A página 3 da Folha, nestes dias de tragédia no Haiti, parece que está destinada a ser uma espécie de gaiola dos loucos. Depois das sandices do tal Mark Weisbrot, quem escreve hoje é um sujeito da UnB chamado José Flávio Sombra Saraiva. Mais sombra do que Saraiva!
Mais uma vez, um artigo pautado, acreditem, pelo mais rombudo antiamericanismo. Lê-se lá, por exemplo, esta maravilha do requinte intelectual:
“As grandes potências que minguaram recursos e esforços diplomáticos para o alívio da pobreza no Haiti e em países miseráveis que o mundo ainda abriga são as mesmas que agora coordenam a operação de aplainar os cemitérios do país caribenho. Silenciou-se repentinamente o discurso monocórdio do combate irracional e linear ao chamado ‘terrorismo internacional’, conceito ainda não bem definido, de Bush a Obama.
Tudo agora é humanitarismo nas lágrimas de crocodilo dos líderes cínicos. Apenas agora, já tarde, ouvem-se discursos de desdobrada atenção ao drama do Haiti. Atores e músicos famosos fazem o cordão de proteção ao humanitarismo renovado do Norte.”
Viram? Sobre milhares de corpos, uma tragédia de alcance inimaginável, Sombra achou tempo para, por meio de uma afirmação solerte, nos levar a indagar: “Mas o que será o terrorismo internacional?” Ele ainda não sabe, coitado! Tem 49 anos, um a mais do que eu, e ainda não sabe o que é o terror. Certamente leva essa dúvida a seus alunos de Relações Internacionais da UnB. Tenho alguns amigos nessa universidade. Imagino o que padecem os que compõem a brigada minoritária dos alfabetizados morais.
Para o Sombra, a política de combate de terror deveria ter sido deixada de lado em benefício do enfrentamento da pobreza no mundo, como se essas fossem questões permutáveis. Há dias, um avião só não foi aos ares nos EUA por causa da incompetência do terrorista — e, claro, da falha no sistema de segurança, que Sombra deve considerar uma papo furado da extrema direita… É claro que terremoto em país pobre será sempre pior do que em país rico, mas, ultimamente, tenho lido textos que buscam, por caminhos oblíquos, dar um jeito de culpar os EUA pelo tremor de terra. Vai ver tudo não passou de uma conspiração para evitar a democracia no Haiti, como diria Weisbrot…
Sombra, sem dúvida, é um dos abduzidos de Celso Amorim e de Samuel Pinheiro Guimarães. Vejam que primor: “O Brasil - em seu esforço de governo, da sociedade organizada e suas ONGs, mas em especial dos sacrifícios pessoais dos militares brasileiros, em missão convertida e gerenciada pela ONU no Haiti - vem sendo apenas discretamente reconhecido.
Obama agora quer oferecer os famosos 100 milhões de dólares que o Brasil já havia solicitado para obras de infraestrutura no país.”
Salvo o elogio aos militares brasileiro, que estavam no Haiti, antes do terremoto, numa missão sem sentido, o resto é eco da tentativa do Itamaraty de fazer do país devastado um palco. Notem como Sombra se refere aos “famosos 100 milhões de dólares” de Obama, como se a grana, sei lá, fosse falsa. Em questão de horas, os EUA mobilizaram mais recurso do que a ONU e o resto do mundo jamais conseguiriam mobilizar. E, como se nota, apanham por isso. Também apanhariam se não fizessem nada, é claro.
O moço está ressentindo. Acredita que não estão nos dando o devido valor na tragédia. Vejam como ele choraminga e reivindica, em seu complexo de vira-lata, a parte que nos cabe na desgraça:
“Aqui na Europa [deve estar em terras imperialistas estudando] nada se sabe acerca da obra de Zilda Arns no Haiti nem que ministro brasileiro foi a primeira autoridade internacional a pisar o solo tremente da ilha. A lógica é mostrar Obama, Sarkozy e outros líderes do Primeiro Mundo isolados, a domesticar a opinião pública e os interesses eleitorais. Espero que o Brasil não faça o mesmo.”
Não, Sombra! Lula jamais usaria um caso como esse para aparecer!!!
E a conclusão do artigo quase me leva a uma concussão cerebral. Leiam:
“Pois que se tome uma lição do Haiti para a política internacional: o pêndulo está excessivamente angulado no realismo global e nos egoísmos nacionais. É hora de movê-lo para a dimensão humana das relações internacionais, que prescinde do humanitarismo, para ser apenas humana a face desejável dos sonhos de um mundo melhor.”
O que dizer sobre essa peroração? Isto: “Eu num intindi u qui ele falôôô…”
Mais Wisbrot
Converso com alguns amigos jornalistas que moram nos EUA. O tal instituto a que pertence Weisbrot, aquele que afirma que os EUA têm medo da democracia no Haiti, é visto como mero megafone de aluguel de qualquer causa dita “de esquerda” envolvendo Venezuela, Bolívia, Equador, Honduras, etc. Tem zero de credibilidade entre os think tankssérios de Washington (Inter-American Dialogue, Brookings etc), e as análises econômicas que faz são impressionantemente toscas.
Mas é popular entre os jornalistas. Sempre que precisam de alguém para criticar os EUA ou, por exemplo, o Fundo Monetário Internacional, ele está à disposição. É o que chamam em inglês de “dial-a-quote”: ligou, o moço atende e fala pelos cotovelos. E até manda material sem que ninguém tenha pedido. Escreve regularmente no Guardian. Mas qualquer imbecil escreve regularmente no Guardian.
Só para que se tenha uma idéia do que pensa o cretino, ele escreveu colunas às pencas defendendo a decisão do Chávez de fechar o canal de TV Globovision. Imaginem… Isso num país em que a liberdade de imprensa é coisa quase sagrada. Foi casado com uma jornalista brasileira, que não partilhava de suas bobagens, diga-se, e isso o tornou um tanto conhecido entre os nossos.
Mas a síntese é esta: sempre que for preciso encontrar um americano para dizer que Chávez está certo, é um democrata e representa uma América Latina mais livre dona de seu destino, chamem Weisbrot. Para os jornalistas, ele fala de graça.
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