por Humberto Fontova em 7 de outubro de 2009 Opinião - EUA e Geopolítica
O
s Kennedy, em particular o presidente assassinado, John. F. Kennedy, foram representativos de uma nova geração de americanos que confrontaram a velha e suja política de homens nos moldes de Nixon... O papel da família Kennedy na vitória eleitoral de Barack Obama não deve ser menosprezado. Sem esse apoio moral, político e financeiro, a saga suja dos clãs Bush e Nixon teria continuado”.
Essa é uma parte de um editorial publicado no final de agosto na versão cubano-stalinista do Der Sturmer da Alemanha nazista. Mas ninguém que esteja familiarizado com a história de Cuba deveria duvidar da sinceridade do editorial. Fidel e Raúl Castro, afinal, devem muito à família Kennedy. E, muito cedo nesse jogo, Castro foi tão perspicaz a respeito de Nixon quanto este foi sagaz a respeito de Castro.
“É melhor torcermos para que Kennedy vença esta eleição”, Fidel Castro confidenciou a um subordinado em 1960. “Se Nixon vencer, a nossa revolução não resistirá”.
“Nixon estava determinado a que a invasão tivesse êxito”, relembra o Coronel Robert Cushman, dos Fuzileiros Navais, um alto assessor militar de Eisenhower em 19601. “Na Casa Branca de Eisenhower, Nixon era o representante da ação no projeto anti-Castro, o seu maior promotor”.
“Faça tudo o que for necessário em Cuba”, Eisenhower aconselhou JFK ao lhe transferir o cargo. “Nós simplesmente não podemos permitir que um regime como aquele continue. Ajude os cubanos ao máximo”.
Bem, nós todos sabemos o resto da história.
“Kennedy acabou derrotado à beira da vitória”, escreveu Richard Nixon a respeito da Baía dos Porcos e da Crise dos Mísseis. “Então, deu aos soviéticos o direito de sentar acampamento em nosso quintal”.
“Nós acabamos conseguindo exatamente o que queríamos desde o início”, declarou em suas memórias, em tom gabão, Nikita Khrushchev, confirmando o que Nixon dissera.“Segurança para o regime de Fidel Castro e a remoção dos mísseis americanos da Turquia. Até hoje, os Estados Unidos cumpriram a sua promessa de não interferir no regime de Castro e de não permitir que ninguém mais inferira. Após a morte de Kennedy, seu sucessor, Lyndon Johnson, nos assegurou que manteria a promessa de não invadir Cuba”, acrescentou Khrushchev.
“Nós trancamos o comunismo de Castro na América Latina e jogamos a chave fora”, rosnava Barry Goldwater, o oponente de Lyndon Johnson nas eleições de 1964. “Eu ajudaria os exilados cubanos ABERTAMENTE. Eu lhes daria armas e munição para fazer Castro voar pelos ares e para fora de sua ilha-fortaleza, agora defendida com armas soviéticas”.
Então, o Açougueiro de Budapeste girou sua faca e riu novamente: “Teria sido ridículo se nós tivéssemos ido à guerra por Cuba — por um país a doze mil milhas de distância. Para nós, uma guerra era impensável”. Portanto, a ameaça que tanto ouriçou os Cavaleiros de Camelot2 e inspirou tantos dramas épicos literários ou cinematográficos entre os escribas da corte, era pura besteira.
Assim, os feitos de coragem, frieza e resolução que inspiraram o eunuco da corte de Camelot, Arthur Schlesinger, a hiperventilar que: “O mundo inteiro viu... a insuperável liderança americana na administração responsável do poder... uma combinação de dureza, nervos e sabedoria, tão brilhantemente controlada, tão inigualavelmente calibrada, que deslumbrou o mundo!”, foi, na verdade a covarde sucumbência dos Melhores e Mais Brilhantes da América diante da falsa ameaça de um valentão de escola, um camponês ucraniano batedor de sapato3ordinário.
