por Jeffrey Nyquist em 02 de setembro de 2008
Resumo: O social-democrata de hoje (e o conservador compassivo) quer os benefícios do mercado sem a dor do processo de mercado, seguindo um caminho que leva a somente um lugar: o socialismo.
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Foi Joshua Rosner, escrevendo no Financial Times do dia 15/7, quem melhor definiu um princípio: “Numa economia capitalista, espera-se que os perdedores assumam as perdas e os ganhadores, os ganhos”. Mas não é assim que as coisas funcionam hoje em dia, não é mesmo? Mais de três décadas atrás, Richard Nixon disse uma frase já famosa: “Agora, somos todos keynesianos”. Em 2008, podemos ir ainda além. Se George Bush tivesse a visão e compreensão de um Nixon, ele seria forçado a admitir: “Nós todos nos tornamos socialistas, mas, da boca para fora, somos pró-livre mercado”.
Rosner diz que começamos a nacionalizar ativos ruins. A partir disso, é só um pequeno passo para nacionalizar ativos bons. Na verdade e logicamente, as duas coisas acarretam uma a outra. Tal como afirma Rosner, nós oficialmente perdemos a fé no mercado. Perdemos a fé na fonte da prosperidade. Nós não mais suportamos a destruição criativa do processo de mercado. Nós não mais queremos o sofrimento que naturalmente acompanha o crescimento real. Coisas boas e apenas coisas boas são exigidas. Perdas são inaceitáveis, ainda que essas sempre acompanhem conquistas genuínas. Todo mundo quer ser um vencedor. No sistema escolar atual encontramos o no child left behind [nenhuma criança deixada para trás], que exemplifica a catástrofe contínua e adiantada na educação americana.
A lógica do capitalismo recente (a forma declinante de capitalismo) exige a eliminação de todo o sofrimento (e, portanto, a eliminação do crescimento real). Este programa é a base da mais recente social-democracia, que se opõe ao mercado exatamente porque a dor e a tragédia são normais ao sistema de mercado. A social-democracia quer um mundo sem a falência de corporações ou de bancos. Não é de se admirar então que, passo a passo, eles cercaram o mercado com “proteções”. O social-democrata de hoje (e o conservador compassivo) quer os benefícios do mercado sem a dor do processo de mercado. O economista austríaco Ludwig von Mises certa vez escreveu: “Homens devem escolher entre a economia de mercado e o socialismo. Eles não podem se esquivar da decisão entre estas alternativas...”. Sem dor, não há ganho (no pain, no gain).
Então, a situação aí está. Uma decisão foi tomada (e quase todos concordam com ela), de que a dor precisa ser nacionalizada. Por conseguinte, ativos ruins precisam ser nacionalizados, uma vez que ativos ruins envolvem dor. Alguém em algum lugar imaginou que nacionalizar faz a dor desaparecer. Tomem, por exemplo, o sistema de saúde. Você o nacionaliza e ele se acaba. Você nacionaliza qualquer ramo da atividade econômica e ele murcha até desaparecer. Aplique este princípio de redistribuição a todos os sofrimentos humanos e, bem, você obtém o socialismo.
O processo é lógico e se baseia no desejo humano por um passe livre nesta vida. E, assim, nacionalizamos as perdas do Bear Stearns[1]. O FDIC [Federal Deposit Insurance Corp.] dá uma generosa contribuição ao IndyMac [2]. Os contribuintes devem pagar pelos megatropeços de Fannie e Freddie[3]. Onde isso vai parar? A distribuição de dívidas e encargos é o primeiro passo. Deixe que cada um se machuque só um pouco, com a responsabilidade transferida para todos (i.e., ninguém em particular). Diga adeus à dor, mas também diga adeus ao dólar americano.
A coletivização de perdas financeiras necessariamente acarreta a coletivização de lucros financeiros. Quanto à liberdade mesma, o sistema de governo criado e apresentado pelos Founding Fathers não pode sobreviver à aceitação geral de práticas financeiras bolcheviques. De acordo com Ludwig von Mises, “Cada passo que um governo dá além... para proteger a suave operação da economia de mercado contra a agressão... é um passo adiante na estrada que leva diretamente ao sistema totalitário, onde não há liberdade de espécie alguma”.
Ah, se os bolcheviques tivessem entendido o alcance dos seus princípios em 1917. Pense em quão diferentemente eles teriam lidado com o período soviético inicial. Sua tendência era de fazer o socialismo acontecer da forma mais desajeitada e violenta. Eles colocaram a carroça à frente dos bois, ficaram irritados quando a carroça não andou e mataram os bois. Nada disso era necessário. Tudo o que eles precisavam fazer era esperar que a burguesia se auto-amolecesse.
Os bolcheviques não precisavam tomar de assalto o Palácio de Inverno e nem matar de fome os Kulaks. Expurgos e julgamentos espetaculares estavam completamente fora de jeito. Tudo que alguém precisava para criar a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas era paciência. Os próprios capitalistas, enfraquecidos por sua promoção do hedonismo, inevitavelmente buscariam refúgio na nacionalização do investimento de risco. Assim, o socialismo seria instalado de um só golpe, em nome da salvação do capitalismo. Nunca houve necessidade de armar o proletariado ou de enforcar homens de negócios em postes de rua. Os homens de negócios enforcar-se-iam por conta própria e no devido tempo, ao exigir um governo ao estilo soviético. A ingenuidade característica do comunista não é nada mais do que um antegozo dos impulsos suicidas de sua vítima.
Só é preciso esperar que o FDIC detone sob a mal administrada República. Se alguém imaginava que os Bônus do Tesouro americano fossem um investimento sem risco, que pense novamente. Estou sugerindo que o governo americano dará o calote? Em minha opinião, não há outro resultado imaginável. Se você duvida desta conclusão, tente imaginar os governos federal, estaduais e municipais saldando dívidas de dez trilhões de dólares. Isto não acontecerá, na medida em que o método mais fácil de dar o calote à disposição do governo é o aviltamento da moeda nacional. Isto significa o fim do poder internacional americano – financeiro e militar. Significa um fim para a velha ordem internacional, que existiu desde 1945. Significa revolução global. Acene e dê um alô ao socialismo.
[1] NT: O Bear Stearns era uma importante administradora de fundos de investimentos, com pesada dependência em créditos imobiliários duvidosos, os subprime. Em maio, praticamente quebrou, mas foi resgatado (comprado a preço baixíssimo) pelo J. P. Morgan, sob as bênçãos e com o aval do FED.
[2] NT: O IndyMac é mais um importante banco de crédito imobiliário que quebrou e foi resgatado por um órgão de seguros federal, o FDIC. Estranhamente, o FDIC, um órgão regulador que já estava monitorando o IndyMac, permitiu empréstimos de risco no mesmo período em que deveria estar zelando para que tais procedimentos não mais ocorressem.
[3] NT: Fannie Mae e Freddie Mac são as duas maiores (e gigantescas) agências hipotecárias americanas. Mal comparando, uma dupla de BNHs. Fannie Mae foi fundada em 1938, durante o New Deal, como agência governamental. Tornou-se empresa privada com ações em Bolsa, com autorização do Congresso para financiar e fomentar o financiamento de moradias a baixo custo.
© 2008 Jeffrey R. Nyquist
Publicado por Financialsense.com
Tradução: MSM
Jeffrey Nyquist é formado em sociologia política na Universidade da Califórnia e é expert em geopolítica. Escreve artigos semanais para o Financial Sense (http://www.financialsense.com/), é autor de The Origins of The Fourth World War e mantém um website: http://www.jrnyquist.com/.
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