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segunda-feira, 22 de setembro de 2008

"A", "B" ou "C"?

Do portal do PERCIVAL PUGGINA
Editorial, Semana de 21/9 a 27/9

Uma das coisas que mais me deixa alarmado quando penso sobre o futuro do nosso país – não por mim, mas por meus filhos e netos – é o abismo ainda existente entre a realidade política e a compreensão que dela tem a opinião nacional. Uma boa política é tão indispensável à dignidade da pessoa humana quanto ao desenvolvimento econômico. À justiça e ao bem estar social. Contudo, enquanto não compreendermos as imensas deficiências do nosso modelo institucional, continuaremos jogando pedras na geni e abrindo rombos nos nossos próprios telhados, convencidos de que tudo se resolve mudando pessoas sem mudar critérios.

Querem um exemplo? As possíveis respostas à questão a seguir fornecem bom exemplo do que afirmo: um parlamentar representa o quê? a) a vontade do eleitor; b) o interesse do eleitor; c) a opinião do eleitor.

Pode parecer inusitado, mas a qualidade da democracia que se tem depende, em muito, de onde a maioria da sociedade crava o "x" da resposta a essa indagação. Um parlamentar é chamado, todo momento, a deliberar a respeito dos mais variados temas. Eles vão da preservação da natureza ao exercício da soberania nacional na Amazônia Brasileira; do porte de armas ao código de trânsito; da previdência social à biotecnologia. Em cada uma dessas ocasiões, o que será realmente significativo à deliberação a ser democraticamente tomada é a qualidade das opiniões, ou seja, a aplicação, ao caso concreto, dos princípios, critérios e valores que orientam os parlamentares quando chamados a dizer o que pensam, ou a relatar, ou a votar.

Se considerarmos que eles são meros representantes de vontades nós os estamos reduzindo à condição servil, a agentes de desejos. Tal atribuição extingue a liderança que o parlamentar deve exercer na sociedade. Se ele é alguém que molha o dedo na boca e espeta no ar para captar a direção das vontades, quem estará conduzindo a sociedade? Pior do que essa abdicação à liderança só a posição que certamente encontra ainda mais adeptos entre os eleitores, segundo a qual o parlamentar deve ser representante de interesses. Negativo! Nananinanão! É precisamente esse critério que nos tem levado à representação classista, corporativa, sanguessuga do Estado, em favor dos privilegiados representantes e dos privilégios representados (que se autodenominam "sociedade civil organizada..."). Fascismo puro. Num país gerado nas entranhas do patrimonialismo, que tão homogeneamente mistura o poder político com os recursos do Estado, a representação parlamentar "de interesses" é o baião de dois, a goiabada com queijo da usurpação que se instala sobre o bem comum. Nosso sistema eleitoral e nossa convicção sobre a função parlamentar, entretanto, estimulam esse modelo.

É ou não verdade que, a cada quatro anos, os muitos grupos de interesse do país promovem reuniões para decidir sobre quem vai ser "o seu representante"? E nascem, daí, as ativas bancadas – as mais fiéis – que são as vinculadas a interesses econômicos, corporativos e associativos organizados, sempre prontas a negociar seus votos em todas as outras matérias contanto que, desses votos, advenham benefícios para os interesses que representam.

Na concepção que produz melhores resultados, o parlamentar é alguém que se afirma como liderança na comunidade em decorrência dos princípios e valores que sustenta e expressa no desempenho das atividades que lhe são atribuídas. Mais do que a dedicação singular a uma causa, mais do que sua aplicação a este ou àquele interesse, seu valor está no conjunto de critérios com que toma decisões. Tais figuras de estadista resultam escassas entre nós exatamente porque adotamos um modelo político baseado nas respostas "a" e "b" da questão acima.

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