Por Nivaldo Cordeiro em 28/07/2008
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Na noite do último sábado eu tive o privilégio de assistir ao concerto de encerramento do 39º FESTIVAL INTERNACIONAL DE INVERNO DE CAMPOS DO JORDÃO. Já bastante tradicional, o evento, que ocorreu em auditório ao lado do Palácio de Inverno do governador do Estado de São Paulo, é bancado, em grande parte, por verbas públicas. A orquestra, composta basicamente por jovens músicos bolsistas, foi regida pelo octogenário maestro Kurt Masur e não era ele apenas que fazia o contraponto com seus jovens músicos.
Na platéia muita gente conhecida, integrante da elite econômica e política de São Paulo, gente que foi ali para ver e ser vista, como é da regra nesses eventos, e não pelo espetáculo musical em si. No programa a majestosa Nona Sinfonia, de Beethoven, considerada por muitos a composição mais bela de todos os tempos. De fato, essa música é capaz de elevar a mais endurecida alma aos cumes do prazer estético. Foi um raro privilégio estar ali.
Na platéia também estava o governador José Serra. Discreto, vestia roupas simples, sem gravada e com camisa que lembrava o indefectível jeans, o uniforme do homem-massa contemporâneo. Não pude deixar de lembrar-me do filme O SEGREDO DE BEETHOVEN, da diretora polonesa Agnieszka Holland. Nas cenas finais do filme podemos ver a estréia da peça em Viena, diante da nobreza e dos governantes principescos. Talvez o compositor nunca imaginasse que um espetáculo solene, em que sua música estivesse no programa, viesse a ter um governante assim trajado, de forma bastante inadequada para o evento e em contraste singular com muitos da platéia. Contraste ainda maior com o maestro, envergando a indumentária tradicional, e seus músicos, todos vestidos a rigor. Não preciso lembrar que, na recriação do filme, o mais elegante na platéia da estréia era o governante e não o maestro.
Mas o governador, pelo menos, entrou mudo e saiu calado, mesmo tendo recebido algumas chochas palmas. Evitou um comício desnecessário. Pior mesmo foi o secretário da Cultura, João Sayad, que representou o poder constituído na solenidade. Subiu ao palco em mangas de camisa, sem gravata e envergando uma calça de jeans desbotada, o emblema mais característico do homem-massa, usando sua indefectível barba por fazer, outro emblema dos intelectuais militantes, os sacerdotes do deus-Estado que governam em nome da massa. Que contraste! Nada poderia ser mais plástico para representar os tempos de hoje: um homem-massa governante, vestido a caráter. Um “intelectual” no poder. Sayad parecia um centauro barbudo, metade homem, metade bicho, quer dizer, homem-massa, que é a besta ela mesma.
A figura apequenada do secretário de Cultura estaria mais adequada, com o seu traje, em algum festival de música pop ou mesmo de funk. Diante daqueles músicos solenes, daquela platéia sofisticada e da música celestial de Beethoven foi um despropósito só. Quando a figura majestosa do maestro Kurt Masur adentrou ao recinto é que o contraste ficou mais acentuado. A digníssima figura do velho artista, absolutamente de acordo com o momento, a música a ser regida, o recinto, a platéia e tudo mais, ofuscou os representantes dos homens-massa tornados governantes, ali presentes.
Quando a massa se eleva a primeira coisa que a distingue é a deselegância, a incapacidade de ter bons modos ao vestir-se e ao falar. O idioma ficará irremediavelmente corrompido, assim como os modos. A decadência pode ser percebida até mesmo nas salas de concerto, um dos recintos mais tradicionais, como bem pude testemunhar.
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