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segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

CRISE NA JUSTIÇA COLOMBIANA

HEITOR DE PAOLA


A CSJ diz: “Aqui não aconteceu nada”


Eduardo Mackenzie



Após a maratônica reunião, a Corte Suprema de Justiça (CSJ) elegeu, por fim, o novo Fiscal Geral da Nação na pessoa da advogada e ex-congressista liberal Viviane Morales Hoyos, 48 anos, na madrugada do 2 de dezembro passado. A terna [1] utilizada foi a enviada pelo Presidente Juan Manuel Santos a qual substituiu, de forma irregular, segundo alguns juristas, a única válida: a segunda que meses antes o Presidente Álvaro Uribe havia apresentado. Nessa mesma noite, o pleno da SCJ elegeu também seu presidente na propriedade e cinco novos magistrados.


Tudo isso parece ter aliviado alguns editorialistas. Entretanto, alguém pode se perguntar se o país está na mesma tônica. Não creio. Essa eleição noturna não encerra, de modo algum, a discussão sobre a vergonhosa aventura da CSJ nos meses passados. Embora a boa-vontade de Viviane Morales pareça imensa, a viabilidade do novo período que se abre continua interditada.


Durante os últimos 16 meses, a CSJ se desvalorizou ante a opinião pública. Nesse período, a crise da Justiça colombiana se fez patente. As declarações do magistrado Augusto Ibáñez, ex-presidente da CSJ, sobre “a era dos juízes” anunciaram que esta abria, sem motivações claras, um processo de luta frontal contra o poder executivo e contra o poder legislativo, e avançava para a conformação de um novo estilo de poder. Mais perspicaz do que alguns acreditam, a opinião pública adivinhou que começava a se cristalizar um governo dos juízes, quer dizer, um desvio detestável do sistema democrático.


Nesses 16 meses a CSJ se meteu, só ela, em um conflito devastador: ela negou-se a cumprir o preceito constitucional de eleger o Fiscal Geral de uma terna apresentada pelo presidente da República. Ela nunca explicou, realmente, o por quê desse ato de rebelião. Ela deixou ver que sua única motivação era política: o grupo dirigente da CSJ detesta o chefe de Estado eleito duas vezes pelos colombianos. Por isso impediu durante um ano e meio a eleição do Fiscal Geral.


Com esse ato de rebelião a CSJ se colocou acima da Constituição, operou à sua maneira, sem respeitar nada nem ninguém. Augusto Ibáñez inventou exigências que a Constituição rechaça. Para resumir: a CSJ aboliu a Constituição e pôs em perigo o edifício institucional do país. Os efeitos viram-se em seguida: aumento da criminalidade em todo o país, incremento do terrorismo das FARC, decisões judiciais aberrantes por todo lado, investigações contra os congressistas que votaram pelo referendo e mudança súbita de posição sobre o foro destes.


Também houve campanhas de satanização e de repressão judicial contra o estamento militar e o poder legislativo, e contra o presidente da República. Houve manobras contra a liberdade de imprensa: alguns magistrados pediram a cabeça de importantes jornalistas. Outros chegaram ao extremo de pedir a obscuros ativistas espanhóis, em janeiro de 2010, que difundissem na Europa as piores imundícies contra o governo colombiano.


Agora o magistrado Jaime Arrubla Paucar, novo presidente da CSJ, nos conta que, com a eleição do 2 de dezembro, eles “cumpriram [o seu dever] para com o país. Se interpreto bem suas palavras, ele pretende que os cidadãos fiquemos em dívida com ele.


Pelo contrário, muitos colombianos queremos saber o que se passou nesses 16 meses, pois a coisa não está clara e o que continua acontecendo tampouco está claro. A claque que aboliu a Constituição continua em seus cargos e nada garante que não voltarão ao mesmo. Que garantias o país tem de que não trabalharão assim? Que obstáculos jurídicos existem contra um desvio tão grave? Pelo que vimos nestes 16 meses, nenhum. Que sanção houve após o motim constitucional? Nenhuma. Que reparação está prevista para emendar o que fizeram? Nenhuma. 


Essa rebelião da CSJ, algo que nunca tinha ocorrido na Colômbia, desequilibrou o sistema penal. Houve derrota institucional e derrota do conceito do Estado de Direito. O país deve ficar calado? “Siga seu caminho, amigo, aqui não aconteceu nada”. É essa a ordem? Será difícil acatá-la. O último capítulo dessa crise é o mal-estar que existe, a justo título, sobre a falta de garantias da justiça. O escândalo do asilo político conseguido por María del Pilar Hurtado não fez senão trazer à flutuação algo que já estava latente.


O que se pode concluir da negativa da CSJ em abrir investigação penal contra a ex-senadora Piedad Córdoba, cujos laços com as FARC são provados, para que os amigos desta possam incrustá-la como parte civil na investigação que abriram contra o ex-presidente Uribe? Isso são garantias?


O que pensar da juíza Jara, premiada com viagem de estudos na Alemanha por haver condenado o coronel Plazas Vega sem ter provas contra ele e tendo, em troca, todos os elementos que provam sua inocência? Isso é um Estado de Direito?


O presidente Juan Manuel Santos e a Fiscal Viviane Morales deveriam ver com realismo o que ocorre. A caça às bruxas contra o ex-presidente Uribe e seus colaboradores, e a vendetta contra o Procurador Geral Ordóñez, mostram o fundo do abismo. E revelam que toda a veleidade de independência do mesmo chefe de Estado e da nova Fiscal Geral, será castigada. A anômala correlação de forças criada pelos fatos deste 16 meses de Constituição abolida, torna tudo isso possível.


Nota da tradutora:


[1] “Terna” é uma lista tríplice, indicada pelo Presidente da República, para que os magistrados escolham um dentre os candidatos propostos ao cargo de Fiscal Geral da Nação.


Tradução: Graça Salgueiro

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