Existe algo que sempre me inquieta e hoje tenho plena certeza do que seja. Para explicar minha inquietação tenho antes que explicar as impressões que sempre tive dela. Essas são poucas, mas como são constantes crescem em qualidade. Sempre me achei mais inteligente que a média das pessoas, pelo menos desde que me entendo por gente, coisa que acontece há uns 5 anos somente. Depois essa impressão caiu e hoje eu penso que eu sou como todo mundo deveria ser normalmente, se não sofressem do mal que sofrem. Esse mal pode ser creditado à televisão, à educação, ao capitalismo, ao comunismo, mas de qualquer forma isso só explicaria a origem do mal e não o mal em si. Esse é muito fácil de perceber depois que se passam anos e anos convivendo ao seu lado.
Mas se as pessoas sofrem de um mal e eu me considero normal, por que diabos eu não acho que isso pode ser um sinal de grandiloqüência? Pelo simples fato de que não acho que sou exemplo para ninguém, não devem seguir o meu caminho, não quero que ninguém seja como eu sou e acho que se alguém se espelhar em mim para se desenvolver só pode ser um burro. Depois que percebi isso em meu íntimo é que tive a certeza de que não sou egocêntrico nem megalomaníaco. E consequentemente consegui enxergar mais claramente a realidade. Quando eu consegui enxergar mais claramente a realidade é que por tabela eu descobri o mal dos outros. Eles são incapazes de enxergar mais claramente a realidade.
De fato a ignorância não tem começo, ela é infinita e persistente. Todos os homens nascem ignorantes, igualmente ignorantes. Essa condição é natural e não precisa ter início, pois é a própria condição manifestada na realidade. Assim o bebê passa anos e anos para aprender a separar e dividir a realidade em pedaços, pedaços reconhecíveis, pedaços reconhecíveis que possuem ligações, pedaços reconhecíveis que possuem ligações e se repetem e são capazes de identificação. Isso em relação a todos os sentidos, a sensação ao tocar uma árvore vai se repetir, a resposta ao chorar vai se repetir, e assim por diante. Anos é o tempo que leva para que uma criança ganhe noção de profundidade, tridimensionalidade e capacidade de abstração. Basta ver qualquer bebê em sua plena forma desengonçada e destrambelhada para saber o que é isso instantaneamente.
Graças aos erros próprios e, em parte, à condução dos adultos a criança passa por essa fase incólume. E quando possui um sendo mais estável do mundo, em um processo paralelo ao outro, ela começa a falar. A fala é a conquista por natureza da criança, que vai aprender na marra a separação da realidade e sua nomeação. Se começa com papi e mami, ela em pouco tempo vai saber que existe ventilador, cama, garfo, papinha, e com o tempo vai ganhar a noção de amor, morte, doença, perigo etc. A criança aprende tudo isso na terapia de choque, ou ela aprende ou perece. E esquecemos rapidamente que ela demora anos e anos, no mínimo uns 6 anos para aprender e dominar completamente o idioma e conseguir captar grande parte da realidade. Mas mesmo assim ainda nessa idade a criança não sabe o que é morte.
Eis que continuando nessa descrição vamos terminar o crescimento de um novo ser humano apenas lá pelos 15 anos. E teremos um novo ser formado completamente aos 20. Essa era minha idéia básica, aos 20 anos mais ou menos foi quando tomei consciência da vida mesma e comecei a trilhar meu caminho particular de aprendizagem, busca e desenvolvimento. Quando passei, anos depois, a ver a realidade mais claramente percebi que nossos jovens de 20 anos estão infantilizados. Eles não conseguem perceber o mundo de maneira que um ser humano de 20 anos deveria ver, mas enxerga a realidade através de olhos totalmente deturpados. Cheios de vícios. Quando na verdade o ser humano deveria ter toda a base livre de vícios maiores para começar a desenvolver um trabalho sério, é exatamente o que hoje é o ápice da desenvoltura e por ali fica a coisa toda. Devemos lembrar que comparativamente, aqui em uma hipótese por mim formulada que deve ser considerada livremente, podemos comprar uma criança de 14 anos de dois séculos atrás como estando no mesmo nível intelectual de nossos jovens de 20 hoje.
