por João Luiz Mauad em 9 de julho de 2010
Para os jusnaturalistas, entre os quais se insere uma boa parte dos liberais, os direitos humanos são aqueles de caráter estritamente negativo. De acordo com essa concepção, o efetivo exercício de um direito não pode requerer que outros sejam forçados a agir para garanti-lo, mas, somente, que se abstenham de interferir para cessá-lo. O meu direito à vida, por exemplo, não exige que os demais laborem para manter-me vivo, mas, pura e simplesmente, que se abstenham de matar-me.
Direitos e obrigações são inseparáveis. Logo, a melhor forma de saber se alguém tem direito a alguma coisa é perguntar quem está obrigado a fornecê-la. O fato de eu desejar ou necessitar muito de algo não quer dizer nada. Eu adoraria, por exemplo, morar na Avenida Vieira Souto, em Ipanema, numa cobertura de frente para o mar, dirigir uma Ferrari último tipo e poder evitar o trânsito caótico voando de helicóptero. Porém, não me basta vontade ou carência, é preciso que eu mesmo tenha condições de adquirir tais coisas para que tenha direito a elas.
De acordo com o mesmo raciocínio, não são direitos coisas como moradia e alimentação dignas, emprego estável, assistência médica gratuita, lazer, terras e outras que impliquem ações positivas de terceiros para satisfazê-los. Muita gente, por conta da importância da saúde para qualquer indivíduo, a considera um direito essencial da pessoa humana. Porém, serviços de saúde são prestados somente através dos esforços e capitais de terceiros, e nenhum “código de ética” progressista será capaz de dar fundamento moral ao fato de que alguém possa beneficiar-se compulsoriamente do trabalho, do dinheiro, do talento ou da energia dos outros, a troco de nada.
Infelizmente, entretanto, pensamento diverso encontra-se absorvido pela constituição de inúmeros países, inclusive a nossa, bem como pela famigerada Declaração dos Direitos Humanos das Nações Unidas, a qual, entre outras pérolas, prevê que: “toda pessoa tem o direito a um nível de vida adequado, que lhe assegure, assim como a toda a sua família, a saúde, o bem estar e, essencialmente, a alimentação, o vestuário, a moradia, a assistência médica e os serviços sociais necessários”.
Ora, se uma pessoa tem direito a moradia, alimentação, cuidados médicos, vestuário, lazer, etc., mas não dispõe de meios para adquiri-los, quem deve provê-los? Os governos, claro! Esse ser magnânimo, caridoso e inesgotável. Ora, como os governos não dispõem de recursos próprios, a única forma de fazer isso é usando os seus poderes coercitivos para arrancar esses recursos de alguém. Em outras palavras, quando o governo nos “dá” alguma coisa, estará, sempre e concomitantemente, tirando de outros a possibilidade de utilizar os seus próprios recursos da forma que melhor lhes convier.
(Faço aqui um parêntese para esclarecer que considero a solidariedade uma virtude de altíssimo valor moral. Penso que qualquer sociedade que se queira minimamente ética e civilizada não pode prescindir dela. Entretanto, quando se admite que a solidariedade seja imposta pela lei, ou, em bom português, que a repartição dos frutos do trabalho seja feita pela força do Estado, não estamos falando mais de virtude, mas de vício. A solidariedade implica sempre a idéia de abnegação, espontaneidade, voluntariedade. Quando, então, se pretende instituí-la pela coação da lei, restará nada mais que o sacrifício involuntário, forçado, determinado pelo medo e pelo castigo).
Num Estado de Direito liberal, a autoridade dos governos é resultado da delegação de poderes pelos indivíduos. Mas só podemos transferir ao Estado os poderes de que, efetivamente, dispomos. Por exemplo: todos nós temos o direito natural à própria vida, liberdade e propriedades e, por conseguinte, a prerrogativa de defendê-las contra os predadores. Por isso, estamos perfeitamente aptos a delegar, aos governos, autoridade para defender-nos daqueles que atentem contra a nossa integridade física, nossa liberdade e nossos bens. De modo inverso, a ninguém é dado o direito de atentar contra a vida, a liberdade e a propriedade alheia, porquanto ninguém pode, tampouco, legitimamente transferir tal autoridade para o Estado.
De acordo com a concepção liberal, são legítimos os serviços prestados pelo governo se, e somente se, são serviços de caráter universal. Estes serviços têm que estar, por princípio, a disposição de todos, indiscriminadamente, mesmo que alguns resolvam não utilizá-los. Quando, por outro lado, um determinado serviço é destinado a apenas uma parte da população, embora seja financiado por todos, esse serviço é imoral.
Nenhum comentário:
Postar um comentário