Por Daniel Milazzo, quinta-feira, 12 de junho de 2008
Em audiência pública promovida pelo Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) nesta terça-feira, 10, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Francisco Rezek denunciou que a declaração das Nações Unidas de 13 de setembro de 2007, assinada pelo Brasil, pode pôr em risco a soberania nacional.
Trata-se da Declaração de Direitos dos Povos Indígenas. Em entrevista a Terra Magazine, Francisco Rezek avalia que o texto não tem o peso jurídico de um tratado internacional, mas abre precedentes para o questinamento da autonomia do Estado brasileiro sobre reservas indígenas.
- Existe na declaração alguma coisa que, no futuro, o Brasil possa se utilizar contra qualquer tentativa de injunção sobre sua soberania? Existe sim. Mas existe também o contrário o tempo todo. E não há dúvida de que isso será motivo de um debate permanente. O texto certamente autorizará cobranças e atitudes várias, dentro e fora do Brasil.
Em tom de protesto, o jurista, que também foi juiz da Corte Internacional de Haia, acrescenta:
- A quê estamos chegando? A uma situação em que uma suposta autonomia indígena, a autodeterminação dos indígenas, vai se fazer sob a orientação e regência de ONGs? É isso? Se for, é algo alarmante.
O presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) encaminhará ao presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), a denúncia apresentada por Rezek.
- Essa denúncia nos preocupa e não podemos dar margem a dúvidas no que se refere a quem pertence a Amazônia brasileira; a Amazônia é nossa, é do Brasil - afirmou Britto durante a audiência.
A fim de não dar brechas a uma leitura da declaração da ONU que leve à internacionalização da Amazônia, a OAB está examinando o texto e discutindo o tema no Conselho da instituição para, em seguida, levá-la ao Senado Federal.
"Self-determination"
O texto da Declaração de Direitos dos Povos Indígenas foi proposto por países como Alemanha, Finlândia e Dinamarca, os quais não são reconhecidos por conhecerem de perto as causas indígenas. Para Rezek, isso é no mínimo "curioso". O jurista lembra ainda que houve onze abstenções em relação ao texto e quatro votos contrários: Estados Unidos, Canadá, Nova Zelândia e Austrália - países que possuem comunidades indígenas em seu território.
- O texto é incongruente porque não resolve o principal dilema de países como o Brasil, que é a questão de saber qual é a grande matriz ideológica a adotar. É preservar a condição natural dos indígenas ou é aculturá-los com maior rapidez e incorporá-los à sociedade?
De acordo com Rezek, self-determination é um termo clássico nas em relações internacionais. É o princípio que nos séculos XIX e XX levou povos à independência ante o domínio colonial. Porém, ele ressalta que quando incorporado ao texto das Nações Unidas, permite-se a interpretação de que haja hoje uma dominação de povos indígenas pelo Estado soberano em que se encontram, sugerindo o direito à independência.
- O texto contém dispositivos que vão certamente motivar cobranças internas e externas que arranham, que desafiam o domínio soberano do território brasileiro em sua extensão, a integralidade daquele território que é um espaço físico da soberania do Brasil e sempre foi - reforça o ex-ministro do STF.
Raposa/Serra do Sol
A respeito da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, localizada no estado de Roraima, Rezek considera injusta a retirada de brasileiros não-indígenas da região.
- A delimitação da reserva Raposa Serra do Sol preocupa por reunir etnias indígenas diversas, não exatamente afeiçoadas umas às outras, e o espaço onde há muitos brasileiros não indígenas, trabalhadores cuja expulsão da área seria uma iniqüidade - argumenta Rezek.
De acordo com a OAB, "a soberania brasileira pode e deve ser mantida independentemente da forma de demarcação daquela e de outras reservas indígenas".
Terra Magazine
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