Isso para falar em termos de início de uma existência minimamente satisfatória. Se olharmos nos consultórios de análise e psiquiatria hoje veremos que a maioria das pessoas não possuem problemas patológicos, mas simplesmente são arrastadas aos consultórios por simples carência emotiva e desestrutura interna para manter-se como um adulto. Ou seja, temos um exército de adultos que são infantis ainda em suas vidas internas. Constatando isso não é espanto algum ver hoje em dia pais, mães, filhos e/ou filhas muitas vezes como amigos e companheiros. A distância mental é tão pequena entre os dois que eles conseguem esse nível de aproximação, quebrando toda a corrente hierárquica necessária à educação do ser humano. Toda a falta e carência que uma mente pode sentir está à mostra para pesquisas nos adultos de hoje em dia. E principalmente nos jovens que serão adultos daqui a algum tempo.
Isso repercute em todos os níveis da vida social. Crianças são histéricas, inseguras, procuram a confirmação e comprovação de que estão certas em ídolos e figuras paternalistas. O pai é o símbolo, ou era, ou cada vez é menos, de referência do filho, a mãe é outro símbolo equivalente. O casal, cada um com sua parcela na construção do novo ser, quando hierarquicamente consolidado é um pilar na qual o filho irá se apoiar para lá chegar um dia. Quando os pais já são meros escombros de vigas retorcidas e colunas deformadas, não há mais apoio algum no qual o filho irá utilizar, e muitas vezes, estando no mesmo nível, haverá apoio mútuo de mesmo nível, o que é lamentável tanto para a consolidação dos pais, como para o crescimento da criança.
Essa forma de existir que hoje se espalha rapidamente por todas as camadas sociais, é um sintoma direto da falta de desenvolvimento interno de cada ser humano. Todos sabemos que um ser humano carente, que carece de algo, ou de tudo, é inseguro. Quem é inseguro procurará confirmações e apoio onde encontrar um pilar que ache íntegro. Se não houver tal pilar em sua vida toda a moral, todos os valores, todos os atos, forma de pensar e perceber o mundo serão relativizados. É como o estudante que possui toda a biblioteca mundial para estudar, mas não tem instrução de ninguém, tendo que sozinho ir lendo e buscando suas fontes de informação. Se toda a literatura e todos os livros filosóficos, científicos e de todos os tipos lá estiverem a chance que ele se perca no caminho e crie uma idéia absolutamente errada do mundo é enorme. Assim acontece hoje em dia. Mas o principal é que as obras mais significativas, as experiências mais enriquecedoras, não estão disponíveis ao grande público. Toda a literatura, cinema, todas as artes, os estudos, a ciência que está disponível para o grande público é da mais rasteira. Mas isso é evidente, como ensinar a uma criança um pensamento profundo, uma teoria elaborada, o método científico rigoroso? Não é possível.
Nesse momento reduz-se o mundo num círculo vicioso automático. Se as mentes estão mais fracas vamos relativizar e amenizar o estudo e os modos de compreender o mundo. E assim sucessivamente até o entorpecimento geral da mente humana em todos os níveis. Isso seria trágico por si só se fosse uma reação natural histórica da raça humana. Mas é, nesse caso, enraivecedor, pois o plano todo é orquestrado por uns poucos. O nível intelectual global tem caído profundamente nas últimas décadas. O engraçado é que era para ter crescido vertiginosamente. Qualquer trabalho literário e intelectual só pode ter lugar em sociedades confortáveis. Sociedades em que o nível de conforto atingiu um patamar tal que propicia a transferência de trabalhos braçais e de lutas constantes ao ócio individual. Deparamo-nos com um problema gigantesco aqui. Temos o nível de conforto mais elevado desde o surgimento da raça humana e ao mesmo tempo temos a derrocada do nível intelectual. Não digo que a produção deixou de existir. Nossos mercados editoriais crescem. Mas o lixo que é produzido e cada vez maior e a literatura de merda que existe é infinitamente superior a alta literatura.
