AUGUSTO NUNES
19/04/2011 às 16:39 \ Direto ao Ponto
Jornais, revistas, emissoras de rádio e TV, sites e blogs concederam espaços de bom tamanho ao relatório do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, o IPEA, sobre o ritmo das obras em 15 aeroportos brasileiros. Só VEJA destacou, na edição desta semana, o trecho mais importante do documento. Espertamente limitado a uma frase, escancara o que há por trás da procissão de vogais, consoantes e algarismos: uma jogada ensaiada ─ como avisa o título da reportagem.
“O poder público poderia estabelecer procedimentos diferenciados em relação às obras de infraestrutura nos aeroportos, a fim de diminuir a demora na execução das diferentes etapas desse tipo de investimento”, recomendaram ao governo federal os companheiros do IPEA. A sugestão foi aceita no mesmo dia. Menos de 24 horas depois, chegou ao Congresso o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2012, propondo o que os governistas chamam de “flexibilização das regras”. Podem chamá-la de ”trilha da ladroagem” que ela atende.
Por encomenda da Presidência da República, o que IPEA sugeriu e os parlamentares a serviço do Planalto tentam oficializar é o sumiço de licitações, concorrências, mecanismos fiscais e outras pedras no caminho que leva aos cofres públicos. O que se propõe é a eliminação de tudo que possa atrapalhar a reedição, em escala ainda mais superlativa, das bilionárias bandalheiras que transformaram os Jogos Pan-Americanos de 2007 num campeonato de gatunagens por equipe, vencido pelo time de supercartolas, ministros de Estado e empresários amigos que joga contra o Brasil decente com o patrocínio do governo (leia o post na seção Vale Reprise).
“São necessárias mudanças, senão não vamos cumprir o cronograma da Copa”, recitou o deputado Cândido Vaccarezza, líder do governo na Câmara. “É um erro o TCU ser capaz de paralisar obras com base em suspeitas de faturamento”. Conversa de vigarista. As “suspeitas” são certezas. Não é o “cronograma da Copa” que está atrasado. É o cronograma do PAC, que só avança na imaginação da presidente Dilma Rousseff. Os 13 aeroportos em obras deveriam estar prontos há muito tempo. Não para desbloquear o desembarque de torcedores estrangeiros, mas para tornar menos infernal a vida dos passageiros nativos.
O relatório é só um pretexto para a formulação da proposta cafajeste. Até as birutas das pistas em decomposição sabem que as obras não serão concluídas a tempo. Até um estagiário de engenharia sabe que não é possível fazer em três anos o que deveria ter começado há quatro. Uns por ingenuidade, outros para cumprir o contrato de aluguel, muitos jornalistas enxergaram no documento a prova de que os técnicos do IPEA agora ousam apontar problemas que envolvem o patrão. Reduzido desde 2003 a uma usina de fantasias ufanistas, o instituto teria demonstrado com o documento que recuperou a vergonha.
O truque não funcionou. A frase que recomenda o atropelamento da lei informa que o que pareceu um grito de independência foi um sussurro de cúmplice. O IPEA acaba de juntar-se ostensivamente à trama que pretende premiar a quadrilha reincidente com a autorização para roubar sem sobresssaltos.
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