por Flavio Morgenstern em 04/11/2011 às 7:08
Quinta-feira, 27 de outubro, houve um confronto entre alunos e policiais na Cidade Universitária, principal campus da USP. Tudo ocorreu porque a polícia recebeu uma denúncia anônima no meio da tarde, e identificando um carro pela placa, autuou em flagrante três estudantes que fumavam maconha no estacionamento da FFLCH, a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.
Ao tentar levá-los para a delegacia, alunos cercaram a viatura e iniciou-se um arranca-Habermas em que destruíram seis viaturas. Até um cavalete foi jogado contra policiais. Desde então, grupos de alunos discutem se querem ou não a Polícia Militar no campus.
Desde então, dá para perder de vista o número de vezes em que se escreveu que se ouviria “o outro lado”, o que não sai na “mídia”. Os textos com essa tônica pipocaram em número tão brutal que já fica difícil saber o que a tal “mídia” realmente diria, ao invés da visão dos que dizem criticá-la. Aqui mesmo no Papo de Homem, os maconheiros e agressores foram chamados de “futuros intelectuais”. Os pontos principais dessa desavença são aqui desmistificados por alguém que também conhece a FFLCH de dentro, e sem o velho discurso “crítico” repetido de todo dia.
1. A PM extrapolou suas funções
A grita mais comum é que a polícia teria cometido excessos. Não houve. Qualquer pessoa sabe que a maconha queima solta em qualquer campus de universidade no país. A Cidade Universitária, afastadíssima do restante de São Paulo, é apenas um dos melhores palcos para se fumar um bagulho escondido dos pais. A PM nunca ataca estudantes por isso.
Tudo começou por uma denúncia. Os “críticos” que dizem que toda a “mídia” é “conservadora” não notaram que praticamente nenhum jornal deu atenção ao fato – se alguém denuncia alunos por maconha nos arrebaldes de um local onde ela é comum, alguma coisa esses caras estavam aprontando que foi além do cotidiano. Foi a primeira “extrapolação” que houve – vinda de alunos.
Mostrei no Implicante algumas fotos que os próprios alunos que criticam a PM tiraram, dizendo que a polícia praticou “repressão”. Cuidado com a foto abaixo: a imagem é forte e chocante.
Dizem que a função da PM é proteger a sociedade, não enquadrar estudante. Ora, as três últimas palavras estão erradas: ser matriculado na USP e ir pra faculdade só pra fumar maconha escondido dos pais não te torna estudante. E quem disse que aluno da USP não pode ser alvo de denúncia se caga fora do pinico?
Tampouco houve “enquadramento” – tudo o que a PM faria seria levar os alunos para a delegacia e os fazerem assinar um termo de compromisso. O próprio diretor do DCE, João Victor de Oliveira, afirmou que os 3 estavam “aceitando” ir pra delegacia (como se precisassem). Qual o problema com isso? Nós sabemos: nesse processo, um PM liga pro papai e pra mamãe dos alunos e assim eles descobrem que aquele menino brilhante estava era puxando fumo no carrão que deram pra ele voltar da USP de noite. Assim descobrem também por onde ele anda perambulando para conseguir a erva – justamente o contrário da proteção que os pais procuraram dar ao filhinho, pagando tão caro. É isso que chamam de “repressão da PM fascista”. Foi para evitar isso que estudantes jogaram pedras e um cavalete em cima de policiais, deixando três deles feridos. Sabe quem vai pagar por isso? É você, seu tonto!
A própria PM sabe que sua função é cuidar da proteção, e não dar uns cascudos em cada maconheiro que encontra no campus, mesmo que bocas-de-fumo extremamente lucrativas existam por toda a Cidade Universitária: há uma que funciona 24 horas pouco antes do prédio invadido da administração da FFLCH, vindo da Letras, em um matagal escuro. Há também uma no CRUSP, o prédio onde deveriam permanecer estudantes de outras cidades, mas que abriga grupos terroristas como o MST e alas radicais de partidos já radicais de extrema-esquerda, e até a máfia nigeriana o dominava na década de 90. Essa fecha cedo, por causa do portão de acesso. Tem outra 24 horas na entrada pra favela São Remo, com portão não vigiado. Os riquíssimos traficantes que fornecem droga aos alunos possuem armamento pesado, como submetralhadoras 9 mm e granadas.
A PM faz vista grossa pra tudo isso. Como fez para o sem-número de alunos que acenderam baseados na cara deles quando foram autuar os três estudantes. É a isso que chamam de fascismo? O coronel Álvaro Batista Camilo orientou os policiais a apenas levá-los para a delegacia e ignorar todos os outros estudantes. Assim seria feito, se não fossem impedidos – apenas para o papai e a mamãe de cada um não ficar sabendo dos hábitos do filhão. Isso é “repressão”?
