocação natural para basear seu sucesso em commodities e produtos extrativos ou deve investir em inovação?

NC – Veja que o Brasil tem uma forte vocação agrícola. Isto é um fato que até as pedras sabem. O Brasil já é o maior produtor (senão o maior exportador) em muitos mercados, como carne, soja, álcool, frutas etc. E o País vai crescer porque tem território, água e uma liderança empresarial nesse setor de fazer inveja a concorrentes.

FBT – Então, a vocação do Brasil seria explorar seus recursos naturais?

NC – A situação do Brasil não se esgota aí. Temos uma grande matriz industrial. No setor de TI, a vocação para crescer é total, com fuso horário favorável e estabilidade política, que falta aos concorrentes (a Índia tem ogiva atômica do Paquistão apontada para ela). Então, não temos que fazer nenhuma escolha; temos é que explorar as potencialidades de ambas as áreas. Essa é uma falsa questão.

A presença do Estado.

FBT – O Brasil já foi apelidado de um "BRIC lento". O Sr. concorda ou discorda?

NC – O Brasil ficou lento nas décadas recentes. Visto em um contexto mais amplo, a afirmação não se sustenta. O que tem segurado nosso desenvolvimento são dois fatores: o descontrole de preços, que perdurou muito, e o agigantamento do Estado, que ainda continua. Na verdade, o primeiro fator está contido no segundo.

FBT – O Estado, então, seria grande demais no Brasil?

NC – Sim. Vejo que precisamos mobilizar as forças da nação para reduzir o gigante estatal. E quando falo isso, estou pensando pelo lado da receita e da despesa. É preciso reduzir impostos, mas igualmente as despesas.

FBT – Como seria, no seu entender, a redução de impostos e das despesas do Estado?

NC – Não tenho nenhuma fórmula, apenas sei que se precisa ser feito e aqui a demanda por líderes positivos e genuinamente comprometidos com os interesses gerais da nação precisam emergir. Não será um processo nem curto e nem fácil. Teremos que enfrentar crenças socialistas fortemente arraigadas. Mas, essas crenças são malignas, erradas, são os grilhões que nos prendem e impedem o desenvolvimento voltar a ocorrer de forma acelerada.

FBT – Sr. acha que seria necessário reformular tudo?

NC – Acho que precisamos redesenhar o Estado, repensar a federação, a representação. É uma demanda para redundar a nação.

FBT – Mas, isso seria possível?

NC – Sei da importância do que estou dizendo, da gravidade das minhas palavras. Mas, não seria honesto com os leitores não dizer o que penso e vislumbro. Temos que redundar politicamente o Brasil para que os brasileiros possam enriquecer e prosperar e se tornar um povo mais feliz. Para tanto, precisamos reduzir o monstro estatal. Não temos alternativa.

Pensador brasileiro

FBT – A programação do Forte 2008 se refere a Ortega y Gasset. Qual o pensador brasileiro que dele se aproxima?

NC – Olavo de Carvalho. Ele é profundo e comprometido com a nacionalidade.

FBT – Algum outro tema que queira comentar?

NC  Sim. Seria relativo aos rumos políticos atuais do Brasil que vejo com muita apreensão. Estamos na rota revolucionária. O PT está,desde que assumiu o poder, ocupando todo a aparelho de Estado e conduzindo o Brasil no rumo da socialização, exatamente na contramão da nossa necessidade histórica, de ir em busca da liberdade.

FBT  O momento atual seria, então, motivo de preocupação?

NC – Eu vejo com muita preocupação a hipótese ou do terceiro mandato ou de ser eleger alguém da linha do PT. Podemos estar em véspera da destruição da alternância de poder no Brasil, algo que na prática já vige, na medida em que não existem forças políticas ditas de “direta”. Não há organizações partidárias verdadeiramente comprometidas com o livre mercado, o que é uma tragédia colossal.

FBT – Sr. poderia explicar?

NC – Agora dar o monopólio do poder político às forças em torno do PT é muito grave, pois equivale a manter o curso do processo revolucionário. Isso se casa com o que está acontecendo com a maioria dos países vizinhos, todos atuando no âmbito do Foro de São Paulo, com a notável exceção da Colômbia, que acabou de infringir vigorosas derrotas às FARC, o braço colombiano do FSP.

FBT – Algum recado?

NC – Nossos líderes empresariais precisam largar a passividade e ir para a arena política, tendo consciência dos perigos que estamos vivendo. Esses perigos podem significar uma regressão civilizacional de grande monta, como vimos na Venezuela e no Zimbábue, este em maior proporção. Não estamos longe disso. E não existe nenhum determinismo histórico que nos diga que as forças do livre mercado devem ser derrotadas. Não.

FBT – Como assim?

NC – Se lutarmos, se líderes assumirem as suas responsabilidades, podemos, aqueles que combatem pela liberdade, retomar o caminho perdido e colocar o Brasil na trilha do desenvolvimento. Mas, isso não acontecerá por inércia, terá que vir pela mãos de homens inteligentes, sóbrios e comprometidos com a nação. Certamente que os setores das Teles com e de TI terão que dar sua contribuição de novos líderes, que confrontem os adversários socialistas, para mudar o curso da nossa História.

FBT – Suas palavras finais.

NC – Acredito firmemente que esse é o lado “certo”. Como dizia Ortega, não se pode permanecer no “erro”. O socialismo é um erro que precisa ser corrigido. As lideranças empresariais não poderão escapar ao enfrentamento dos inimigos da civilização.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
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‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".