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quarta-feira, 18 de março de 2009

Nerd Sem Máscara - O Inevitável Watchmen

MÍDIA SEM MÁSCARA
THE RIGHTWATCHER | 17 MARÇO 2009 | ARTIGOS CULTURA

Teria o governo o direito do monopólio do uso dos "super-seres"? E os governos reais teriam o direito de tirar o direito do cidadão de reagir contra os crimes que são cometidos contra ele? O super-herói, afinal, nada mais é que um cidadão que, dotado de armas fantasiosas ou poderes que as substituem, assume a tarefa de auto-defesa da sociedade. O próprio fato de serem forçados a se mascararem de alguma forma já demonstra que no século 20 este direito era cobiçado maliciosamente pelos governos centralistas, já que para simplesmente defenderem-se eles precisavam agir no anonimato.


Há um evento ofuscante no mundo nerd no momento e seu nome é Watchmen. Embora tenha saído no cinema após o sombrio Batman de Christopher Nolan, quem acompanha os quadrinhos sabe que a transição do gênero super-herói de um passatempo de crianças para um modelo arquétipo literário completo só foi possível graças ao Watchmen de Alan Moore, ao Cavaleiro das Trevas de Miller e o Sandman de Neil Gaiman. Com Watchmen traduzido fielmente para as telas, e a presença "espiritual" de Miller nos dois últimos filmes do Batman, fica faltando apenas uma adaptação da obra de Gaiman para o cinema. Considerando que a indústria se abriu para séries de vários capítulos como em Harry Potter, não é de todo absurdo pensar em uma série de filmes que narre a saga de Sandman.


Watchmen marca a nona-arte porque nele os atos fantásticos dos super-heróis não são o assunto final do trabalho. Não se trata de apenas mostrar pessoas extraordinárias fazendo coisas extraordinárias para que o espectador projete-se neles. Ali, temos uma história com super-heróis, mas não sobre eles.
 

E qual seria, então, o assunto de Watchmen? A história, que se passa na década de 80, começa com um assassinato misterioso. Logo um dos super-heróis, o direitista conservador Rorschach, surge para investigá-lo. Sua primeira descoberta é que a vítima era a identidade secreta de um super-herói da velha guarda, o Comediante. Rorschach parte então para avisar sobre o fato seus ex-colegas do grupo Watchmen, uma espécie de "Liga da Justiça", dado que estão todos agora involutariamente aposentados por uma lei de 1977 que proibia a atividade de vigilantes mascarados. Esta foi a primeira vez nos quadrinhos que se utilizou o argumento da proibição da atividade super-heróica que veríamos ainda em "Cavaleiro das Trevas" e mais tarde na animação "Os Incríveis" e na série da Marvel "Guerra Civil". Já aí vemos uma das inúmeras questões levantadas pelo filme, já que a máscara do super-herói pode ser vista como uma metáfora do porte de armas, já que uma e outra representam o direito do cidadão comum de defender-se dos "vilões". Teria o governo o direito do monopólio do uso dos "super-seres"? E os governos reais teriam o direito de tirar o direito do cidadão de reagir contra os crimes que são cometidos contra ele? O super-herói, afinal, nada mais é que um cidadão que, dotado de armas fantasiosas ou poderes que as substituem, assume a tarefa de auto-defesa da sociedade. O próprio fato de serem forçados a se mascararem de alguma forma já demonstra que no século 20 este direito era cobiçado maliciosamente pelos governos centralistas, já que para simplesmente defenderem-se eles precisavam agir no anonimato.
 

