MÍDIA A MAIS
16 | 08 | 2012
Por: Maria Júlia Ferraz
Antes que aleguem elitismo por parte da autora deste texto, deixo claro que, no Brasil, nem tudo é como parece ser. Ou seja, uma atitude ou uma lei que aparentemente beneficie a população com poder aquisitivo mais baixo não significa melhorias reais para essa parcela da população. No entanto, criticar algumas dessas leis é pedir para ser execrado pela maioria das cabeças pensantes.
Sofremos de uma culpa tão grande pela desigualdade social que ficamos cegos quanto ao que realmente poderia mudar os quadros de miséria econômica e cultural no Brasil.
Confundimos a pintura externa de um imóvel com uma reforma em sua estrutura. A pintura deixa a casa mais apresentável, mas não resolve de forma alguma os problemas que porventura existam em seu alicerce. Quantas vezes é preciso destruir para reerguer?
É dentro dessa confusão que encaixo a sanção da lei sobre 50% das vagas das escolas técnicas e universidades federais serem destinadas aos alunos oriundos das escolas públicas. Aparentemente, ela funciona como um mecanismo de recuperação daqueles que não foram agraciados com uma boa formação básica nas...ESCOLAS PÚBLICAS.
A educação brasileira sofreu um sucateamento que beira (sendo muito otimista) o irreversível. É só passear pelas redes sociais para perceber o quanto a grande maioria dos brasileiros escreve muito, muito, muito mal. Quando digo mal, não estou fazendo referência à norma culta, ao uso refinado de vírgulas, palavras com grafia complicada. Refiro-me ao trivial, às conjugações verbais e nominais mais simples, à ortografia básica. E a língua é instrumento de comunicação interpessoal, assim como é também mecanismo para compreensão do mundo em que se vive. Uma alfabetização ruim é prejudicial sim para o resto da vida escolar.
Se o governo quisesse realmente promover a melhoria do ensino no Brasil e instrumentalizar o cidadão, daria melhores condições de trabalho ao professor. Utilizaria o tanto de imposto que rouba do trabalhador e organizaria um sistema de ensino que poderia receber verdadeiramente o nome de FUNDAMENTAL. Principalmente ao professor da rede pública, àquele que trabalha com a formação do cidadão. Aliás, não vem ao caso, pois não é a proposta deste artigo, mas, para isso, o governo e os engenheiros sociais teriam que rever o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente – que protege “adolescentes” que ameaçam seus professores de morte.
A educação no Brasil é um problema estrutural. Assegurar vagas por meio das ações afirmativas [*] não vai qualificar o que não tem qualidade. E quem se posiciona contra é tachado, sem nenhuma reflexão, de RACISTA, RICO, BRANCO MIMADO. No Facebook, uma das redes sociais preferidas dos adolescentes, vi um “convite” que convocava os estudantes do ensino médio das escolas públicas para uma passeata pró-cotas. O convite dizia que, se você era contra as cotas, significava que você era branco, tinha estudado em escola particular, sua família tinha recebido terras no século XIX para “branqueamento” do Brasil (a lei de terras do II Reinado não foi lá grande coisa, mas branqueamento do Brasil é algo inverossímil), entre outras asneiras.
Não passa pela cabeça desse estudante que as ações afirmativas (como a política de cotas) são inconsistentes porque não redimensionam o papel da educação no país?
O estudante da escola pública tem o direito de se posicionar a favor da educação? Claro! Com toda a certeza. Deve se posicionar a favor da educação, da qualidade, do acesso a boas universidades. O grande problema é que as cotas não significam a defesa da educação, nem o acesso a uma boa formação.
A política de cotas é apenas a pintura em um prédio cuja estrutura está comprometida.
Em conversa com um professor de uma universidade federal foi comentada a seguinte situação: “Meus alunos não conseguem ler. Posso dar o mais simples texto relacionado a autores clássicos da disciplina que leciono. Boa parte da sala de aula não consegue acompanhar.”
