Mente, Materialismo e o destino do Homem
AS PRIMEIRAS CINCO CONFERÊNCIAS NESTA SÉRIE tratarão sobre filosofia, não sobre economia. A filosofia é importante porque todos nós, tenhamos ou não consciência desse fato, possuímos uma filosofia definida, e suas idéias filosóficas orientam suas ações.
A filosofia de hoje é a de Karl Marx [1818-1883]. Ele é a personalidade mais poderosa da nossa época. Karl Marx e as idéias de Karl Marx -- idéias que ele não inventou, desenvolveu, ou melhorou, mas que ele combinou num sistema -- são amplamente aceitas hoje, mesmo por muitos que enfaticamente se declaram anticomunistas e antimarxistas. Sem saber, muitas pessoas são filosoficamente Marxistas, embora utilizem nomes diferentes para suas idéias filosóficas.
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Marxistas hoje falam de Marxismo-leninismo-estalinismo. Volumes são escritos hoje na Rússia sobre as contribuições de [Vladimir Ilyich] Lênin [1870-1924] e [Josef] Stalin [1879-1953]. No entanto, o sistema permanece o que era nos tempos de Karl Marx; o Marxismo está de fato petrificado. Lênin contribuiu somente com injúrias muito fortes contra seus adversários; Stalin não contribuiu nada. Assim, é duvidoso chamar quaisquer destas contribuições de "nova", quando nós percebemos que a contribuição mais importante de Marx para sua filosofia foi publicada em 1859. (1)
Leva muito tempo para idéias conquistarem o mundo. Quando o Marx morreu em 1883, o nome dele era em geral desconhecido. Alguns jornais relataram em um par de linhas que Karl Marx, autor de vários livros, tinha morrido. Eugen von Böhm-Bawerk [1851-1914] publicou (2) uma crítica sobre as idéias econômicas de Marx em 1896, mas foi somente 20 anos depois que as pessoas começaram a considerar Marx um filósofo.
As idéias de Marx e de sua filosofia realmente dominam nossa época. A interpretação dos eventos atuais e a interpretação da história em livros populares, bem como nos escritos filosóficos, novelas, peças de teatro, e assim sucessivamente, são geralmente Marxistas. No centro está a filosofia Marxista da história. Desta filosofia é tomado emprestado o termo "dialético", que é aplicado a todas suas idéias. Mas isso não é tão importante como é compreender o que materialismo marxista significa.
Materialismo tem dois sentidos diferentes. O primeiro refere-se exclusivamente aos problemas éticos. Um homem material só está interessado em coisas materiais -- comida, bebida, abrigo -- não em arte, cultura, e assim sucessivamente. Nesse sentido a maioria dos homens é materialista. O segundo sentido do materialismo refere-se a um grupo especial de soluções sugeridas para um problema básico da filosofia -- a relação entre a mente humana ou espírito de um lado, e o corpo humano e suas funções fisiológicas do outro lado. Diversas respostas foram oferecidas a este problema -- entre elas as respostas religiosas. Nós sabemos muito bem que existe uma conexão entre corpo e mente; a medicina provou que determinados danos ao cérebro provocam algumas mudanças no funcionamento da mente humana. Porém, os materialistas deste segundo grupo explicam todas as manifestações da mente humana como produtos do corpo.
Entre estes materialistas filosóficos, existem duas correntes de pensamento:
A. Uma escola que considera o homem como uma máquina. Este grupo diz que estes problemas são muito simples -- a “máquina” humana funciona exatamente como qualquer outra máquina. Um Francês, Julien de La Mettrie [1709–1751], escreveu o livro que contém esta idéia, Man, the Machine; e hoje muitas pessoas ainda querem explicar todas as operações da mente humana, direta ou indiretamente, como se fossem operações mecânicas. Por exemplo, veja a Enciclopédia de Ciências Sociais. (Encyclopedia of the Social Sciences) Um dos colaboradores, professor na New School for Social Research, diz que a criança recém-nascida é como um carro Ford, pronto para funcionar. Talvez! Mas uma máquina, um Ford recém-fabricado, não funciona por si só. Uma máquina não realiza nada, não faz nada sozinha -- sempre são os homens ou um certo número de homens que realizam algo através da máquina. Alguém precisa ativar a máquina. Se a atividade do homem cessar, a atividade da máquina também cessa. Nós temos que perguntar para este professor daNew School for Social Research, “Quem ativa a máquina?”. A resposta destruiria a doutrina materialista da máquina.
Às vezes as pessoas falam sobre "alimentar" a máquina, como se estivesse viva. Mas, evidentemente, não está. Em seguida, às vezes as pessoas também afirmam que a máquina sofreu um "colapso nervoso". Mas como um objeto sem nervos pode sofrer um colapso nervoso? Está teoria “maquinista” foi repetida várias vezes, mas não é muito realista. Nós não temos que lidar com isto porque nenhum homem sério realmente acredita nisto.
B. A teoria fisiológica proposta pela segunda classe dos materialistas é mais importante. Esta teoria foi formulada originalmente por Ludwig Feuerbach [1804-1872] e Karl Vogt [1817-1895] nos primeiros dias de Karl Marx. Esta idéia dizia que os pensamentos e as idéias são "simplesmente" secreções do cérebro. (Nenhum filósofo materialista nunca deixou de usar a palavra "simplesmente". Que significa, “eu sei, mas eu não posso explicar”). Hoje os cientistas sabem que determinadas condições patológicas causam certas secreções, e que essas secreções causam determinadas atividades no cérebro. Mas estas secreções são quimicamente as mesmas para todas as pessoas na mesma situação e condição. Contudo, idéias e pensamentos não são as mesmas para todas as pessoas na mesma situação e condição; elas são diferentes.
