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terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

O triunfo da razão cínica - fundador do PT mostra a cara do partido-seita

Da revista CAROS AMIGOS
Por César Benjamin

César Benjamin é um dos fundadores do PT e foi coordenador da campanha de Lula a presidente em 1989 (apenas um ano antes da fundação do FORO DE SÃO PAULO) e aqui expõe o que é e sempre foi realmente o PT, que ele só foi ver depois de perder a ilusão com seu "chefe".

A crise do PT é a mais profunda crise da esquerda brasileira. para o bem e para o mal, foi o PT a vanguarda política da nossa esquerda nos últimos vinte anos.

O Partido dos Trabalhadores está morrendo. Nele não resta mais nenhum espírito transformador, nenhuma autenticidade, nenhum impulso vital. Não tem princípios a defender. Não tem mais referências sobre coisa alguma, pois suas posições históricas – sobre a previdência, os transgênicos, a política econômica, o FMI ou qualquer outro assunto – estão sempre prontas a ser sacrificadas no balcão em que se fazem as negociações do momento.

O PT não tem, nem pretende mais ter, projeto de sociedade. Tem apenas projeto de poder. Essa volúpia desenfreada, sem ideal, cria o ambiente propício ao cinismo e à corrupção crescentes, a que estamos assistindo, pois a melhor maneira de se manter em cima é copiar os poderosos e se aliar a eles. Hoje, o militante de que o PT precisa, o que é valorizado pela direção, é o carreirista obcecado pelo sucesso rápido e a trajetória meteórica, disposto a dizer amém, pronto a desmentir amanhã, por qualquer pretexto, aquilo que defendia até hoje.

Os que construíram o partido e não se corromperam nele não têm mais lugar. Tornaram-se um estorvo. São enxovalhados. Estão sendo substituídos por filiados pela Internet e por gente arrebanhada pelos esquemas políticos tradicionais. Esquemas caros, como se sabe, pois esvaziados da militância voluntária que impulsionou o partido quando ele era jovem. Para financiar essa operação e esse novo modo de ser, é cada vez mais tênue, no andar de cima, a separação entre política e negócios. Candidatos a deputado, até ontem meros assalariados, falam abertamente em levantar 10 ou 20 milhões de reais para suas campanhas, sabe-se lá de que forma. Candidatos a cargos mais altos aventuram-se em todos os tabuleiros. São as regras do jogo. Não há mais pudor. Todos caminham nus pelos salões.

Valores esquecidos

O PT tornou-se uma via de ascensão individual para a afluência material e o poder. Multiplicam-se as pessoas que se tornam subitamente importantes e que se sentem, assim, sem ter história nem biografia, sem ter passado nem futuro. Pobres de espírito, sempre ocupados nas articulações do momento – para a próxima convenção, a próxima nomeação ou a próxima eleição –, não lêem um livro, não se dedicam a conhecer bem assunto nenhum, não são solidários às dificuldades do povo brasileiro, não pretendem ser fiéis a uma idéia de nação. Suas lealdades se esgotam nos limites do grupo de interesse a que estão vinculados. Valores como humildade, perseverança e ideal estão definitivamente fora de moda. Tudo agora é cálculo. Liberado para florescer, o oportunismo tem pressa. Tempo é poder. Tempo é dinheiro.

A crise do PT é a mais profunda crise da esquerda brasileira. Para o bem e para o mal, foi o PT a vanguarda política da nossa esquerda nos últimos vinte anos, e dentro dele foi vanguarda a Articulação. Além de perseguir com coerência uma estratégia política e controlar com competência os principais aparatos de poder, ela propunha a toda a esquerda uma forma de luta estratégica, que, uma vez vitoriosa, seria capaz de abrir um período novo de ação política em nosso país: a eleição de Lula à presidência. Participávamos de múltiplas iniciativas militantes no cotidiano, e a cada quatro anos renovávamos nossa esperança em uma possibilidade especial, a de colocar Lula lá.

Durou menos de um ano a transição de um auge a uma crise. Hoje, a Articulação tem um poder que a esquerda nunca teve, mas não é vanguarda de mais nada, nem para o bem nem para o mal. É, simplesmente, outra coisa: um grupo que ocupa posições de mando em um Estado corrompido e conservador, forte para premiar e punir, fraco para transformar. Adaptado a ele, usa essas posições para negociar tudo com todos. Falar de um “governo em disputa” era um erro há nove meses. Hoje é apenas cumplicidade com o charlatanismo.

