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segunda-feira, 19 de maio de 2008

QUANDO OS FRACOS DOMINAM OS FORTES

Do portal GRUPO INCONFIDÊNCIA
Por A. C. Portinari Greggio

Este é o sexto artigo duma série sobre o papel das universidades e dos intelectuais na subversão política. No último, verificamos que a classe intelectual, tal como a conhecemos hoje, surgiu no século 15 e desde o começo foi fator de perturbação da ordem social. Os intelectuais tinham prestígio e competência, mas não participavam do poder. Por isso, “viviam à margem da sociedade, em rodas boêmias ou círculos de confrades, sem compromisso com a economia, a administração ou a política. Nessa situação de privilegiada irresponsabilidade, davam-se ao luxo de adotar opiniões contrárias, comportamentos escandalosos e atitudes críticas. Tal conduta, longe de afastá-los dos que carregavam o peso da sociedade organizada, tornavam-nos ainda mais encantadores, emprestando-lhes exagerada aura de inteligência, de originalidade e de coragem.”

Fato é que, depois de muitas idas e vindas, explorando a ingenuidade de seus adversários, essa classe chegou ao poder em muitos países, inclusive no Brasil. O regime instituído pela constituição de 1988 não passa disso: a ditadura duma certa fração da classe intelectual, exercida pelos políticos, pela mídia, pelas ongues e pelos movimentos sociais. Que fração é essa? Basta olhar ao redor: são os politizados, conscientes, militantes, geralmente provenientes de faculdades de Letras, Humanas, Sociais, Filosofia e outras do gênero.

O objetivo deste artigo é examinar a estratégia dos intelectuais no seu conflito com as demais facções da classe dominante.

Havia, para eles, duas opções estratégicas.

A primeira era tomar violentamente o governo e investir-se a si mesmos nos postos de autoridade. Mas a experiência das revoluções socialistas foi desastrosa. Em todas o poder acabou caindo nas mãos dos seus rivais mais odiados – os engenheiros, técnicos, contadores, cientistas e administradores, apoiados pelos militares e policiais – e as utopias viraram ditaduras tecnocráticas mais fechadas que as antigas sociedades burguesas.

Diante disso, só lhes restava a outra opção: sem destruir a sociedade, apossar-se do poder mediante a contestação da legitimidade da autoridade instituída, substituindo-a pelo poder espúrio da intelectualidade. Essa estratégia subversiva se realizou por meio de dois projetos paralelos, o de Antonio Gramsci e o da Escola de Frankfurt.

É importante definir a diferença entre poder e autoridade, no nosso contexto. Poder é poder. Um bandido armado exerce poder, embora não tenha nenhuma autoridade sobre a vítima. Autoridade, porém, é poder legítimo, ou seja, poder conscientemente obedecido. Incluem-se nessa categoria tanto a autoridade natural – do pai, do mestre, do sábio – como a legal, sancionada por lei ou contrato, tal como a autoridade do juiz, do funcionário, do militar ou do patrão.

A fraude dos intelectuais na sua estratégia subversiva consiste em confundir propositadamente autoridade e autoritarismo, e abusar do conceito de democracia. Para eles, democracia é o contrário de autoritarismo. E como autoritarismo e autoridade se confundem, democracia enfim passa a ser o contrário de autoridade. Com esse sofisma e sob o pretexto de combater o autoritarismo e defender a democracia, contestam todas as formas de autoridade instituída.

A autoridade legítima e instituída simplesmente chega e manda. Quando o comandante dá uma ordem à tropa, ou o gerente passa uma instrução ao empregado, ou a mãe manda o filho para a cama, fazem-no simplesmente porque têm o título, natural ou legal, de comandante, de gerente ou de mãe. Esse título é suficiente para validar a ordem.

