Palácio Itamaraty, 21 de dezembro de 2009
Meu querido companheiro José Alencar, vice-presidente da República,
Minha querida companheira Dilma Rousseff, ministra-chefe da Casa Civil,
Vocês me viram botando a mão no cabelo do Zé Alencar? É que teve um tempo em que tinha caído o cabelo do Zé Alencar. E vocês estão percebendo que a Dilma está de cabelo novo. Não é peruca não, é o cabelo normal dela, que voltou a se apresentar em público. Eu acho que foi uma homenagem à Inês, porque eu estou pedindo para a Dilma tirar a peruca já faz um mês, e ela não quis tirar a peruca. E hoje ela apareceu aqui, na frente da Inês, sem peruca, mostrando seu novo visual.
Quero cumprimentar o companheiro Paulinho Vannuchi, ministro dos Direitos Humanos,
O companheiro Tarso Genro, ministro da Justiça,
O companheiro Juca Ferreira, ministro da Cultura,
O companheiro Patrus Ananias, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
O nosso querido companheiro Paulo Bernardo, do Planejamento,
A Izabela Teixeira, interina do Meio Ambiente,
O Guilherme Cassel, do Desenvolvimento Agrário,
O Luiz Dulci, da Secretaria-Geral da Presidência da República,
O Luís Inácio Adams, advogado-geral da União,
Vocês não imaginam como o Brasil é fantástico, não é? Um Luiz Inácio nordestino encontra um Luís Inácio com sobrenome alemão! Eu não sei quem é que viajava muito, mas de qualquer forma...
Quero cumprimentar o nosso querido companheiro Padilha, de Relações Institucionais,
O Franklin Martins, de Comunicação Social,
Samuel Pinheiro Guimarães, de Assuntos Estratégicos,
Edson Santos, de Políticas de Promoção da Igualdade Racial,
A Nilcéa Freire, de Políticas para as Mulheres,
Tem mais ministro aqui do que nas reuniões ministeriais que eu convoco.
Quero cumprimentar os deputados federais: Fernando Ferro, a deputada federal Janete Pietá, o deputado federal Luiz Couto, o deputado federal Pedro Wilson,
Quero cumprimentar o nosso companheiro e embaixador Antonio Patriota, secretário-geral das Relações Exteriores,
Nossa querida companheira Maria Fernanda Coelho, presidente da Caixa Econômica Federal,
Nossa querida companheira Dayse Benedito, representante da sociedade civil,
Quero cumprimentar os companheiros e as companheiras que foram agraciados com o Prêmio,
E quero cumprimentar todos os companheiros que estão aqui.
Primeiro, eu não vou ler meu discurso. Por quê? Porque não tem sentido, ou seja, não vou falar das coisas que já falou a Dilma, o Paulinho, a Dayse. Eu vou ser breve, porque direitos humanos é garantir ao presidente da República ter uma agenda mais humana, também. Faz quatro finais de semana que nós trabalhamos. Portanto, a dona Marisa está com um cartão vermelho para mim lá, que... Eu vou tentar fazer uma média, para ver se eu ganho apenas um amarelo.
Mas dizer, Paulinho, da alegria de podermos hoje estar lançando o 3º Plano de Direitos Humanos. Programa feito a muitas mãos. Mãos conhecidas, mãos menos conhecidas, e mãos anônimas de pessoas que não saem em fotografias, de pessoas que não sobem em palanques, mas de pessoas que diariamente estão fazendo alguma coisa para que o mundo melhore e para que as pessoas sejam tratadas com mais respeito e com mais cidadania.
Ao concluir o Programa de Direitos Humanos nº 3, nós também estamos concluindo, este ano, um momento muito fantástico no Brasil. Na sexta-feira passada terminou, aqui no Brasil, a 1ª Conferência Nacional de Comunicação. Mil e seiscentos delegados participaram, envolvendo empresários, envolvendo o movimento social, gente da televisão, gente do rádio, gente das favelas. E pelo fato de ser o primeiro, pelo fato de ser um tema complicado, eu penso que o resultado foi excepcional. Nós então completamos, com esse encontro da Comunicação, 63 conferências nacionais.
Então, vocês podem dizer, como militantes de algumas dessas conferências, e podem dizer orgulhosamente, que praticamente todas as políticas que nós levamos a cabo neste governo - não é da cabeça do presidente Lula, não é da cabeça do Zé Alencar, não é da cabeça da Dilma -, mais elas significam o resultado da maturação democrática que a sociedade brasileira vem construindo neste país.
