Do portal MÍDIA SEM MÁSCARA
por João Luiz Mauad em 07 de maio de 2008
Resumo: Para grande parte de nossos socialistas o trabalho é um fim em si mesmo e não um meio para a obtenção do verdadeiro fim, que é o aumento do bem-estar geral, obtido através do gradativo aumento do poder de compra de cada indivíduo.
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Tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília, com apoio amplo, geral e irrestrito das centrais sindicais, o Projeto de Lei nº 7663/06, de autoria do deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), que reduz a jornada máxima de trabalho, no país, das atuais 44 para 40 horas semanais. De acordo com o autor do projeto e seus patrocinadores, a lei, caso aprovada, deverá gerar mais empregos, além de aumentar a segurança do trabalhador.
Antes de mais nada, é preciso ressaltar que, como normalmente acontece em Pindorama, estamos andando na contramão da história. Discute-se hoje um projeto que já foi testado em alguns países mundo afora, sempre com resultados muito diferentes do esperado. Há cerca de uma década, por exemplo, a França aprovou dispositivo legal que reduziu a jornada semanal de trabalho de 40 para 35 horas. Conhecida como “ Lei de Aubry” – numa referência direta à ex-ministra socialista do trabalho Martine Aubry –, a estrovenga foi saudada como um marco histórico na caminhada daquele país rumo ao pleno emprego – uma das maiores e mais veneradas utopias socialistas.
Após todos esses anos, no entanto, a taxa de desemprego na terra de Napoleão não só não caiu, como apresentou um discreto aumento. Como era de se esperar, pesquisas recentes mostram que 2/3 dos franceses são hoje favoráveis à revogação da tal lei. Não por acaso, esta era justamente uma das plataformas de campanha do recém-eleito Nicolas Sarkozy.
Um outro francês, este bem menos popular que o atual presidente, porém infinitamente mais sábio, costumava dizer que "na esfera econômica, um ato, um hábito, uma instituição, uma lei não geram somente um efeito, mas uma série de efeitos. Dentre esses, só o primeiro é imediato. Manifesta-se simultaneamente com a sua causa. É visível. Os outros só aparecem depois e não são visíveis. Podemos nos dar por felizes se conseguirmos prevê-los. (...) Entre um bom e um mau economista existe uma diferença: um se detém no efeito que se vê; o outro leva em conta tanto o efeito que se vê quanto aqueles que se devem prever." (Frédéric Bastiat)
Acho que já contei, num outro artigo, a história de um empresário ocidental que, em viagem à China comunista, deparou-se com um grupo de centenas de homens que construíam uma pequena barragem de terra, munidos exclusivamente de pás e enxadas. Antevendo uma oportunidade de negócio, ele comentou com o oficial chinês que o acompanhava que apenas um operário, de posse de uma moderna máquina escavadeira, poderia executar toda aquela empreitada num tempo bem mais curto. A resposta do astuto oficial – mal escondendo um sorriso sarcástico no canto dos lábios – foi: "sim, mas imagine todo o desemprego que isso acarretaria". Sem nada dizer, porque estúpido não era, o empresário pensou: "se são empregos que desejam, melhor seria que lhes tirassem as pás e dessem-lhes colheres".
O raciocínio do chinês é o mesmo que infesta a mente de muitos dos nossos socialistas, para quem o trabalho é um fim em si mesmo e não um meio para a obtenção do verdadeiro fim, que é o aumento do bem-estar geral, obtido através do gradativo aumento do poder de compra de cada indivíduo. A curto prazo e em âmbito localizado, a introdução de novas máquinas e equipamentos realmente provoca um desemprego temporário. Como diria Bastiat, é o efeito que se vê. No entanto, no longo prazo, os efeitos do avanço tecnológico são inúmeros, mormente em relação ao aumento da produtividade e da prosperidade econômica que ela provoca.
