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segunda-feira, 21 de abril de 2008

Golpe Constitucional

Do portal do ESTADÃO
Por Denis Lerrer Rosenfield em segunda-Feira, 14 de Abril de 2008

A prudência recomenda a desconfiança. Encenações, mentiras, desmentidos e desmentidos de desmentidos se tornaram o cotidiano dos brasileiros, aflitos com a falta de moralidade reinante na cena pública. O atual governo nem se ruboriza mais com o que faz, tendo desaparecido qualquer resquício de coerência entre o que é dito e o que é feito. O que vale num dia cessa de valer em outro. Não há a menor preocupação com o cumprimento da palavra e a retidão no comportamento. Neste contexto, como situar a discussão sobre um eventual terceiro mandato de Lula, seja sob a forma da pura e simples reeleição (acompanhada ou não de um plebiscito), seja sob a de um "novo" mandato de cinco anos, em que a partida estaria zerada?

Lula está em plena campanha pelo PAC, inaugurando obras inexistentes e criando símbolos, como se assim pudesse passar à opinião pública a idéia de que algo está sendo feito. O que, porém, está sendo feito senão a campanha de si mesmo, a campanha de alguém empenhado num processo eleitoral de promoção de si mesmo?

Não se pode creditar a Lula a virtude da coerência ou o cumprimento da palavra. A palavra só serve como instrumento retórico, de convencimento do "povo". Eis por que acreditar num líder carismático como Lula é prova de ingenuidade. Ele diz uma coisa e outra sem o menor compromisso com a verdade.

Legítima é, pois, a pergunta: o que faz ele com seus discursos? Desde a sua eleição, jamais abandonou uma postura eleitoral, algumas vezes criticando o governo, como se não fosse o responsável por ele. O que fala é o seu comportamento. O seu fazer é o de alguém que tem um projeto pessoal de poder, pronto a tudo se as condições políticas lhe forem favoráveis. Lula não permanece em Brasília, na rotina própria de um presidente, mas faz campanha em todo o País, recolhendo os frutos de sua popularidade e criando condições para que esta suba ainda mais. Os seus altos índices mostram que o seu "fazer" produz bons resultados. Ele pode dizer pessoalmente que não quer a reeleição, mas, se o "povo" quiser, aí, sim, a coisa seria diferente.

O que está em processo, podendo ou não ser bem-sucedido, é o que poderíamos denominar "golpe constitucional". Golpe porque se trata de uma mudança abrupta das regras do jogo, feita por um líder carismático que se aproveita de sua alta popularidade e de seu forte apoio em sindicatos (comprados) e movimentos sociais (por ele financiados), visando a alterar completamente os princípios da democracia representativa. Constitucional porque seguiria procedimentos constitucionalmente estabelecidos, aparentemente obedecendo à ordem da legalidade. A aparência de golpe desaparece, haja vista que as formalidades democráticas são mantidas, prescindindo do uso das armas. Trata-se, na verdade, de uma subversão da democracia por meios democráticos.

Uma das condições de um processo desse tipo reside num líder cujo perfil carismático o coloque acima das refregas partidárias e dos conflitos sociais. É precisamente o caso de Lula, que faz um discurso que agrada a empresários e outro, a movimentos sociais, aparentemente dando satisfação a ambos. No que diz respeito a alianças partidárias, elas lhe servem para mostrar que se situa acima do seu jogo. A divisão entre partidos ditos de esquerda e de direita tampouco é observada, pois coexistem em sua base de apoio o PP e o PCdoB, por exemplo. Sob esta ótica, os que se opõem a ele só podem ser "conspiradores", como se estivessem cometendo um crime de lesa-majestade.

Um líder carismático deve ter uma ampla base social de sustentação. O recente veto à fiscalização pelo Tribunal de Contas da União dos novos recursos concedidos às centrais sindicais mostra toda a sua preocupação em contentar essa sua base. Primeiro, ele lhes concede uma forma específica de financiamento, propiciando-lhes um amplo espectro de atuação. Segundo, esses recursos são de livre utilização, não sendo objeto de nenhuma fiscalização. Desta maneira, os sindicatos estão cada vez mais amarrados ao próprio aparelho de Estado, fazendo parte dele. Os antigos discursos do sindicalista pela autonomia sindical e pelo fim da obrigatoriedade da contribuição sindical são simplesmente "esquecidos". A meta agora é que todos se tornem igualmente pelegos, instrumentos do seu próprio poder.

Os movimentos sociais cumprem essa mesma função de controle de uma ampla massa de manobra, podendo ser requisitada a qualquer momento. Poderia ser, por exemplo, requisitada para uma ampla mobilização nacional por um plebiscito visando a uma reforma constitucional que permita a introdução da reeleição para um terceiro mandato. O recente episódio de financiamento do MST com verbas do Ministério da Educação é apenas a ponta de um imenso iceberg, que envolve outros Ministérios, como o de Desenvolvimento Agrário e o de Desenvolvimento Social. Os movimentos sociais são financiados pelo governo, que conta com esse grande trunfo. Podem, assim, invadir qualquer propriedade privada, prejudicar o agronegócio, ocupar rodovias e estradas de ferro. Ademais, estão com as mãos livres para agirem segundo as suas conveniências, pois a lei não é a eles aplicada. A impunidade é total.

Dentro desse projeto, é fundamental contar com uma ampla base social, sobretudo de desempregados ou empregados temporariamente, pois estes não são alcançados pelos sindicatos ou o são, imperfeitamente, pelos movimentos sociais. Eis a função cumprida pelo Bolsa-Família, que alavanca a alta popularidade do presidente entre os mais desfavorecidos, que vêem os recursos recebidos como uma forma de sobrevivência. Se seus alimentos são fornecidos pelo presidente, sua vida dele depende. Não convém menosprezar o poder de mobilização que pode estar aqui embutido, e a mobilização eleitoral seria um dos seus fatores.

Todo o cuidado é pouco!

Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na UFRGS.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
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A perversão da retórica, que falseia a lógica e os fatos para vencer o adversário em luta desleal, denomina-se erística. Se a retórica apenas simplifica e embeleza os argumentos para torná-los atraentes, a erística vai além: embeleza com falsos atrativos a falta de argumentos.
‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".