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sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A voz dos fatos

DIÁRIO DO COMÉRCIO
Olavo de Carvalho - 6/10/2010 - 20h17

Não é necessário analisar os resultados da eleição de domingo. Eles falam por si. O fato mais significativo, sem dúvida, foi a votação espetacular do palhaço Tiririca. Ela é a moral da história de oito anos da Era Lula. Ostentando com franqueza sarcástica a sua condição de candidato inculto, burro, desprepreparado, Tiririca explicitou a regra implícita que elegeu o sr. Luís Inácio Lula da Silva em 2002 e lhe garantiu o aplauso do beautiful people deste País.

Todos conhecem a previsão do general Olímpio Mourão Filho, publicada no livro, A Verdade de um Revolucionário, de 1978:

"Ponha-se na presidência qualquer medíocre, louco ou semi-analfabeto, e vinte e quatro horas depois a horda de aduladores estará à sua volta, brandindo o elogio como arma, convencendo-o de que é um gênio político e um grande homem, e de que tudo o que faz está certo. Em pouco tempo transforma-se um ignorante em um sábio, um louco em um gênio equilibrado, um primário em um estadista. E um homem nessa posição, empunhando as rédeas de um poder praticamente sem limites, embriagado pela bajulação, transforma-se num monstro perigoso."


A Era Lula foi muito além da profecia. A adulação transpôs os limites do círculo palaciano, espalhou-se por todas as camadas sociais, implantando em milhões de almas uma nova escala de julgamento que invertia, num só lance, todos os valores. Pois não chegaram a enxergar uma virtude mística no fato de que o homem, subindo na escala social como nenhum outro brasileiro, aprendesse a vestir ternos Armani, a aparar a barba e a polir as unhas, mas continuasse tão iletrado – e orgulhoso de sê-lo – quanto no começo da carreira?

Ao longo do governo Lula, o império do mau exemplo se impôs mediante atos, sem que ninguém verbalizasse seu significado, evidente aos olhos de todos. Tiririca apenas traduziu em palavras a máxima que meio Brasil já vinha seguindo sem declará-la: o maior dos méritos é subir na vida sem mérito.

Os 1,35 milhão de eleitores que transformaram a abestada criatura no deputado mais votado do Brasil fizeram muito mais do que enviar eloquente recibo a Lula e seus cultores: "Captamos a mensagem, sr. Presidente". Mostraram que uma expressiva parcela do eleitorado desistiu de levar a sério uma palhaçada eleitoral onde a maioria conservadora, algo entre 70% e 80%, não tem canais partidários por onde se fazer ouvir.

Essa situação grotesca é precisamente aquilo que o sr. Presidente chama de "novo paradigma" e qualifica de irreversível, provavelmente com razão. Rateado o espaço eleitoral entre a esquerda da esquerda e a direita da esquerda, os remanescentes da antiga direita encaixam-se como podem: os sicofantas explícitos, na primeira, os camuflados na segunda.

Não resta ninguém para pregar o desmantelamento da máquina de corrupção e subversão petista, nem para prometer um castigo exemplar aos protetores das Farc e do PCC nas altas esferas, nem para dar voz à repulsa do povo pelas políticas abortistas, ou para explicar, com a simplicidade da lógica elementar, que uma inclinação sexual mutável não pode ser fonte de direitos permanentes.

Já na Era FHC não havia direita. Havia esquerda e "centro". Associada a palavra "direita" a toda sorte de crimes e abusos, todo direitista buscou prudente abrigo num inócuo meio-termo, sem saber que com isso se condenava à "espiral do silêncio" e à derrota inevitável. O passo seguinte foi rotular uma parte do "centro" como "extrema direita", de modo que os centristas trocassem novamente de crachá.

Quando o sr. Luís Inácio festejou como apoteose da democracia a ausência de candidatos presidenciais de direita nas atuais eleições, a obra da "espiral do silêncio" estava completa. Era a vitória final do "novo paradigma": vote em quem quiser, desde que seja de esquerda.

É uma daquelas situações que o velho Karl Kraus diria impossíveis de satirizar, por serem satíricas em si mesmas. Quem pode encarná-la melhor do que um palhaço profissional que alardeia, como suprema razão para votarem nele, a sua completa falta de qualificações para o cargo?

Outros dois fatos devem ser interpretados na mesma direção.

A vitória do sr. Tarso Genro no Rio Grande do Sul mostra que os liberais gaúchos nunca entenderam o óbvio: que sua vitória de 2006 não se deveu às suas lindas doutrinas e doces propostas, mas à hostilidade do povo gaúcho ao partido que por doze anos transformara o Estado na sede nacional da subversão comunista.

Uma vez no poder, tinham a obrigação precípua de destruir o esquema comunopetista, com o qual, em vez disso, preferiram cultivar uma política servil de boa vizinhança. Perderam para o velho inimigo porque não ousaram ser direitistas. Num campeonato de esquerdismo, vence, por definição, o mais esquerdista.

Quanto à votação modesta do sr. José Serra, já era esperada. Ele só poderia ampliá-la se, em vez das meras alusões à aliança PT-Farc, apresentasse um programa de ação claro, definido, para o desmantelamento do Foro de São Paulo e das articulações criminosas que o compõem.

Parece abusivo ter de lembrar isso a um político profissional, mas falemos o português claro: Candidatos presidenciais não fazem "críticas", não "denunciam". Criticar e denunciar, no fim das contas, é somente falar. Isso é para os habitantes do Parlamento, que é um foro de debates, ou para os articulistas de mídia, que não têm poder de mando. Candidatos presidenciais apresentam propostas de ação.

Uma proposta de ação que quebre a espinha da narco-subversão e devolva a paz ao povo atemorizado pela violência – eis o que o eleitorado brasileiro espera. O sr. Serra limitou-se à função de crítico, e de crítico inibido pela timidez de ferir antigos companheiros de militância, dos quais, por alguma razão, se sente devedor e refém.

A crítica, em si, tem seus méritos, mas de um candidato presidencial espera-se muito mais. O sr. Serra que mostre a disposição de fazê-lo, e atrairá para si muito mais votos do que poderá obter mediante arranjos e alianças, nos quais o eleitorado só verá uma confirmação a mais de que votar em Tiririca foi a decisão mais razoável, dadas as circunstâncias.

Olavo de Carvalho é ensaísta, jornalista e professor de Filosofia

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