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segunda-feira, 26 de outubro de 2009

A invasão vertical dos bárbaros

Fonte: DOCTOR PLUMBING - US ARMY


Por Miguel Gustavo Lopes Kfouri
Curitiba, 30-09-2002


A reportagem de capa (o ano é 2002) de uma das mais importantes revistas do país faz a apologia da mentira. Um candidato socialista radical pode ganhar a eleição para presidente já no primeiro turno. Os efeitos da instabilidade do câmbio sobre a economia revelam que o Estado brasileiro está falido e a beira de um colapso muito maior do que o da Argentina. A CNBB realiza um plebiscito para decidir se o Brasil deve ou não participar da ALCA. E o que é pior: em meio a esse cenário nada auspicioso (e meio kafkiano), vê-se que os membros das classes altas e médias estão completamente alheios e indiferentes aos desdobramentos inelutáveis dessa terrível situação.

Que cultura é essa onde campeia o egoísmo e a mentira como se fossem coisas naturais e até saudáveis? O que está acontecendo em nossa sociedade?

Em 1967, o filósofo Mário Ferrreira dos Santos escreveu um livro com o título que usei como epígrafe deste texto. No prefácio ele explica o significado dessa expressão dizendo o seguinte:

"A História nos relata que houve muitas invasões HORIZONTAIS de bárbaros; ou seja, invasões que se processaram com maior lentidão ou não, maior rapidez ou não, e que consistiram na penetração pacífica ou violenta dos povos, que se deslocavam para as regiões habitadas por outros, impondo-lhes o seu poder ou pelo menos os seus costumes. Mas só se pode falar em invasão de bárbaros, quando essa se processa no território que corresponde à civilização. Não foram essas invasões tão cruentas como muitas vezes são descritas, pois as que se processaram no antigo Império Romano, sobretudo no período final, processaram-se gradualmente, e muitas vezes com o apoio interno dos próprios civilizados, já barbarizados em muitos dos seus costumes.

Na verdade, a invasão que é a penetração gradual e ampla dos bárbaros não só se processa HORIZONTALMENTE pela penetração no território civilizado, mas também VERTICALMENTE, que é a que penetra pela cultura, solapando os seus fundamentos, e preparando o caminho à corrupção mais fácil do ciclo cultural, como aconteceu no fim do império romano, e como começa a acontecer agora entre nós."

Como o próprio filósofo destaca, essa "obra é uma denúncia dessa invasão, que, preparando-se e desenvolvendo-se há quase quatro séculos, atinge agora a um estágio intolerável, e que nos ameaça definitivamente."

Revelando todo seu gênio de verdadeiro filósofo ao refletir sobre essa corrupção cultural, Mário Ferreira dos Santos, sem apelar para radicalismos - que, em reflexão filosófica, é sintoma de superficialidade -, lembra também que,

"De outro lado, há disposições prévias corruptivas, que estão em todo ciclo cultural, e actuam desde o primeiro momento com maior ou menor intensidade, para destruir a forma do ciclo que repelem. E esse é o tema de outra obra nossa 'Vida e Morte dos Ciclos Culturais'."

O livro "A invasão vertical dos Bárbaros" é dividido em duas partes. A primeira trata de temas referentes à sensibilidade e à afetividade do homem. Nela são analisadas questões como a exaltação da força, valorização exagerada do corpo, a supervalorização romântica, a superioridade da força sobre o Direito, a propaganda desenfreada e tendenciosa, a valorização da memória mecânica, o surgimento da horda e do tribalismo, a exploração da sensualidade, a disseminação do mau-gosto etc.

Na segunda parte são tratados temas que se referem à intelectualidade, tais como a luta contra a universalização do conhecimento (com o conseqüente desaparecimento dos princípios comuns a várias ciências, corrupção da linguagem e atomização do conhecimento), o desvirtuamento da Universidade, a separação entre Religião, Filosofia e Ciência, a incompreensão entre Ética e Moral, o Proletário e a exploração ideológica, juventude transviada, nominalismo e realismo, o conceito de Deus etc.

A obra é de atualidade desconcertante, e constitui um diagnóstico preciso das doenças espirituais e culturais que podem levar uma civilização a um estado de barbárie e morte. Portanto, é de leitura fundamental, pois, como se sabe, o diagnóstico é também o primeiro passo para a cura da doença. Demais, a leitura desse livro ajudará a todos que buscam responder às perguntas que fiz acima a encontrar as respostas que procuram.

Contudo, o que quero destacar aqui é que o filósofo escreveu essa obra num momento histórico, cultural e político muito mais tumultuado que o nosso. E, sabendo há muito que a academia oficial, monopolizada pelo governo, jamais seria o lugar de onde deveria partir a luta para salvar o ciclo cultural em que vivemos, pôs-se a escrever durante a sua vida toda, às vezes até mimeografando as suas obras e, assim, cumprindo a sua parte na luta.

A vida e a obra de Mário Ferreira dos Santos constituem para todos nós, mais que um exemplo a seguir, um poderoso testemunho de que, para evitar a completa barbarização de toda uma cultura, basta que existam algumas pessoas cujas vidas estejam integralmente a serviço da Verdade.

Diante dessa afirmação, os pessimistas de hoje talvez dirão que é impossível deter a revolução cultural gramsciana que já está em estádio avançado. Ao que eu responderia: contemplar a realidade dessa ótica é cair naquele velho erro de ficar vendo o corpo através da sombra, atitude que, ao final, só nos levará a tomar a sombra pelo corpo e, no final das contas, "a conhecer o bem pelo seu reflexo no mal", como já disse o professor Olavo de Carvalho. Com efeito, se os que podem ver a luz preferem ficar olhando somente para as trevas, logo tudo para eles será choro e ranger de dentes.

