Fonte: "El Diário Exterior", 2 de Julho 2010.
Tradução: A. Montenegro
Por Álvaro Vargas Llosa
A reunião do G-20, em Toronto, no Canadá, deixou em evidência uma verdade patética: os governos, instituições e personalidades que nos deveriam orientar nesta convalescença da hecatombe 2007/2008, continuam recomendando as mesmas políticas que conduziram ao desastre.
Antes e durante as reuniões, o presidente Obama insistiu com as nações, para adiar o ajuste fiscal e a redução da dívida, ações que poderiam sufocar a débil recuperação. Afirmou que o "violento acordo" dos participantes para reduzir o déficit pela metade até 2013 e estabilizar os percentuais da dívida até 2016, revelava mais "violência" que "acordo".
O canadense Stephen Harper, a alemã Angela Merkel e inclusive o francês Nicolás Sarkozy, defenderam o corte fiscal. Mas a oposição dos Estados Unidos e do Japão e a ambiguidade de potências emergentes como o Brasil, resultaram num acordo que não passa de uma banguela declaração de boas intenções.
Publicações respeitáveis, que deveriam contribuir para a clareza moral, agora que a dívida pública alcança 92% da economia da França e 83% da economia da Grã Bretanha, enquanto o déficit dos EUA está na estratosfera, asseguram que não é hora de disciplina monetária e fiscal.
Até Martin Wolf, do "Financial Times", considera "correto que os Bancos Centrais continuem imprimindo dinheiro". Clive Crook, do mesmo jornal, diz que é justo chamar a Alemanha "um mal cidadão global, por ajustar a política fiscal, apesar do superavit externo e da margem para endividar-se mais".
A revista Forbes, supostamente favorável ao mercado, publicou um artigo criticando as medidas de austeridade anunciadas por George Osborne, presidente do Exchequer britânico, que pretende cortar 25% do orçamento de várias repartições estatais. Na revista Bloomberg, o financista George Soros disse que "as medidas de redução de gastos de alguns países europeus produzirão um desastre".
O raciocínio destas vozes habitualmente autorizadas é o seguinte: a recuperação continua dependendo do estímulo estatal. E para restabelecer o equilíbrio entre as nações que têm superávit externo, como a Alemanha ou a China e as deficitárias, como os EUA ou Espanha, as primeiras devem economizar menos e gastar mais.
Se este conselho, que culpa o prudente pela conduta do imprudente, viesse dos pesos pesados de sempre – como o Premio Nobel Paul Krugman e companhia – seria lamentável. Agora, vindo da única superpotência, dos gurus mais influentes da comunidade empresarial e de publicações que se dizem conservadoras, fica claro que o mundo está mais louco do que se temia.
Os déficits, a dívida e o dinheiro fácil, causaram a bolha e a crise. Também causaram o filme de suspense hitchcoqueano que a Europa vive há meses. Tomar as decisões políticas necessárias para a recuperação continuada, evitando futuras bolhas, já é difícil. Mais ainda quando qualquer medida responsável tropeça com as manifestações nacionais, como na França, contra a reforma das aposentadorias e na Grecia e na França contra a reforma fiscal. Tomar tais medidas quando os líderes e vozes respeitadas perderam o juízo, exige esforços titânicos.
Graças a Deus, nem tudo está perdido. Ao mesmo tempo em que o G-20 pirava, o Banco Central da Suiça publicou seu informe anual, criticando como azarenta a manutenção de políticas fiscais e monetárias dissolutas. Sustenta que as taxas de juros artificialmente baixas, distorcem as decisões de investimento e levam os mercados financeiros a adotar riscos elevados. Um programa de austeridade seria gerador de confiança, sinalizando o sistema financeiro e proporcionando os empréstimos de longo prazo com baixo custo, em benefício dos maiores investimentos.
O BPI (Banco Central da Suiça) sustenta ainda que as políticas monetárias descontroladas, poderão produzir o clima de dinheiro fácil, que produziu a crise atual, gerando incentivo para que certas entidades financeiras tomem muitos empréstimos a curto prazo, para repassar a longo prazo, brecha que se traduziria em congelamento do crédito no primeiro sinal de baixa liquidez.
No cerne da questão, as políticas atuais protelam o momento de encarar o desafio demográfico do Estado de Bem Estar nos países que envelhecem rapidamente. Protelam a reestruturação das indústrias ineficientes que vivem ligadas aos aparelhos de UTI do acesso ao crédito fácil.
Verifica-se que "há algo de podre no reino da Dinamarca" quando o Banco Central da Suissa condena as políticas que aplaudiu durante anos. É um alerta para os desastres iminentes, se os governos continuarem no rumo atual.
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