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sábado, 24 de outubro de 2009

O Brasil elegerá Nosferatu?

Fonte: BRASIL ACIMA DE TUDO
19 de outubro de 2009


“O Serra é uma alma atormentada”

Fernando Henrique Cardoso
Por Nivaldo Cordeiro (*)


Meu caro leitor, confesso-lhe que fiquei fortemente impressionado com a reportagem trazida a público pelo último número da revista Piauí. Claramente na origem a matéria tinha puro objetivo propagandista eleitoral, mas a jornalista que a escreveu é demasiado talentosa e conscienciosa para se limitar a fazer um mero panfleto. Acompanhou José Serra por mais de um ano e trouxe à luz flashes valiosos, não apenas para o eleitor brasileiro, como também para quem se debruça cientifica e profissionalmente sobre a cena política brasileira.


Muita gente não conhece a revista
Piauí. Eu habitualmente não a leio, pois a acho uma publicação insossa e pretensiosa, recheada de conteúdo para diletantes da esquerda tida por mais culta e sofisticada. É editada por Mario Sergio Conti, talentoso jornalista que passou por vários órgãos de imprensa e escreveu um livro magnífico (NOTÍCIAS DO PLANALTO). É propriedade de gente ligada a uma família de conhecidos banqueiros que abraçaram a causa esquerdista e transitam em meio à esquerda revolucionária brasileira e mundial com desenvoltura. Este número da revista está especialmente ótimo, com a matéria sobre José Serra e com um ensaio magnífico do peruano Mario Vargas Lllosa sobre a arte de escrever romance. A página de poesia nos apresenta uma poetisa, Rose Ausländer, que escreveu no idioma alemão. Vale conferir. Na internet os poemas estão abertos ao público não assinante, bem como seu resumo biográfico.


Mas o relevante é a matéria com o Serra. Ela traz nuances psicológicas assustadoras do governador de São Paulo e um retrato biográfico primoroso do político da Mooca. Enganam-se os que pensam que José Serra tenha qualquer vestígio do que poderíamos chamar de político de direita. Ele mesmo declarou: “O governo Lula é de esquerda? Não dá para falar nisso. Com o significado do passado, eu estaria à esquerda do PT. Desenvolvimento virou coisa de esquerda. Política econômica é quase subversiva”.


Nesta frase está contida a sua psicologia e o seu dégradé político. José Serra é um desenvolvimentista marxista convicto, à moda dos anos cinqüenta e, se eleito presidente, não hesitará em pôr em prática as suas crenças. Elas são o receituário consolidado da teses do PCB, do ISEB e da CEPAL. Não por acaso a narrativa de Daniela Pinheiro registra que o único ser que ousa fumar na frente do Serra, na sala dele, é João Manuel Cardoso de Mello, aquele mesmo que concebeu o Plano Cruzado. Sarney levou a fama de ter feito explodir a inflação, mas foi este indigitado senhor, auxiliado pelo Luiz Gonzaga Belluzzo, o autor intelectual do desastre inflacionário daqueles tempos. A velha herança do PCB, do ISEB e da CEPAL, tudo somado, é o maior equívoco teórico sobre o papel do Estado e o capitalismo que se tem notícias. O Plano Cruzado é a prova histórica da alucinação teórica dessa gente. Nunca se ouviu uma palavra de mea culpa dessa gente, é como se tudo tivesse nascido da pena nefando do Sarney.


A primeira lição que a revista nos dá é que essa gente, que está fora do poder federal, desde aquela época, voltará em peso com José Serra, se eleito for. Ele mesmo é um expoente dessa corrente, que tem dominado a Unicamp desde a fundação. Lembremos que FHC teve a sensatez de pegar os brilhantes economistas da PUC-Rio para debelar a inflação criada pela Unicamp. Com Serra certamente teremos todo o arsenal intervencionista posto em marcha de uma só vez: tabelamento de câmbio e preços, estatização, controle dos salários, do comércio exterior e uma perseguição tributarista sobre as empresas e as pessoas, do que tem dado mostra Jose Serra e seu secretário da Fazenda aqui em São Paulo, destruindo setores inteiros da economia paulista na ânsia pelo esbulho tributário. Será um retrocesso enorme em matéria de política econômica. Serra considera empresários algo próximo de delinqüentes e a propriedade privada uma espécie de roubo, à moda de Rousseau. Ele declarou que seu compromisso é eliminar a pobreza e bem sabemos o que significa isso na boca de um poderoso intelectual orgânico da esquerda stalinista: a opressão do Estado sobre os que trabalham e produzem riquezas, tentando redistribuir riquezas de forma arbitrária. Essa gente acha que a lei da escassez é mito e que pobreza existe por falta da vontade política do governante. Acha também que a igualdade idealizada no plano das posses econômica é empreendimento perfeitamente exeqüível e desejável, um imperativo moral, cabendo ao Eleito realizar a empreitada, pelo instrumento do Estado.


