A quase totalidade das pessoas que conheço nas classes opinantes jamais dedicou um só minuto a examinar os meios e critérios da busca da verdade – seja no sentido mais geral e filosófico da coisa, seja no que se refere à veracidade dos meros fatos que se alegam, na mídia e nas conversas do dia a dia, como provas disto ou daquilo.
Mesmo estudantes de filosofia, quando a obrigação curricular os força a um contato epidérmico com o assunto, não absorvem dele senão as crenças da moda – marxista, desconstrucionista, neopragmatista –, não as usando jamais como pontos de partida para uma investigação moralmente responsável, mas como travesseiros fofos onde podem acomodar-se, sem nenhum problema de consciência, nas reconfortantes certezas usuais do seu meio social.
Não por coincidência, são esses mesmos os que com maior freqüência apelam ao chavão da incerteza geral e da inexistência da verdade, não porque tenham algum dia buscado essa verdade sem encontrá-la, mas precisamente para dispensar-se de buscá-la.
Outro dia, em debate num blog, uma senhorita formada nessa mentalidade despejava sobre os interlocutores seu olímpico desprezo pelas “teorias conspiratórias que buscam um verniz de ‘cientificidade’, ao mesmo tempo que não se submetem às regras do discurso científico, como peer-reviewing.”
Peer-reviewing, “revisão pelos colegas”, é uma regra da publicação de trabalhos científicos em revistas especializadas, não uma regra do próprio discurso científico. Pode ser uma condição sociológica do progresso da ciência, não um componente interno da lógica científica. Milhares de peer-reviews não garantem a cientificidade de um discurso, nem a impugna a completa falta deles, porque aquilo que se entende por “científico” é um certo nexo lógico entre premissas factuais, processos de demonstração, critérios de verificação e resultados obtidos – algo que tem de ser dado na própria estrutura do raciocínio proposto e não pode ser-lhe acrescentado de fora. A revisão por especialistas pode confirmar ou impugnar a presença desses elementos num trabalho científico, mas, a partir do momento em que ela própria se transmuta em “regra do discurso científico”, a noção mesma de discurso científico perde toda substância própria e se dissolve na mera aprovação coletiva de um grupo social. A confusão entre o discurso científico e as condições sociológicas da sua aceitação por esta ou aquela comunidade acadêmica reflete uma visão infantil, concretista, místicóide, fetichista do que seja a ciência. Essa visão é a base sobre a qual se erigem não só alguns dos mitos mais queridos do ativismo acadêmico contemporâneo, como o aquecimento global, o holismo ecológico, as teorias da “exclusão social”, a superpulação ou as eternas causas econômicas da criminalidade, como também o simulacro de autoridade com que os grupos interessados impõem, sob a alegação desses mitos, as políticas que bem lhes interessam. Essas políticas podem ter os resultados sociais mais variados – quase invariavelmente nefastos –, mas pelo menos um desses resultados é constante e infalível: o acréscimo do poder social da classe acadêmica.
Como a opinião da mídia, formada nas mesmas fontes, segue de perto a da comunidade acadêmica, a conjugação de poderes dá a esses dois pilares da ortodoxia contemporânea uma autoridade controladora, inibidora e repressora incomparavelmente mais vasta que a do alto clero católico na Idade Média, com o agravante de que seu exercício não é tolhido por nenhuma consciência de culpa ante um Deus transcendente e invisível. Se acompanharmos a história da formação da doutrina cristã ao longo da sucessão dos concílios, veremos que é uma história marcada por polêmicas apaixonadas, violentas até, que se estendiam por décadas e por séculos antes que uma decisão papal lhes pusesse fim. Nada de semelhante existe na universidade atual, onde a condenação das heresias não vem ao término de um longo processo de discussão, como na Igreja, mas já vem pronta desde o começo, proibindo e impossibilitando a discussão e expelindo do meio social os discordes e recalcitrantes. E a repressão totalitária não se exerce só sobre teorias científicas, mas até sobre meras opiniões políticas. Experimente negar abertamente o evolucionismo, o aquecimento global, a superioridade moral do socialismo ou as virtudes salvíficas de Barack Hussein Obama – e veja quantos minutos transcorrem antes que suas verbas de pesquisa sequem ou seu emprego vá diretamente para o beleléu.
Isso não significa, é claro, que sempre a força repressiva se esteie na opinião da maioria. Um grupo relativamente pequeno pode controlar facilmente os mecanismos de publicação e, justamente através da peer-review, impor ou vetar o que bem entenda. Recentemente, um grupo de 52 cientistas subscreveu um apelo urgente da ONU em favor de medidas drásticas para controlar o “aquecimento global”. O documento foi contestado por nada menos de 650 cientistas, para os quais o aquecimento global é apenas uma farsa montada para juntar dinheiro e poder político. Adivinhem qual das duas correntes tem mais fácil acesso às publicações acadêmicas. A ex-pesquisadora da Nasa, dra. Dr. Joanne Simpson, signatária do manifesto dos 650, até explicou que agora podia falar a verdade porque já não estava ligada a nenhuma organização científica nem dependia de verbas de pesquisa (v.http://epw.senate.gov/public/index.cfm?FuseAction=Minority.Blogs&ContentRecord_id=2158072e-802a-23ad-45f0-274616db87e6).
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