Primeiro, idéias e pensamentos não são tangíveis. E segundo, os mesmos fatores externos não produzem a mesma reação em todo mundo. Uma maçã caiu uma vez de uma árvore e bateu num certo jovem [Isaac Newton]. Isto pode ter acontecido a muitos outros jovens antes, mas este acontecimento particular desafiou este jovem particularmente e ele desenvolveu algumas idéias disto.
Mas as pessoas nem sempre têm os mesmos pensamentos quando elas presenciam os mesmos fatos. Por exemplo, na escola alguns aprendem; outros não. Há diferenças nos homens.
Bertrand Russell [1872-1970] perguntou, “Qual é a diferença entre os homens e as pedras?” Ele disse que não havia nenhuma diferença, a não ser que os homens reagem a mais estímulos que as pedras. Mas na verdade há uma diferença. Pedras reagem de acordo com um padrão definido que nós podemos conhecer; podemos prever o que acontecerá a uma pedra se ela for tratada de uma determinada forma. Mas nem todos os homens reagem da mesma forma quando são tratados de determinada maneira; nós não podemos estabelecer tais categorias de ações para homens. Assim, embora muitas pessoas pensem que materialismo fisiológico é uma solução, na verdade conduz a um beco sem saída. Se realmente fosse a solução para este problema, isso significaria que, em qualquer caso, nós poderíamos saber como todos reagiriam. Não podemos sequer imaginar quais seriam as conseqüências se todo mundo soubesse o que todos os outros iriam fazer.
Karl Marx não era um materialista no primeiro sentido -- o sentido “maquinista”. Mas a idéia fisiológica era muito popular na sua época. Não é fácil saber exatamente o que influenciou Marx porque ele odiava algumas pessoas e de outras tinha inveja. Karl Marx odiava Vogt, o representante do materialismo fisiológico. Assim que materialistas como Vogt começaram a falar de política, Karl Marx disse que eles tinham idéias ruins; isso significava que Marx não gostava delas.
Marx desenvolveu o que ele pensava ser um novo sistema. De acordo com sua interpretação materialista da história, as “forças produtivas materiais" (esta é uma tradução exata do Alemão) são as bases de tudo. Cada etapa das forças produtivas materiais corresponde a uma fase definida de relações de produção. As forças produtivas materiais determinam as relações de produção, isto é, o tipo de possessão e propriedade que existem no mundo. E as relações de produção determinam a superestrutura. Na terminologia de Marx, capitalismo ou feudalismo são relações de produção. Cada um destes foi necessariamente produzido por uma fase particular das forças produtivas materiais. Em 1859, Karl Marx disse que uma nova fase das forças produtivas materiais produziria o socialismo.
Mas o que são estas forças produtivas materiais? Da mesma forma que Marx nunca disse o que era uma "classe", ele nunca disse exatamente o que são as "forças produtivas materiais”. Após analisar suas obras nós descobrimos que as forças produtivas materiais são as ferramentas e as máquinas. Num de seus livros [Misère de la philosophie — A miséria da Filosofia], escrito em Francês em 1847, Marx afirma que “a fábrica manual produz o feudalismo – a fábrica a vapor produz o capitalismo.” (3) Ele não disse isto neste livro, mas em outras obras ele escreveu que surgiriam outras máquinas que iriam produzir o socialismo.
Marx tentou arduamente evitar a interpretação geográfica do progresso, porque isso já havia caído em descrédito. O que ele disse foi que as "ferramentas" eram a base de progresso. Marx e [Friedrich] Engels [1820-1895] acreditavam que novas máquinas seriam desenvolvidas e que elas conduziriam ao socialismo. Eles alegravam-se com as novas máquinas, pensando que isso significava que o socialismo estava próximo. No livro Francês de 1847, ele criticou aqueles que davam importância à divisão do trabalho; ele afirmou que as ferramentas eram importantes.
Nós não devemos esquecer que ferramentas não caem do céu. Elas são produto de idéias. Para explicar as idéias, Marx disse que as ferramentas, as máquinas -- as forças produtivas materiais -- se refletem nos cérebros dos homens e assim as idéias surgem. Mas as ferramentas e as máquinas são, elas mesmas, o produto das idéias. Além disso, antes de existir máquinas, deve existir a divisão do trabalho. E antes de existir a divisão do trabalho, idéias definidas precisam ser desenvolvidas. A origem destas idéias não pode ser explicada por algo que só é possível numa sociedade, que é, ela mesma, produto de idéias.
O termo "materiais" fascinou as pessoas. Para explicar mudanças em idéias, mudanças em pensamentos, mudanças em todas essas coisas que são os produtos de idéias, Marx os reduziu a mudanças em idéias tecnológicas. Nisto ele não era original. Por exemplo, Hermann Ludwig Ferdinand von Helmholtz [1821–1894] e Leopold von Ranke [1795-1886] interpretaram a história como a história da tecnologia.
É tarefa da história explicar por que determinadas invenções não foram postas em prática por pessoas que tiveram todo o conhecimento físico requerido para sua construção. Por que, por exemplo, os antigos gregos, que tiveram o conhecimento técnico, não desenvolveram estradas de ferro?
Assim que uma doutrina se torna popular, ela é simplificada de tal forma que permita a compreensão das massas. Marx dizia que tudo depende das condições econômicas. Como declarou em seu livro Francês [A miséria da Filosofia] de 1847, ele entende que a história das fábricas e ferramentas desenvolveram-se independentemente. Segundo Marx, todo o movimento da história humana aparece como conseqüência natural do desenvolvimento das forças produtivas materiais, as ferramentas. Com o desenvolvimento das ferramentas, a estrutura da sociedade muda e, conseqüentemente, tudo o mais muda também. Por tudo o mais, ele quis dizer a superestrutura. Autores Marxistas, escrevendo depois de Marx, explicaram tudo na superestrutura como resultado de mudanças definitivas nas relações da produção. E eles explicaram tudo nas relações de produção como resultado das mudanças nas ferramentas e máquinas. Isto foi uma vulgarização, uma simplificação, da teoria marxista. Marx e Engels não foram completamente responsáveis por isso. Eles criaram muitas tolices, mas eles não são responsáveis por toda a tolice de hoje.
