em 8 de setembro de 2010
Tamanha é a pressão que finalmente começa a se abater sobre o IPCC que Rajendra Pachauri [ver na editoria de Ambientalismo do M@M: “O guru, a boca e a botija”] se viu forçado à ridícula posição de tentar resgatar a credibilidade ao contradizer a maior parte de sua campanha de relação públicas forjada ao longo dos anos. Ele deu um passo extraordinário quando admitiu que o IPC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climática, órgão da ONU ainda presidido por Pachauri) não dispõe de números comprováveis cientificamente, mas veja bem, está tudo certo, afinal o IPCC é, de fato, uma agência de formulação e redação de políticas e não uma produtora de relatórios científicos “que jamais verão a luz do dia”.
Quer dizer que Pachauri está admitindo que desde ao sua concepção, o objetivo do IPCC era prescrever e ordenar políticas para governos? Ora, ora, quem poderia supor que tivesse sido assim, não é mesmo?
Em meio à declaração de Pachauri de que estava feliz com o relatório da IAC [InterAcademy Council], ele deixou escapar uma surpreendente e definitiva afirmação:
O Times of India pergunta: Há algo no relatório de investigação da ONU com que o senhor discorda total ou parcialmente?
Pachauri: Eles falaram sobre quantificar incertezas. Até certo ponto, nós estamos fazendo isso, ainda que não com perfeição. Mas a questão é que em alguns casos, você realmente não dispõe de uma base quantitativa à qual possa atribuir uma probabilidade ou um nível de incerteza que defina as coisas em termos quantitativos. E é aí que não devemos deixar de levar em conta a opinião abalizada de especialistas. E isso não foi levado em conta, ou ao menos, não foi ressaltado pelo relatório [do IAC].
Então, se você não consegue quantificar incertezas (coisas como a sensibilidade da temperatura, digamos 0,5 grau ou 6,5 graus, e com quais probabilidades), vá em frente com a sua melhor “estimativa” [chute], chame-a de opinião abalizada de especialistas (especialmente se apenas você escolher e pagar os especialistas “certos”) e daí diga que há 90% de certeza, mesmo que não haja números, mas você vai somando até chegar à certeza desejada.
Assim, depois de todos esses anos dizendo que o IPCC era uma entidade científica, agora que foi revelada como não-científica, subitamente a desculpa é que, de fato a entidade é dirigida politicamente. Perceba o quanto Pachauri agora tenta situar a posição do IPCC como muito distante da ciência:
Times of India: Ao suprimir a política da ciência, esta não ficaria vazia de seu real propósito social?
Pachauri: Sejamos francos. Nós estamos num organismo intergovernamental e nossa força e aceitabilidade daquilo que produzimos é, em larga medida, em função de sermos pertencentes a governos.
(E eu aqui pensando que a força do IPCC vinha dos seus “2.500 cientistas” e da rigorosa revisão pelos pares... ).
Se não fosse este o caso, seríamos tal como qualquer outra entidade científica que talvez produzisse relatórios de primeira qualidade, mas que jamais seriam vistos à luz do dia e simplesmente porque não são importantes na formulação de políticas. Agora, é claro que se [o IPCC] é um organismo intergovernamental e queremos que os governos sejam os donos daquilo que produzimos é óbvio que esses governos nos darão os indicativos sobre qual direção a tomar e sobre quais são as questões que eles querem ver respondidas. Infelizmente, as pessoas perderam completamente de vista a resolução original pela qual o IPCC foi criado. Tal resolução diz claramente que nossas avaliações deveriam incluir estratégias de reação realistas. Se isso não significa uma avaliação de políticas, então significa o quê? E eu temo que, a meu ver, tenhamos ficado na defensiva em vez de apresentarmos uma ampla gama de políticas a serem adotadas; com isso não estou dizendo que prescrevemos a política A, B ou C, mas com base na ciência, estamos buscando estratégias de reação realistas. E é exatamente isso que o comitê [IAC] recomendou que abandonássemos — recomendações políticas. È por isso que levantei a questão sobre o que está escrito no mandato de criação do IPCC. Trata-se de um erro de percepção da comunidade científica. Eu espero poder corrigi-lo.
O IPCC simplesmente não pode ser, ao mesmo tempo, a última palavra imparcial e manifesta da ciência E a última palavra na elaboração de políticas. De duas uma: ou é a busca pela verdade que dirige o IPCC ou é a necessidade de promover políticas que o faz; o IPCC não pode responder a ambas as demandas sem um conflito.
O que Pachauri está declarando é que a prioridade nº 1 do IPCC NÃO é exatamente a de descobrir o que governa o clima do planeta.
Tradução: Henrique Dmyterko
Publicado originalmente no site da autora em 04/09/2010*
*Jo Nova é autora do “Manual dos Céticos”, cuja versão brasileira pode ser obtida clicando aqui.
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