Qualquer ser humano com 20 anos de idade que conviveu em uma sociedade minimamente desenvolvida sabe que se ouvir um homem o aconselhando a pular de uma ponte para ser feliz vai saber que o que o sujeito diz é errado, por rápida impressão interna. Mas isso atualmente não se dá ao fato de que viver é melhor que morrer, mas simplesmente que o fato de morrer por alguma coisa maior foi simplesmente tirado do imaginário popular. A vontade individual foi minada de todas as maneiras. É impensável hoje alguém decidir algo autonomamente se isso vai contra o consenso popular de nascer-estudar-trabalhar-morrer. Aliado a esse fato temos o direito à felicidade, que é um expressão totalmente sem sentido e absolutamente vazia. A felicidade não chega através de luta, trabalho, suor nem nada disso, é um estado alcançado mais pela contingência que pelo plano elaborado, aliás somente pela contingência. Pascal Bruckner sintetizou de forma magistral esse pensamento nessa frase: “nós constituímos as primeiras sociedades a tornar pessoas infelizes por não serem felizes.”
A condição humana é ser infeliz, é ter momentos de angústia, desilusão, tristeza e lamento. Essa é a nossa condição básica, nascemos ignorantes, pelados e famintos. Somos por definição seres que alçam vôo sobre as misérias. Através do trabalho, da luta individual, do crescimento interno, do desenvolvimento dos valores, da consolidação da mente sobre o corpo. Mas todo esse trabalho não nos leva à felicidade, mas a realização humana. Muitas das vezes é trabalhosa e estafante. E na grande maioria não há felicidade em comer, dormir, trabalhar e se manter. Essas coisas básicas trazem a tranqüilidade para ser humano de forma mais plena. Quem tem comida diariamente, uma cama para dormir, possui saúde e família não deve por isso ficar feliz automaticamente, mas simplesmente perceber que possui todas as necessidades básicas satisfeitas e que a partir dali pode buscar uma completude maior. Hoje em dia, talvez, a única coisa pela qual as pessoas lutassem com a própria vida seriam seus filhos, mas uma reduzida parcela da população, a maioria bradaria por uma melhor gestão governamental enquanto culpa meio mundo pelas mazelas.
O senso individual foi perdido e com isso perdeu-se a unidade interna do indivíduo que se vê capaz de analisar e validar ou não seus pensamentos com a realidade que se impõe a todos. Se a pessoa não se acha mais capaz, como pessoa, de autonomia, pela lógica inexorável do fato teremos uma pessoa que não é capaz de se ver como canal entre si e o mundo. Essa é a doença mental que falei no começo do texto. As pessoas deixaram de perceber-se como algo real que possui correspondência com a realidade e por isso, autonomamente, são capazes de avaliar o mundo por si mesmos e tomar decisões e guiar as próprias vidas.
Essa é a típica condição da criança. Ela é incapaz de autonomia e por isso busca validar-se e a suas ações pelas dos outros, dos pais, depois dos amigos, dos mestres etc. Temos um exército de crianças que não acreditam, ou não são capazes de ver o mundo como realidade mesma. E essas crianças podem ter a idade que for, temos crianças desde cinco anos de idade até crianças com cinqüenta. Esse problema é o maior problema que enfrentamos atualmente. A perda da noção básica individual como ser autônomo. E quando isso acontece, como acontece com qualquer criança, temos a realidade moldada por histórias, que não precisam de lastro real. Conte a uma criança qualquer história e ela acreditará, se for contada por alguém que confia. Por isso a sensação de autoridade da pseudo-ciência e da mídia que temos hoje é altamente destrutiva. Ela substitui a realidade mesma por histórias e narrativas. Que por atingirem crianças, terminam por serem absorvidas como realidade mesma.
A perda da autonomia é grave e traz conseqüências desastrosas para nossa sociedade. Trazem a perda dos valores, da moral e da ética, a perda da realização humana mesma, transferida para compras, trabalho e hedonismo, e trazem o mal maior, a influência à manipulação mental descarada que ocorre atualmente em todos os níveis da sociedade por uns poucos que conhecem a regra e se aproveitam dela para levar à cabo seus planos grandiloqüentes. Estar apto a perceber tais deformações sociais e mentais generalizadas é a busca básica de qualquer pessoa que perceba a realidade como está. Qualquer um que diga que sabe como trazer a felicidade e completude para a raça humana como um todo é maluco e megalomaníaco. Podemos ao máximo trazer alguns poucos esclarecimentos e uns caminhos incertos para a realização individual do ser, nunca da raça inteira, do povo inteiro, nem de toda nação. Salvar o planeta, salvar todas as crianças, salvar todas as mulheres, salvar todos os gays, salvar todos os árabes, salvar todos os judeus, salvar todas as baleias, salvar todos os negros etc., só pode ser piada de mal gosto e é, mas assim não é percebida pela maioria que não acha nada, o que é pior do que achar alguma coisa. Mas isso também é sintoma da doença mental, a perda constante de individualidade, de poder, de autonomia, de capacidade de crescimento e resolução dos próprios problemas. Perceber isso já é o grande passo para amadurecer, a criança só cresce da primeira vez que se vê como criança e logo busca crescer para ser adulto.
