Há meses Lula "surfava" numa onda de popularidade, alimentada por pesquisas de opinião cada vez mais desconcertantes.
Os índices de aprovação não paravam de subir e se tornaram acachapantes: Lula beirava os 80% e seu governo 70%. Ao mesmo tempo as pesquisas proclamavam que até os antigos redutos de resistência e oposição a Lula tinham cedido. A própria classe média agora se mostrava favorável ao Presidente e por toda a parte o êxito era incontestável.
Sem qualquer pudor, falou-se até de Lula como o líder político de maior prestígio no mundo.
8 Leia Eleições municipais: dogma virtual
Tais dados de pesquisas, profusamente comentados e repetidos na mídia, além de aceitos como incontestes por muita gente, criavam um efeito psicológico e transmitiam a idéia de que qualquer oposição ao Presidente era inútil e sem futuro. Era necessário conformar-se.
A oposição não encontrava (ou simulava não encontrar) um discurso, mostrando-se e confessando-se desorientada.
Máquina de propaganda regada a petróleo
Simultaneamente, o País era bombardeado regularmente com notícias alvissareiras de achados fabulosos de petróleo.
Planos de exploração do chamado pré-sal, com promessas de aplicação de fundos em educação e saúde, tornaram-se verdadeiras obras-primas de ficção e propaganda política. Com as mãos sujas de óleo, ao estilo de Getúlio, Lula parecia tocar e oferecer uma prosperidade sem limites aos brasileiros.
O Presidente chegou a ser saudado, pelo "companheiro" Chávez, como magnata do petróleo e se aventou a hipótese de o Brasil entrar na OPEP.
Lula aparecia e se proclamava como um predestinado!
A economia ia (ou parecia ir) bem e todos falavam do "momento mágico" que o país atravessava.
Hegemonia endossada pela mídia
Lula reinava isolado na cena política, governando pouco, viajando muito e discursando sem parar. E já tinha carimbado, com sua mão negra de petróleo, a companheira Dilma como sua provável sucessora.
A mídia, quase como um todo, endossava este ambiente psico-político. O clima já era de hegemonia, a ser consagrado nas urnas, de modo devastador e "democrático". Falava-se na "onda vermelha".
A partir de uma vitória eleitoral inequívoca, com um Congresso subserviente e uma oposição desconjuntada, estariam abertas as portas para o aventureirismo político: uma mini Constituinte? Um terceiro mandato? Cada um é livre de fazer suas conjecturas.
O "dogma" da transferência de popularidade
Em face desse quadro de fundo, era necessário jogar todas as fichas - e a máquina do Governo Federal - na presente eleição municipal, para a conquista do maior número de prefeituras, com preferência para os grandes centros urbanos.
Muitos asseveravam que, devido à fraqueza dos partidos e ao carácter personalista da política no Brasil, Lula facilmente transmitiria sua popularidade crescente aos apadrinhados (seus e do governo), antecipando o que aconteceria em 2010.
O Presidente traçou um plano e destacou forças-tarefa de ministros para ativarem a máquina eleitoral, o que foi anunciado até em importantes órgãos de imprensa estrangeiros.
Marta Suplicy, a candidata símbolo
Não é difícil compreender que S. Paulo era, evidentemente, peça-chave nesse jogo. Por isso Lula decidiu envolver-se pessoalmente na disputa.
Tudo indica que a promessa do Presidente a Marta Suplicy foi, no caso de uma vitória assinalada, designá-la como candidata do PT à eleição presidencial em substituição a Dilma Roussef.
A promessa procedia, segundo a lógica simplista do lulo-petismo. O Presidente, com seu prestígio, elegeria Marta prefeita. Depois a designaria candidata à Presidência, transferindo seu imenso potencial de votos e fazendo sua sucessora vitoriosa em 2010.
Pela importância de S. Paulo, pela visibilidade da disputa, pela relevância da candidata petista, pelo empenho pessoal do Presidente, a cidade tornou-se o palco e uma espécie de parábola para o País.
Permitam-me, pois, que analise com um cuidado particular o que se passou na disputa eleitoral pela Prefeitura.
Desconcerto ante o governismo triunfante
Ao ter início a corrida eleitoral já as pesquisas apresentavam Marta Suplicy liderando com uma vantagem folgada.
No campo da oposição instalava-se uma briga intestina, com duas candidaturas que se digladiavam, parecendo perder o rumo e desacreditando essa mesma oposição. Essa discórdia só gerava desconcerto e desânimo na faixa de público que não aderia ao lulo-petismo.
Enquanto só o PT (com o apoio de Lula) parecia prosperar sem problemas, as intenções de voto de Marta cresciam e falava-se até em vitória no primeiro turno. O Presidente dizia acreditar nisso e convocava a militância para "liquidar a fatura" logo.
Lula veio fazer carreatas com a candidata e no ar ficava a sensação da inoperância de todas as forças políticas perante o governismo triunfante.
Como disse, tudo (do governo à oposição) era uma parábola para o País.
Urnas desmentem pesquisas
Chegaram as eleições. Marta mantivera a liderança nas pesquisas do primeiro ao último dia... e na boca de urna. Surpresa! Kassab venceu o primeiro turno.