Há também um fator mais complicado: adoram dizer que a PM é corrupta e só prende pobre. Nesse caso, nem sequer prendeu alunos de classe média, com carro. Ou seja: o que incomodou a gentalha aí foi que a PM não foi corrupta, como mostrou o Urso. Afinal, prende-se o favelado, mas também o burguês. Mas o argumento é que… ela bate em pobre. Em outros casos.
2. A PM no campus não ajuda na segurança
É uma afirmação tirada da cartola. Os dados apontam para o oposto de maneira gritante: simplesmente 92% das ocorrências de crimes diminuíram a partir do convênio com a PM que, após o assassinato no campus em maio, aumentou o policiamento.
Noventa e dois porcento. De 13 roubos (não furtos) de veículos, só um foi registrado no mesmo período posterior. Não teve crime que não diminuiu. E os crimes são de todas as searas: de furtos a sequestros. A USP já sofreu onda de estupro há uma década. É um número que nem está mais contado. Pediram-me a fonte disso. Dica: joguem no Google.
Dizem que a PM já estava liberada de entrar no campus desde 2009, quando prendeu o líder do radicalíssimo SINTUSP (Sindicato dos Trabalhadores da USP), o técnico de ar-condicionado Claudionor Brandão. Em sua ficha corrida, conta-se até envenenamento de comida de dois bandejões para impedir que furassem a greve.
O policiamento, afinal, era pouco. Ou os crimes não teriam caído tanto com a presença policial. Alguém acredita que o estudante Felipe Ramos de Paiva teria sido assassinado dentro da Cidade Universitária se houvesse um PM do seu lado? Ademais, o convênio solicitou a presença de mais 16 policiais para toda a Cidade Universitária. De-zes-seis. Fascismão, hein?
Apenas para poder fumar seu baseado em paz, longe do papai e sem serem incomodados, os alunos inventam “soluções” doidivanas. O diretor do DCE, João Victor de Oliveira, propõe:
“Melhor treinamento da Guarda [Universitária], maior acesso da comunidade externa no interior da Universidade garante (sic) sim a segurança de toda a comunidade.”
Não há dados para tal. A Guarda Universitária, apesar de encantar com o nome, é uma guarda patrimonial. Se vir algum caso de estupro em cima de uma estátua, vai pedir: “Por favor, pode estuprá-la mais pra lá para não sujar a estátua? Obrigado!” E quer “maior” acesso da comunidade externa? Mais traficantes, talvez?
Há dados para o oposto. A estudante Marina Gilli o rebate:
“A PM já diminuiu em 92% o índice de criminalidade aqui na Cidade Universitária – não tem motivo algum pra retirar a PM.”
Ou há um motivo: fumar maconha sem o papai descobrir? Também propõem mais iluminação. De fato, os bandidos andam com dificuldade em achar carro no escuro. Só faltam dizer que câmeras vão coibir algo – aquelas câmeras que vemos flagrando bandidos dia após dia e eles só faltam dar tchauzinho antes de irem embora sem nunca serem identificados.
Fica ainda uma dúvida: há grupos de extrema-direita atuando na USP. Caso resolvam atacar os maconheiros, com ajuda de skinheads (que teriam “livre acesso a USP”), não poderíamos chamar a PM. Como fica? Deixamos os maconheiros apanhando sem ajuda?
3. A polícia não deve atuar na Universidade, lar do livre pensamento
Essa foi a gambiarra mental mais comum, partindo de famosos professores de Direito (Trabalhista, embora ninguém tenha tido coragem de dizer) e Filosofia ligados à extrema-esquerda da própria USP.
É difícil pensar no que diabos a PM no campus atrapalha o livre pensamento. Se possuem toda essa suposta “visão crítica”, deveriam saber por que setores radicais de esquerda são tão dominantes nas universidades: durante a ditadura, o general Golbery do Couto e Silva criou a “teoria da panela de pressão”, supondo que reprimir o pensamento (lá sim!) em todas as esferas iria desestabilizar o regime. Sabiamente, deixou a esquerda se proliferar onde ela é mais inócua: entre os que se julgam intelectuais – exatamente nas universidades. É por isso que partidos nanicos extremistas nunca obtêm mais do que 0,2% dos votos em eleições municipais, mas ganham eleições fraudadas com 20% de diferença do segundo colocado nas eleições para o DCE até hoje – para depois perderem de 30% do partido nanico concorrente também fraudador e ninguém achar estranho.