Não que Kennedy estivesse ele mesmo acima das trapaças – mas essas tinham como alvo os seus compatriotas e a expensas da segurança nacional de seu país. Eis um exemplo:
“Os Republicanos permitiram que uma ditadura comunista florescesse a oito minutos de vôo a jato de nossas fronteiras”, acusava John F. Kennedy pouco antes de seu famoso debate com Richard Nixon durante a campanha presidencial de 1960. “Nós precisamos apoiar os combatentes anticastristas. Até agora, esses combatentes pela liberdade não receberam nenhuma ajuda de nosso governo”.
Duas semanas antes daquele debate crucial em outubro de 1960, JFK tinha sido informado em detalhes pela CIA (sob ordens de Eisenhower) acerca dos planos de invasão a Cuba (que mais tarde seria conhecida como a invasão da Baía dos Porcos). Portanto, JFK sabia perfeitamente bem que a administração Republicana estava ajudando os combatentes anti-Castro. Mas, uma vez que os planos eram secretos, ele sabia perfeitamentebem que Nixon não poderia refutá-lo em público.
Em outras palavras, para atingir seu oponente Republicano com um golpe baixo, Kennedy contava com o patriotismo desse oponente. Sejamos francos: aqui os Republicanos estavam em desvantagem deplorável. Nixon teve de ficar quieto. Ele poderia ter derrubado Kennedy facilmente nesse ponto. Mas, para alguns candidatos, a segurança nacional (e a dos combatentes anticastristas) pesava mais do que ganhar pontos em um debate.
E vocês sabem como os companheiros de viagem de Castro e Che adoram respirar fundo e dizer: “Nossa! Que coisa! Não é excitante ver como Castro desafiou dez presidentes americanos? Ah, ele é tão cheio de sonhos!” E se vocês acham que eu exagero, aqui vão algumas citações documentadas:
“Fidel deixa a arma cair ao chão, bate as mãos nas coxas e se levanta ereto. Ele é como um pênis poderoso tomando vida!” (Abbie Hoffman)
“Você é o primeiro e o maior herói a aparecer no mundo desde a II Guerra Mundial! É como se o fantasma de Cortez tivesse surgido em nosso século, montando o cavalo branco de Zapata!” (Norman Mailer)
“Um dos homens mais encantadores que jamais conheci!...Castro é pessoalmente dominador. É muito mais do que carisma. Castro permanece uma das poucas personalidades verdadeiramente eletrizantes num mundo onde seus pares parecem maçantes!” (Frank Mankiewics, ex-secretário de imprensa de Robert Kennedy e articulador de campanha Democrata).
“Enquanto Fidel falava, eu podia sentir uma sensação peculiar em sua presença. Era como se eu estivesse encontrando-me com uma nova força da natureza! É um homem tão cheio de energia que ele é quase de uma espécie diferente! Força se irradia dele!” (Saul Landau,cineasta)
Bem, como é de praxe, quando se trata de descrições de qualquer coisa relacionada a Castro/Cuba por parte da mídia especializada e através de estudos sérios, a verdade não é apenas diferente - mas o total oposto daquilo que vocês obtêm da grande mídia e dos livros-texto universitários.
De fato, depois da “combinação de dureza, nervos e sabedoria, tão brilhantemente controlada, tão inigualavelmente calibrada, que deslumbrou o mundo!” de Camelot, o “corajoso desafio” de Castro aos Estados Unidos tomou a forma da Guarda Costeira americana e até mesmo da marinha britânica (quando alguns intrépidos exilados transferiram suas operações para as Bahamas) fazendo um escudo protetor ao redor da ilha de Castro. Muito longe de “desafiar” uma superpotência, Castro escondeu-se por trás das saias de duas superpotências, mais o Império Britânico.
E nesse caso, pelo menos, tal como evidenciado pelo recente editorial, não podemos acusar os irmãos Castro de ingratidão.
