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terça-feira, 26 de abril de 2011

Entendendo o Egito Pós Mubarak

DANIEL PIPES


por Daniel Pipes

National Review Online
26 de Abril de 2011
Original em inglês: Understanding Post-Mubarak Egypt
Tradução: Joseph Skilnik



Conforme o Egito segue para uma nova era, uma avaliação de suas complexidades e sutilezas ajuda a compreender o provável curso que tomará. Algumas considerações sobre as questões mais importantes:

O espírito da Praça Tahrir é verdadeiro e está vivo, porém excessivamente longe dos centros do poder. Ideias revolucionárias – como as do governo prestar serviços ao povo, não o contrário, dos governantes serem escolhidos pelo povo e das pessoas terem direitos e dignidade inerentes – finalmente penetraram em uma parcela substancial do país, especialmente nos jovens. A longo prazo, essas ideias podem fazer milagres. Mas por enquanto, são ideias dissidentes, determinadamente excluídas de qualquer papel operacional.
Uma corte militar sentenciou o blogger liberal Maikel Nabil a três anos de prisão.


O governo militar irá continuar. Os soldados não tomaram o poder com a saída de Hosni Mubarak há dois meses, mas sim em 1952. Foi quando os Oficiais Livres derrubaram a monarquia constitucional e tomaram o poder. Um oficial de alto escalão após o outro – de Naguib a Nasser, a Sadat, a Mubarak, a Tantawi – numa sucessão ininterrupta de 59 anos. Com o passar do tempo as forças armadas expandiram sua esfera de ação do âmbito político ao econômico, produzindo de tudo, de aparelhos de televisão a azeite de oliva, controlando uma parcela considerável da riqueza do Egito. Os soldados ficaram acostumados demais com o poder e a boa vida para desistir das mordomias. Eles farão de tudo, seja expurgar Mubarak, jogar seus filhos na prisão, banir seu antigo partido político, mudar a constituição ou reprimir a dissidência, a fim de manter o poder.


As forças armadas não são seculares. Das longínquas origens dos anos 30 do século passado à recente reafirmação da Sharia (lei islâmica) como "a principal fonte de legislação", a liderança militar egípcia consistentemente mostrou uma orientação islamista. Mais especificamente, os Oficiais Livres saíram do braço armado da Irmandade Muçulmana e através das décadas têm competido com o braço civil. Conforme escreve no Middle East Quarterly a analista Cynthia Farahat, a rivalidade deles "deve ser entendida não como a luta entre uma ditadura autocrática e secular de um lado contra outra, ávida islamista, e sim como a luta entre dois grupos rivais ideologicamente similares, senão idênticos, vindos da mesma fonte".
A Irmandade Muçulmana é menos descomunal do que leva a crer a sua reputação.


A Irmandade Muçulmana não é o centro do poder. A organização sofre de problemas da maior importância. Primeiro, é menosprezada por extremistas violentos e temperamentais. Recentemente a Al-Qaedadesferiu-lhe violentas críticas por tomar parte em eleições e ridicularizou-a por estar no caminho para se tornar "secular e de se afiliar falsamente ao Islã". Segundo, a irmandade é fraca no que diz respeito ao público em geral. Hesham Kassem da Organização Egípcia para os Direitos Humanos observa que o número de membros não passa de 100.000, o que em um país com 80 milhões de habitantes significa que "realmente não se trata de um movimento popular" e sim uma instituição apadrinhada beneficiando-se por ser singularmente tolerada. A competição genuinamente política deverá diminuir o seu apelo.

E por último, compreender a política egípcia significa penetrar no jogo duplo, característico do Oriente Médio (como na política iraquiana e síria), fica-se exaurido pelos militares e pelos islamistas. Observe os elementos contrários:

Cooperação rotineira entre os militares e os islamistas. Segundo Farahat, os militares "colaboraram sutilmente com os islamistas contra seus compatriotas de inclinação mais democrática e minorias religiosas, notadamente os coptas". Um dos muitos exemplos: Em 14 de abril, uma conferência sobre direitos humanosfoi interrompida duas vezes por criticar os militares pelo fato de terem transportado civis a tribunais militares. Primeiro por um policial militar apreensivo com as "mulheres indecentes", segundo por islamistas furiosos com o debate inadequado sobre os militares. Quem é quem? Os papéis se tornaram quase que intermutáveis. Na mesma linha, a nova liderança militar autorizou os islamistas a formarem partidos políticos e a libertaram membros da irmandade da prisão. Por outro lado, Mohamed Badei, líder da irmandade, teceu elogios às forças armadas e a sua organização endossou o referendo do exército em março.

O governo explora o medo da Irmandade Muçulmana. As forças armadas se beneficiam das apreensões, tanto internas quanto externas, de uma tomada de poder pelos islamistas. Essa perspectiva não só justifica a continuação do seu próprio domínio sobre o Egito como também seus excessos e crueldades. Os militares aprenderam a usar os islamistas como um ioiô. Por exemplo, em 2005, Mubarak, com muita perspicácia, permitiu a entrada de 88 membros da Irmandade Muçulmana no parlamento, mostrando dessa maneira simultaneamente, os perigos da democracia e da indispensabilidade da sua própria tirania. Tendo consolidado esse enfoque, autorizou a entrada de apenas um membro da Irmandade Muçulmana nas eleições de 2010.

Resumindo, embora a modernidade da Praça Tahrir e o barbarismo da Irmandade Muçulmana tenham importância a longo prazo, a grande probabilidade é a de que os militares continuarão a governar o Egito, fazendo apenas alterações cosméticas.

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