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terça-feira, 23 de novembro de 2010

O CARÁTER DO ESTADO MODERNO

NIVALDO CORDEIRO

O CARÁTER DO ESTADO MODERNO
12/11/2010


O artigo publicado no jornal eletrônico Mídia Sem Máscara (Estado: ministro de Deus), escrito a quatro mãos por Júlio Severo e o Pr. Marcello de Oliveira, traz-nos um excelente tema para discussão. O que é o Estado? Em última análise, é uma estrutura jurídica organizada burocraticamente com o objetivo de fazer prevalecer a vontade política da elite dirigente. Gosto dessa definição porque ela é exata. Claro que o Estado tem que respeitar a vontade geral, mas nem sempre o faz. Claro que ele deveria respeitar a lei natural, mas há séculos não o faz. Claro que deveria ser um instrumento pelo qual a justiça divina fosse corretamente administrada e ministrada aos delinqüentes, mas o Estado moderno deu as costas à transcendência, de sorte que aquilo que é definido como crime deixou de ter raiz em Deus.

O artigo, embora bem escrito, peca precisamente por pensar o Estado em termos do “como se”, ou seja, como se o Estado buscasse o bem comum e estivesse de acordo com a lei natural. Acontece precisamente o oposto desde que irrompeu o primeiro Estado nacional, suplantando a ordem medieval e inaugurando a modernidade. Desde Maquiavel, pelo menos, os dirigentes estatais deixaram de buscar o ideal de Estado que nasceu com Platão e Aristóteles e foi consagrado pela Igreja. Desde então valeu o que os homens modernos pensaram: o Estado é um espólio a ser apropriado pelos novos príncipes em constante luta entre si para se apossar dele.

No meio dessa luta há o problema do consentimento ou da legitimidade dos governantes. Os novos príncipes passaram a cultivar os mais baixos instintos das multidões como instrumento de alcançar o poder e nele se legitimar.

O novo Estado moderno também perdeu qualquer amarra com a lei natural, passando o processo legislativo a ser completamente autônomo e arbitrário em relação à lei divina e à lei natural. Afirmo, sem medo de errar, que desde Felipe II da Sicília o corpo legislativo de todos os Estados adquiriu a autoridade da lei divina, mas seu processo foi completamente descolado da transcendência. Além de fazer do poder a fonte única do direito, o novo legislativo, na sua imanência radical, tem buscado o que a Igreja e as Escrituras rejeitaram desde sempre: o perfectibilismo humano. O que temos visto é precisamente isso: os novos príncipes, para terem o poder de mando sobre o Estado, prometem ao povo todo tipo deperfectibilismo, como se estivesse ao seu alcance eliminar as tragédias humanas. Começa pela enorme blasfêmia contida na afirmação de que “todo poder emana do povo e em seu nome será exercido”, se esquecendo que todo poder emana de Deus ele mesmo.

Aí está a raiz de todas as revoluções. No século XX conhecemos o aprofundamento das democracias com o uso do expediente do voto universal, que permitiu fazer emergir o que elas têm de pior: a adulação das massas – ou do homem-massa, como observou Ortega yGasset – em nível nunca antes visto. Ao Estado cabe agora eliminar a lei da escassez, prover Educação e Saúde, eliminar os riscos existenciais, corrigir o clima, substituir a família como célula formadora de homens íntegros, corrigir qualquer tipo de singularidade natural. A palavra igualdade será o mantra a ser perseguido em todas as circunstâncias. Todas as decisões estatais serão agora tomadas com o fito de instituir essa utopia nefasta, contrária à lei divina. Até mesmo a hierarquia natural de amar a Deus sobre todas as coisas é deixada de lado. O supremo crime agora é descumprir qualquer lei estatal, mesmo que esta seja ostensivamente injusta e contra o direito natural. Um exemplo óbvio é a legislação sobre o aborto que se espalha sobre o planeta, gerando o que João Paulo II chamou de “cultura de morte”.

Os autores escreveram: “A função de autoridade governamental constituída é trabalhar como ministro de Deus para o bem, isto é, para a segurança, ordem e a paz da sociedade (Rm 13:3,4)”. Eles deveriam escrever que essa “deveria” ser a função, mas que há muito ela foi abandonada e que é essa toda a tragédia da modernidade. Vimos Obama com seu sistema de saúde, vimos Lula e Dilma com suas múltiplas bolsas. Esses novos príncipes querem aperfeiçoar o homem, adular as massas contra a natureza apenas e tão somente para chegar ao poder e nele se manter. As recentes eleições no Brasil formam um exemplo claro dessa descida aos infernos da política. Diferentemente dos EUA nossa gente está politicamente muito mais doente.

São Paulo, quando escreveu suas epístolas, tinha diante de si uma realidade de poder, o Império Romano, firmemente comprometido com o direito natural aristotélico, que moldou sua estrutura jurídica. Ele estava correto por essa via. E, por outro lado, bem sabia que o Reino de Deus não é desse mundo, faça lá o Estado o que fizer cabe ao cristão estar de acordo com a lei de Deus, que é transcendente e além do Estado. Paulo, como Cristo, recusou-se o papel de revolucionário, embora nunca se enganasse quanto à natureza real do Estado. Cristo diante de Pilatos e do Sinédrio é o exemplo mais consumado da injustiça que o Estado pode cometer. O Estado condenou o Justo dos justos.

O Estado moderno não apenas não está comprometido com o bem comum, ele encarna o próprio mal. Ele realiza os massacres em larga escala, pelas guerras. Ele mata inocentes como a polícia brasileira tem matado. Ele encarcera como jamais as multidões foram encarceradas, desde o início dos tempos. Ele interfere na relação do homem com a mulher, do casal com seus filhos, na relação com vizinhos, em tudo. Regula tudo. Policia tudo. Com os meios técnicos disponíveis fez uma prisão eletrônica que por ela praticamente eliminou a liberdade em geral. Não se pode ter qualquer ilusão quanto ao caráter do Estado moderno e é dever de um cristão consciente denunciá-lo e combatê-lo. E eliminar qualquer ilusão que se possa ter de que alguma bondade possa derivar desse leviatã maldito.

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