A meu ver, mesmo num momento em que grande parte das pessoas parecem querer dirigir seus olhares somente para as sombras, todas as pessoas que buscam a verdade têm o dever de continuar a olhar para o corpo. E o que isso significa? Deixo a resposta para o mestre Mário Ferreira dos Santos:

"Se temos em nossa estrutura cultural, no âmbito das idéias superiores, tudo quanto de maior a humanidade ardentemente sonhou e desejou, como admitir que se destruiu o que é fundamento para uma caminhada mais promissora?

Que afastemos o que obstaculiza, que lutemos contra o que desvirtua, que fortaleçamos o que nos auxilia a marchar para frente, está bem! Mas renunciar, demitirmo-nos do conquistado, para volver atrás, isso nunca!

Lutar pelo nosso ciclo cultural, fortalecer os aspectos positivos para impedir o desenvolvimento do que é negativo, eis o nosso dever."


Miguel Gustavo Lopes Kfouri
mglkfouri@onda.com.br


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INVASÃO VERTICAL DOS BÁRBAROS
Trecho do livro "Invasão Vertical dos Bárbaros", de Mário Ferreira dos Santos



O problema ético - O que caracteriza a ética culta e civilizada é a sua fundamentação na prudência como hábito reiterado do saber (virtude é um hábito reiterado e bom), do conhecimento dos princípios, meios e fins, e inclui, subordinadamente, a sabedoria, a ciência, a filosofia, etc. Funda-se na moderação, no manter-se equilibradamente entre os excessos contrários, pois o vício, como hábito continuado do que é mau, pode surgir, também, de uma virtude tomada em excesso.

A moderação é a temperança nas paixões, o evitar-se os excessos, o saber manter-se no meio termo justo e bom. Por isso a moderação exige também a justiça, o reconhecimento do que é devido à natureza das coisas, o respeito aos seus direitos, a ausência da lesão ao direito alheio, o saber dar a cada um o que lhe cabe, com moderação. E exige ainda coragem, ânimo forte, a capacidade para saber arrostar os riscos, que a prática do bem pode exigir, sem cair nos excessos da temeridade e da audácia. Vê-se, assim, que a prudência precisa dos freios da moderação, da iluminação, da justiça e da força, da coragem, como a moderação necessita o auxílio da prudência, os limites da justiça, a coragem que faz vencer os ímpetos exagerados, e a coragem o conhecimento da prudência, os freios da moderação, a visão clara da justiça. Todas essas virtudes cooperam entre si para darem os melhores resultados. Soltas, são incompletas; cooperando, são poderosas. O homem verdadeiramente culto sabe dosar seus atos. O bárbaro, não. Este se deixa arrastar pelos excessos da coragem que o levam à temeridade, à audácia; aos excessos da prudência, que o tornam astucioso, manhoso; aos desvios da justiça, que o tornam cruel, inclemente; aos desvios da moderação, que o levam à ira, à cólera, à destruição.

Que nos mostra o espetáculo de hoje? Não há exemplos viciosos que se repetem e se multiplicam? Bárbaros intra muros... É mister apontá-los, e apontá-los até dentro de nós, porque em nossos momentos de fraqueza e de desfalecimento somos bárbaros também. Que cada um faça seu exame de consciência, e compreenda que não há nessas atitudes nenhuma grandeza, pois a temeridade e a audácia bárbaras não são manifestações de força, mas apenas de fraqueza na capacidade inibidora; revelam apenas que aquele que os sofre é um fraco em sua vontade e em sua inteligência. Por isso é presa fácil de suas paixões e de sua concupiscência. Só os fortes, só os corajosos são moderados e prudentes, porque tais virtudes exigem mais inteligência e vontade do que deixar desencadear as forças primitivas.

Dizia Nietzsche, e nisto ele era bem cristão, que o homem de real valor não é aquele que levanta o gládio e desfecha o golpe, mas aquele que, sendo capaz de levantar o gládio, não fere, e perdoa.

A ética do bárbaro é a ética do dente por dente, do olho por olho. É a ética da vingança, é a norma do que deseja apenas o castigo, do sádico que só se satisfaz ao ver o adversário morder o pó da derrota. Não é o que vence e dá a mão para levantar o vencido. Não é o que busca a solução que o tornará amigo de seus semelhantes. Não é o que ama, mas o que odeia.

O bárbaro ameaça a nossa ética. Invade todos os caminhos, penetra nos lares, nas escolas. Quer estabelecer a sua grandeza na sua miséria, proclama a sua força onde esta não está, aponta a sua exaltação, quando ela é depressão, e quando julga olhar a sua altura apenas está vendo o vale, em cujos pântanos ele perdura. Seus vôos são apenas saltos de sapos, ou arrancos de fera, nunca o vôo das aves que invadem o azul do céu, e que são símbolos da grandeza e da inteligência humana.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
"Para conseguir sua maturidade o homem necessita de um certo equilíbrio entre estas três coisas: talento, educação e experiência." (De civ Dei 11,25)
Cuidado com seus pensamentos: eles se transformam em palavras. Cuidado com suas palavras: elas se transformam em ação. Cuidado com suas ações: elas se transformam em hábitos. Cuidado com seus atos: eles moldam seu caráter.
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A perversão da retórica, que falseia a lógica e os fatos para vencer o adversário em luta desleal, denomina-se erística. Se a retórica apenas simplifica e embeleza os argumentos para torná-los atraentes, a erística vai além: embeleza com falsos atrativos a falta de argumentos.
‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".