CAFFEINE CULT
sábado, 28 de agosto de 2010
Consuetudinariamente sou inquirido a respeito do meu salutar ódio pela esquerda, retroalimentado todas as manhãs através de farinha láctea Nestlé, Biotônico Fontoura e Taffmann E como mamãe me ensinou.
Apesar de as aparências aduzirem para um fanatismo xiita e histéricos faniquitos de fobia por progresso, pelas liberdades, pelas cultura e por todas as benesses que foram graciosamente concedidas à humanidade por Karl Marx, em verdade trata-se ipso facto de um amor incondicional aos mais modernosos e atuais elementos de progresso da civilização: a cultura greco-romana, a calça jeans, o papel higiênico macio, o thrash metal, a possibilidade de pagar R$66,00 numa edição de luxo de O Capital e uma internet cheia de pornografia que não será baixada sozinha.
Inobstante, fatores históricos cujo atraso grita horridamente perpetuam a eterna azáfama da coisa antiga que precisa ser trocada por uma coisa nova, cometendo o eterno erro hegeliano: acreditar religiosamente que idéias envelhecem e precisam ser substituídas pela força do tempo por idéias novas, não importa quão piores sejam, exatamente como como se trocam cuecas.
Há 2.500 anos Platão demonstrava pela primeira vez como seria uma sociedade sem Estado, supostamente perfeita, onde todos seriam filósofos. Nos últimos 400 anos, diversos pensadores, como Vico, Saint-Simon, Robert Owen, Leroux, Fourier, Marx, Engels, Lênin, Trotsky e Stálin, quiseram mudar o que era velho por um novo sonho seguidor de regras auto-definidas – nos últimos, desta feita, com um estágio totalitário só pra se extinguir sozinho logo depois. Com este mesmo tempo a marchar, algumas idéias se provam pouco atinadas com aquela entidade abstrata chamada de mundo real pelos sábios, enquanto outras denunciam que nem toda idéia nova é necessariamente melhor do que uma antiga, como provam o tênis Conga, a Cherry Coke e a dance music. Piorando: as idéias mais novinhas em folha acabam se tornando cafonas e velhas em menos tempo do que conceitos como liberalismo, que poucos percebem tão mais novos.
Neste contexto, nada pode ser mais esquisito do que um esquerdista usando a internet. A imagem de um blogueiro de esquerda é mais anacrônica do que Lady Gaga tocando num gramofone. Quando um ser vivo se considera progressista, alguém precisa lhe avisar de que esse progresso está fora de moda.
Genealogia de uma revolta
Aquilo que se chama pensamento progressista não passa de uma epopéia velha e com ares de estória da carochinha para enganar adultos velhos, que acham que deixar de ser adolescente para ficar gagá é sinal de maturidade.
Todo pré-adolescente se indignou com as injustiças do mundo e, ao perceber que as únicas delas que possuem entidades construídas para lidar ad hoc com suas peripécias são a política e a religião, imediatamente passa a se revoltar obstinadamente contra elas. Ainda que se possa atingir uma profunda sapiência nesse questionamento de ambas, críticas rasteiras só levam a manter a platitude de pires que caracteriza o pensar ressentido.
Na prática, o progressismo é um modo pedante de exprimir uma noção bobalhóide, a saber: algumas pessoas ganham mais pelo tempo de trabalho do que outras (e aqui o tempo de trabalho é a única medida permitida – ignore-se a educação, especialização etc), e os filhos dessas nascerão, já, com oportunidades desiguais. Logo, o único modo de acabar com a iniqüidade é proibindo que tempos de trabalho iguais (novamente, a única aferição válida) permitam pagamentos diferentes. Como a única maneira de se proibir que isso ocorra em todo lugar é através do Estado, que pode coagir qualquer empresa (empresa tal que poderia ser mais atraente do que trabalhar para o Estado), resta tomar o poder a força e obrigar toda pessoa e organização a seguir a mesma métrica.