Qual é a influência desta teoria marxista sobre as idéias? O filósofo René Descartes [1596-1650], que viveu no início do século XVII, acreditava que o homem tinha uma mente e que o homem pensa, mas que os animais eram simplesmente máquinas. Marx afirmou, naturalmente, que Descartes viveu numa época em que a "Manufakturperioden", as ferramentas e máquinas, eram tais que ele foi forçado a explicar sua teoria afirmando que os animais eram máquinas. Albrecht von Hailer [1708-1777], um Suíço, afirmou a mesma coisa no século XVIII (ele não gostava da igualdade perante a lei dos governos liberais). Entre estes dois homens, viveu La Mettrie, que também explicou homem como uma máquina. Portanto, o conceito de Marx, de que as idéias eram um produto das ferramentas e máquinas de uma determinada época, é facilmente refutado.
John Locke [1632-1704], o conhecido filósofo do empirismo, declarou que tudo na mente do homem provém da experiência dos sentidos. Marx afirmou que John Locke era um porta-voz da doutrina classista da burguesia. Isto conduz a duas deduções diferentes das obras de Karl Marx: (a) A interpretação que ele deu a respeito de Descartes é que ele vivia numa época em que as máquinas foram introduzidas e, portanto, Descartes explicou o animal como uma máquina; e (b) A interpretação que ele deu a respeito da inspiração de John Locke -- que ela veio do fato de que ele era um representante dos interesses classistas dos burgueses. Aqui estão duas explicações incompatíveis para a origem das idéias. A primeira destas duas explicações, no sentido de que as idéias são baseadas em forças produtivas materiais, as ferramentas e máquinas, é inconciliável com a segunda, a saber, que os interesses de classe determinam as idéias.
Segundo Marx, todos são forçados -- pelas forças produtivas materiais -- a pensar de tal maneira que o resultado mostre seus interesses de classe. Você pensa da forma que seus "interesses" forçam você pensar; você pensa de acordo com seus “interesses” de classe. Seus “interesses” são algo independente da sua mente e suas idéias. Seus “interesses” existem no mundo além de das suas idéias. Conseqüentemente, a produção de suas idéias não é nenhuma verdade. Antes da aparição de Karl Marx, a noção de verdade não tinha qualquer significado para todo o período histórico. O que o pensamento das pessoas produziu no passado sempre foi "ideologia", não verdade.
“Les idéologues” na França foram bem advertidos por Napoleão [1769–1821], que disse que tudo ficaria bem na França exceto para os “idéologues”. Em 1812, Napoleão foi derrotado. Ele deixou o exército na Rússia, retornou só, incógnito, e apareceu em de dezembro de 1812 em Paris. Ele jogou a culpa dos males que aconteceram ao seu país sobre os maus "idéologues", que influenciaram o país.
Marx usou ideologia num sentido diferente. Segundo Marx, ideologia era um pensamento doutrinário produzido por membros de uma classe. Estas doutrinas necessariamente não eram verdades, mas somente as expressões dos interesses classistas. Naturalmente, um dia haverá uma sociedade sem classes. Uma classe -- a classe proletária -- prepara o caminho para a sociedade sem classes. A verdade de hoje é a idéia dos proletários. Os proletários abolirão todas as classes e então virá a Idade Dourada, a sociedade sem classes.
Marx chamava Joseph Dietzgen [1828–1888] de proletário, mas Marx o teria chamado de pequeno-burguês se soubesse mais sobre ele. Oficialmente Marx aprovou todas as idéias de Dietzgen, mas em sua correspondência privada com Ferdinand Lassalle [1825-1864] ele expressou alguma discordância. Não existe lógica universal. Cada classe possui sua própria lógica. Mas, evidentemente, a lógica do proletariado é a verdadeira lógica do futuro. (Estas pessoas ficaram ofendidas quando os racistas assumiram as mesmas idéias, alegando que as diferentes raças possuem diferentes lógicas, mas a lógica dos Arianos é a verdadeira lógica) [[ Nota endireitar.org: sobre esse mesmo assunto ver o artigo Polilogismo: Karl Marx e os Nazistas ]].
A sociologia do conhecimento de Karl Mannheim [1893–1947] se desenvolveu das idéias de Hitler. Todo o mundo pensa em ideologias -- i.e., falsas doutrinas. Mas há uma classe de homens que desfruta de um privilégio especial -- Marx os denominou "intelectuais não-engajados". Estes "intelectuais não-engajados" possuem o privilégio de descobrir verdades que não são ideologias.
A influência dessa idéia de “interesses” é enorme. Em primeiro lugar, é importante lembrar que esta doutrina não afirma que os homens agem e pensam de acordo com o que eles consideram ser seus próprios interesses. Em segundo lugar, recorde que ela considera os “interesses” como independentes dos pensamentos e idéias dos homens. Estes interesses independentes obrigam os homens a pensar e agir de uma forma definida. Como um exemplo da influência que esta idéia possui sobre nosso pensamento hoje, eu poderia mencionar um Senador Americano -- não é um Democrata -- que afirmou que as pessoas votam de acordo com seus “interesses”; ele não disse de acordo com o que eles pensam ser seus interesses. Esta é a idéia de Marx -- assumindo que "interesses" são algo definido e além das idéias de uma pessoa. Esta idéia de doutrina de classe foi primeiramente desenvolvida por Karl Marx no Manifesto Comunista.