Tradução: Henrique Dmyterko
Essa é uma parte de um editorial publicado no final de agosto na versão cubano-stalinista do Der Sturmer da Alemanha nazista. Mas ninguém que esteja familiarizado com a história de Cuba deveria duvidar da sinceridade do editorial. Fidel e Raúl Castro, afinal, devem muito à família Kennedy. E, muito cedo nesse jogo, Castro foi tão perspicaz a respeito de Nixon quanto este foi sagaz a respeito de Castro.
“É melhor torcermos para que Kennedy vença esta eleição”, Fidel Castro confidenciou a um subordinado em 1960. “Se Nixon vencer, a nossa revolução não resistirá”.
“Nixon estava determinado a que a invasão tivesse êxito”, relembra o Coronel Robert Cushman, dos Fuzileiros Navais, um alto assessor militar de Eisenhower em 19601. “Na Casa Branca de Eisenhower, Nixon era o representante da ação no projeto anti-Castro, o seu maior promotor”.
“Faça tudo o que for necessário em Cuba”, Eisenhower aconselhou JFK ao lhe transferir o cargo. “Nós simplesmente não podemos permitir que um regime como aquele continue. Ajude os cubanos ao máximo”.
Bem, nós todos sabemos o resto da história.
“Kennedy acabou derrotado à beira da vitória”, escreveu Richard Nixon a respeito da Baía dos Porcos e da Crise dos Mísseis. “Então, deu aos soviéticos o direito de sentar acampamento em nosso quintal”.
“Nós acabamos conseguindo exatamente o que queríamos desde o início”, declarou em suas memórias, em tom gabão, Nikita Khrushchev, confirmando o que Nixon dissera.“Segurança para o regime de Fidel Castro e a remoção dos mísseis americanos da Turquia. Até hoje, os Estados Unidos cumpriram a sua promessa de não interferir no regime de Castro e de não permitir que ninguém mais inferira. Após a morte de Kennedy, seu sucessor, Lyndon Johnson, nos assegurou que manteria a promessa de não invadir Cuba”, acrescentou Khrushchev.
“Nós trancamos o comunismo de Castro na América Latina e jogamos a chave fora”, rosnava Barry Goldwater, o oponente de Lyndon Johnson nas eleições de 1964. “Eu ajudaria os exilados cubanos ABERTAMENTE. Eu lhes daria armas e munição para fazer Castro voar pelos ares e para fora de sua ilha-fortaleza, agora defendida com armas soviéticas”.
Então, o Açougueiro de Budapeste girou sua faca e riu novamente: “Teria sido ridículo se nós tivéssemos ido à guerra por Cuba — por um país a doze mil milhas de distância. Para nós, uma guerra era impensável”. Portanto, a ameaça que tanto ouriçou os Cavaleiros de Camelot2 e inspirou tantos dramas épicos literários ou cinematográficos entre os escribas da corte, era pura besteira.
Assim, os feitos de coragem, frieza e resolução que inspiraram o eunuco da corte de Camelot, Arthur Schlesinger, a hiperventilar que: “O mundo inteiro viu... a insuperável liderança americana na administração responsável do poder... uma combinação de dureza, nervos e sabedoria, tão brilhantemente controlada, tão inigualavelmente calibrada, que deslumbrou o mundo!”, foi, na verdade a covarde sucumbência dos Melhores e Mais Brilhantes da América diante da falsa ameaça de um valentão de escola, um camponês ucraniano batedor de sapato3ordinário.
Não que Kennedy estivesse ele mesmo acima das trapaças – mas essas tinham como alvo os seus compatriotas e a expensas da segurança nacional de seu país. Eis um exemplo:
“Os Republicanos permitiram que uma ditadura comunista florescesse a oito minutos de vôo a jato de nossas fronteiras”, acusava John F. Kennedy pouco antes de seu famoso debate com Richard Nixon durante a campanha presidencial de 1960. “Nós precisamos apoiar os combatentes anticastristas. Até agora, esses combatentes pela liberdade não receberam nenhuma ajuda de nosso governo”.
