Por Olavo de Carvalho
Quando escrevi no Diário do Comércio que "não há, no jornalismo ou nos debates em geral, atitude mais indigna, mais abjeta e, no fundo, mais ridícula, do que tentar impugnar uma denúncia sob o pretexto de que ela é teoria da conspiração", não sabia que o ilustre prof. Oliveiros da Silva Ferreira tinha usado desse expediente contra a minha pessoa, em artigo publicado na seção "Pensar e Repensar" do seu website. Muito menos podia imaginar que ele tivesse recorrido a esse golpe baixo só para depois acabar expondo uma opinião que não é muito diferente das minhas, com a óbvia intenção de fazer parecer que era só dele, originalíssima e incompartilhável.
Quando escrevi no Diário do Comércio que "não há, no jornalismo ou nos debates em geral, atitude mais indigna, mais abjeta e, no fundo, mais ridícula, do que tentar impugnar uma denúncia sob o pretexto de que ela é teoria da conspiração", não sabia que o ilustre prof. Oliveiros da Silva Ferreira tinha usado desse expediente contra a minha pessoa, em artigo publicado na seção "Pensar e Repensar" do seu website. Muito menos podia imaginar que ele tivesse recorrido a esse golpe baixo só para depois acabar expondo uma opinião que não é muito diferente das minhas, com a óbvia intenção de fazer parecer que era só dele, originalíssima e incompartilhável.
Essa opinião é a seguinte: no Brasil há uma crise permanente do Estado, a qual "vem da República e da Federação, portanto, de 1889/1891, quando copiamos, sem poder copiar, o modelo norte-americano....O processo, no Brasil, é o da usurpação do Estado pelo Governo (as Medidas Provisórias são o exemplo claro e legal)...". Uma das conseqüências disso é que "deixamos as nossas Forças Armadas marginalizadas e sendo reduzidas à condição de gendarmaria, ou seja, a uma organização em armas a serviço da política dos Governos. O Exército é o fundamento do Estado. Sem ele, o mais é silêncio."
Pouco ou nada tenho a objetar a esse diagnóstico. O problema é que, na ânsia de valorizar um determinado fator causal como explicação dos males nacionais, o prof. Oliveiros nega ou subestima todos os outros, inclusive os mais óbvios e patentes, incorrendo assim no delito de "teoria da conspiração" do qual ele me acusa e tal como ele próprio o define: "Apontar um fato isolado e único como causa e explicação única e suficiente de todos". Na visão dele confiram o texto emwww.oliveiros.com.br/ie.html , os problemas do Brasil derivam todos de um erro único que cometemos em 1889-91 e viemos repetindo pelas décadas a fora: copiando a Constituição americana num contexto impróprio, permitimos que o governo se sobrepusesse ao Estado. Tudo o mais que aconteceu desde então, sobretudo nos últimos tempos a retomada de impulso do movimento comunista, a aliança entre as facções políticas de esquerda e o banditismo comum, a conquista da hegemonia cultural pela esquerda, a destruição da cultura superior, o desmantelamento de toda oposição legitimamente conservadora, a debacle planejada da educação, a criação do Foro de São Paulo etc. etc. não existe, é irrelevante ou empalidece diante da mancada inaugural de Ruy Barbosa. Acreditar que nos fatos novos haja algum problema a investigar é "ignorar os processos sociais" (sic). Que um intelectual morra de amores pela sua própria teoria, é doença profissional corriqueira. Mas que, por ela, chegue a suprimir a história de quatro décadas, ah, isto já é delírio passional alarmante. Ignorar não só "os processos sociais", mas as regras mínimas da metodologia historiográfica e até as leis da lógica elementar, é imaginar que um fator estrutural permanente já velho de mais de um século possa, por si, produzir mudança, sem a interferência de elementos novos. A "crise do Estado" pode ter sido um terreno fértil para a aliança de comunistas e criminosos comuns que hoje mata 50 mil brasileiros por ano, para a disseminação dos sovietes no campo ou para a instauração de um poder hegemônico onde só a esquerda tem condições de lançar candidatos à presidência mas não teria jamais a virtude mágica de gerar esse estado de coisas sem o ingresso em cena da algumas forças novas, como a "revolução cultural" gramsciana a partir dos anos 60 e a criação do Foro de São Paulo em 1990. E é justamente a importância dessas forças que o prof. Oliveiros nega, apegando-se à sua "crise do Estado" com a obsessividade monomaníaca de um consumado fetichista sociológico.