Nem Engels, nem Marx eram do proletariado. Engels era muito rico. Ele caçava raposas em um casaco vermelho -- este era o passatempo dos ricos. Teve uma namorada que ele considerava demasiado abaixo dele para pensar em se casar. Ela morreu, e a irmã dela se tornou sua sucessora. Casou-se finalmente com a irmã, mas somente quando ela estava morrendo -- somente dois dias antes de sua morte.
Karl Marx nunca ganhou muito dinheiro por si mesmo. Ele recebeu algum dinheiro como colaborador regular do jornal The New York Tribune. Mas ele foi sustentado quase completamente por seu amigo Engels. Marx não era um proletário; ele era o filho de um próspero advogado. Sua esposa, a Sra. Karl Marx [Jenny von Westphalen, 1814–1881], era a filha de um alto Junker prussiano. E o cunhado de Marx era o chefe da polícia prussiana.
Assim, estes dois homens, Marx e Engels, que reivindicaram que a mente proletária era diferente da mente da burguesia, estavam numa posição embaraçosa. Então eles incluíram uma passagem no Manifesto Comunista para explicar: “Quando o tempo chegar, alguns membros da burguesia se unirão às classes emergentes”. Porém, se alguns homens conseguem se livrar da lei de interesses de classe, então a lei não é mais uma lei geral.
A idéia de Marx era que as forças produtivas materiais conduzem os homens de uma fase para outra, até eles alcançarem o socialismo, que é o fim e o ápice de tudo. Marx disse que o socialismo não pode ser planejado com antecedência; a história cuidará dele. Na visão de Marx, esses que afirmam como o socialismo funcionará são apenas “utópicos”.
O Socialismo já estava intelectualmente derrotado no tempo que Marx escreveu. Marx contestava seus críticos afirmando que aqueles que estavam em oposição eram somente “burgueses”. Ele afirmou que não era necessário derrotar os argumentos dos seus oponentes, mas somente desmascarar sua origem burguesa. E como sua doutrina não passava de ideologia burguesa, não era necessário lidar com isto. Isto deveria significar que nenhum burguês pudesse escrever alguma coisa a favor do socialismo. Assim, todos escritores estavam ansiosos para provar que eles eram proletários. Também seria oportuno mencionar neste momento que o precursor do socialismo francês, Saint-Simon (4), era descendente de uma famosa família de duques e condes.
Simplesmente não é verdade que as invenções se desenvolvem porque as pessoas procuram finalidades práticas e não por verdades.
Quando Marx publicou suas obras, o pensamento alemão era dominado por George Wilhelm Friedrich Hegel [1770-1831], professor na Universidade de Berlim. Hegel tinha desenvolvido a teoria da evolução filosófica da história. Em alguns aspectos suas idéias eram diferentes, até mesmo opostas, das idéias de Marx. Hegel foi o homem que destruiu o pensamento Alemão e a filosofia Alemã por mais de um século, pelo menos. Ele encontrou uma advertência em Immanuel Kant [1724-1804], que havia dito que a filosofia da história só poderia ser escrita por um homem que tivesse a coragem de fingir que vê o mundo com os olhos de Deus. Hegel acreditou que ele tinha os "olhos de Deus”, que ele conhecia o fim de história, que ele conhecia os planos de Deus. Ele disse que o Geist (Mente ou Espírito) se desenvolve e se manifesta no curso da evolução histórica. Então, o curso da história é inevitavelmente o progresso do menos satisfatório para condições mais satisfatórias.
Em 1825, Hegel disse que havíamos alcançado um estado de coisas maravilhosas. Ele considerou o reino da Prússia de Friedrich Wilhelm III [1770-1840] e a Igreja da União Prussiana (Prussian Union Church) como a perfeição do governo secular e espiritual. Marx afirmou, como Hegel, que havia história no passado, mas que não haverá mais nenhuma história quando nós alcançarmos um estado que é satisfatório. Assim, Marx adotou o sistema Hegeliano, embora usasse forças produtivas materiais em vez de Geist. As forças produtivas materiais passam por várias fases. A fase presente é muito ruim, mas há uma coisa em seu favor -- ela é a fase preliminar necessária para o aparecimento do estado perfeito do socialismo. E o socialismo está próximo.
Hegel foi chamado de filósofo do absolutismo prussiano. Ele morreu em 1831. Sua escola de pensamento se dividiu entre esquerda e direita. (A esquerda não gostava do governo prussiano e da Igreja da União Prussiana). Esta distinção entre a esquerda e a direita existiu desde então. No Parlamento Francês, aqueles que não gostavam do governo do rei estavam sentados no lado esquerdo do plenário da assembléia. Hoje ninguém quer sentar à direita.
Originalmente, isto é, antes de Karl Marx, o termo "direita" referia-se aos partidários do governo representativo e liberdades civis, como o oposto da "esquerda" que favorecia ao absolutismo real e a ausência de direitos civis. O aparecimento das idéias socialistas alterou o significado destes termos. Alguns da "esquerda" foram sinceros ao expressar suas opiniões. Por exemplo, Platão [427-347 AC] era honesto ao declarar que um filósofo deveria governar. E Augusto Comte [1798–1857] dizia que a liberdade foi necessária no passado, uma vez que tornou possível para ele publicar seus livros, mas agora que os livros foram publicados não há qualquer necessidade de liberdade. E da mesma forma Etienne Cabet [1788-1856] falava de três categorias de livros -- os maus livros, que deveriam ser queimados; os livros intermediários, que deveriam ser corrigidos; e os "bons" livros restantes. Portanto, houve uma grande confusão quanto às liberdades civis que seriam concedidas aos cidadãos no estado socialista. Isto aconteceu porque as idéias marxistas não progrediram em países que possuíam liberdades civis, mas em países onde as pessoas não possuíam tais liberdades.