E isso é importante. É importante porque vai consolidando uma coisa com muito mais, eu diria, segurança de que não vai aparecer ninguém, ninguém com o espírito de aventureiro, para achar que pode desmontar tudo o que está feito neste país, e a gente voltar ao tempo em que apenas meia dúzia de pessoas tomavam decisões neste país, elaboravam as políticas, sem levar em conta o que a sociedade brasileira pensava, pensa e pensará daqui para diante.
Eu lembro, Paulinho, eu lembro perfeitamente bem a emoção que eu senti na primeira vez em que os catadores de materiais recicláveis, mais popularmente conhecidos como catadores de papel, entraram no Palácio do Planalto e fizeram uso da palavra. Eu lembro quando, pela primeira vez, os sem teto deste país entraram no Palácio, e lembro da emoção do companheiro que fez uso da palavra, dizendo que ele não precisaria conquistar mais nada, só o fato de ele ter entrado no Palácio do presidente da República já era uma conquista que eles não imaginavam.
Eu me lembrei, Paulinho, quando eu fui, em 94, à África do Sul, e fui visitar o Mandela - eu, a Benedita da Silva e o companheiro Vicentinho -, e vi aquela fila de gente, em volta do Palácio do Governo, que não queria nem ver o Mandela. Eles só queriam botar a mão no Palácio, porque nunca tinham conseguido chegar perto daquele Palácio. Ora, para quem estava lá dentro podia parecer pouco. Mas para quem apanhava quando chegava a 10 quilômetros do Palácio, tocar na parede do Palácio era uma conquista democrática de uma grandeza extraordinária. E a gente precisa aprender a valorizar essas conquistas que vão se somando e que terminam mostrando uma conquista quase infinita.
Eu lembro do famoso encontro com o GLBT. Eu lembro da preocupação que reinava no Palácio. Eu lembro. Tinha sido, como todas as conferências, um decreto presidencial convocando a conferência. Mas aí, depois, o pessoal começava a dizer: “Mas, ô Lula, e se tiver algum problema lá? E se alguém quiser te beijar? E se alguém quiser tirar foto? E se alguém quiser fazer alguma coisa?” Eu falei: Se alguém quiser fazer, vai fazer, porque nós vamos lá. Eu penso que foi, possivelmente, a maior aula de cidadania contra o preconceito de que eu já participei, foi aquela conferência. Porque o preconceito... Aliás, quem fez o filme cortou, acho, a palavra preconceito, porque quando eu falo de uma doença, a doença... eu estou falando do preconceito. Mas parece que, no filme, cortaram o preconceito e ficou “uma doença” que não sei das quantas...
Eu lembro da campanha, eu lembro da campanha de um candidato nosso em Pernambuco, em 1982, o Manoel Conceição. Ele era dirigente sindical de Pindaré-Mirim. Ele teve uma bala na perna e ele foi preso, virou gangrena, e tiveram que cortar a perna dele. Ele ficou só com o joelho para cima. Foi candidato em 82, em Pernambuco, e na televisão, no tempo da Lei Falcão, você só dizia assim: “Fulano de tal, faz isso”. Então, o Manoel Conceição, a propaganda dele era assim: “Manoel Conceição, perdeu uma perna”. E não dizia por que ele perdeu a perna. E o preconceito, eu confesso a vocês que eu acho que o preconceito e a hipocrisia são duas doenças que nós precisamos, quem sabe, fazer muito investimento em pesquisa para que a gente possa banir essa coisa do meio da Humanidade. Porque é gravíssimo o preconceito, ou seja, ninguém, ninguém, ninguém, ninguém, ninguém pergunta a um negro, ninguém pergunta a um pobre, ninguém pergunta a um hanseniano, ninguém pergunta a um cego, ninguém pergunta a um homossexual, ninguém pergunta, na hora da eleição, o que ele é, a pessoa quer o voto dele.
A Receita Federal, a Receita Federal não quer saber se a pessoa é branca, se ela é negra, se ela é homossexual, se ela é portadora de deficiência, se ela é ex-presa política, ou seja, ela quer saber de receber o imposto que a pessoa deve. Ora, isso só já nos dá o direito de brigar com muito mais força pelo resto da cidadania. Se a gente já tem a cidadania de votar e a cidadania de pagar os nossos tributos, o resto é consequência das coisas que nós temos que conquistar neste país.