O desmentido fragoroso das pesquisas tinha igualmente um lado de parábola em relação a Lula. Não seriam também inconsistentes as pesquisas da popularidade de Lula? O que é fato é que as urnas desmentiram essa popularidade. E não só em S. Paulo!
Com resultados bem desfavoráveis por todo o País, era necessário tentar virar o jogo em S. Paulo. Uma vitória de Marta ainda podia dar certo fôlego ao lulo-petismo.
Sai de cena o "paz e amor"
Com o segundo turno, a máquina comandada por Lula, tirou a máscara, e mostrou do que é capaz na briga política. Ou seja, deixou evidente que o lulo-petismo apenas usa o sistema democrático para atentar contra ele e, se possível, eliminá-lo.
O Presidente designou seu secretário-particular, Gilberto Carvalho, para coordenar a campanha de Marta Suplicy. Tinha início a fase dois.
Logo em seguida, dez ministros desembarcaram em S. Paulo para subir no palanque com a candidata. Nos discursos transpareceu todo o rancor autoritário do lulo-petismo.
Para Dilma Roussef, crer na vitória contra o PT, era "prova de soberba, de elitismo e descompromisso com a democracia".
Tarso Genro atacou os tabus conservadores da elite e disse que a candidata era alvo de preconceito.
Luiz Dulci afirmou não ser possível ter uma das maiores metrópoles do mundo na mão de um síndico conservador.
Para Aldo Rebelo, vice de Marta, "São Paulo se transformou no último barco à deriva para os náufragos das forças conservadoras do Brasil".
Carlos Lupi mostrou inconformidade "em ver São Paulo na mão de uma direita disfarçada".
Não sei se percebem que no léxico político do lulo-petismo ser da elite ou ser conservador e de direita é, de si, quase um crime. As forças conservadoras não têm vez na "democracia" do PT.
Veio depois a baixaria da propaganda do horário político. A campanha da petista investiu com insinuações a respeito da vida particular de Kassab. E Marta, em entrevista televisionada, encenou a farsa do "eu não sabia".
O lulo-petismo e seu braço sindical infiltraram e tentaram manipular uma manifestação de policiais civis em greve, instigando um confronto armado com a Polícia Militar, nas proximidades do Palácio do Governador, que esteve a ponto de causar uma tragédia de gravidade incalculável.
Num último extertor de desespero, o lulo-petismo clamou pelo socorro de sua verdadeira força inspiradora: a "esquerda católica". Mais de 100 padres assinaram um documento que deveria ser lido nas paróquias para dar apoio explícito a Marta Suplicy. A manobra foi arquitetada por Gilberto Carvalho (ex-seminarista e elo de ligação do governo com a CNBB) e D. Pedro Luiz Stringhini.
A indignação nos meios católicos foi de tal monta que o bispo auxiliar de S. Paulo teve que recuar e pedir desculpas públicas.
Lula, terminou a campanha ao lado de Marta, com discurso agressivo e populista e envergando uma camisa vermelha ao estilo "chavista".
"O jogo virou de ponta-cabeça"
Os resultados do segundo turno são conhecidos de todos. O desvelar do lado agressivo e esquerdista da candidata de Lula fizeram aumentar o repúdio do eleitorado. A derrota foi massacrante. Ruiu o "castelo de cartas". A parábola, era também a imagem do lulo-petismo em boa parte do País.
Dias antes do segundo turno, na previsão do que aconteceria nas urnas, Raymundo Costa, escreveu no jornal Valor(21.0ut.2008): "Enfim, o jogo que era armado antes da eleição virou de ponta-cabeça e recomeça em outras bases".
E a jornalista Dora Kramer, no jornal O Estado de S. Paulo(24.out.2008), dois dias antes do segundo turno afirmava, em artigo intitulado Quadrilátero da saia-justa:
- "De cada ângulo que se olhe, essa eleição municipal revela fatos e consolida evidências que derrubam teorias eleitorais recentemente elaboradas a partir de um único dado: a popularidade do presidente Luiz Inácio da Silva.
A campanha do segundo turno revogou a crença inabalável de políticos e marqueteiros na doutrina "paz e amor" ....
No primeiro turno as urnas já haviam derrubado o mito do "poste", desmentido assertivas sobre a transferência automática de votos e arquivado a idéia do Palácio do Planalto de transformar o resultado da eleição de prefeitos numa interpretação plebiscitária sobre o governo Lula, com o objetivo de estabelecer desde já as balizas para a armação do jogo da sucessão presidencial em 2010."
Um comentário:
Cavaleiro, que bela análise! Nunca acreditei naqueles índices de popularidade. Como professora, transitei em muitas classes de muitas classes sociais no litoral paulista e nunca conheci nenhuma pessoa sequer que acreditava ser Lula um governante honesto.
Na Universidade, no entanto, há muitos marxistas, mas são uma elite mínima. Não perfazem 80% da população.
Poderíamos pensar no pessoal da Bolsa Família. Os resultados eleitorais pelo Brasil mostram que eles gostam de mamar, mas não gostam do PT. Assim. essas pesquisas eram realmente um grande engodo.
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