O progressista, assim, parte de uma idéia até bacaninha, quando se tem pouca idade e experiência com a realidade: se caridade faz bem a algumas pessoas, se todas fizerem o mundo será melhor. Nem um único progressista na história da evolução humana foi capaz de se perguntar qual o maior número: quantas pessoas podem fazer caridade ou quantas que só podem recebê-la. Pior: não se trata mais apenas de caridade, de boa vontade por parte do sujeito – trata-se de fazer o Estado controlar a “caridade”: não se dá mais nada ao seu vizinho, mas sim dá-se tudo ao Estado para que este redistribua.
O progressista nada mais quer do que fazer com que o Estado controle o progresso. É uma idéia que rendeu muitos livros e deu fama a diversos filósofos, mas nunca fez com que o Estado criasse riqueza. Nunca fez com que indivíduos vivendo sob o jugo do Estado vivessem melhor do que aqueles vivendo em um país com tradições liberais fortes.
O progressista acreditou na Gurgel e na reserva de mercado. O reacionário permitiu que o Google, o mp3 e o iPad fossem inventados.
O reacionário inventa um produto novo e melhora a vida das pessoas. O progressista cobra imposto.
Progressista, enfim, é o cara que só lê livros escritos há menos de 30 anos. Progressista é só o burguês que odeia burguês.
Enquanto o progressista acredita que está indo contra um velho sistema, o progresso já atropelou todos os progressistas – o progresso significa iPod, não sindicato. Mas sem consciência de perceber a sabugice de usar internet wireless que as privatizações permitiram para pedir bolsa do governo, o progressista é alesmaiado o sobejante para atentar para o fato de que a única coisa públicagratuitaedequalidade que existe é o Google.
Destruindo todas as réstias de inteligência que a combinação de ilusão de progresso com controle estatal possa permitir sobreviver, o progressista não apenas acredita que repapagaiar uma aleivosia sobre “progresso” ad nauseam seja algo que aponte pro futuro, como também acredita que tudo o que não seja filiado a um sindicato ou “movimento social” seja coisa retrógrada – mesmo que seja o mesmo pesadelo estatizante, com discurso (e apenas discurso) menos planificante: qual seja, o fascismo.
Pensam, ademais, que são o exato oposto do fascismo em todos os aspectos. Uma simples análise demonstra como esta pecha de “fascista” para todos os seus inimigos fala mais sobre a esquerda cega a si mesmo do que a qualquer dos seus desafetos.
Fascistas e esquerdistas são favoráveis a controlar o que acham que pode gerar injustiças sem que esteja em seu total e irrestrito poder. Aquela anarquia do mercado que gera “desigualdade” deve ser rigidamente controlada pelo Estado, em ambos os sistemas. A liberdade de imprensa, que pode gerar “oposição” e uma “mídia golpista”, também é rigorosamente impedida. A criminalidade... ops! Essa só pode ser controlada no fascismo!
E, claro, não importa o quanto você seja contra toda a outra opressão estatal em todas as áreas em que ela nociva, enquanto os progressistas lutando pelo “social” não o sejam: se você quer controlar a criminalidade, imediatamente será alguém contra o progresso, um fascistóide!
É claro que sobra ao progressista se encontrar com seus pares de inteligência apoucada em comunidades na internet. E sem nunca poder afirmar que se quer que o Estado proíba tudo o que é privado, apela-se para o neoromantismo da “social democracia”. Seria uma idéia menos panaquinha, não fosse o vezo progressista em tomar o nome apenas para não se considerar algo menos “progresso prafrentex”, como, aleatoriamente, “comunista”. Afinal, é lindo se considerar “social democrata”, mas pense em privatizar uma empresa podre, dando prejuízos horrendos aos contribuintes, e torná-la uma das empresas mais lucrativas do mundo, que rende mais ao governo só em impostos do que em lucro bruto (!!!) e... você deixará de ser um democrata com visão social (?!) por conta disso!
Por fim, há uma diferença fundamental entre pessoas de direita e de esquerda. Pessoas de direita gostam de armas e especulação financeira. Pessoas de esquerda gostam de maconha e Tom Zé. Algum desses lados tem de estar errado.
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