Mas se as pessoas sofrem de um mal e eu me considero normal, por que diabos eu não acho que isso pode ser um sinal de grandiloqüência? Pelo simples fato de que não acho que sou exemplo para ninguém, não devem seguir o meu caminho, não quero que ninguém seja como eu sou e acho que se alguém se espelhar em mim para se desenvolver só pode ser um burro. Depois que percebi isso em meu íntimo é que tive a certeza de que não sou egocêntrico nem megalomaníaco. E consequentemente consegui enxergar mais claramente a realidade. Quando eu consegui enxergar mais claramente a realidade é que por tabela eu descobri o mal dos outros. Eles são incapazes de enxergar mais claramente a realidade.
De fato a ignorância não tem começo, ela é infinita e persistente. Todos os homens nascem ignorantes, igualmente ignorantes. Essa condição é natural e não precisa ter início, pois é a própria condição manifestada na realidade. Assim o bebê passa anos e anos para aprender a separar e dividir a realidade em pedaços, pedaços reconhecíveis, pedaços reconhecíveis que possuem ligações, pedaços reconhecíveis que possuem ligações e se repetem e são capazes de identificação. Isso em relação a todos os sentidos, a sensação ao tocar uma árvore vai se repetir, a resposta ao chorar vai se repetir, e assim por diante. Anos é o tempo que leva para que uma criança ganhe noção de profundidade, tridimensionalidade e capacidade de abstração. Basta ver qualquer bebê em sua plena forma desengonçada e destrambelhada para saber o que é isso instantaneamente.
Graças aos erros próprios e, em parte, à condução dos adultos a criança passa por essa fase incólume. E quando possui um sendo mais estável do mundo, em um processo paralelo ao outro, ela começa a falar. A fala é a conquista por natureza da criança, que vai aprender na marra a separação da realidade e sua nomeação. Se começa com papi e mami, ela em pouco tempo vai saber que existe ventilador, cama, garfo, papinha, e com o tempo vai ganhar a noção de amor, morte, doença, perigo etc. A criança aprende tudo isso na terapia de choque, ou ela aprende ou perece. E esquecemos rapidamente que ela demora anos e anos, no mínimo uns 6 anos para aprender e dominar completamente o idioma e conseguir captar grande parte da realidade. Mas mesmo assim ainda nessa idade a criança não sabe o que é morte.
Eis que continuando nessa descrição vamos terminar o crescimento de um novo ser humano apenas lá pelos 15 anos. E teremos um novo ser formado completamente aos 20. Essa era minha idéia básica, aos 20 anos mais ou menos foi quando tomei consciência da vida mesma e comecei a trilhar meu caminho particular de aprendizagem, busca e desenvolvimento. Quando passei, anos depois, a ver a realidade mais claramente percebi que nossos jovens de 20 anos estão infantilizados. Eles não conseguem perceber o mundo de maneira que um ser humano de 20 anos deveria ver, mas enxerga a realidade através de olhos totalmente deturpados. Cheios de vícios. Quando na verdade o ser humano deveria ter toda a base livre de vícios maiores para começar a desenvolver um trabalho sério, é exatamente o que hoje é o ápice da desenvoltura e por ali fica a coisa toda. Devemos lembrar que comparativamente, aqui em uma hipótese por mim formulada que deve ser considerada livremente, podemos comprar uma criança de 14 anos de dois séculos atrás como estando no mesmo nível intelectual de nossos jovens de 20 hoje.
Isso para falar em termos de início de uma existência minimamente satisfatória. Se olharmos nos consultórios de análise e psiquiatria hoje veremos que a maioria das pessoas não possuem problemas patológicos, mas simplesmente são arrastadas aos consultórios por simples carência emotiva e desestrutura interna para manter-se como um adulto. Ou seja, temos um exército de adultos que são infantis ainda em suas vidas internas. Constatando isso não é espanto algum ver hoje em dia pais, mães, filhos e/ou filhas muitas vezes como amigos e companheiros. A distância mental é tão pequena entre os dois que eles conseguem esse nível de aproximação, quebrando toda a corrente hierárquica necessária à educação do ser humano. Toda a falta e carência que uma mente pode sentir está à mostra para pesquisas nos adultos de hoje em dia. E principalmente nos jovens que serão adultos daqui a algum tempo.