As questões levantadas por Watchmen, entretanto, não param aí. Na medida em que o direitista noir Rorschach vai avisando seus ex-companheiros, vamos enquadrando-os também. O primeiro é o Coruja, visivelmente inspirado no Batman (ainda que indiretamente pelo Besouro Azul): filho de pais milionários, utilizou sua fortuna para construir aparatos tecnológicos de combate ao crime e utiliza um uniforme que faz referência a uma criatura da noite. Longe de seus dias de glória, o Coruja atualmente vive uma vida insossa e frustrada de classe média, falido pelos seus gastos, barrigudo pela falta de exercícios e acovardada pela lei de 77, pela Guerra Fria e pela sua atitude de desistência frente aos seus sonhos e vocação. A seguir, conhecemos Ozymandias, também um ex-herói, que se aposentou dois anos antes da lei de 77 e criou em cima de sua antiga imagem um império comercial e industrial que permite que ele possa comprar todo o patrimônio de Lee Iacocca e outros bilionários juntos "três vezes". Ozymandias é considerado o homem mais inteligente do mundo e participou de inúmeras experiências de expansão de consciência, além de ter incomparáveis habilidades marciais. Por fim, ele visita o único ser com super-poderes, que é o Dr. Manhantan e sua esposa e heroína também, a Espectral. O Dr. Manhantan é o gancho para as questões religiosas da história. Desintegrado em um teste de física nuclear, conseguiu reagrupar-se. Porém, voltou com uma visão dos "bastidores" da criação, podendo manipular a matéria quase como um deus, possuindo consciência plena de todos os momentos presentes, passados e futuros de sua vida e podendo estar em mais de um lugar ao mesmo tempo. Essa verdadeira "ascese materialista" não o torna uma pessoa melhor, porém cada vez mais frio e maquinal, como o próprio universo materialista sem Deus ao qual ele se uniu e que ele mesmo define como um "relógio sem relojoeiro". Sua esposa, a Espectral, tornara-se heroína apenas para satisfazer sua mãe, uma heroína da geração anterior, e anteriormente atraída pelo exotismo do Dr. Manhantan, hoje vive em perene frustração dada a indiferença dele. Também deve conviver com sua exótica mãe que ainda hoje é apaixonada pelo homem que a estuprou. Enquanto isso, ao mesmo tempo, as relações entre a União Soviética e os Estados Unidos vão se acirrando, trazendo a sombra da guerra nuclear total bem próxima.
 
O vilão do filme, como vemos no final, manipula todos os super-heróis e mata dezenas de milhões com o objetivo de trazer o ideal da paz mundial. Seu "socialismo caviar" elitista é evidente para qualquer um que saiba que o socialismo é gerado e movido nas altas elites e não no proletariado. Sua atitude de colocar-se como salvador do mundo, planejador global de direito pelo simples fato de ter o poder de fazê-lo denuncia que afinal, o tema do filme, é nada mais nada menos que a mentalidade revolucionária ainda que o autor não conheça o termo. Para quem ainda não está familiarizado com o conceito, vale uma lida nos artigos seminais de Olavo de Carvalho sobre o assunto: (http://www.olavodecarvalho.org/semana/070813dc.html e http://www.olavodecarvalho.org/semana/071010dce.html).


De fato, a questão última que o filme coloca é: mesmo supondo que uma revolução global, que matasse milhões, pudesse atingir seu objetivo declarado de uma "sociedade mais justa", seria espiritual, moral e eticamente correto obtê-la a este custo? Seria correto que esse "mundo melhor possível" fosse baseado na manipulação geral das consciências como faz o vilão? Aliás, seria correta a afirmação final do vilão para os super-heróis de que eles é que estariam errados em tentar detê-lo e ele é o herói? Sob tal contexto, o único que se mantém coerente o filme todo é o conservador Rorschach, que não aceita contemporizar com os sutis argumentos revolucionários do vilão, e através de um pequeno jornal conservador de direita inspirado exatamente nos "mediawatch" americanos e é tido como "paranóico" e "fanático" é que coloca a dúvida sobre se o vilão realmente teria tido sucesso ou não, denunciando-o.
 

O autor, Alan Moore, porém, nada tem de conservador. Praticante de paganismos exóticos, seu mérito maior é exatamente não ter sido panfletário ao criar a história e, assim, ao refletir as ideologias e crenças dos personagens, acabar dando a vitória moral ao direitista Rorschach em face da mentalidade revolucionária do vilão, à qual subjuga todos os demais. Na verdade a atitude dos outros personagens lembra bem a do personagem central de 1984 que morre tecendo louvores ao Grande Irmão. Eles concordam em participar da mentira em face dos "benefícios" que ela traz. Foram derrotados e subjugados pelo tamanho estonteante da revolução global trazida pelo vilão.


Watchmen é uma obra com super-heróis, mas é sobre política, religião, psicologia, sociologia e filosofia. É uma pena que o diretor tenha optado pelo excesso de sexo e violência que não estão presentes nos quadrinhos originais. Uma das super-heroínas da primeira geração era apenas brevemente mencionada como lésbica e, no filme, não apenas vemos sua parceira, como um beijo "caliente" entre as duas. A cena de sexo do Coruja e a Espectral em sua nave, também meramente insinuada no graphic novel, beira o soft porn. A quantidade de fraturas expostas e sangue também excedem em muito o original. Talvez por apelo, talvez por achar que isso seja um avanço, o diretor optou por tais inserções e temos apenas a lamentar por isso. No mais, entretanto, é um filme com muito o que se discutir e recomendável para todos os que se interessam por tais assuntos. Três vivas para Zack Snyder por tê-lo realizado e aguardemos para ver quem terá brio para transpor Sandman para o cinema.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
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‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".