Rodrigo de Almeida Ubirajara Loureiro, 04/07/2008
Tentativa de conter desvalorização do dólar favorece especuladores do mercado financeiro
Uma operação de nome e natureza complexos, realizada pelo Banco Central, provocou prejuízo ao Tesouro Nacional, entre 2007 e maio deste ano, de mais de R$ 14 bilhões. O tamanho das perdas do BC é inversamente proporcional aos lucros obtidos pelo sistema bancário com o chamado swap reverso, operação no mercado de derivativos em que os investidores apostam nas variações do câmbio e dos juros. No mercado de derivativos, as transações são liquidadas no futuro. Os preços no futuro derivam dos preços no mercado à vista – daí vem o nome "derivativos".
Repleto de tecnicalidades, o assunto é tratado com cautela pela direção do banco. O presidente Henrique Meirelles, seus diretores e auxiliares temem a politização do assunto, que vem ganhando espaço no terreno livre da internet. Sob a condição de terem os nomes preservados, dois técnicos do BC falaram ao JB. Eles exibiram um estudo sobre o tema, mostraram gráficos e tabelas e chegaram aos R$ 14 bilhões. Ressalvaram que não há uma ilegalidade sequer na operação. É jogo limpo, tipicamente de mercado especulativo. Apontam, porém, "erros e omissões" por parte da diretoria do BC.
O JB ouviu ainda mais dois economistas para compreender o difícil mundo dos swaps. É uma área para iniciados. O swap reverso é uma operação na qual o BC vende contratos futuros de juros e compra contratos futuros de câmbio. Esses contratos são negociados, por exemplo, na Bolsa Mercantil de Futuros (BM&F). O balanço é feito e pago diariamente, com referência ao desempenho futuro do Certificado de Depósito Interbancário (DI) – taxa que regula o custo de transações entre os bancos – e a variação cambial. A cada dia comparam-se DI e câmbio. Se o DI, ancorado na taxa Selic, é maior do que a desvalorização cambial, o BC precisa depositar a diferença na conta dos bancos. E vice-versa. É uma aplicação "virtual". O dinheiro não entra na economia real.
Tome-se um exemplo prático. Digamos que um investidor tenha US$ 1 milhão para aplicar no Brasil. O Banco Central quer impedir que esse dinheiro se converta em reais e pressione a valorização do real. Para impedir o movimento, o BC oferece um swap reverso. Sem a operação, o especulador converteria os dólares em reais e os aplicaria, por exemplo, em títulos públicos, ganhando a taxa do CDI, ancorada na Selic. Com o swap, o BC oferece a oportunidade para o investidor não converter os dólares imediatamente. É uma espécie de seguro contra a desvalorização do dólar e de uma compensação pela perda de oportunidade de aplicação em títulos cuja rentabilidade é assegurada pela Selic e pelo CDI. Na lógica dos operadores do BC, o swap reverso vem contribuindo para impedir uma desvalorização ainda maior do dólar. Essa é a parte boa.
Do outro lado da moeda, técnicos ouvidos pelo JB alertam para o fato de que o BC controla tanto a Selic (a principal influência sobre o DI) quanto o câmbio (que, embora livre, acaba sendo influenciado pelos movimentos da Selic). Também tem acesso à situação de todos os bancos. Mesmo tendo à mão todas as variáveis envolvidas na operação, o prejuízo se repete – uma perda "injustificável", na visão dos críticos.
– No fim das contas, o BC arbitra o próprio prejuízo e favorece o mercado financeiro – diz um dos técnicos, lembrando que, ao aumentar os juros, por exemplo, o BC perde nas duas pontas: nos contratos de câmbio que vende e nos contratos de juros que compra.
É a isto que os críticos da operação chamam a atenção: vender swap reverso em período de elevação de juros significaria jogar dinheiro público fora. Fontes do próprio banco reconhecem que o cenário atual é o pior dos mundos para esse tipo de operação. Ex-diretor do BC e consultor econômico da Confederação Nacional do Comércio (CNC), o economista Carlos Thadeu de Freitas reforça a tese e diz que a operação realizada "no momento em que mudou o ciclo de variação dos juros só é interessante para o mercado, para os detentores de swap":
– As operações do Banco Central no mercado de derivativos, no momento em que o próprio BC anuncia que vai subir taxas de juros, quase certamente resultarão em prejuízo para os cofres da União.
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