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segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Esses soberbos ateus

CONDE LOPPEUX DE LA VILLANUEVA
quinta-feira, 15 de dezembro de 2011



Meu caro amigo gaúcho Leonardo Faccioni escreveu esse brilhante artigo a respeito da indigência intelectual do neo-ateísmo em seu blog, www.faccioni.blogspot.com . Uma análise muito interessante, que vou publicar aqui.

A agressiva multiplicação do ateu militante é um fenômeno demasiado contemporâneo. Todos já cruzamos com algum e, ao que consta, passaram a constituir verdadeiras congregações virtuais, cuja propaganda mereceria outro ensaio.

Trata-se de figura que faz de sua crença na descrença um cavalo de batalha e sai à caça de conversões, sem dar uma pinoia à contradição aparente. Quase sempre de contestável alfabetização, mas gozando da escolaridade tão volumosa quanto superficial (como apenas a massificação do ensino poderia consagrar), ela arrota qual autômato a máxima: "fui criado em ambiente católico, mas, à medida que estudei e adquiri conhecimentos..." Que conhecimentos, cara-pálida? Acaso sua cultura manualesca – misto de televisão e pré-vestibular – supera dois mil e quinhentos anos de filosofia e teologia, ou o livre debate do qual participaram tantas das maiores mentes da história universal?

Em verdade, o tipo não é novo. Chesterton já fazia com eles um pedagógico picadinho, numa tradição que Thomas Woods e outros vêm retomando junto ao grande público dos Estados Unidos. Rejeitam a religião sem jamais a terem conhecido - sobremaneira no Brasil, onde tantos sacerdotes põem as almas a perder por seu imanentismo apostático, ou simplesmente por seu desobediente mau gosto, que faz da Igreja dessa terra, patronesse-mor da arte ocidental noutros tempos e paragens, uma colecionadora de prédios medonhos e expressões bregas. Para nosso maior desastre, rompeu com o legado civilizacional que deveria portar.

A constatação entristece-me sobretudo porque, como dito por algum grande, quanto melhor conheço a História da Igreja, mais a amo. É um patrimônio monumental que não escapa aos sentidos: segue em pé por todo o mundo, pronto a ser admirado. São os véus de uma soberba sempre mais disseminada a impedir que quem o queira ver, veja. E justo esses julgam-se os iluminados, prontos a reformar o mundo e fazer queimar os infiéis desta nova era.

A seu modo, o ateu é um crente – na terrível acepção por ele próprio conferida à palavra. Sob a fachada de deificação do método científico (que, em si mesmo, não é a ciência), o ateu opta pela negação da transcendência sem, para tanto, dispor de qualquer fundamento verificável segundo seus próprios critérios. A descrença, com todo seu pretenso charme contestatório, não reside no ateísmo, mas no agnosticismo – uma insatisfação muito humana pela intangibilidade da metafísica.

Há na contenda uma frequente incompreensão da própria noção de divindade. Quando, por um milagre, conseguem-se apresentar a um neo-ateu as reflexões do Doutor Angélico, ou do insuspeito (porque pagão) Aristóteles, percebe-se que a criaturinha desconhece como prova coisa que não se dê em laboratório, com todo o aparato cartesiano a postos. Em sua presunção juvenil, muitos dentre eles imaginam que o Deus adorado pelos cristãos seja davvero um velho forte e barbudo, como no lápis de Michelangelo, a soltar raios por sobre as nuvens. De fato, para derrubar um tal conto de fadas não seriam necessários grandes dispêndios intelectuais. Não obstante, foi esse o Deus dos filósofos por quase dois milênios! Quão imbecis eram Agostinho e Leibniz!

A nem tão sutil sutileza pode escapar a mentes aprisionadas pela pós-modernidade, mas uma representação iconográfica não pretende abranger o representado, senão comunicar suas qualidades, valendo para as artes visuais como uma metáfora vale ao texto.

Enquanto fé e ciência jamais foram entendidas como antagonistas pela cristandade (seria realmente absurdo pensá-lo, vez que, por uma, a Igreja era a maior promotora da técnica e da livre investigação intelectual, e por outra, tampouco se tinha notícia de organização social frutífera sem algum horizonte místico), era igualmente evidente, muito antes do advento dos microscópios, que Deus, se existe, é imensurável por definição. O cristianismo medieval bebe da filosofia grega, em parte entendida como uma antecipação da Revelação, justamente porque seu Deus é uma necessidade ontológica apreendida da natureza mesma da realidade.

As crias de Dawkins jamais estudaram metafísica e imaginam que, havendo um deus, este provaria sua veracidade ao enviar ao mundo sua fotografia autografada com firma reconhecida. Vivemos um verdadeiro apogeu intelectual. Sócrates deve se arrepender da cicuta.

Conforme reza o Catecismo, Deus transcende a criação, mas está presente nela. Citando Agostinho, “é maior do que há de maior em mim, e mais íntimo do que o que há de mais íntimo em mim”; mantém e sustenta a criação. De tal feita, Deus não pode ser dissecado, desmontado, fragmentado e medido, pois Ele é a medida de todas as coisas.

Para validar o divino em laboratório, seria necessário ao observador escapar à estrutura do real e fazer da unidade do cosmos seu objeto de pesquisa. Ora, o próprio observador é um escravo de sua materialidade. Ele existe e, por existir, sua presença o condena ao reconhecimento do tempo e da matéria.

Deus é o eterno e o perfeito, habitando fora do tempo e do mundo, mas participando de sua estrutura, através da qual se revela. Vale dizer, inexiste uma “partícula de Deus” – Deus é a própria existência. Eis o que deve se sedimentar antes de debatermos quanto à autoconsciência ou não dessa vontade primeva, e se esta atua sobre o mundo após o ato inaugural. Assim é que a divindade faz-se cognoscível à razão humana, não sendo a fé a via exclusiva para sua apreensão, conquanto se revele a mais rica – bem o sabe São Tomé. Creste, porque me viste. Felizes aqueles que creem sem ter visto!

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