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terça-feira, 8 de julho de 2008

A prosperidade não é o problema

Do portal OrdemLivre.org
Por Diogo G.R. Costa

Diqing Jiang saiu da China para fazer cursos de pós-graduação nos EUA. Hoje trabalha comigo em Washington. Na última virada do ano chinês, Diqing ligou para sua família. Fazia quatro anos que ele não visitava a China. "Vamos ter porco neste ano-novo, mãe?", perguntou ao telefone. Ele se lembrava de comer carne de porco apenas uma vez por ano. Mas as coisas haviam mudado: "Meu filho, agora podemos comer porco quando quisermos, não precisamos mais esperar o ano-novo." Diqing estava desatualizado. A China estava enriquecendo. Sua família estava enriquecendo. Prosperidade significa mais comida na mesa.

Mas o que Diqing vê como bênção é considerado por observadores internacionais uma espécie de maldição. O preço dos alimentos não pára de aumentar. Os jornais mostram fotos de protestos em diversos países, as famílias dos países ricos vêem seu poder aquisitivo diminuir e as dos países pobres sentem a fome apertar. O principal culpado, dizem especialistas dentro e fora do Brasil, é o aumento da renda per capita nos países do Sudeste Asiático. André Petry escreveu na revista Veja (28/5) que "o que ajudará a perpetuar o problema é o aumento do consumo de alimentos, sobretudo na China e na Índia".

Leitores de Shakespeare podem se lembrar de Lancelote em O Mercador de Veneza. Num diálogo com Jéssica, uma judia, sobre seu casamento com Lorenzo, um cristão, Lancelote ironiza que um maior número de judeus convertidos ao cristianismo aumentará o preço da carne de porco.

Os preços informam a relação de oferta e demanda sobre determinado produto. É verdade que uma expansão significativa da demanda mundial por alimentos eleva o preço desses produtos. Mas a história não acaba aí. Um aumento de preços cria incentivos para que recursos materiais e intelectuais sejam deslocados para saciar a nova demanda. Investe-se capital e implementam-se novas tecnologias para a produção de alimentos. No longo prazo, esse processo aumenta a produtividade - e os alimentos ficam mais baratos. Esse processo é o que o economista Julian Simon chamava de a história da economia agrícola.

O problema, portanto, não é o aumento da demanda. É o não-aumento da oferta. A demanda por computadores e carros aumentou nos últimos anos, mas esses produtos ficaram mais baratos. Uma investigação que pretenda solucionar o problema deve perguntar-se por que o ajuste da produção está tendo dificuldades para acompanhar o maior consumo de alimentos.

É aí que entram as perversas intervenções governamentais. Nos EUA, a política do etanol desviou a produção do milho para os tanques dos carros e aumentou o preço do cereal, mundialmente. Na Europa, os subsídios agrícolas - que chegam a US$ 53 bilhões anuais - fecham o mercado à competição dos agricultores de países em desenvolvimento, o que limita as possibilidades de avanço agrícola em diferentes partes do mundo. Em países pobres, uma terrível combinação de falta de infra-estrutura nas estradas, blitze que causam engarrafamentos intermináveis e impostos que encarecem técnicas de refrigeração e conservação de alimentos faz metade da comida se estragar antes que chegue ao consumidor. E ainda há as restrições ao livre-comércio. Metade de toda a comercialização mundial de arroz não é feita num ambiente de livre mercado, mas é administrada por conselhos políticos. Não surpreende, por isso, que apenas de 5% a 7% do arroz do mundo seja comercializado internacionalmente.

Restringir as exportações, como fizeram os governos da Rússia, Argentina e Índia, só piora o problema e torna ainda mais distante a existência de um livre mercado de produtos agrícolas. As conseqüências são óbvias. Imagine se os Estados brasileiros criassem tarifas para o comércio doméstico. Se o Rio Grande do Sul impusesse um imposto sobre o arroz exportado para a Bahia ou se o Rio de Janeiro cobrasse 30% de tarifa de toda a soja vinda de Mato Grosso, menos arroz e soja chegariam às prateleiras, e a um preço mais alto. É isso que as restrições comerciais fazem em escala mundial. Estima-se que a remoção de todas as barreiras comerciais enriqueceria o mundo em até US$ 2,6 trilhões por ano.

Uma demanda global de alimentos exige uma oferta global de alimentos. Países pobres e ricos devem abandonar as barreiras de importação e exportação que impedem a circulação de comida - e tornam múltiplas refeições um luxo, fazendo da nutrição um privilégio de poucos. O aumento do consumo mundial é o incentivo que move o progresso agrícola e permitiu que cada vez menos terra e trabalho fossem necessários para alimentar cada vez mais gente. A história do moderno mundo capitalista indica que, no longo prazo, com o aumento populacional, a comida fica mais barata, seja medida em relação ao preço do trabalho ou aos bens de consumo.

Essa é uma razão para vermos com bons olhos o aumento do consumo de alimentos no Continente Asiático. Mas não a principal. O maior motivo para comemorarmos esse aumento na demanda é pensar que milhões de pessoas podem comer, e comer melhor. Mais indianos já podem fazer duas refeições por dia. Os chineses não precisam mais se alimentar quase que exclusivamente de grãos. A família de Diqing não precisa esperar pela virada do calendário para comer carne de porco.

A prosperidade de milhões de seres humanos merece ser celebrada como uma conquista civilizacional de dimensões globais. São os obstáculos ao direito dos povos de comercializar livremente que devem ser condenados e demolidos. Os Lancelotes de nossa época estão errados. Em longo prazo, nem o cristianismo nem o capitalismo aumentam o preço da carne de porco.

Diogo G.R. Costa é editor de OrdemLivre.org

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
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A perversão da retórica, que falseia a lógica e os fatos para vencer o adversário em luta desleal, denomina-se erística. Se a retórica apenas simplifica e embeleza os argumentos para torná-los atraentes, a erística vai além: embeleza com falsos atrativos a falta de argumentos.
‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".