Ou seja: nem nos anos de chumbo as teorias de extrema esquerda não puderam ser discutidas na universidade. Ademais, O Capital de Karl Marx sempre foi livro obrigatório em qualquer curso de Economia – nitidamente dominado por liberais (livros de liberais e conservadores, por outro lado, são proibidos em cursos dominados por esquerdistas, como o confronto que se deu entre José Guilherme Merquior e Marilena Chauí ali mesmo, na FFLCH).
Esse pessoal que acha que a PM atrapalha o “pensamento livre” anda pesquisando o que na faculdade? Coquetéis molotov nucleares? Ou se acha tão “perigoso” por ler autores arcanos, herméticos e danbrownianos, porém inócuos e facilmente refutáveis como Marx (destruído por Böhm-Bawerk antes mesmo de terminar de escrever O Capital) e Foucault (esmirilhado por Jean Baudrillard, velho fã de Marx e Adorno, em Oublier Foucault)? Acham mesmo que alguma professora de Letras vai analisar o poema da linguicinha do Mário de Andrade, e repentinamente ser interrompida: “Análise subversiva! Teje presa, ó comunista!”?
Caros estudantes da USP: se vocês acham que PM é repressão, experimentem gritar “Karl Marx já era! Viva o capitalismo!” no campus. O que vocês acham que atrapalha mais o “livre pensamento”: PM que só autua aluno com denúncia ou professores que nunca te passaram um livro do qual discordem?
Essa gente acha que alguém tem medo dos seus livrinhos. Algumas pessoas dão a vida por uma ideologia. Outras, dão um bocejo.
4. Maconha é menos perigosa do que bomba de gás lacrimogêneo
As armas dos traficantes da favela São Remo são suficientes para convencer aquela minoritária parcela da população que consegue unir premissa à consequência. Aos que estão em dificuldade, explico: pode-se lutar pela liberação da droga. Eu mesmo, como a maioria absoluta dos liberais (ao contrário da crença da religião esquerdista), luto por sua legalização.
Acontece que, enquanto elas não são legalizadas, não se deve fumar. É tão simples quanto parece. Quando você paga seu bagulho, não está pagando só pelo produto – está dando dinheiro pro traficante comprar armas, subornar policiais mal-pagos, colocar crianças no tráfico. Dói tanto assim ficar sem queimar uma brenfa? Alguém pode me explicar por toda a Humanidade no que caralhos maconha é melhor do que sexo? Acredito que falta muita vida sexual pra esse povo.
Você pode não ver os efeitos devastadores da droga. Mas isso só se não tiver muita capacidade lógica. Sendo aluno da USP, é de bom alvitre demonstrar alguma. O traficante não é um vendedor qualquer, que “precisa” vender maconha. Não é como um vendedor de melancia, que se a melancia fosse ilegal, “precisaria” só vender melancia. Traficante é um capitalista que te passa mais a perna do que operadora de telefonia. Tente ligar pro seu traficante e cancelar o serviço pra você ver o que te acontece. Aí você vê a violência na favela onde compra sua cannabis e não nota que quem mata as pessoas é você? Não viram O Poderoso Chefão? Não viram Tropa de Elite?
Link YouTube | “Eu sou estudante…”
Enquanto isso, um estudante morre por latrocínio dentro do campus. Ninguém percebe que quem o matou, muito provavelmente, era algum traficante que ficou com preguiça de voltar a pé pra casa?
E bomba de efeito moral (infelizmente, não faz alunos saírem por aí discutindo Kierkegaard e Camus) só é usada em defesa. Sinto muito, mas dizer que “policiais soltaram até bombas” é confissão de culpa. Gás lacrimogêneo deixa até o policial que o utiliza com os olhos chorando. Mas é justamente para não machucar aluno. Já o cavalete e a chuva de pedras que jogaram nos policiais, que não demonstravam agressividade anterior foram, sim, objetivados a ferir. Veja o vídeo do G1.
Custa fazer a marofa em casa? Opa. Custa. O papai pode descobrir e te deixar sem TV a cabo. Ou, então, você vai ser obrigado a sair da barra da saia da mamãe e ir morar sozinho pra queimar seu beck. Aí, acabará rapidinho tendo preocupações mais urgentes, como impostos, do que “drogas recreativas”.
É bom mudar o discurso, ou rapidinho descobriremos que toda pessoa contra a PM no campus da USP foi criada a leite de pêra pela avó.
5. Os estudantes decidiram em assembleia
Aqui vai uma boa mentira: uma democracia significa um homem, um voto. Há a campanha #PlebiscitoJá para mostrar que, quando essa regra é seguida, os resultados pró-PM e anti-baderna são acachapantes (e há mecanismos on-line internos da USP para tal).