Tendo reduzido tudo a uma explicação única, ele jura que quem faz isso sou eu:"Digo, e reafirmo, que atribuir ao Foro de São Paulo a responsabilidade intelectual, moral e política por tudo o que acontece de errado no Brasil tem algo a ver com o que entendo por 'teoria da conspiração' — que se define por apontar um fato isolado e único como causa e explicação única e suficiente de todos."
Em vez de responder às minhas denúncias, o prof. Oliveiros prefere deformá-las mediante o recurso pueril do hiperbolismo e sair cantando vitória sobre um fantasma de sua própria invenção.
Desde logo, eu nunca disse nem pensei que o Foro de São Paulo comandasse a revolução gramsciana no Brasil, mesmo porque esta começou duas décadas antes de que essa entidade fosse fundada. O prof. Oliveiros é que inverte a ordem temporal da minha narrativa para fazê-la parecer insensata.
Em segundo lugar, longe de tudo reduzir a uma explicação única, assinalei repetidamente, nos meus artigos de jornal e em conferências, a multiplicidade desnorteante de linhas estratégicas simultâneas e de fontes várias, postas em ação pela esquerda nos últimos tempos:
a) A técnica do golpe de Estado administrativo, na qual mudanças drásticas e de amplas conseqüências são introduzidas por meras portarias ou regulamentos, sem passar pelo processo legislativo.
b) A militarização da sociedade, nas linhas propostas pelo general vietnamita Vo Nguyen Giap, adotada por Hugo Chávez na Venezuela em 2004.
c) A reorganização da esquerda mundial em "redes" para a "guerra informática" e a mobilização instantânea da militância mundial nos momentos decisivos.
d) A inserção da esquerda nas estratégias dos três globalismos concorrentes: ocidental, russo-chinês e islâmico.
e) A macro-estratégia de mudança civilizacional concebida nos altos círculos globalistas com o auxílio de intelectuais de grande porte como Arnold Toynbee, Carroll Quigley e outros.
f) A utilização maciça de técnicas de engenharia comportamental para a mudança rápida de valores e condutas, segundo as linhas do Instituto Tavistock de Londres.
g) A estratégia da "guerra assimétrica".
h) A guerra cultural travada segundo os princípios da Escola de Frankfurt.
Se, dentro de um quadro tão complexo, falei também do gramscismo e do Foro de São Paulo, nada, absolutamente nada justifica insinuar que tudo reduzi a estes dois fatores. E, se insisti particularmente em falar do Foro de São Paulo, não foi por ignorar os demais aspectos do panorama histórico, mas pela simples obrigação jornalística de chamar a atenção dos leitores para um dado recente e de óbvia importância que os demais formadores de opinião, entre eles o próprio Oliveiros da Silva Ferreira, preferiam ocultar ou camuflar.
Por fim, o que atribuí ao Foro de São Paulo não foi nem poderia ter sido jamais "a responsabilidade por tudo o que acontece de errado no Brasil" (o que no mínimo suporia que nada houve de errado antes de 1990), e sim a responsabilidade por certos atos muito determinados e concretos, como por exemplo o compromisso de solidariedade às Farc assinado em 2001, a intenvenção estrangeira em favor de Hugo Chávez no plebiscito venezuelano de 2003, a criação de mecanismos de proteção continental a terroristas capturados fora de seus países de origem e, facilitado por esses mecanismos, o apoio dado pelas Farc ao PCC e outras quadrilhas locais para que espalhem o terror nas ruas das capitais brasileiras. Ainda que o Foro não fosse culpado de mais nada, esses quatro fatos já bastariam para caracterizá-lo como a mais perigosa entidade revolucionária que já existiu na América Latina, mais eficiente até, por deter o comando de vários governos, do que o foi a extinta OLAS, Organização Latino-Americana de Solidariedade, da qual ele é de certo modo a reencarnação ampliada. Negar a realidade ou a importância desses fatos sob a alegação de que o Foro não tem culpa de outros tantos e diversos males é uma desconversa tão patética, tão fraca, tão miserável, que não mereceria resposta, se não fosse autor dela o detentor de alguns méritos intelectuais, que nem por serem mais modestos do que ele imagina devem ser ignorados.
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