Tempo e trabalho são fatores presentes na produção de qualquer bem ou serviço. Ambos são recursos escassos e, portanto, sujeitos à lei dos custos de oportunidade. A sua utilização em determinada tarefa automaticamente exclui seu uso concomitante noutra qualquer. Se tenho, por exemplo, que plantar batatas para ganhar a vida, não poderei utilizar o mesmo tempo e energia para desenvolver programas de computador ou pesquisas no ramo da energia nuclear. Até posso desenvolver duas atividades distintas, mas nunca ao mesmo tempo.
Outrora, quando a tecnologia ainda engatinhava, os seres humanos gastavam praticamente todo o seu tempo na caça e na coleta, atividades indispensáveis à sua sobrevivência. Depois de muito tempo, nossos ancestrais descobriram que podiam cultivar a terra e dela colher quantidades cada vez maiores de alimento, além de estocá-lo para consumo futuro. Embora a agricultura ainda fosse bastante rudimentar, seu aparecimento liberou um contingente razoável de pessoas para outras atividades, antes impossíveis ou improváveis, como a produção artesanal de roupas, ferramentas e outros acessórios, por exemplo. Aos poucos, o desenvolvimento de novas técnicas foi liberando um contingente cada vez maior de pessoas (a princípio desempregadas) para outras atividades, tornando crescente e diversificada a produção de bens e serviços.
Com o advento da Revolução Industrial, a introdução de novas técnicas e máquinas, tanto na agricultura quanto na indústria, colocou em disponibilidade uma quantidade inimaginável de pessoas. Num primeiro momento, o desemprego no campo foi impressionante e ocasionou uma onda de imigração para as cidades que chocou diversos historiadores, além de turvar as mentes obtusas de alguns economistas, alguns deles donos de uma retórica contundente e sofisticada, como Karl Marx, para quem a riqueza produzida pelo novo modelo, por ele apelidado de capitalista, se dava às custas da miséria da maioria. Infelizmente, o alemão era um dos que só conseguia enxergar os efeitos imediatos daquela revolução que testemunhava, uma deficiência que gerou teorias tão esdrúxulas quanto absurdas, que vêm repercutindo até hoje e cujas conseqüências nefastas para toda a humanidade talvez um dia possam ser mensuradas.
A história do capitalismo, no entanto, demonstrou que Marx estava errado. Como mau economista que era, não previu que todo aquele enorme contingente de desempregados, substituídos por máquinas e outros equipamentos, migraria para outras atividades e provocaria uma onda de desenvolvimento e prosperidade até então inimagináveis. Não sabia ele que o progresso necessita de gente com tempo e força disponíveis para produzir novos bens e serviços, enfim, para criar novas riquezas.
Na medida em que as indústrias tornam-se mais eficientes e produtivas, os produtos ficam mais baratos, a renda per capta dos consumidores aumenta e, com ela, a demanda por serviços – setor que, nos países desenvolvidos, passou a absorver cada vez mais mão-de-obra, sendo hoje o responsável por cerca de 80% do mercado de trabalho nos EUA, por exemplo. A melhor notícia, no entanto, é que o trabalho braçal (físico) foi sendo paulatinamente substituído pelo "cerebral". Além disso, o aumento da renda e do tempo disponíveis possibilita que parcelas sempre crescentes da população possam ter acesso à educação é à cultura, antes um privilégio apenas dos nobres.
O raciocínio por trás dos pseudobenefícios da redução da jornada semanal de trabalho está calcado na mesma idéia estúpida dos comunistas chineses, acima descrita. Ao reduzir em 10% a jornada máxima, pretende-se, através da lei, colocar 11 homens para fazer o trabalho que hoje é feito por 10. Ao enxergar apenas o resultado aparente – de todo modo questionável, já que, mantidos os valores nominais da hora trabalhada, os novos empregos de alguns serão proporcionais às horas tiradas de outros – seus idealizadores não vêem que, a longo prazo, este tipo de política acaba freando o desenvolvimento, uma vez que impede a dinâmica natural do capitalismo.
O autor é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.
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