Isso é ponto pacífico. Para evitar que percam vergonhosamente, há uma tática comum da galera pró-baderna: “decidir” tudo por “assembleias”. Isto é, marca-se uma reunião, em 102% dos casos em horário de aula (mesmo de prova), em que se “vota” algum tema.
Como quem mais pode cabular aulas são (não é preciso argumentar) o povo da maconha e da violência, conseguem uma derrota menos inglória. Ainda assim, costumam perder. O mecanismo padrão, assim que uma votação contra invasão de prédios, greves ou PM se mostra um fracasso, é cancelar a assembleia e marcar uma outra. Assim, nova aula cabulada, nova votação – dessa vez com menos gente sendo obrigada a matar aula apenas para votar por ter aula. O mecanismo geralmente se repete três, quatro, cinco vezes até que conseguem “votar” alguma coisa. Enquanto isso, dizem que votações “um homem, um voto” não lhes representam.
Os votos nas assembleias são contados pedindo-se para se levantar a mão e contando, no olhômetro, quantas mãos se levantaram de um lado, quantas se levantaram de outro. Convido o leitor a contar quantas mãos estão levantadas nessa foto, da última assembleia, na terça-feira (dia 1.º de novembro), estrategicamente marcada para o horário das aulas no mesmo dia em que marcaram um evento pró-permanência da PM (assim, os que foram ao evento não conseguiriam votar contra suas propostas):
Nesta assembleia, diga-se, votou-se, no olhômetro (enquanto pessoas cansavam-se de ficar com a mão levantada, andavam de um lado pro outro etc.), que o prédio invadido da administração da FFLCH deveria ser desocupado. O que fizeram os perdedores? Indignados, invadiram o prédio da reitoria. É uma imposição fascista de suas vontades tão deslavada que poderiam simplesmente suspender as “assembleias” e se livrar ao menos da hipocrisia de fingir que estão se lixando para alguém além de seus umbigos.
Explicação: a PM é fascista. Os estudantes da USP são democráticos. Por isso invadiram um prédio da FFLCH e depois a reitoria. Pra poder dialogar. Não foi porque descobriram que na reitoria havia vários balaios cheios de roupa suja pra lavar.
6. Um prédio público foi ocupado
É um termo que deve ter sido cunhado por algum advogado de porta de cadeia espertinho. “Ocupação” pode ser militar (como a do Iraque) ou pode-se ocupar um lugar temporariamente para depois desocupá-lo (como uma cadeira numa sala de aula).
Quando estudantes precisam esconder o rosto e tomam à força, com barricadas, um prédio público, impedindo que alguém além deles próprios adentrem o que é de todos (não só deles) e impedem suas funções com paus e pedras, o que aconteceu foi uma “invasão”. O problema é que o termo correto demonstra até para uma muriçoca que está se cometendo um crime. A saída é passar um marketing no vocábulo. A dita “mídia conservadora” nem percebe e cai na mutreta dos criminosos.
7. A USP tem memória histórica recente de violência da PM, na época da ditadura
A ditadura acabou há mais tempo do que ela durou. Alunos na casa dos 20 anos andam regurgitando esse clichê despudoradamente. Os pais deles não viveram a ditadura direito. A memória histórica dessa galera inclui Toddyinho, Danoninho, Cavaleiros do Zodíaco e Teletubbies.
Em contrapartida, “esquecem-se” da memória muito mais recente da violência dos próprios grupos extremistas que tentam expulsar a PM do campus.
8. A PM é parte da privatização do ensino
Por fim, se unir premissa à consequência não deu certo até agora, falta um exercício simples.
Criticam a PM por ser “instrumento da ditadura”. Ao mesmo tempo, criticam a privatização do ensino. Uma coisa é quase oposta à outra.
Mas, sem a PM, o que cada unidade da USP terá de fazer para garantir a segurança? Contratar segurança privada. Uma espécie de Blackwater uspiana. A diferença é que todo mundo sabe que nenhum segurança particular tem coragem de olhar torto pra um estudante, que já corre o risco de estampar os jornais.
Se for pra poder fumar bagulho em paz, mesmo às custas de latrocínios e sequestros, aí até a extrema esquerda vira a favor da privatização.
FLAVIO MORGENSTERN
Escritor, redator, tradutor e faz-tudo com textos, exceto aviões de papel. Gosta das coisas boas da vida: cultura greco-romana, língua latina, fenomenologia alemã, literatura americana e pornografia russa. Calunia em um blog pessoal e um político. No Twitter, @flaviomorgen.
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