Isso repercute em todos os níveis da vida social. Crianças são histéricas, inseguras, procuram a confirmação e comprovação de que estão certas em ídolos e figuras paternalistas. O pai é o símbolo, ou era, ou cada vez é menos, de referência do filho, a mãe é outro símbolo equivalente. O casal, cada um com sua parcela na construção do novo ser, quando hierarquicamente consolidado é um pilar na qual o filho irá se apoiar para lá chegar um dia. Quando os pais já são meros escombros de vigas retorcidas e colunas deformadas, não há mais apoio algum no qual o filho irá utilizar, e muitas vezes, estando no mesmo nível, haverá apoio mútuo de mesmo nível, o que é lamentável tanto para a consolidação dos pais, como para o crescimento da criança.
Essa forma de existir que hoje se espalha rapidamente por todas as camadas sociais, é um sintoma direto da falta de desenvolvimento interno de cada ser humano. Todos sabemos que um ser humano carente, que carece de algo, ou de tudo, é inseguro. Quem é inseguro procurará confirmações e apoio onde encontrar um pilar que ache íntegro. Se não houver tal pilar em sua vida toda a moral, todos os valores, todos os atos, forma de pensar e perceber o mundo serão relativizados. É como o estudante que possui toda a biblioteca mundial para estudar, mas não tem instrução de ninguém, tendo que sozinho ir lendo e buscando suas fontes de informação. Se toda a literatura e todos os livros filosóficos, científicos e de todos os tipos lá estiverem a chance que ele se perca no caminho e crie uma idéia absolutamente errada do mundo é enorme. Assim acontece hoje em dia. Mas o principal é que as obras mais significativas, as experiências mais enriquecedoras, não estão disponíveis ao grande público. Toda a literatura, cinema, todas as artes, os estudos, a ciência que está disponível para o grande público é da mais rasteira. Mas isso é evidente, como ensinar a uma criança um pensamento profundo, uma teoria elaborada, o método científico rigoroso? Não é possível.
Nesse momento reduz-se o mundo num círculo vicioso automático. Se as mentes estão mais fracas vamos relativizar e amenizar o estudo e os modos de compreender o mundo. E assim sucessivamente até o entorpecimento geral da mente humana em todos os níveis. Isso seria trágico por si só se fosse uma reação natural histórica da raça humana. Mas é, nesse caso, enraivecedor, pois o plano todo é orquestrado por uns poucos. O nível intelectual global tem caído profundamente nas últimas décadas. O engraçado é que era para ter crescido vertiginosamente. Qualquer trabalho literário e intelectual só pode ter lugar em sociedades confortáveis. Sociedades em que o nível de conforto atingiu um patamar tal que propicia a transferência de trabalhos braçais e de lutas constantes ao ócio individual. Deparamo-nos com um problema gigantesco aqui. Temos o nível de conforto mais elevado desde o surgimento da raça humana e ao mesmo tempo temos a derrocada do nível intelectual. Não digo que a produção deixou de existir. Nossos mercados editoriais crescem. Mas o lixo que é produzido e cada vez maior e a literatura de merda que existe é infinitamente superior a alta literatura.
Qualquer ser humano com 20 anos de idade que conviveu em uma sociedade minimamente desenvolvida sabe que se ouvir um homem o aconselhando a pular de uma ponte para ser feliz vai saber que o que o sujeito diz é errado, por rápida impressão interna. Mas isso atualmente não se dá ao fato de que viver é melhor que morrer, mas simplesmente que o fato de morrer por alguma coisa maior foi simplesmente tirado do imaginário popular. A vontade individual foi minada de todas as maneiras. É impensável hoje alguém decidir algo autonomamente se isso vai contra o consenso popular de nascer-estudar-trabalhar-morrer. Aliado a esse fato temos o direito à felicidade, que é um expressão totalmente sem sentido e absolutamente vazia. A felicidade não chega através de luta, trabalho, suor nem nada disso, é um estado alcançado mais pela contingência que pelo plano elaborado, aliás somente pela contingência. Pascal Bruckner sintetizou de forma magistral esse pensamento nessa frase: “nós constituímos as primeiras sociedades a tornar pessoas infelizes por não serem felizes.”