A cooptação do PT pelo sistema de poder é a mais vergonhosa de todas, pois vem desassociada de qualquer ganho real para a base social que ele deveria representar. Ao contrário, ele aceitou ser o algoz dessa base: a contar do início do governo Lula, teremos 1 milhão de novos desempregados em fevereiro de 2004, e os rendimentos do trabalho estão em queda livre. A previdência pública foi desmontada, e anuncia-se para breve o acerto de contas com a legislação trabalhista. Comparativamente a isso, a socialdemocracia européia teve uma trajetória brilhante.
Nenhum de nós pede que Lula faça uma revolução. Nenhum desconhece o cenário, nacional e internacional, que nos cerca. Pedimos apenas decência, espírito republicano e compromisso com um capitalismo regulado. Basta isso para que sejamos chamados de radicais, num país em que política e indecência sempre foram mais ou menos a mesma coisa, em que o Estado sempre foi um espaço de negociatas e em que, em vez de capitalismo, prevalece a bandalha. Insistimos nessas três coisas, porque por menos do que elas a própria atividade política já não vale a pena. Por menos, é melhor ir para casa.

O que nos afasta do PT não são posições adotadas nessa ou naquela questão. São valores e princípios. É esse ilimitado pragmatismo de quem, uma vez no poder, não pode correr risco nenhum, nem mesmo o risco de dizer a verdade. No lugar da verdade, marketing, dissimulação e engodo, uma enorme operação de deseducação política do povo brasileiro. No lugar de uma ação coletiva, de baixo para cima, um líder que desmobiliza e que, como todo medíocre, começa a se considerar semideus. No lugar de um projeto, espertezas, um discurso para cada interlocutor. No lugar de diálogo, ameaças, chantagens, nomeações, demissões. No lugar da luta de idéias, movimentos sempre nas sombras. É o triunfo da razão cínica.

Herança duradoura

O chefe disso chama-se Luís Inácio Lula da Silva. Sua principal herança, para a esquerda brasileira, não será formada a partir de acertos e erros aqui e acolá, naturais na trajetória de qualquer pessoa. Sua herança mais duradoura será construída pela sistemática sinalização de valores negativos, que ele ajudou a difundir amplamente nos últimos anos. Isso é que é imperdoável. Arrogante com os “de baixo” e subserviente aos “de cima”, desqualifica-se, pois o que se espera de um líder popular é exatamente o contrário: que seja humilde com os de baixo e firme com os de cima. Aos pobres, “seus filhos”, pede infinita paciência, enquanto atende com presteza aos reclamos dos ricos, os financiadores de campanhas. Desemprega 1 milhão de brasileiros e anuncia-se como aquele que resgata a auto-estima do Brasil. Considera-se corajoso porque tira direitos de enfermeiras, professores e barnabés, conduz serviços essenciais ao colapso, enquanto se dispõe a pagar pontualmente mais de 150 bilhões de reais em juros aos rentistas só neste ano. É o novo líder dos trezentos picaretas que denunciava. Logo lhes entregará mais ministérios.

Seu governo passará, mas sua liderança deixará na esquerda um extenso e duradouro legado: milhares de pessoas despreparadas e sem valores, que aprenderam no PT que fazer política é gerenciar interesses. Esses ficarão ainda por muito tempo, na forma de uma geração de gente perdida, que nunca lutou e foi derrotada. É isso que dói.

* Após reler o artigo, sem tempo para corrigir, César Benjamin pediu desculpas. Abaixo o referido texto:

Peço desculpas
por César Benjamin

A revista Caros Amigos que está nas bancas neste mês traz um artigo meu, intitulado "O triunfo da razão cínica"*, que, sob muitos aspectos, é equivocado e injusto. Dei-me conta disso ao relê-lo com calma no dia seguinte, mas uma infeliz sucessão de circunstâncias tornou impossível que eu corrigisse a tempo o meu erro. Deixem-me, primeiro, contá-las, para depois refletir rapidamente sobre as dimensões mais profundas do episódio.

Atrasei meu artigo do mês, por acúmulo de trabalho, de modo que a revista permaneceu com uma página aberta, à minha espera, tendo como prazo-limite as primeiras horas da manhã de uma segunda-feira. Só consegui redigir o texto no domingo à noite, emocionado e impactado pelo contato que tive, pouco antes, com militantes históricos do PT. Compartilhei com eles o clima de forte amargura com os rumos de uma instituição à qual todos entregamos, generosamente, muitos anos de vida. Como afirmo no artigo, não se trata de discordar dessa ou daquela posição, mas de constatar um processo que aponta para a falência da própria luta de idéias. Em diversas áreas, filiações em massa, despolitizadas, de origem desconhecida, estão tornando inviável qualquer expectativa de um debate honesto, numa tentativa - que provavelmente será bem-sucedida - de congelar o controle do partido nas mãos de grupos que têm mais recursos e menos escrúpulos em adotar esse padrão de comportamento. Para muitos militantes, constatar isso não é apenas uma questão de política abstrata. Vem associado a sentimentos pessoais bastante dolorosos.

