janeiro 31, 2011
Luiz Carlos Faria e Miguel Nagib
Impõe-se que questões morais sejam varridas dos programas das disciplinas obrigatórias de ensino; quando muito, podem integrar disciplina facultativa
No começo de 2010, pais de alunos da rede pública de Recife protestaram contra o livro de orientação sexual adotado pelas escolas. Destinada a crianças de sete a dez anos, a obra “Mamãe, Como Eu Nasci?”, do professor Marcos Ribeiro, tem trechos como estes: “Olha, ele fica duro! O pênis do papai fica duro também?” “Algumas vezes, e o papai acha muito gostoso. Os homens gostam quando o seu pênis fica duro.” “Se você abrir um pouquinho as pernas e olhar por um espelhinho, vai ver bem melhor. Aqui em cima está o seu clitóris, que faz as mulheres sentirem muito prazer ao ser tocado, porque é gostoso.”
Inadequado? Bem, não é disso que vamos tratar no momento. O ponto que interessa está aqui: “Alguns meninos gostam de brincar com o seu pênis, e algumas meninas com a sua vulva, porque é gostoso. As pessoas grandes dizem que isso vicia ou “tira a mão daí que é feio”. Só sabem abrir a boca para proibir. Mas a verdade é que essa brincadeira não causa nenhum problema”.
Considerando que entre as pessoas que “só sabem abrir a boca para proibir” estão os pais dos pequenos leitores dessa cartilha, pergunta-se: têm as escolas o direito de dizer aos nossos filhos o que é “a verdade” em matéria de moral?
De acordo com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH), a resposta é negativa. O artigo 12 da CADH reconhece expressamente o direito dos pais a que seus filhos “recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções”. É fato notório, todavia, que esse direito não tem sido respeitado em nosso país.
Apesar de o Brasil ter aderido à CADH, o MEC não só não impede que o direito dos pais seja usurpado pelas escolas como concorre decisivamente para essa usurpação, ao prescrever a abordagem transversal de questões morais em todas as disciplinas do ensino básico.
Atendendo ao chamado, professores que não conseguem dar conta de sua principal obrigação – conforme demonstrado ano após ano por avaliações de desempenho escolar como o Saeb e o Pisa -, usam o tempo precioso de suas aulas para influenciar o juízo moral dos alunos sobre temas como sexualidade, homossexualismo, contracepção, relações e modelos familiares etc.
Quando não afirmam em tom categórico determinada verdade moral, induzem os alunos a duvidar “criticamente” das que lhes são ensinadas em casa, solapando a confiança dos filhos em seus pais.
A ilegalidade é patente. Ainda que se reconhecesse ao Estado – não a seus agentes – o direito de usar o sistema de ensino para difundir uma agenda moral, esse direito não poderia inviabilizar o exercício da prerrogativa assegurada aos pais pela CADH, e isso fatalmente ocorrerá se os tópicos dessa agenda estiverem presentes nas disciplinas obrigatórias.
Além disso, se a família deve desfrutar da “especial proteção do Estado”, como prevê a Constituição, o mínimo que se pode esperar desse Estado é que não contribua para enfraquecer a autoridade moral dos pais sobre seus filhos.
Impõe-se, portanto, que as questões morais sejam varridas dos programas das disciplinas obrigatórias. Quando muito, poderão ser veiculadas em disciplina facultativa, como ocorre com o ensino religioso. Assim, conhecendo previamente o conteúdo de tal disciplina, os pais decidirão se querem ou não compartilhar a educação moral de seus filhos com especialistas de mente aberta como o professor Marcos Ribeiro.
LUIZ CARLOS FARIA DA SILVA, 54, doutor em Educação pela Unicamp, é professor adjunto da Universidade Estadual de Maringá.
MIGUEL NAGIB, 50, é procurador do Estado de São Paulo, coordenador do site www.escolasempartido.org e especialista do Instituto Millenium.
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