Nikolai Bukharin [1888–1938], um autor comunista que viveu em um país comunista, escreveu um panfleto em 1917 (5), no qual ele disse: nós pedimos as liberdades de imprensa, de pensamento e liberdades civis no passado porque nós estávamos na oposição e necessitávamos destas liberdades para conquistar. Agora que nós conquistamos, não existe qualquer necessidade de tais liberdades civis. [Bukharin foi julgado e condenado à morte nos expurgos dos processos Moscou em março de 1938] Se o sr. Bukharin fosse um comunista Americano, ele provavelmente ainda estaria vivo e livre para escrever mais panfletos sobre o porquê da liberdade não ser mais necessária.
Estas peculiaridades da filosofia marxista só podem ser explicadas pelo fato que Marx, embora vivesse na Grã-bretanha, não estava tratando das condições da Grã-bretanha, onde, ele acreditava, as liberdades civis já não eram necessárias, mas com as condições da Alemanha, França, Itália, e assim por diante, locais onde as liberdades civis ainda eram necessárias. Desta forma nós vemos que a distinção entre direita e esquerda, que tiveram significado na época da Revolução Francesa, já não tem qualquer significado.
Notas:
[1] A Contribution to the Critique of Political Economy (Moscow: Progress Publishers, 1859).
[2] “The Unresolved Contradiction in the Economic Marxian System” in Shorter Classics of Eugen von Böhm-Bawerk (South Holland, Ill.: Libertarian Press, 1962 [1896; Eng.Trans. 1898]), pp. 201–302.
[3] “Le moulin à bras vous donnera la société avec le souzerain; le moulin à vapeur, la société avec le capitaliste industriel.” Karl Marx, Misère de la philosophie (Paris and Brussels, 1847), p. 100.—Ed.
[4] Claude Henri de Rouvroy, Comte de Saint-Simon [1760–1825]—Ed.
[5] “The Russian Revolution and Its Significance,” The Class Struggle, Vol. I, No. 1, May–June,1917.—Ed.
Parte 2 de 2
Conflitos de Classe e Socialismo Revolucionário
MARX ASSUMIU que os "interesses" eram independentes das idéias e pensamentos humanos. Ele afirmou que o socialismo era o sistema ideal para o proletariado. Disse também que os interesses de classe determinam o pensamento dos indivíduos e que esta condição provoca conflitos irreconciliáveis entre as várias classes. Marx então voltou ao ponto inicial – isto é, o socialismo é o estado ideal.
Os conceitos de "classe" e "conflito de classe” eram fundamentais no Manifesto Comunista (1848). Mas Marx não disse o que era uma "classe". Marx morreu em 1883, 35 anos depois da publicação do Manifesto Comunista. Nesses 35 anos ele publicou muitos volumes, mas em nenhum deles ele disse o que ele queria dizer pelo termo "classe". Após a morte de Marx, Friedrich Engels publicou o manuscrito inacabado do terceiro volume de O Capital (Das Kapital). Engels disse que este manuscrito, no qual Marx tinha parado de trabalhar muitos anos antes de morrer, foi encontrado na escrivaninha de Marx depois de sua morte. Num capítulo de três páginas naquele volume, Marx nos conta o que não era uma "classe". Mas você pode procurar por todas suas obras para compreender o que era uma "classe", jamais irá encontrar. Na realidade, "classes" não existem na natureza. É o nosso pensamento – nossas classificações em categorias – que constrói classes em nossas mentes. A questão não é se as classes sociais existem no sentido de Karl Marx; a questão é se nós podemos utilizar o conceito de classes sociais na forma como Karl Marx o entendia. Nós não podemos.
Marx não viu que o problema do "interesse" de um indivíduo, ou de uma classe, não pode ser resolvido simplesmente fazendo referência ao fato que existe tal interesse e que os homens têm de agir de acordo com os seus interesses. Duas questões devem ser colocadas: (1) Para que objetivos estes "interesses" conduzem as pessoas? (2) Quais métodos elas querem aplicar para atingir estes objetivos?
A Primeira Internacional foi um pequeno grupo de pessoas, um comitê de alguns homens em Londres, amigos e inimigos de Karl Marx. Alguém sugeriu que eles cooperassem com o movimento trabalhista-sindicalista britânico. Em 1865, Karl Marx leu na reunião do Comitê Internacional um documento, Valor, Preço, e Lucro (Value, Price, and Profit), uma de suas poucas obras originalmente escritas em inglês. Neste documento, ele destacou que os métodos do movimento sindical eram muito ruins e deveriam ser modificados. Parafraseando: "Os sindicatos querem melhorar o destino dos trabalhadores no âmbito do sistema capitalista - isto é inútil e desesperado. No âmbito do sistema capitalista não há nenhuma possibilidade de melhorar o estado dos trabalhadores. O melhor que o sindicato poderia alcançar deste modo seria algum sucesso de curto prazo. Os sindicatos devem abandonar esta política 'conservadora’; eles devem adotar a política revolucionária. Eles têm que lutar pela abolição da sociedade salarial e devem trabalhar para a vinda do socialismo". Marx não teve coragem para publicar este documento enquanto estava vivo; só foi publicado depois de sua morte por uma de suas filhas. Ele não quis fazer oposição aos sindicatos; ele ainda tinha esperanças que eles abandonariam suas teorias.
