15/08/2010
Ao dar cobertura ao tal "plebiscito" pela limitação da propriedade da terra, a CNBB envolve em seu manto uma dessas patacoadas ideológicas que, pela teimosa repetição, acabam sendo confundidas com direitos, não raro com direitos humanos e servindo à violência. Isso me faz lembrar algo que testemunhei há coisa de um ano.
Certa tarde, tocou meu telefone e alguém me perguntou se poderia atender o secretário de Segurança Pública, general Edson Goularte. Pouco havíamos falado até então, o secretário e eu. Dele só tinha a imagem de um homem sereno e firme. Surpreendeu-me com um convite: "O senhor aceitaria comparecer, como meu convidado, a uma reunião que manterei amanhã com representantes do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana?". Sim, eu aceitaria, claro. Como não?
No dia seguinte, de paletó e gravata, como convém, compareci ao gabinete do secretário. Dali, após rápido cafezinho, fomos para a sala onde transcorreria o encontro. Falando pelos visitantes, o presidente do dito Conselho fez breve relato de suas observações sobre o ocorrido na desocupação de uma fazenda em São Gabriel e reconheceu que as investigações a propósito do assassinato de um invasor avançavam regularmente. Em seguida, apresentou um curioso conjunto de postulações que considerava necessárias para haver mais paz no campo. Muito o gratificaria, por exemplo, que o governo gaúcho criasse uma brigada agrária, uma polícia agrária, uma corregedoria agrária (ou coisa que o valha) e sei lá mais o que agrário. Propunham, enfim, a criação de um conjunto de órgãos específicos para atuar em conflitos no meio rural (entendendo-se por conflitos aquilo que acontece quando o MST decide invadir alguma coisa, claro). As propostas foram recusadas pelo secretário. O Estado não dispunha de recursos para criar essas novas estruturas e o governo não via razão para fracionar as existentes. Ponto. Vamos adiante.
Foi então que se deu o episódio a seguir, que relato em virtude de sua exemplaridade. Um dos membros do grupo visitante, em tom de espanto e sensibilidade arrepiada, disse ter chegado ao seu conhecimento que o comando da operação policial postado diante da área invadida impedira a entrega de alimentos aos invasores. Quando ele se articulava para dar sequência às expressões de sua inconformidade, o secretário interrompeu: "Por ordem minha!". Entreolharam-se, incrédulos, os membros do Conselho. E o general prosseguiu: "Se a Justiça determinara que eles saíssem, como haveria o Estado de lhes entregar alimentos para que ficassem?". Diante de lógica tão irretorquível, o outro optou por dramatizar ainda mais: "Mas havia crianças ali, secretário!". Só não fungou uma lágrima porque ela não lhe veio. E o general, no mesmo tom sereno: "A porteira estava fechada quando entraram, mas sempre esteve aberta para saírem. Responsabilize os pais pela situação que descreve".
Por que estou contando isso? Porque esse diálogo serve para mostrar que movimentos revolucionários tipo MST são capazes de apresentar mistificações como teses e sofismas como argumentos, cobrando das autoridades, para aquelas e para estes, atenção e acatamento. Ademais, quando tais disparates arregimentam massas de manobra, como faz o tal "plebiscito", com apoio da CNBB, a violência é bem servida. E isso é feito em nome de supostos direitos que, no fundo, são apenas descabidas reivindicações de uma ideologia de péssimo passado e sem futuro algum nos caminhos do bom senso.
ZERO HORA, 15 de agosto de 2010
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