A formação capenga dos estudantes brasileiros engessa o crescimento do Brasil. É claro que os estudantes não podem ser culpabilizados por isso. Mas seria necessário que alguém mostrasse que há benefícios em uma boa formação. Isso não é elitismo. Quem disse que é necessário nivelar por baixo para que todos tenham acesso à educação e à cultura? Isso sim é preconceito. É como se afirmássemos que o pobre tem que se contentar com menos.
É só olhar para a História. Não a História enquanto elemento ideológico, mas a História como significância dos fatos e análises de acertos e erros. A boa formação cultural sempre esteve no cerne de toda grande civilização, cada qual com seu tempo histórico. Ao trocar um real investimento na base da formação cultural por uma mera “caiação” não mexemos no problema e ainda adiamos a solução.
Um outro argumento utilizado é o da dívida histórica que temos com os negros por conta da escravidão, pelos abusos cometidos em três séculos de dominação branca, pela pobreza reservada aos negros e seus descendentes e, finalmente, pela desigualdade social.
Por essa perspectiva, facilmente se levanta a bandeira da vítima do processo histórico. A escravidão ocorreu? Sim. Foi positiva? Não. Fez parte da formação da sociedade brasileira? Sim. (Gilberto Freyre analisa maravilhosamente isso em “Casa Grande & Senzala” e em “Sobrados e Mocambos”). Conseguiremos reorganizar um passado que deixou de existir através de uma política de cotas? Não! Porque são coisas distintas.
O problema da educação não tem a ver com a escravidão, com as piadas de péssimo gosto, seja de negros, de loiras, de mulheres ao volante ou de portugueses. Aliás, humor chulo atinge vários tipos de personagens, não apenas o negro.
O problema da educação é a coisa mais democrática que se tem hoje no Brasil: atinge todas as etnias – seja você negro, branco, japonês, descendente de italiano, alemão ou indígena.
Dirão que atinge mais o pobre que o rico. Sistema de cotas não resolve problema social. Só perpetua os já existentes. Disfarça, agrada à militância, deixa feliz os que acreditam no governo como uma espécie de Papai Noel, mas não vai resolver o problema da desigualdade social e não vai apagar o passado escravista que o Brasil não conseguiu romper ao organizar seu Estado politicamente independente.
Em termo de comparação, é acreditarmos que a saúde no Brasil está melhorando porque, em vez de construirmos mais hospitais e melhorarmos o atendimento já disponível, passamos a escolher os mais pobres e miseráveis para serem atendidos. Gritarão que uma coisa não pode ser comparada a outra. No entanto, o princípio é o mesmo: priorizar pessoas pelo seu status quo. Essa seria uma ação justa? Recuperaria os descalabros da saúde pública? Óbvio que não.
Eu sinto muito mesmo quando vejo uma política populista, que beneficia exclusivamente o governo em médio e longo prazo, sendo comemorada como se fosse a salvação dajuventude brasileira. É motivo para velório, para manifestação.
É a construção de uma sociedade distópica em que as aparências e a estatística burra valem muito mais que a formação real do indivíduo. É a concretização do desmoronamento do conhecimento adquirido e acumulado. É o reconhecimento de que não temos condição de consertar a educação, jogamos a toalha e vamos nos satisfazer com o mais medíocre possível. É dizer ao estudante da escola pública, aos negros, aos índios que eles precisam de uma chance maior, pois não possuem os mesmo atributos dos demais brasileiros. Por fim, essa é a técnica utilizada por governos mal intencionados para, gradualmente, acabar com uma estrutura crítica de pensamento que faz com que setores da sociedade relutem em ser mero gado humano que alimenta o monstro representado hoje pelo governo que aí está.
[*] Recomendamos os vídeos dos nossos colunistas Thomas Sowell e Walter Williams que tratam brilhantemente dessas questões: http://www.midiaamais.com.br/video/lista/Videos/pagina
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