Aqui está um conflito evidente de opiniões entre os proletários, relativo a que meios utilizar. Os sindicatos proletários e Marx discordaram sobre o que era o "interesse" dos proletários. Marx afirmou que o "interesse" de uma classe era óbvio – não poderia haver nenhuma dúvida quanto a isto – todos conheciam este “interesse”. Então aqui surge um homem que não pertence a esta classe proletária, um escritor e advogado que informa aos sindicatos que eles estavam errados. “Esta é uma política ruim”, ele afirmou. “Vocês precisam mudar radicalmente sua política". Aqui toda a idéia de classe é destruída, a idéia de que um indivíduo, às vezes, pode errar, mas que uma classe como um todo nunca pode errar.
Críticas às doutrinas marxistas sempre foram superficiais. Eles não mostraram como Marx se contradisse e como ele não conseguiu explicar as suas idéias. A crítica de Böhm-Bawerk [1] era boa, mas ele não cobriu o sistema inteiro. Os críticos de Marx nem mesmo descobriram as contradições mais patentes de Karl Marx.
Marx acreditou na "lei férrea dos salários". Ele aceitou isso como a base fundamental da sua doutrina econômica. Ele não gostou do termo Alemão para esta lei, a "lei de bronze" dos salários, sobre o qual Ferdinand Lassalle [1825-1864] tinha publicado um panfleto. Karl Marx e Ferdinand Lassalle não eram amigos; eles eram concorrentes, competidores muito sérios. Marx disse que a única contribuição de Lassalle foi o próprio termo, a "lei de bronze" dos salários. E que, no mais, o termo, foi emprestado, emprestado do dicionário e de Goethe [2].
A "lei férrea dos salários" ainda sobrevive em muitos livros didáticos, na mente dos políticos e, conseqüentemente, em muitas das nossas leis. De acordo com a "lei férrea dos salários", a taxa salarial é determinada pela quantidade de alimentos e outras necessidades requeridas para a preservação e reprodução da vida, para sustentar os filhos dos trabalhadores até que eles próprios possam trabalhar nas fábricas. Se as taxas salariais ficarem acima disto, o número de trabalhadores aumentaria e o aumento do número de trabalhadores derrubaria as taxas salariais novamente. Os salários não podem cair abaixo deste ponto porque haveria uma escassez de trabalho. Esta lei considera que o trabalhador é algum tipo de micróbio ou roedor sem livre escolha ou livre arbítrio.
Se você pensa que é absolutamente impossível, sob o sistema capitalista, para os salários divergirem desta taxa, como você ainda pode falar, como fez Marx, sobre o empobrecimento progressivo dos trabalhadores como sendo inevitável? Existe uma contradição insolúvel entre a idéia marxista da lei férrea das taxas salariais, segundo a qual os salários permanecerão num ponto em que eles são suficientes para sustentar os descendentes dos trabalhadores até que eles possam se tornar trabalhadores, e sua filosofia da história, que sustenta que os trabalhadores serão empobrecidos cada vez mais até serem conduzidos à insurreição aberta, provocando assim o socialismo. Evidentemente, ambas as doutrinas são insustentáveis. Mesmo 50 anos atrás, os principais escritores socialistas foram obrigados a recorrer a outros esquemas elaborados na tentativa de sustentar suas teorias. O que é surpreendente é que, durante o século desde as obras de Marx, ninguém mostrou esta contradição. E esta contradição não é a única em Marx.
O que realmente destruiu Marx foi sua idéia do progressivo empobrecimento dos trabalhadores. Marx não viu que a característica mais importante do capitalismo era a produção em grande escala para as necessidades das massas; o principal objetivo dos capitalistas é produzir para as grandes massas. Nem Marx viu que sob o capitalismo o cliente sempre tem razão. Na sua condição de assalariado, o trabalhador não pode determinar o que será feito. Mas na condição de cliente, ele é realmente o chefe e fala para o chefe dele, o empresário, o que fazer. O chefe dele deve obedecer às ordens dos trabalhadores como membros do público consumidor. A Srta. Webb [3] era a filha de um próspero homem de negócios. Como outros socialistas, pensou que o pai dela era um autocrata que dava ordens para todo mundo. Ela não viu que ele estava sujeito à soberania das ordens dos clientes no mercado. A “grande” Srta. Webb não era mais inteligente que o menino mensageiro mais bobo, que só vê que o chefe dele dá ordens.
Marx não tinha nenhuma dúvida sobre quais objetivos os homens visavam. Ele também não teve quaisquer dúvidas sobre a melhor maneira de atingir estes objetivos. Como é que um homem que leu tanto e interrompe sua leitura apenas para escrever, não percebe as discrepâncias em suas idéias?
Para responder a esta pergunta, temos que voltar para o pensamento do seu tempo. Aquele foi o tempo da Origem das Espécies [1859] de Charles Darwin. Era a moda intelectual daquela época enxergar os homens apenas do ponto de vista da sua filiação na classe zoológica dos mamíferos, que agiam com base nos instintos. Marx não levou em conta a evolução da humanidade para um o nível superior ao dos homens muito primitivos. Ele considerou o trabalho não especializado como tipo normal de trabalho e o trabalho especializado como a exceção. Num dos seus livros, ele escreveu que o progresso tecnológico na melhoria das máquinas provoca o desaparecimento dos especialistas porque a máquina pode ser operada por qualquer pessoa; não há necessidade de nenhuma habilidade especial para operar uma máquina. Portanto, o tipo normal de homem no futuro será o não especialista.
No que diz respeito a muitas de suas idéias, Marx pertenceu a eras muito antigas, especialmente na construção de sua filosofia da história. Marx substituiu a evolução Hegeliana do Geist pela evolução dos fatores materiais de produção. Ele não percebeu que os fatores materiais de produção, i.e., as ferramentas e máquinas, são, de fato, produtos da mente humana. Ele afirmou que estas ferramentas e máquinas, as forças produtivas materiais, inevitavelmente provocariam a vinda do socialismo. Sua teoria foi denominada "materialismo dialético" (dialectical materialism), abreviada pelos socialistas para "diamat" (diamet em inglês).