Eu lembro, Paulinho, do dia em que nós lotamos o Palácio do Planalto de cachorros. Tinha uma briga, pela imprensa, que cachorro não podia entrar no shopping, cachorro não podia entrar no ônibus, cachorro não podia entrar no metrô, cachorro não podia entrar em igreja, Ricardo, não podia entrar em igreja. E aí eu resolvi fazer um desafio, para quebrar mais esse preconceito, que era levar os portadores de deficiência física, com os seus olhos, que eram os cachorros que guiavam eles. E foi interessante, porque nenhum cachorro fez qualquer sujeira, que muitos outros já fizeram dentro do Palácio do Planalto.
Eu acho que a gente ainda está muito longe de chegar à perfeição. E acho, Abdias, que esses teus 140 anos de luta pela igualdade racial não foram suficientes para que a gente conseguisse transformar aquilo que está na nossa Constituição em práticas concretas pelos seres humanos, que têm que cumprir a Constituição. Ou seja, nós estamos nos tornando um país quase perfeito, do ponto de vista da elaboração das normas, das leis: é o Estatuto da Criança e do Adolescente, é o Estatuto da Igualdade Racial, é o Estatuto... é a nossa Constituição mesmo, é Quioto... hein? Ah, do Idoso, de tudo... mas o de Quioto, também, que quiseram quebrar, agora!
Então, eu penso, eu penso que nós estamos quase atingindo a perfeição. Agora, é importante lembrar que a sociedade que cumpre as leis é feita por seres humanos. E nós é que somos defeituosos, nós é que descumprimos aquilo que nós mesmos fazemos. Nós é que, muitas vezes, quando lemos, não entendemos; e se não lemos, não sabemos aquilo que é a normatização das conquistas dos direitos neste país. Isso vale para todos os segmentos da sociedade. E quando a gente constata essas dificuldades, nós temos que estar animados. Por quê? Nós temos que estar animados porque outros países levaram muito mais tempo do que a gente para conquistar, e nós estamos caminhando, eu diria, a passos extraordinários.
Vejam uma coisa, quando a Dilma estava falando, eu estava lembrando de um discurso que eu fiz no Rio de Janeiro, em um encontro da UNE, sobre a questão dos desaparecidos brasileiros. Eu estava dizendo: a gente sofreria menos, se a gente transformasse os nossos companheiros em heróis, não apenas em perseguidos, mas em heróis. Vejam uma coisa: a Inês lutava por quê? Porque ela queria ter liberdade, neste país. Ela lutava por quê? Porque ela sonhava que um dia este país iria ter um governo que tivesse compromisso com a grande maioria da sociedade. A Dilma lutava pelas mesmas coisas. O Franklin Martins participou do sequestro de um embaixador americano exatamente para que a gente tivesse mais liberdade. O Tarso Genro foi preso para isso, o outro foi preso para aquilo. O Paulinho Vannuchi ficou não sei quantos anos; a Dilma, não sei quantos anos. Ora, gente! Então, eu acho que é importante a gente colocar isso na nossa consciência: é que valeu a pena, valeu a pena!
A mãe, a mãe do nosso companheiro, a nossa querida... eu não sei o nome dela todo... Elzita Santa Cruz. Ela falou aqui no começo, na abertura. Aquela mãe... Obviamente que a gente nunca vai tirar do coração da mãe o sofrimento de não ter visto o seu filho e enterrado ele. Isso é impagável, isso não tem política que consiga resolver esse problema. Agora, nós temos que ter consciência de que valeu a pena, de que a vida dele e de que a vida de outros significaram a gente chegar aqui porque, senão, ninguém vai lutar mais. Então, eu acho que esse, Paulinho, é o grande gesto, é a grande conquista.
Eu, um dia, desci com a Dilma lá no Quartel, no Comando do 2º Exército, lá na frente do Ibirapuera. Aí, quando o helicóptero parou, a Dilma ficou olhando, ficou olhando, e falou para mim: “Engraçado, eu não tenho raiva. Eu vim para cá.” Eu acho que ela não tem raiva é porque ela, se alguém prendeu a Dilma, se alguém torturou a Dilma, achando que tinha acabado a luta da Dilma, ela é uma possível candidata a presidente da República deste país.
