São duas as ações movidas pelo coronel Marcos Aurélio contra o juiz Carlos Eduardo Lemos e o secretário estadual de Segurança, Rodney Miranda. O primeiro atuou como juiz de exceção do caso Alexandre Martins de Castro Filho e junto com o segundo comandou as investigações policiais com base nas quais os dois montaram a farsa do crime de mando.
Um dos processos a que Rodney e Carlos Eduardo vão responder tem como ponto de partida denúncia ao Ministério Público Estadual (MPE). O outro está sendo encaminhado ao Conselho Superior de Ética do Executivo. Em ambos, o corregedor da PM juntou documentos oficiais que provam serem inverídicas e fantasiosas as afirmações contidas no livro “Espírito Santo” sobre sua participação em dois episódios ocorridos imediatamente após a morte de Alexandre: a prisão dos sargentos Heber Valêncio e Ranilson Alves da Silva e a apreensão da arma roubada do juiz Alexandre.
No livro, o coronel Marcos Aurélio é identificado pelo nome fictício de Áureo Macedo Carmelo de Souza. À época dos fatos ele era tenente-coronel e servia como diretor adjunto da Diretoria de Inteligência (Dint) da corporação. Com sua equipe, Marcos Aurélio entrou no caso ao saber, pelo coronel Adilson Costa Barros, então no comando do Policiamento Ostensivo Metropolitano (CPOM), de que partira da Secretaria de Segurança Pública um pedido de prisão contra o sargento Heber Valêncio, por suposto envolvimento no crime. Heber servia no 4º BPM.
Marcos Aurélio foi então à sede desse batalhão e, com a aquiescência do seu comandante à época, tenente-coronel Robson Luiz Martins Barbosa, de lá saiu, na companhia do subtenente Boa Ventura Fagundes, no livro sob o pseudônimo de Álvaro Cintra, lotado na P2 da unidade, em direção à casa de Valêncio. Fagundes conhecia o endereço de Valêncio.
O que aconteceu então, a partir do momento em que Marcos Aurélio, Fagundes e equipe chegaram às proximidades da residência de Valêncio, virou, na narrativa do livro “Espírito Santo”, uma autêntica fábula, um emaranhado de inverdades que ocupa as 15 páginas do capítulo 2 do livro, intitulado “As peças começam a se encaixar”.
É nesse capítulo que se depreende da narrativa a obsessão com que Carlos Eduardo e Rodney buscaram elementos para engendrar a farsa do crime de mando. Fica evidente nesse texto que Valêncio passaria a ser a principal peça da montagem. Havia a história do apartamento locado com o seu aval no trajeto percorrido pelo juiz Alexandre, de casa à academia de ginástica onde se exercitava e na frente da qual foi morto. O fato – devidamente comprovado por documentos – de o apartamento ter sido alugado seis meses antes de Alexandre matricular-se na academia, o que inviabiliza a versão de que o imóvel funcionara como posto de monitoramento dos passos do juiz, nunca foi considerado pelo policial ou pelo juiz. Muito menos teve qualquer peso nas investigações ou no julgamento de Valêncio o laudo policial que atestava não servir o tal apartamento a essa função, pois de nenhuma de suas janelas se avistava a rua por onde Alexandre passava.
Nada disso importava à dupla Carlos Eduardo-Rodney. E a esse desinteresse somou-se a irritação dos dois pelo fato de o então tenente-coronel Marcos Aurélio ter agido com lisura apego à lei no episódio da prisão de Valêncio, ocorrida num primeiro momento, e de Ranilson, em seguida. Era preciso, para fazer valer a farsa, levantar suspeitas sobre o comportamento isento de Marcos Aurélio no episódio da prisão dos dois sargentos. E é isto o que se vê no livro “Espírito Santo”.
Muito provavelmente não contavam Carlos Eduardo e Rodney que, além de militar correto, o hoje coronel Marcos Aurélio também fosse um oficial zeloso com relação a certas minúcias de seu trabalho. Por exemplo: a organização e a guarda de documentos sobre sua participação no episódio da morte de Alexandre.
Século Diário está de posse de cópias de toda essa documentação, que respalda as ações judiciais do oficial contra seus detratores e vai servir de base para esta nova série de matérias sobre a grande farsa do crime de mando no caso Alexandre.
