Por Diogo G.R. Costa é editor de OrdemLivre.org
O OrdemLivre.org esteve no XXI Fórum da Liberdade. Lá, Tom Palmer, vice-presidente de programas internacionais do Cato, participou de um painel com Paulo Guedes e Ciro Gomes. O tema era "Livre comércio: ameaça ou oportunidade". O discurso do economista Paulo Guedes foi informativo e até mesmo divertido, mas quero falar aqui do debate (C.T. - clique aqui para ver que maravilha foi o Ciro sendo colocado em seu devido lugar de demagogo, para dizer o mínimo) entre Ciro Gomes e Tom Palmer.
O debate decorreu de uma inesperada resposta de Ciro Gomes à apresentação feita anteriormente por Tom Palmer. Palmer havia concluído sobre o tema que a globalização do comércio funciona como uma ameaça para monopólios e mercantilistas e uma oportunidade para os consumidores dos diferentes países. E apontou alguns dados do Banco Mundial e do Fraser Institute sobre o nível de intervencionismo do Estado brasileiro. Em sua vez, Ciro Gomes disse que era a favor da liberdade absoluta, mas não hoje. Ciro falou de coordenação econômica sem especificar causas e efeitos, coisa que ele costuma fazer. A diferença é que dessa vez ele aproveitou seu discurso para responder ao Palmer. Criticou os estrangeiros que pintam uma caricatura do Brasil sem capturar a verdadeira identidade nacional. Foi a provocação certa para esquentar um debate entre Ciro Gomes e Tom Palmer.
Não tenho a transcrição do debate (C.T. - tem problema não, clique aqui e veja no vídeo o debate), mas tentarei lembrar os pontos principais. Depois que os três palestrantes fizeram suas apresentações, Palmer pediu a palavra para responder ao ataque do deputado cearense. Ele se defendeu dizendo que não é uma descaracterização de identidade enfatizar o excesso de intervencionismo do Brasil, afinal, a identidade brasileira está nas artes, na cultura, e não na burocracia, assim como a identidade russa e dos povos por trás da cortina de ferro não estava no comunismo. Aproveitou para lembrar que a Estônia, ao se modernizar após a desmoronamento do império soviético, reduziu as tarifas de importação para zero, e alcançou resultados positivos. Ciro Gomes, confundindo os nomes, disse que a Lituânia não tinha nada a perder, mas que o Brasil tem, se adotar um "free trade" irrestrito. E que até os americanos, que falam tanto de "free trade", são protecionistas e seletivos. "Com o Canadá as fronteiras são abertas, mas com o México constrói-se um muro". E depois de reclamar de alguma falha de tradução no que ele havia dito sobre identidade, lembrou que o mundo não pode adotar a identidade consumista americana, país que ele conhecia bem, pois já foi um professor visitante na Harvard. De acordo com Ciro, nem todos os povos devem ou precisam ter o nível de consumo que os americanos têm. "Imaginem se os chineses resolvessem ter dois carros na garagem por família... O mundo acabava", concluiu.
Na sua vez, Palmer começou por endossar o ataque de Ciro ao muro na fronteira entre Estados Unidos e México: "É um muro criminoso e deve ser derrubado". E continuou: "Mas enquanto fala desse muro, o Sr. Gomes parece estar querendo levantar outro, um muro imaginário, ao redor de uma certa elite. Acredito que eu estou sentado ao lado de um homem bastante rico para os padrões brasileiros. De um homem que viaja para Cambridge para lecionar em Harvard, para a Europa, que tem bons ternos, provavelmente bons carros. Mas e os brasileiros? Ah, os brasileiros não podem ter o mesmo nível de consumo do Sr. Gomes..." Palmer encarava Ciro Gomes e falava sobre como esse pensamento mercantilista mantém os brasileiros empobrecidos enquanto a elite protege seus privilégios. "Sr. Gomes, o senhor deveria ter vergonha!" A platéia aplaudiu.
Ciro Gomes provavelmente não esperava ser apontado como um defensor dos privilegiados contra os pobres. Em sua vez, resolveu culpar novamente o serviço de interpretação, que deveria ter traduzido mal as suas palavras, e disse que só foi para Harvard porque recebeu bolsa. Mas o golpe já havia acertado o alvo. Durante o resto do Fórum, as pessoas repetiam as palavras finais de Tom Palmer, "you should be ashamed". Semana passada, em Atlanta, encontrei um brasileiro que me disse ter ouvido falar que o Ciro Gomes havia sido destruído num debate no FL. Não creio que tenha sido um ataque devastador, mas foi algo mesmo memorável. Alguém comparou ao que Henry Maksoud havia falado a Collor numa edição do Fórum anterior a sua eleição. Algo como "Se você for eleito e implementar suas idéias, eu me mudo do país".
É sempre saudável ver um político (e não falo em particular do Ciro Gomes) levar um golpe onde menos espera. O livre comércio internacional beneficia as sociedades da mesma forma que a divisão de trabalho beneficia os indivíduos. Levados às últimas conclusões, os argumentos usados para atacá-lo acabam conduzindo à economia de subsistência e à miséria em que ela implica. Mas os políticos são muito bem articulados para permitir que a fragilidade do seu discurso seja dissecada em público. O que leva boa parte do público a ter uma reverência injustificável por eles. Poucos têm coragem de apontar a nudez da classe como o jornalista americano H.L. Mencken:
"Como os jornais falam do político o tempo todo e ele recebe aplausos quando aparece em público, as pessoas acham que ele é um homem realmente importante... As pessoas falam do governo fazendo isso ou aquilo como se falassem de Deus. Mas o governo não é, na verdade, nada mais do que um grupo de homens, normalmente homens bastante inferiores. Eles podem ter alguém melhor trabalhando para eles, mas eles próprios raramente merecem alguma consideração. Poucos deles conseguem fazer algo de valor em qualquer atividade digna de respeito, e poucos deles conhecem alguma coisa que vale a pena ser conhecida ou já tiveram algum pensamento que vale a pena ser pensado".
Precisamos de mais pessoas que zombem dessa pretensa glória e que coloquem o ônus de justificar a intervenção do governo em seus próprios ombros. A arrogância da elite política brasileira merece levar mais tapas retóricos na cara.
2 comentários:
Infelizmente, frases fortes, como "you should be ashamed", valem mais do que argumentos.
Perto do fim (não temos a resposta do Ciro) Tom Palmer parece partir da premissa entranha de que o México é pobre porque não tem livre comércio. Depois, distorce o que o Ciro diz sobre identidade do consumo achando que o Ciro quer que todo mundo se conforme com a pobreza. Não vi o Ciro dizer nada parecido em momento algum. Pra convencer mais facilmente a platéia, antes faz um agrado dizendo (acredite quem puder) que acha que o muro da fronteira com o México deve ser derrubado.
Não acho que isso seja honesto.
VOCÊ TEM ALGUMA DÚVIDA DE QUE OS PAÍSES ONDE VIVEM AS POPULAÇÕES MAIS POBRES DO PLANETA SÃO OS QUE TEM MAIORES "ENTRAVES POLÍTICOS" PARA O MERCADO?
JÁ SOBRE O CIRO E TOM PALMER FICOU MUITO CLARO, BASTA VER E OUVIR OUTRA VEZ.
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