Mas na ideologia dos intelectuais, a obediência é a fonte do autoritarismo. Embora tenha legitimidade e título, a autoridade instituída não deve mandar sem antes consultar os subalternos. E estes devem exigir o direito de ser ouvidos e de questionar. Ao exigir que a autoridade instituída se torne “cidadã” e se submeta à “democracia participativa”, os intelectuais de fato estão a abolir toda a autoridade, substituindo-a pelo poder de quem fala mais e melhor nos comitês e assembléias. E como falar é a sua especialidade, é óbvio que toda essa pregação não tem outro objetivo senão desarmar os adversários e obrigá-los a lutar no terreno mais favorável à intelectualidade.

Uma vez no poder, os intelectuais instituem o tipo de governo mais adequado às suas limitações: o Estado democrático de massas, que no Brasil corresponde ao regime da constituição de 1988. O Estado democrático de massas é uma ditadura disfarçada, que não precisa da violência nem do terror policial. É uma nova forma de poder exercido sem coação, num ambiente em que todas as liberdades são permitidas. Só que essas liberdades não são as liberdades clássicas, do cidadão contra a tirania do Estado. O Estado democrático de massas não permite a liberdade contra o Estado, mas incentiva a liberdade de todos contra todas as demais instituições e autoridades.

Sob o pretexto de defender fracos contra fortes, ou de proteger minorias, o Estado patrocina a rebelião do aluno contra o professor, do filho contra os pais, da mulher contra o marido, do empregado contra o empregador, do soldado contra seus superiores. É nesse contexto que crescem os “movimentos sociais” – de negros, índios, homossexuais, sem-terra, sem-teto, feministas, idosos, deficientes, febéns, criminosos, presidiários, tudo, enfim.

Os únicos que não podem contar com a proteção do Estado são os membros das classes “autoritárias”. Na estratégia do Estado democrático de massas, há dois tipos de “autoritários”: os de dentro do Estado – militares, policiais e funcionários públicos – e os de fora – empresários, profissionais, trabalhadores e pais de família “patriarcais”.

Quanto aos primeiros, o Estado democrático de massas bem gostaria de livrar-se deles; não podendo fazê-lo, cuida de neutralizá-los mediante a política de direitos humanos, embaraçando sua ação, desmoralizando seu esprit de corps, negando-lhes equipamentos, reduzindo seus soldos e diminuindo sua auto-estima.

E os empresários? Diferente dos regimes comunistas, o Estado democrático de massas evita a estatização da economia. Não porque goste dos empresários, mas porque precisa deles. Eliminá-los seria péssimo negócio porque obrigaria os intelectuais a assumir a a atividade produtiva, coisa avessa à sua natureza. Por isso preferem poupar a “burguesia”, mantendo-a sob controle, para extorquir-lhe os tributos com os quais sustentam o seu esquema de poder.

Com esse objetivo, o Estado utiliza a propaganda para inculcar nos empresários o mais doentio sentimento de “culpa”. Por meio dos sindicatos e da fiscalização o Estado mantém as empresas sob contínuo assédio. E, com auxílio das ongues, procura cooptá-las para que se integrem em programas “sociais”, “solidários”, “participativos” e outras vigarices, trazendo-as assim para o seu lado, em troca de proteção e sociedade em bandalheiras do governo.

Mas a liberdade de todos contra todos tem seu custo. Não é por acaso que nos os países onde vige a democracia de massas os índices de criminalidade, abortos, ilegitimidade e baixo rendimento escolar pioram continuamente. A economia perde a eficiência e as empresas passam a depender cada vez mais da proteção governamental. Em longo prazo, o resultado da democracia de massas é a desintegração do país.

Nos próximos artigos trataremos do impacto das ciências exatas, do positivismo e dos currículos profissionalizantes nas universidades tradicionais. Essas transformações tiveram profundas conseqüências na História do Ocidente e no Brasil.

A. C. Portinari Greggio é Economista, ex-aluno da Escola Preparatória de Cadetes de São Paulo

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