[Num aparte, o Dr. Mises contou sobre uma visita a uma escola no México, uma "escuela socialista”, uma "escola socialista”. Mises perguntou para o reitor da escola o que "escola socialista” significava. O reitor explicou que a legislação mexicana exigia das escolas o ensino da doutrina Darwinista da evolução e do materialismo dialético. Em seguida, ele fez um comentário sobre a provisão na lei que fazia esta exigência e sobre próprio sistema escolar: “Há uma grande diferença entre a letra da lei e a prática. Noventa por cento dos professores em nossas escolas são mulheres e a maioria delas são Católicas praticantes.”]
Marx argumentou da tese à negação da tese para a negação da negação. A propriedade privada dos meios de produção por cada trabalhador individual foi o início, a tese. Este era o estado de coisas numa sociedade em que cada trabalhador ou era um agricultor independente ou um artesão que possuía as ferramentas com as quais ele estava trabalhando. Negação da tese – propriedade sob o capitalismo – quando as ferramentas já não são propriedades dos trabalhadores, mas dos capitalistas. A negação da negação foi a propriedade dos meios de produção pela sociedade inteira. Raciocinando desta forma, Marx afirmou que tinha descoberto a lei da evolução histórica. E é por isso que ele chamou isto de "socialismo científico”.
Marx rotulou todos os socialistas do passado de "socialistas utópicos” porque eles tentaram mostrar por que socialismo era melhor. Eles queriam persuadir seus concidadãos porque tinham a esperança de que as pessoas adotariam o sistema social socialista se estivessem convencidos de que era melhor. Eles eram "utópicos”, Marx afirmou, porque eles tentaram descrever o futuro paraíso terrestre. Entre os precursores de Marx, a quem ele considerou "utópicos”, estavam Saint-Simon, um aristocrata Francês; Robert Owen [1757-1858], um fabricante britânico; e Charles Fourier [1772-1837], um Francês que era, sem dúvida, um lunático. (Fourier era chamado de "tolo do Palais-Royal [4]". Ele costumava fazer declarações como “Na era do socialismo, o oceano já não será salgado, mas limonada”). Marx considerou estes três como grandes precursores. Mas, ele afirmou, eles não perceberam que o que estavam dizendo era somente “utópico". Eles esperavam a vinda do socialismo por uma mudança nas opiniões das pessoas. Mas para Marx, a vinda do socialismo era inevitável; viria com a inevitabilidade da natureza.
Por um lado, Karl Marx escreveu da inevitabilidade do socialismo. Mas por outro lado, ele organizou um movimento socialista, um partido socialista, declarou várias vezes que o seu socialismo era revolucionário, e que a subversão violenta do governo era necessária para o aparecimento do socialismo.
Marx adotou suas metáforas do campo da ginecologia. O partido socialista é como a obstetrícia, disse Marx; ele torna a vinda do socialismo possível. Quando questionados: “se vocês consideram todo processo inevitável, por que vocês não favorecem a evolução em vez da revolução”, os marxistas respondem, “Não existem evoluções na vida. O nascimento não é em si uma revolução?".
Segundo Marx, a meta do partido socialista não era influenciar, mas só ajudar o inevitável. Mas a obstetrícia influencia e muda condições. A obstetrícia realmente tem trazido progresso neste ramo da medicina, e até mesmo salvou vidas. E por salvar vidas, poderia ser dito que a obstetrícia mudou de fato o curso da história.
O termo "científico" adquiriu prestígio no decurso do século XIX. O livro Anti-Dühring (1878) de Engels se tornou um dos livros mais bem-sucedidos entre as obras filosóficas marxistas. Um capítulo deste livro foi reimpresso como um panfleto com o título "O Desenvolvimento do Socialismo da Utopia à Ciência", e teve sucesso enorme. Karl Radek [1885-1939], um comunista soviético, mais tarde escreveu um panfleto chamado "O Desenvolvimento do Socialismo, da Ciência à Ação".
A teoria da ideologia de Marx foi preparada para desacreditar as obras da burguesia. [Tomás] Masaryk [1850-1937], da Tchecoslováquia, nasceu de pessoas pobres, agricultores e trabalhadores, e ele escreveu sobre Marxismo. No entanto, os marxistas o chamam de burguês. Como ele poderia ser considerado "burguês" se Marx e Engels denominavam a si próprios de "proletários"?
Se os proletários devem pensar de acordo com os "interesses" da sua classe, o que significa então a existência de discordâncias e dissensões entre eles? A confusão torna a situação muito difícil de explicar. Quando há dissensão entre proletários, eles chamam o opositor de "traidor social”. Depois de Marx e Engels, o mais eminente homem dos comunistas foi um Alemão, Karl Kautsky [1854-1938]. Em 1917, quando Lênin tentou revolucionar o mundo inteiro, Karl Kautsky opôs-se à idéia. E por causa desta discordância, o ex-todo-poderoso homem do partido se tornou, de repente, um "traidor social". Ele foi chamado disto e de muitos outros nomes.
Esta idéia é como a dos racistas [5]. Os racistas Alemães declararam que um grupo definido de idéias políticas eram Alemãs e que todos os verdadeiros Alemães devem necessariamente pensar de acordo com este grupo particular de idéias. Esta era a idéia Nazista. Segundo os Nazistas, a melhor situação era estar num estado de guerra. Mas alguns Alemães – Kant, Goethe, e Beethoven, por exemplo – tiveram diferentes idéias “não-Alemãs". Se nem todos Alemães pensam de uma determinada maneira, quem é que vai decidir quais idéias são Alemãs e quais não são? A resposta só pode ser que uma "voz interior” é o melhor padrão, o critério definitivo. Esta postura necessariamente conduz a conflitos que devem resultar em guerra civil, ou até mesmo guerra internacional.