Não podemos esquecer que José Sarney, à época, com todos os defeitos, tinha ainda limites morais e culturais que serviam de contrapeso ao ímpeto esquerdista da gangue da Unicamp. Com Serra será bem diferente. Ele é de natureza autoritária e consolida larga experiência legislativa e executiva, o que o credencia a ser altamente eficaz na consecução dos seus objetivos. Seus auxiliares também, o que significa que nem de um período de aprendizado necessitam na sua chegada ao poder. Praticarão o mal coletivista desde a primeira hora. Um governo desse naipe pode enveredar o Brasil pela senda da tirania burocrática como jamais houve, como nem o PT ousou imaginar.


O retrato psicológico do Serra é de um homem obcecado pelo poder, incapaz de aceitar o contraditório de quem quer que seja. Bem notado que ele se relaciona bem com mulheres, mas não com homens. Mesmo Fernando Henrique relata que Serra sempre preferiu conversar com Dona Ruth a conversar com ele. Serra está sempre pronto para o enfrentamento com aqueles que ousam dizer-lhe “não” para alguma coisa. É a psicologia do ditador. Teremos um Nosferatu eleito Chanceler, como no filme V de Vingança? Uma psicologia assim é um perigo, sobretudo se obtiver o poder de mando sobre as Forças Armadas e a Polícia Federal. As dificuldades da realidade podem ser confundidas como má vontade da população ou de certas pessoas indesejadas pelo governante. A tentação de usar o poder de Estado para corrigir o mundo “rebelde” pode ser irresistível.


Devemos ter em conta também que Serra não é inimigo do PT, muito ao contrário. A estranha forma como está sendo conduzida a sucessão paulista pode esconder ações surpreendentes de bastidores: Alckmin, o favorito ao governo do Estado, está sendo rifado em favor de um principiante desconhecido, Aloysio Nunes Ferreira, talvez o único homem que conta com a confiança irrestrita de José Serra; a decisão de Gilberto Kassab de elevar de forma escandalosa o IPTU paulistano em véspera de um pleito capital e a vinda inesperada de Ciro Gomes para São Paulo, sob o patrocínio do PT, tudo somado pode indicar um acordo por cima entre grupos do PSDB de José Serra e do PT. Não devemos esquecer também que o próprio presidente da FIESP, Paulo Skaf, deve sair candidato pela legenda do PSB, o mesmo partido de Ciro Gomes agora. É de se sublinhar também que as opiniões emitidas por José Serra sobre Geraldo Alckmin não tiveram autorização para serem publicadas na matéria, por motivos óbvios.


Parece haver um acordo para a partilha prévia do poder entre as facções principais da esquerda que hoje têm o controle total da política do Brasil: Serra presidente e alguém ligado ao PT para governador do Estado de São Paulo parece ser a solução salomônica. Por isso o PT insiste na candidatura natimorta da inexpressiva Dilma. A eleição não passará assim de um mero circo grotesco com o fito de cumprir o calendário eleitoral, com tudo decidido previamente por debaixo do pano. Um engodo para com a opinião pública, que pensará que participa de um pleito sério. Ninguém dos interessados perderia com um acordo deste e todos nós seríamos feitos de tolos.


É notável a perspicácia de FHC quando disse não basta arrotar competência gerencial no comando do Estado para seduzir o eleitorado. Que uma eleição é sobretudo um processo de sedução de almas, como fez Obama nos EUA. E completou: “O Serra é um ótimo gestor e ponto final. Mas acho que ele é mais administrador e economista do que formulador. É mais pragmático que imaginativo”. Disse tudo. Serra é um trator que age no mundo do imaginário político sem pensar. FHC viu o que eu vi, a alma atormentada que pode guardar a psicologia de um ditador. Estrategicamente Serra é mal formado. A declaração de FHC não foi do agrado de José Serra, que a rebateu dizendo que ele tem também é “teórico”. Ora, FHC não se referia à cultura teórica quando falou que ele não é “formulador”. O ex-presidente percebeu que em Serra há um operacional subalterno que não amadureceu ainda o suficiente para ser o primeiro mandatário, o formulador, aquele que pensa grande e que tem a capacidade de administrar e enxergar além dos conflitos passageiros dos agentes políticos do dia. É a mesma percepção minha e é aquilo que mais me apavora em pensar no day after da eventual eleição do Serra. Um sargento assumindo a posição de general.


Depois de ler a revista Piauí fiquei com a sensação de que Lula poderá deixar saudade, mesmo com seu ar estúpido e risonho de torcedor de futebol. Ao menos tem alma pacificadora, não atormentada. Não vejo bons augúrios, infelizmente, se admitirmos que não há nenhum nome capaz de derrotar José Serra para a Presidência da República.


(*) Fonte:
http://www.nivaldocordeiro.net/

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