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segunda-feira, 8 de setembro de 2008

A Manha do Barão de Itararé

Do portal WSCOM
Ipojuca Pontes,

No ensaio sobre a significação do cômico, o filósofo Henri Bergson diz que o riso, em certas situações, nasce do entrechoque “da rigidez do mecânico com o flexível”. Teoricamente, a coisa soa um tanto hermética. Mas o francês ilustra suas palavras evocando a imagem do sujeito que dá uma topada na rua, cai e provoca o riso pelo efeito da rigidez mecânica onde deveria haver maleabilidade. Já Freud, em seu “O Chiste e sua relação com o inconsciente”, considera, analisando o cômico a partir do uso da palavra, que o riso se origina ao se desmontar o sentido de uma frase ou de um conceito bem comportado, para, em seguida, reconstruí-lo em cima de um modelo risível.

A explicação de Freud sintetiza melhor a graça corrosiva do Barão de Itararé, considerado por várias gerações, desde os anos 1920, como o melhor e mais dotado humorista brasileiro. Com efeito, desmontando conceitos, crenças e verdades estabelecidas, o Barão revirou tudo de cabeça para baixo, estabelecendo um novo juízo para a compreensão de pessoas, instituições e coisas de sua época. Investindo contra a rigidez do entendimento mecânico socialmente consagrado, ele desarticula a realidade aparente, para dar a esta mesma realidade um sentido surpreendente e mordaz. Por exemplo: ao verificar que ao sair com uma mulher gostosa o sujeito pode provocar, sem querer, a cupidez do próximo, inverteu o sentido da frase tradicional com uma simples troca de palavra: “Antes só do que bem acompanhado”.

De fato, na sua mordacidade compulsiva, o humorista espicaçou totens & tabus. Nada, ou quase nada, ficou fora do alcance do seu espírito iconoclasta: a mendacidade de ministros boquirrotos, a burrice das figuras preeminentes, a sem-vergonhice genética dos governantes, a intolerância das “autoridades constituídas”, a corrupção dos meios oficiais, a malandragem da vida acadêmica e, em especial, a desonestidade do jornalismo servil – só para ficar no genérico.

Para expressar o seu humor corrosivo, de larga abrangência, o gaúcho Aparício Torelly, mais tarde feito Barão de Itararé, fundou no Rio de Janeiro, em 1926, o tablóide A Manha - “órgão de ataques de... riso”-, jornal que não tinha expediente, pois, segundo o Barão, “jornal sério não vive de expediente”. Ele fazia o semanário praticamente sozinho e neste espaço crítico viu cair a República Velha representada pelo governo café-com-leite de Washington Luiz (a quem chamava de Vaz Antão Luiz), nascer e morrer a Revolução de 30, acicatada pelas esporas da “ditabranda” de Getúlio Vargas (a quem chamava de G. Túlio Dor Nelles Vargas) e a testemunhar, com empenho pessoal, a redemocratização do país.

A vida do Barão teve lances admiráveis. Por ocasião da comemoração dos seus 25 anos de jornalismo, em 1945, quando ainda sobrevivia a ditadura Vargas, o lendário Herbert Moses, então presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), resolveu homenageá-lo, enaltecendo-o como um incansável combatente da liberdade. A fala de agradecimento do humorista foi antológica.

Disse ele, na ocasião: “O Brasil foi descoberto, por acaso, em 1500, e ficou sendo Colônia de Portugal até 1822, mas não por acaso. Nesse ano, para continuar mandando, um príncipe português proclamou a independência do Brasil e o país, desde então, passou a fazer dívidas por conta própria, ficando cada vez mais dependente dos credores. Em 1889, foi proclamada a República, a qual foi passando por muitos estados de evolução, entre os quais o estado de sítio, o estado de emergência, o estado de guerra e o Estado Novo, que é, afinal, o estado a que chegamos”.

E, para o delírio da platéia, arrematou:

“É preciso combater sempre. Discordo da teoria de que os povos empenhados na luta pela democracia devam esperar o seu desfecho para concretizar suas aspirações. É no próprio curso do conflito que se afirmam os valores dos que prezam a liberdade. Por isso, não compreendo um combatente dependendo de um relógio de pulso, embora seja verdade que todo combatente deva ter pulso para lutar, mesmo que não tenha relógio”.

Durante a sobremesa do almoço de confraternização, Itararé fez inesperada revelação sobre a própria fidalguia: “Confesso aos senhores que antes de me fazer barão em pensei em me tornar duque. É preciso explicar: havia um duque, sogro de Portinari, que fora bailarino. O Brasil já era muito grande para tão poucos duques, mesmo sendo um deles o Duque de Caxias. Assim, nada mais natural que eu também fosse duque. No meu esquema, apenas três duques figurariam nas páginas rutilantes da nossa história: o Duque de Caxias, que brigava, mas não dançava; o Duque Dançarino, que dançava, mas não brigava; e eu, Itararé, que brigo e danço conforme a música”.

Como se há de convir, o método humorístico do Barão tinha dialética adequada. Ele consistia em realizar um jogo cadenciado na desestruturação das frases para expressar o seu pensamento da forma mais elaborada possível, obtendo, com isso, o envolvimento hipnótico do leitor e levá-lo, pelo riso, a pensar seriamente – o que, como sabem os profissionais do ramo, é coisa muito difícil. De tal modo que os seus leitores mais ardorosos passaram a apontá-lo como o Bernard Shaw do Brasil, comparação que ele descartou solenemente, ao considerar o dramaturgo inglês como o “Itararé da Inglaterra”.

No plano político, embora eleito vereador no Rio de Janeiro pelo Partido Comunista, em 1947 - antes, portanto, da desestalinização -, o humorista não era propriamente uma alma totalitária. Pelo contrário. No momento oportuno, ele deixava o engajamento de lado e era capaz de afirmar que Luiz Carlos Prestes era “O que cavaleiro da Esperança Malograda” e que, com o líder comunista, “ninguém conversa, pois ele fala sozinho”.

E sobre a sua atuação político-partidária na Câmara de Vereadores do Rio, conhecida como a “Gaiola de Ouro”, radicalizou: “Foi uma das grandes coisas que me aconteceram na vida contra a minha vontade. Eu quero fazer silêncio tétrico sobre este assunto”.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
"Para conseguir sua maturidade o homem necessita de um certo equilíbrio entre estas três coisas: talento, educação e experiência." (De civ Dei 11,25)
Cuidado com seus pensamentos: eles se transformam em palavras. Cuidado com suas palavras: elas se transformam em ação. Cuidado com suas ações: elas se transformam em hábitos. Cuidado com seus atos: eles moldam seu caráter.
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A perversão da retórica, que falseia a lógica e os fatos para vencer o adversário em luta desleal, denomina-se erística. Se a retórica apenas simplifica e embeleza os argumentos para torná-los atraentes, a erística vai além: embeleza com falsos atrativos a falta de argumentos.
‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".