São mais de trezentas folhas em tamanho ofício, com a nomeação do coronel Marcos Aurélio Capita para a comissão que investigava a morte do advogado Marcelo Denadai pelo então ministro da Justiça, Miguel Reale, cópias de IPMs, despachos oficiais dos escalões superiores da PM, sentenças judiciais, pareceres sobre o estado de saúde mental dos militares que integraram a “tropa de elite” (informal) de Rodney, autos de apreensão de arma e documentos, depoimentos judiciais, boletins sobre situação funcional de todos os personagens envolvidos no caso, boletins de ocorrências policiais, despachos oficiais de autoridades judiciárias e policiais, inquéritos a cargo do Ministério Público (com respectivos resultados), denúncias e procedimentos internos da PM, certificados, diplomas – em suma, um extenso rol de papéis oficiais relativos a fatos que jogam por terra tudo o que Rodney e Carlos Eduardo usaram no livro para denegrir a imagem do coronel Marcos Aurélio.
Se a organização e o ordenamento desse material consumiram uma semana de trabalho da equipe de jornalistas de Século Diário que cobre a farsa do crime de mando, imagine-se a tarefa que terão Carlos Eduardo e Rodney para responder judicialmente pelas inverdades que escreveram e fizeram publicar no livro “Espírito Santo”.
Já na terceira página do capítulo 2 do livro, eles iniciam os ataques ao atual corregedor da PM, atribuindo-lhe algo que ele não fez durante o espalhafatoso cerco que Rodney ordenou fosse montado próximo à casa do sargento Heber Valêncio. Dizem os autores que Marcos Aurélio pôs fim ao cerco ao determinar “a imediata retirada de todos, alegando a falta do mandado de busca e apreensão – apesar de já ter sido informado pelo delegado Jorge Pimenta, da DHPP, que o documento legal estava sendo providenciado”. Tudo mentira.
Quem questionou a falta do mandado de prisão, bem antes, ainda no quartel do 4º BPM, foi o coronel Costa Barros, ao ser cobrado da prisão de Valêncio em telefonema do gabinete de Rodney. Nos autos do IPM aberto pela corporação a respeito, está registrado o seguinte: “Enquanto o TEN CEL PM MARCOS AURÉLIO AINDA ESTAVA NA SEDE DO 4º BPM (...), O CEL PM COSTA BARROS recebeu nova ligação telefônica cobrando a prisão do SGT VALENCIO, onde o Oficial requereu uma cópia do mandado de prisão, sendo informado de que esse “estava saindo”. Seja como for, o TEN CEL PM MARCOS AURÉLIO se deslocou com a equipe da DINT e em companhia do SUB TEN PM BOA VENTURA FAGUNDES até o bairro Araçás, em Vila Velha-ES, onde residia o SGT PM VALENCIO, e ao chegar à casa do Policial já encontrou no local viaturas do policiamento ostensivo do 4º BPM e um carro com repórteres, fato que chamou a atenção do Oficial. O TEN CEL MARCOS AURELIO perquiriu a 2º TEN PM SÔNIA RIBEIRO PINHEIRO, Oficial de serviço na área do 4º BPM sobre o que fazia no local, tendo essa relatado que recebera ordem do CP PM RENATO CRISTIANES LACERDA, através do telefone celular funcional à disposição dos Oficiais de serviço, para que ficasse nas proximidades de uma residência e se preparasse para talvez adentrar o domicílio e realizar uma prisão. As investigações denotaram que o empenho de Policiais do 4º BPM na captura do SGT PM VALENCIO não era de conhecimento do Comandante da Unidade, tampouco do COPOM, setor responsável pelo gerenciamento operacional da Corporação.”
Ou seja, ao chegar ao local, o coronel Marcos Aurélio testemunhou uma autêntica balbúrdia, uma grande confusão para atrair os holofotes da imprensa e, acima de tudo, um indesculpável erro de quem armara aquela cena, pois o que estava acontecendo depunha contra a corporação. A ordem dele para que aqueles policiais deixassem o local teve, portanto, o objetivo de preservar a PM de um escândalo, irresponsavelmente orquestrado pelo capitão Renato Cristianes, então a serviço de Rodney Miranda.
Com a situação voltando à ordem legal, Marcos Aurélio então iniciou a operação de captura do sargento Valêncio, episódio seguinte do capítulo “As peças começam a se encaixar” e no qual Rodney e Carlos Eduardo prosseguem em sua obsessão de montar a farsa do mando tendo como principais suspeitos dois inocentes – os sargentos Valencio e Ranilson – e, como cúmplice (sem apresentar qualquer prova ou indício), o hoje coronel Marcos Aurélio.
A fragilidade das imputações que eles fazem a este oficial está disfarçada no livro com o artifício de um nome fictício para identificá-lo. Mas isso agora é irrelevante, o mal está feito. Leitor algum do livro deixará de fazer a associação entre o personagem “Áureo Macedo Carmelo de Souza” e o atual corregedor da PM.
Na próxima edição, outro show de prepotência e exibicionismo, agora num posto de gasolina.
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