Duas semanas antes daquele debate crucial em outubro de 1960, JFK tinha sido informado em detalhes pela CIA (sob ordens de Eisenhower) acerca dos planos de invasão a Cuba (que mais tarde seria conhecida como a invasão da Baía dos Porcos). Portanto, JFK sabia perfeitamente bem que a administração Republicana estava ajudando os combatentes anti-Castro. Mas, uma vez que os planos eram secretos, ele sabia perfeitamentebem que Nixon não poderia refutá-lo em público.
Em outras palavras, para atingir seu oponente Republicano com um golpe baixo, Kennedy contava com o patriotismo desse oponente. Sejamos francos: aqui os Republicanos estavam em desvantagem deplorável. Nixon teve de ficar quieto. Ele poderia ter derrubado Kennedy facilmente nesse ponto. Mas, para alguns candidatos, a segurança nacional (e a dos combatentes anticastristas) pesava mais do que ganhar pontos em um debate.
E vocês sabem como os companheiros de viagem de Castro e Che adoram respirar fundo e dizer: “Nossa! Que coisa! Não é excitante ver como Castro desafiou dez presidentes americanos? Ah, ele é tão cheio de sonhos!” E se vocês acham que eu exagero, aqui vão algumas citações documentadas:
“Fidel deixa a arma cair ao chão, bate as mãos nas coxas e se levanta ereto. Ele é como um pênis poderoso tomando vida!” (Abbie Hoffman)
“Você é o primeiro e o maior herói a aparecer no mundo desde a II Guerra Mundial! É como se o fantasma de Cortez tivesse surgido em nosso século, montando o cavalo branco de Zapata!” (Norman Mailer)
“Um dos homens mais encantadores que jamais conheci!...Castro é pessoalmente dominador. É muito mais do que carisma. Castro permanece uma das poucas personalidades verdadeiramente eletrizantes num mundo onde seus pares parecem maçantes!” (Frank Mankiewics, ex-secretário de imprensa de Robert Kennedy e articulador de campanha Democrata).
“Enquanto Fidel falava, eu podia sentir uma sensação peculiar em sua presença. Era como se eu estivesse encontrando-me com uma nova força da natureza! É um homem tão cheio de energia que ele é quase de uma espécie diferente! Força se irradia dele!” (Saul Landau,cineasta)
Bem, como é de praxe, quando se trata de descrições de qualquer coisa relacionada a Castro/Cuba por parte da mídia especializada e através de estudos sérios, a verdade não é apenas diferente - mas o total oposto daquilo que vocês obtêm da grande mídia e dos livros-texto universitários.
De fato, depois da “combinação de dureza, nervos e sabedoria, tão brilhantemente controlada, tão inigualavelmente calibrada, que deslumbrou o mundo!” de Camelot, o “corajoso desafio” de Castro aos Estados Unidos tomou a forma da Guarda Costeira americana e até mesmo da marinha britânica (quando alguns intrépidos exilados transferiram suas operações para as Bahamas) fazendo um escudo protetor ao redor da ilha de Castro. Muito longe de “desafiar” uma superpotência, Castro escondeu-se por trás das saias de duas superpotências, mais o Império Britânico.
E nesse caso, pelo menos, tal como evidenciado pelo recente editorial, não podemos acusar os irmãos Castro de ingratidão.
Tradução: Henrique Dmyterko
1 NT: Richard Nixon era o vice de Eisenhower e candidato à presidência em 1960.
2 NT: Camelot, a Corte do Rei Artur, ou o sonho de Camelot, era a auto-imagem promovida pelos Kennedy e sua máquina política e de propaganda.
3 NT: Alusão ao episódio em que Khrushchev tirou o sapato e o bateu sobre a mesa durante Assembléia da ONU.
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