A condição humana é ser infeliz, é ter momentos de angústia, desilusão, tristeza e lamento. Essa é a nossa condição básica, nascemos ignorantes, pelados e famintos. Somos por definição seres que alçam vôo sobre as misérias. Através do trabalho, da luta individual, do crescimento interno, do desenvolvimento dos valores, da consolidação da mente sobre o corpo. Mas todo esse trabalho não nos leva à felicidade, mas a realização humana. Muitas das vezes é trabalhosa e estafante. E na grande maioria não há felicidade em comer, dormir, trabalhar e se manter. Essas coisas básicas trazem a tranqüilidade para ser humano de forma mais plena. Quem tem comida diariamente, uma cama para dormir, possui saúde e família não deve por isso ficar feliz automaticamente, mas simplesmente perceber que possui todas as necessidades básicas satisfeitas e que a partir dali pode buscar uma completude maior. Hoje em dia, talvez, a única coisa pela qual as pessoas lutassem com a própria vida seriam seus filhos, mas uma reduzida parcela da população, a maioria bradaria por uma melhor gestão governamental enquanto culpa meio mundo pelas mazelas.
O senso individual foi perdido e com isso perdeu-se a unidade interna do indivíduo que se vê capaz de analisar e validar ou não seus pensamentos com a realidade que se impõe a todos. Se a pessoa não se acha mais capaz, como pessoa, de autonomia, pela lógica inexorável do fato teremos uma pessoa que não é capaz de se ver como canal entre si e o mundo. Essa é a doença mental que falei no começo do texto. As pessoas deixaram de perceber-se como algo real que possui correspondência com a realidade e por isso, autonomamente, são capazes de avaliar o mundo por si mesmos e tomar decisões e guiar as próprias vidas.
Essa é a típica condição da criança. Ela é incapaz de autonomia e por isso busca validar-se e a suas ações pelas dos outros, dos pais, depois dos amigos, dos mestres etc. Temos um exército de crianças que não acreditam, ou não são capazes de ver o mundo como realidade mesma. E essas crianças podem ter a idade que for, temos crianças desde cinco anos de idade até crianças com cinqüenta. Esse problema é o maior problema que enfrentamos atualmente. A perda da noção básica individual como ser autônomo. E quando isso acontece, como acontece com qualquer criança, temos a realidade moldada por histórias, que não precisam de lastro real. Conte a uma criança qualquer história e ela acreditará, se for contada por alguém que confia. Por isso a sensação de autoridade da pseudo-ciência e da mídia que temos hoje é altamente destrutiva. Ela substitui a realidade mesma por histórias e narrativas. Que por atingirem crianças, terminam por serem absorvidas como realidade mesma.
A perda da autonomia é grave e traz conseqüências desastrosas para nossa sociedade. Trazem a perda dos valores, da moral e da ética, a perda da realização humana mesma, transferida para compras, trabalho e hedonismo, e trazem o mal maior, a influência à manipulação mental descarada que ocorre atualmente em todos os níveis da sociedade por uns poucos que conhecem a regra e se aproveitam dela para levar à cabo seus planos grandiloqüentes. Estar apto a perceber tais deformações sociais e mentais generalizadas é a busca básica de qualquer pessoa que perceba a realidade como está. Qualquer um que diga que sabe como trazer a felicidade e completude para a raça humana como um todo é maluco e megalomaníaco. Podemos ao máximo trazer alguns poucos esclarecimentos e uns caminhos incertos para a realização individual do ser, nunca da raça inteira, do povo inteiro, nem de toda nação. Salvar o planeta, salvar todas as crianças, salvar todas as mulheres, salvar todos os gays, salvar todos os árabes, salvar todos os judeus, salvar todas as baleias, salvar todos os negros etc., só pode ser piada de mal gosto e é, mas assim não é percebida pela maioria que não acha nada, o que é pior do que achar alguma coisa. Mas isso também é sintoma da doença mental, a perda constante de individualidade, de poder, de autonomia, de capacidade de crescimento e resolução dos próprios problemas. Perceber isso já é o grande passo para amadurecer, a criança só cresce da primeira vez que se vê como criança e logo busca crescer para ser adulto.
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Cavaleiro do Templo