28/06/2008
Nos últimos meses debrucei-me seriamente sobre os escritos de Ortega y Gasset, particularmente sobre o seu monumental REBELIÃO DAS MASSAS, obra escrita a partir de 1926 em capítulos publicados em jornais. Destino maiúsculo deste pequeno grande livro, escrito na pressa dos textos jornalísticos, mas de grande profundidade analítica. Ortega conseguiu essa proeza porque antes, em 1923, escreveu o não menos monumental ESPANHA INVERTEBRADA, obra na qual mergulhou na história e na atualidade de seu país. O que viu na Espanha viu na Europa e no mundo. Como um profeta viu seu povo – espanhol assim como europeu – caminhar para o abismo e nada teve a fazer. Pregou no deserto.
A guerra civil espanhola não foi menos trágica e menos previsível do que Hitler e o bolchevismo. Estava tudo lá, nas obras do grande filósofo espanhol, com a cristalina transparência própria a um vidente. Na segunda parte do ESPANHA INVERTEBRADA ele relata o que se falava nas ruas de então, que não havia homens em Espanha. Ortega clareia o que estava subentendido na expressão: não havia homens de escol, uma aristocracia, mas havia a presença massacrante e apavorante das massas, homens indiferenciados e medíocres, sedentos de sangue e poder.
Fiz-me a mesma pergunta quando Lula tomou posse – fui à Esplanada dos Ministérios vê-lo passear em triunfo em carro aberto, cercado de bandeiras vermelhas por todos os lados – e renovei a pergunta agora quando vi que a bandidagem carioca botou o Exército Brasileiro para fora de seu território, no Morro da Providência, apoiada que estava pelos poderes locais constituídos. E pelo Federal também, diga-se de passagem. Onde estão os homens de escol? Estão escassos e escondidos no Brasil de hoje, como outrora estavam na Espanha. Ortega: “¿No hay hombres o no hay masas? A resposta é de uma obviedade perturbadora. E concluiu o filósofo:
“Pero, como em estas páginas queda dicho, las masas, uma vez movilizadas en sentido subversivo contra las minorías selectas, no oyen a quien les predica normas de disciplinas. Es preciso que fracasen totalmente para que em sus propias carnes laceradas aprendan lo que no quieren oír... El odio a los mejores parece agotarse como fuente maligna, y empieza a brotar un nuevo hontanar afectivo de amor a la jerarquia, a las faenas constructoras y a los hombres egregios capaces de dirigirlas”.
Estava plenamente certo, como se viu, e a Espanha invertebrada, assim como toda a Europa, precisaram da carnificina mais atroz e dos fornos crematórios mais iníquos para amansar as massas desembestadas. Ele não poderia ser mais apocalíptico àquela altura, o ano da Graça de 1923. Deu no que deu.
Nossos homens egrégios foram corridos não só do Morro da Providência, foram espantados também dos palácios do Planalto, das universidades, dos órgãos de imprensa e mesmo da direção de muitas empresas privadas. O discurso e a lógica acabrunhantes do homem-massa passam agora pelo socialmente aceito e o seu oposto, a conversação dos homens sérios e cultivados, foi banida. A civilização deu lugar à barbárie.
Brasil invertebrado, poderíamos bem arremedar Ortega, posto que a estrutura de um povo é sua elite, a quem as massas devem obedecer. Nem temos a elite e as nossas massas estão moucas a qualquer voz da razão.
Não posso esquecer jamais do nosso Exército expulso do Morro da Providência, vítima que foi do conluio entre os criminosos comuns e os criminosos políticos, gente da mesma laia, as massas triunfantes no poder. Vivemos tempos de grandes perigos.
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