| 27 NOVEMBRO 2010
INTERNACIONAL - AMÉRICA LATINA
INTERNACIONAL - AMÉRICA LATINA
Caso Plazas Vega: A juíza Jara não é como os demais juízes. Ela condenou a 30 anos de cárcere uma pessoa inocente e sem haver encontrado contra ela uma só prova.
As críticas que está recebendo a sentença que condenou, em primeira instância, o coronel Alfonso Plazas Vega a 30 anos de cárcere, estão aumentando e ganhando em amplitude e qualidade. Dias atrás um debate acadêmico organizado pela Universidade Sergio Arboleda de Bogotá, reuniu um grupo de distinguidos juristas. Todos emitiram conceitos seríssimos sobre esse tema e o resultado é inequívoco: a sentença da juíza María Stella Jara é uma aberração, um mal exemplo do que um juiz que se respeite não deve fazer, e do que o poder judiciário em uma democracia não pode tolerar.
O diretor do departamento de Direito Penal da Universidade Sergio Arboleda, professor Fernando Velásquez, estimou que não se pode dar ao coronel Plazas o tratamento de "autor mediato" porque não se dão os pressupostos jurídicos para isso. Ele admitiu que é importante para a Colômbia estabelecer a verdade acerca dos fatos do Palácio da Justiça, mas que isso não se pode fazer a qualquer preço.
O professor Christian Wolfhügel, da mesma universidade, disse que imputar ao coronel um delito que não existia na época dos fatos (o desaparecimento forçado de pessoas), equivale a violentar o princípio de legalidade que proíbe a aplicação retroativa da lei penal em desfavor do acusado. A juíza fez isso com o agravante de que ela conhecia a situação, pois admitiu na sentença que em 1985 esse delito não fazia parte do Código Penal colombiano.
O professor Ricardo Posada Maya, diretor da Área Penal da Universidade de los Andes, declarou, dentre outras coisas, que não vê claro que nos fatos do Palácio da Justiça se houvessem cometido crimes de lesa-humanidade. Sustentou que para predicar que um delito é de lesa-humanidade devem-se adotar os critérios do Direito Internacional, que a juíza Jara parece não haver respeitado, pois chegou a crer que os tratados internacionais haviam substituído o Código Penal colombiano.
Não por casualidade, o reitor da Universidade que fez o convite, Rodrigo Noguera Calderón, havia sublinhado minutos antes nesse painel que o Direito Penal na Colômbia vive um momento de "alto grau de prostração" e que isso exige que a Universidade examine essa problemática "em debates acadêmicos".
O presidente da Associação Nacional de Professores de Direito Penal e Ciências Penais, Jaime Enrique Granados, interveio na qualidade de advogado do coronel Plazas. Ele reiterou que não há prova alguma que incrimine seu defendido. Ele assinalou que as provas apresentadas pela juíza Jara repousam sobre declarações anômalas e contraditórias de duas testemunhas, e sobre a evocação da transcrição de uma gravação cujo suporte material nunca apareceu no julgamento.
Granados denunciou que dentre os 36 cadáveres incinerados encontrados no Palácio da Justiça há nove sem identificar e que estes podem ser dos chamados desaparecidos. Denunciou, além disso, que há gente interessada em bloquear as análises científicas que permitirão identificar esses cadáveres e derrubar a hipótese de que houve "desaparecidos" no trágico episódio.
Em dissonância com os oradores, o professor Kai Ambos, da Universidade Georg-August de Göttingen, Alemanha, declarou que "no Palácio da Justiça o Exército cometeu atrocidades" e que a justiça colombiana "está cheia de erros". Ele lamenta que a juíza Jara tenha saído da Colômbia por ter sido "ameaçada". Mesmo assim, o jurista alemão teve que admitir que ele não pode dizer se a sentença dessa juíza "era correta ou não".
Ofuscada por esses comentários, a juíza Jara respondeu violentamente desde a Alemanha, uma semana depois. Entretanto, a carta incendiária que ela enviou a El Espectador, onde ataca acerbamente o ex-presidente Álvaro Uribe, as Forças Armadas, o Conselho Superior da Judicatura, a imprensa e, em particular, dois brilhantes jornalistas que fustigaram, com razão, a espalhafatosa sentença contra o coronel Plazas, confirma que María Stella Jara está longe de ser uma juíza serena e distanciada dos tumultos da agitação política.
Pelo contrário. A linguagem de ódio que ela utiliza, o rancor que verte em sua carta, correspondem a alguém de perfil fanático, próprio de um militante comunista que não tem escrúpulos e se permite difamar as autoridades eleitas de um país democrático e a imprensa livre e, sobretudo, que põe seu cargo e sua missão a serviço de uma obscura causa política.
A juíza Jara não é como os demais juízes. Ela condenou a 30 anos de cárcere uma pessoa inocente e sem haver encontrado contra ela uma só prova. Os juízes não fazem isso. Ela fez. Ela não poderá escapar dessa responsabilidade. A sentença que assinou em 9 de junho de 2010 aí está para provar sua deslealdade. Ela terá que explicar isso algum dia a seus colegas alemães e a todos os colombianos. Estar na Alemanha não a eximirá dessa obrigação legal e moral.
