21 de setembro de 2009
Faz algum tempo, em entrevista à Bandeirantes, em São Paulo, a uma pergunta dos entrevistadores respondi que não fazia previsões, embora alimentasse apreensões, o que levou um deles a indagar se me referia ao MST; “também” foi a resposta; “então há outros?”. E, diante da resposta afirmativa, perguntou se podia mencioná-los, ao que aditei, exemplificativamente, sistema hospitalar, penitenciário, policial, a favelização das grandes cidades e suas ligações com o tráfico, entre outros. Os dias se passaram e, infelizmente, as minhas apreensões não foram infirmadas. Estou a lembrar-me do fato acompanhando notícias recentes daqui e de longe. Ao que se diz, 16 ônibus empregados no transporte coletivo foram incendiados na capital da Bahia, nove postos policiais militares destruídos, 10 mortes e 20 presos. Por quê? Em reação a medidas comuns da administração no sentido de transferir condenados, em razão de tráfico de drogas, de uma prisão para outra de maior segurança; este fato, até então curial, teria motivado a reação violenta e as ameaças difundidas resultaram na solidariedade de pessoas ligadas ao mesmo ofício, umas condenadas, outras não.
Os fatos foram largamente divulgados. E, qualquer que seja o nome que se der a eles, a inegável realidade é que a nação presencia o conflito rude e aberto entre entidades sem face e o poder público, com a singularidade delas armam-se contra o Estado, cuja ação, até ontem havida como normal, é questionada em termos belicosos. A autoridade timorata, de um lado, de outro uma entidade sem existência legal, usando a linguagem das armas. Até onde sei, trata-se de uma modalidade de guerra civil. Ou será exagero meu?
Fato semelhante foi bosquejado pelo MST, que, para significar sua divergência com o governo, projetou invadir propriedades “produtivas”. Mês passado, a mesma entidade anunciou movimento de âmbito nacional de invasões e no dia e na hora marcados, exibindo seu poder e sua disciplina militar, realizou a tarefa anunciada em 10 Estados, metade do Brasil; o Ministério da Fazenda e prédios públicos foram os preferidos. O novo plano é refinado. Não alega que as invasões serão em terras ditas “improdutivas”, mas, às claras, em propriedades “produtivas”. É o requinte. Em geral as propriedades invadidas são produtivas e algumas modelarmente produtivas, como as destinadas a aprimoramento seletivo de espécies vegetais, selvagemente destruídas, agora, para proclamar o dogma de que a ilicitude não tem limites, a insolência chega ao ponto de afiançar que as invasões visarão às propriedades “produtivas”. Sempre me chamou a atenção o rigor técnico, senão científico, do movimento desde o início, quando começou alterando o dicionário, chamando de “ocupação pacífica” o que a lei denominava “esbulho” ou “invasão”. Graças a essa “camuflagem”, invadiu o que quis sem dizer que invadia; usou outro nome. Agora, quando a invasão já não assusta ninguém, tão familiar se tornou ou, a entidade que, faz anos, promove invasões, chega ao requinte de afirmar, à face do Estado, que atingirá as propriedades “produtivas”, seguindo a regra de dois passos à frente e um passo para trás.
Dizem os jornais da semana finda que nenhuma reparação tiveram as muitas vítimas de invasões que têm se sucedido e, por isso mesmo, têm se repetido monotonamente, porque entre o invasor e o invadido o poder público não consegue distinguir um do outro. Ora, faz mais de século, escreveu Rui Barbosa que “cada atentado que se tolera à desordem, é um novo alimento que se lhe ministra. A fera não se desafaz de devorar, devorando. Nas presas menores se lhe aguça o apetite das maiores. Não reagindo em defesa dos particulares, o poder abandona a da Sociedade”.
Agora se diz que as repartições invadidas pelo MST foram depredadas e roubados instrumentos seus, que o Incra pretende identificar os invasores ligados à terra e os alheios a ela. Não sei se o fará ou se poderá proceder à discriminação. Se o fizer, ainda que tardiamente, será um começo. Ou continuará a não ver o que entra pelos olhos de um cego. Fico por aqui. Sinalando a gravidade de situações a que chegamos, nada menos que uma guerra civil encabulada ou mascarada para praticar a coisa sem dar-lhe o nome.
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