E é assim que as coisas acontecem, é assim. Eu acho que nós estamos andando no tom certo, na caminhada certa, fazendo as coisas certas. Quem me conhece sabe que, desde o tempo do movimento sindical, eu não gosto de fazer nada precipitado, Abdias. Por isso é que eu quero chegar à tua idade, fazer as coisas com mais tranquilidade, mas com mais segurança. Se me derem um rio com cachoeira para eu entrar em um caiaque para chegar em um lugar que está a apenas dez minutos de onde eu estou, e me derem um rio mais tranquilo que vai demorar meia hora, podem ficar certos de que eu vou pelo rio de meia hora, porque eu sei que eu vou chegar em segurança e vou cumprir a minha missão. Então, o importante é que a gente tenha consciência de que nós estamos neste mundo para cumprir missões. E que tem dia em que a gente vai dormir frustrado, tem dia em que a gente pensa que não vale a pena. Quantas vezes a gente vai ficando decepcionado com aquilo que a gente faz no dia-a-dia? E aí, quando a gente chega no dia 21 de dezembro, próximo do Natal e a gente consegue fazer... Na entrega do 3º Programa de Direitos Humanos, a gente conseguir trazer gente, assim, de todo o Brasil, e saber que vocês estão lutando pelos direitos humanos, independentemente de quem seja o presidente da República. É mera coincidência eu estar aqui. Mas vocês já lutavam antes de eu chegar aqui e, certamente, vão continuar lutando muito mais, porque vocês vão aprendendo.
Então, eu quero terminar dizendo para vocês que essa demarcação das terras indígenas que nós fizemos agora... Eu não ia fazer agora, Marcio, porque você me deve uma, que eu vou cobrar só no ano que vem, agora. Estamos com espírito de Natal, vamos deixar para lá. Mas eu acho que essas... Por mais que a gente faça pelos índios neste país, por mais que a gente faça pelos negros neste país, a dívida é uma dívida impagável, é uma dívida impagável. E ela não pode ser paga em dinheiro, ela tem que ser paga em gestos, em atitudes, em comportamentos, em uma aproximação entre as várias gerações, para que a gente vá criando um mundo sem mágoas, sem ressentimentos porque as coisas... não tem como pagar, não é uma quantidade em dinheiro, é muito mais uma quantidade de gestos, de olhar, de coisas que nós temos que fazer.
Então eu quero, Paulinho, sem elogiar tanto o teu pessoal, porque daqui a pouco vão pedir aumento de salário, e dizendo que eu já transformei a Secretaria em Ministério, já faz um ano. Na outra, eu anunciei. Somente seis meses depois é que eu fui descobrir que faltava um DAS-6 para poder consagrar como Ministério. Aí eu fui ver, o DAS-6 estava com o Paulo Bernardo. Eu fui tomar, do Paulo Bernardo, o Ministério. Na verdade, eu dei um DAS-6 da Presidência, para poder consagrar o Ministério. Ou seja, nós vamos terminar o governo sem secretarias. Todas vão ter que ser transformadas em Ministério. E quem vier, ou crie mais, ou faça o que quiser, porque depois que vier outro, é o outro que vai fazer. Outro ou outra, sei lá quem é que vem.
De qualquer forma, de qualquer forma eu quero, Paulinho, agradecer, agradecer a sabedoria de todos vocês. Não é fácil fazer um documento como este. Os interesses pelas palavras são enormes, a importância das vírgulas ganha a dimensão de uma exuberância extraordinária. E esse teu jeito de ser, esse teu jeito equilibrado de fazer as coisas permitiu que nós chegássemos a este documento que agora vamos digeri-lo, vamos tentar trabalhar outra vez, transformar em projeto de lei aquilo que for projeto de lei, mandar para o Congresso Nacional debater, e assim nós vamos construindo a nossa democracia.
Então, Inês, minha querida Inês, eu só queria te dizer uma coisa, - eu estou vendo a Margarida Genevois ali, eu estou vendo... - é que valeu a pena, valeu a pena cada gesto que vocês fizeram, cada choque que vocês tomaram, cada apertão que vocês tiveram valeu a pena, porque nós aprendemos. E na medida que a gente aprende, a gente garante que não haverá mais retrocesso neste país. E isso nós devemos a vocês, que lutaram antes de nós.
Um abraço. Parabéns, Paulinho. Parabéns à Secretaria dos Direitos Humanos, e parabéns a todos vocês.
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