Havia dois grupos Russos, ambos consideravam-se proletários – os Bolcheviques e os Mencheviques. O único método para “resolver" as discordâncias entre eles era usar a força e a liquidação. Os Bolcheviques venceram. Em seguida, nas fileiras dos comunistas Bolcheviques surgiram outras diferenças de opinião – entre Trotsky [6] e Stalin – e a única maneira de resolver seus conflitos foi um expurgo. Trotsky foi forçado ao exílio, mudou-se para o México, e foi assassinado lá em 1940. Stalin não originou nada; ele voltou para o Marx revolucionário de 1859 – não para o Marx intervencionista de 1848.
Infelizmente, expurgos não acontecem somente porque os homens são imperfeitos. Expurgos são as conseqüências necessárias das bases filosóficas do socialismo marxista. Se você não puder discutir opiniões com diferenças filosóficas da mesma maneira que você discute outros problemas, você tem que achar uma outra solução – através da violência e do poder. Isto não se refere somente às divergências relativas a políticas, problemas econômicos, sociologia, lei, e assim por diante. Refere-se também aos problemas das ciências naturais. Os Webbs, senhor e senhora Passfield, ficaram chocados ao saber que as revistas e jornais Russos tratavam até mesmo dos problemas das ciências naturais partindo do ponto de vista da filosofia Marxista-leninista-estalinista. Por exemplo, se houver uma diferença de opinião em relação à ciência ou genética, isto deve ser decidido pelo "líder". Esta é a conseqüência inevitavelmente necessária do fato que, de acordo com doutrina Marxista, você não considera a possibilidade de dissensão entre pessoas honestas; ou você pensa como eu, ou você é um traidor e deve ser liquidado.
O Manifesto Comunista apareceu em 1848. Naquele documento, Marx pregou a revolução; ele acreditou que a revolução estava próxima. Ele acreditava que o socialismo seria então provocado por uma série de medidas intervencionistas e listou dez medidas intervencionistas – entre elas o imposto de renda progressivo, a abolição dos direitos de herança, reforma agrícola, etc. Estas medidas eram insustentáveis, ele disse, mas necessárias para a vinda do socialismo.
Assim, Karl Marx e Engels acreditaram em 1848, que o socialismo poderia ser atingido pelo intervencionismo. Em 1859, onze anos após oManifesto Comunista, Marx e Engels abandonaram a defesa das intervenções; eles já não esperavam que o socialismo surgisse através de mudanças legislativas. Eles queriam provocar o socialismo por uma rápida mudança radical. Deste ponto de vista, os seguidores de Marx e Engels consideraram as medidas posteriores – o New Deal, o Fair Deal, etc... – como políticas “pequeno-burguesas”. Na década de 1840, Engels havia dito que as leis trabalhistas britânicas eram sinais do progresso e um sinal do colapso do capitalismo. Mais tarde, eles chamaram tais medidas ou políticas intervencionistas (Sozialpolitik) de muito ruins.
Em 1888 – 40 anos depois da publicação do Manifesto Comunista – uma tradução foi feita por um escritor inglês. Engels acrescentou alguns comentários a esta tradução. Referindo-se às dez medidas intervencionistas preconizadas no Manifesto, ele afirmou que estas medidas não eram apenas insustentáveis, como reivindicou o Manifesto, mas precisamente por serem insustentáveis é que eles necessariamente pressionariam cada vez mais em direção a ainda mais medidas deste tipo, até que finalmente estas medidas mais avançadas conduzissem ao socialismo. [7]
Notas:
[2] - [Marx também criticou Lassalle por usar o termo "Arbeiterstand" (estado de trabalho); Marx disse que Lassalle estava confuso, mas nunca explicou porque Lassalle estava confuso. - Ed.]
[3] - [Beatrice Webb (1858–1943), mulher de Sidney Webb (1859–1947), mais tarde senhor e senhora Passfield, British Fabians. — Ed.]
[4] - N. do T. - Fourier esperou pontualmente, durante dez longos anos, ao meio-dia, nos jardins do Palais-Royal, o benemérito que lhe financiaria a construção de Harmonia (Fourier descreveu detalhadamente, em Le Nouveau Monde Industriel et Sociétaire (1829), as ações que o benemérito deveria realizar: Fourier, 1973, pp.554-561).
[5] - Conferir o artigo “Polilogismo: Karl Marx e os Nazistas” em http://www.endireitar.org/content/view/84/75/ para mais detalhes; é uma tradução de um trecho do livro Omnipotent Government de Ludwig von Mises.
[6] - [Leon Trotsky (1879–1940)]
[7] - N. do T. – Em março 1850, dois anos após o Manifesto, Marx e Engels publicaram a Mensagem do Comitê Central à Liga dos Comunistas, um documento que era, segundo o próprio Marx, "no fundo, nada mais que um plano de guerra contra a democracia".
Este documento “continha as proposições fundamentais do programa e táticas Marxistas".
O historiador inglês Robert Payne (Marx, Londres, 1968, p.239) afirma que "embora pouco conhecido e raramente estudada”, a Mensagem de março é "um dos documentos mais importantes e seminais do século XIX", ela "agiu como uma bomba com um fusível atrasado, explodindo só no século XX".
Na Mensagem já encontramos a orientação expressa para “levar ao extremo as propostas dos democratas” e superar as propostas em cada demanda para a reforma social, propondo uma demanda mais extrema - “ditar tais circunstâncias” aos democratas que seu papel “leve desde o princípio o germe de sua queda”. (cf. Karl Marx and Critical Examination of his Works - part 2; Leslie R. Page; Sentinel Publishing; 2000 e http://www.marxists.org/portugues/marx/1850/03/ccaliga.htm).
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