Redigi meu artigo de uma só vez, sem muita reflexão e ponderação, contando relê-lo no dia seguinte. Saí, porém, atrasado. Enviei essa primeira versão sem a necessária revisão, que só fui fazer na hora do almoço, quando percebi o equívoco. Telefonei para a redação, para fazer correções, mas era tarde: a revista estava na gráfica. A responsabilidade, evidentemente, é toda minha.

Esta é a seqüência que, como disse acima, forma a história factual do episódio. É claro que ela não basta. Desde então, tenho procurado a raiz do meu erro, tentando deixar aflorar o maior conteúdo de verdade que eu possa conseguir perceber.

O artigo é fundamentalmente errado por, pelo menos, quatro razões. Primeiro, é raivoso, quando deveria ser apenas firme e claro. Segundo, é maniqueísta, com uma rígida divisão entre o bem e o mal que nunca corresponde ao que a vida é. Terceiro, homogeneiza realidades que são heterogêneas e nivela por baixo, deixando de enxergar diferenças importantes. Quarto, não ajuda a construir.

A única coisa boa que consigo extrair desse conjunto de erros, cometido de uma só vez, é que ele me levou a refletir com mais abertura e sinceridade sobre minhas próprias limitações. Vejo-as agora amplificadas.

Nosso país vive uma crise de grandes dimensões. Sua face mais evidente é a crise social, mas sua face mais profunda é o que poderíamos chamar de crise de destino. Ambas estão se acelerando visivelmente, no rumo de algum tipo de ruptura que terá de ocorrer, não se sabe quando nem em que direção. Sob certos aspectos, estamos em uma espécie de guerra civil não declarada.

Isso não é jogo de palavras. Democracia, liberdade e cidadania já são meras abstrações para boa parte do nosso povo, que apenas tenta sobreviver. Grupos sociais numerosos vivem em estado de anomia, sem regras, sem segurança de direitos básicos e sem perspectivas. Quem apura o ouvido percebe que há um desespero abafado se alastrando entre as pessoas. Minha angústia em relação ao PT e ao governo Lula diz respeito à pequenez com que ambos se comportam diante da catástrofe. O ruído surdo, que ela produz, talvez não chegue a Brasília.

O Brasil - e, dentro dele, a esquerda brasileira - pagarão muito caro por
isso. Justamente porque estamos caminhando para situações-limite, cabe mais do que nunca um esforço crítico. Ele precisa ser claro, firme e duro, porém sempre repleto de compreensão, pedagogia e disposição para o diálogo com todas as pessoas honestas, desejosas de marcharem juntas para salvar o país.

Muitas delas permanecem no PT.

À revista que generosamente tem acolhido os meus textos, aos seus leitores e a todos os que, com justa razão, possam ter se sentido agredidos com o meu artigo deste mês, eu peço sinceras desculpas.

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A teoria marxista da “ideologia de classe” não tem pé nem cabeça. Ou a ideologia do sujeito traduz necessariamente os interesses da classe a que ele pertence, ou ele está livre para tornar-se advogado de alguma outra classe. Na primeira hipótese, jamais surgiria um comunista entre os burgueses e Karl Marx jamais teria sido Karl Marx. Na segunda, não há vínculo entre a ideologia e a condição social do indivíduo e não há portanto ideologia de classe: há apenas a ideologia pessoal que cada um atribui à classe com que simpatiza, construindo depois, por mera inversão dessa fantasia, a suposta ideologia da classe adversária. Uma teoria que pode ser demolida em sete linhas não vale cinco, mas com base nela já se matou tanta gente, já se destruiu tanto patrimônio da humanidade e sobretudo já se gastou tanto dinheiro em subsídios universitários, que é preciso continuar a fingir que se acredita nela, para não admitir o vexame. Olavo de Carvalho, íntegra aqui.
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‎"O que me leva ao conservadorismo é a pesquisa e a investigação da realidade. Como eu não gosto de futebol, não gosto de pagode, não gosto de axé music, não gosto de carnaval, não fumo maconha e considero o PT ilegal, posso dizer que não me considero brasileiro - ao contrário da maioria desses estúpidos que conheço, que afirma ter orgulho disso". (José Octavio Dettmann)
" Platão já observava que a degradação moral da sociedade não chega ao seu ponto mais abjeto quando as virtudes desapareceram do cenário público, mas quando a própria capacidade de concebê-las se extinguiu nas almas da geração mais nova. " Citação de Olavo de Carvalho em "Virtudes nacionais".