María Stella Jara é uma juíza incomum: é talvez a única juíza do mundo que depois de condenar alguém, e de deixá-lo doente e em uma prisão militar, volta-se contra ele e em carta pública do estrangeiro tenta angustiá-lo ainda mais com as mais falsas calúnias, como se a condenação de 30 anos não houvesse satisfeito seus baixos instintos. Segundo a juíza, o coronel Plazas está por trás das ameaças de morte que ela diz ter recebido. Tudo isso é infame e destinado a golpear a família e os amigos do Coronel.
A carta da juíza Jara, que ela diz ter enviado a uma associação alemã de juízes, afirma que as"ameaças [contra ela] provêm dos "mais altos funcionários do Estado", que o poder executivo lança "agressões" contra a Corte Suprema de Justiça, que o DAS, um organismo de segurança, realizou contra ela "interceptações telefônicas ilegais", que examinou suas "contas bancárias e suas propriedades", que "orquestrou uma campanha de desprestígio" contra ela.
O problema dessas acusações é que elas não estão acompanhadas de prova. Só refletem a íntima convicção da interessada. E, coisa curiosa, são cópia literal da retórica de certos magistrados e dos grupos extremistas em guerra contra o governo e contra as maiorias que rechaçam sua pobre visão de vida. Essas acusações não foram provadas sequer pela Fiscalização nem pela Corte Suprema de Justiça.
A juíza Jara deveria explicar a seus colegas alemães por que rechaçou a investigação, tão independente e completa, do Tribunal Especial de Instrução de 1986, realizada por dois magistrados e dez juízes de instrução criminal, e por que substituiu esse valioso documento por uma série de afirmações débeis de familiares dos supostos "desaparecidos" os quais admitiram que suas informações vinham de umas "chamadas anônimas".
A juíza Jara deverá explicar por que deu credibilidade ao testemunho de Ricardo Gámez Mazuera, quando esse testemunho foi totalmente desvirtuado e descartado pela Procuradoria Geral da Nação em 1990.
A juíza Jara deverá explicar por que aceitou como válido o depoimento de Edgar Villamizar Espinel, que havia prestado "testemunho" em um potrero (um polígono de armas longas na Escola de Cavalaria de Bogotá) sem a presença do defensor do Coronel Plazas, e sem que tal prova tivesse sido decretada pela Fiscalização. Deverá explicar por que não aparece a data da recepção de tal "testemunho" e por que tal "depoimento" foi assinado por um Edgard Villamil (e não Villamizar). Deverá explicar por que ela aceitou esse testemunho quando todo mundo sabia que este continha mentiras sobre a identidade e a condição do declarante, e que todo mundo sabia que não havia a menor prova de que Villamizar tivesse entrado no citado polígono.
Ela deverá explicar por que aceitou a versão de Villamizar sem que este jamais tenha se apresentado ao processo, e quando está comprovado que Villamizar não é testemunha de nada pois não esteve nas operações do Palácio da Justiça. Deverá explicar por que ela rechaçou as provas de demonstram que Villamizar, durante os fatos do Palácio da Justiça, estava longe de Bogotá, no Batalhão Vargas de Granada (Meta), pois essa unidade provou que não havia enviado Villamizar, nem nenhum outro sub-oficial, à contenda do Palácio da Justiça. Ela aceitou esse testemunho que contém outras falsidades: como a de que o chefe de Villamizar era um "Major Jairo Alzate Avendaño", nome que não existe nos registros do Exército da Colômbia.
A juíza Jara terá que explicar por que desprezou as declarações do civil José Vicente Rubiano Galvis que, como capturado durante os fatos do Palácio da Justiça, passou a noite de 7 de novembro de 1985 nas instalações da Escola de Cavalaria, junto com mais três pessoas, sem ter visto nem ouvido as pretendidas torturas e vexames de "reféns" que Villamizar tratou de introduzir no processo. Terá de explicar por que na Escola de Cavalaria do Cantão Norte não foram encontrados cadáveres nem restos humanos como mencionava Villarreal.
As altas esferas da Justiça e da Procuradoria conhecem perfeitamente estas coisas e sabem que nesse processo violaram-se as leis do país, e que algum dia essas violações sairão à face do mundo. Talvez por isso, depois da sentença na primeira instância eles ordenaram uma série de movimentos curiosos no pessoal judiciário envolvido: a juíza Jara foi enviada à Alemanha e a fiscal que instruiu o caso foi destituída por faltas profissionais cometidas no exercício de seu cargo.
Com sua carta de insultos contra a Colômbia a juíza Jara trata de sepultar estas e outras perguntas que saltam aos olhos após a leitura de sua desditosa sentença. Com sua gritaria desde a Alemanha ela não sufocará o grande mal-estar que sua atuação deixou na Colômbia.
Tradução: Graça Salgueiro
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