Do portal AGÊNCIA AMAZÔNIA DE NOTÍCIAS
Por LORENZO CARRASCO (*), segunda, 26 de maio de 2008
RIO — Enquanto o Brasil se debate em meio a um virtual “apagão” do Estado nacional, o governo dos Estados Unidos, por intermédio da sua Agência de Desenvolvimento Internacional (Usaid), delineia um “plano estratégico” para a ocupação efetiva de áreas críticas da Amazônia, onde a presença soberana dos Estados nacionais que compartilham a região é precária.
A estratégia integra uma nova etapa do processo de "internacionalização" da Amazônia, subseqüente à já consolidada fase de demarcação de vastas reservas naturais e indígenas na região, em proporções muito superiores às recomendadas pelos interesses nacionais.
Apenas no Brasil, as reservas indígenas ocupam quase 1,1 milhão de quilômetros quadrados, cerca de 13 % do território nacional, para pouco mais de 400 mil indígenas. Para comparação, toda a Região Sudeste, a mais populosa do País, com mais de 75 milhões de habitantes, não chega a 928 mil quilômetros quadrados.
Aproximadamente a metade dessa área está destinada a unidades de conservação biológica ou ambiental. Situações semelhantes ocorrem no Peru, Bolívia e Equador.
Lançada em junho de 2005 pela Usaid, a Iniciativa para Conservação da Bacia Amazônica (ABCI, na sigla em inglês) não oculta o propósito de coordenar as ações de diversos grupos ambientalistas e indigenistas nacionais e estrangeiros, provendo-os dos recursos e instrumentos de “governança ambiental” para o controle efetivo da região. A intenção é recrutar povos indígenas, “populações tradicionais” e Ongs nacionais e estrangeiras, para criar uma rede que em nada difere de um exército de ocupação pós-moderno a serviço de um esquema de “governo mundial” controlado por grupos hegemônicos do Establishment anglo-americano.
Neste contexto, ação da Usaid vem reforçar financeiramente as intensas atividades de Ongs como o Fundo Mundial para a Natureza (WWF), Survival International, Conservation International, The Nature Conservancy e outras, financiadas tanto pela Usaid como por agências governamentais do Canadá, Reino Unido, Holanda e outros países europeus, além de fundações familiares do Establishment.
Por “governança ambiental”, deve-se entender o controle efetivo dos territórios demarcados como reservas, sob intensas pressões internacionais, para obstaculizar o desenvolvimento do Brasil e seus vizinhos, insidiosamente apresentado como ameaça à integridade do meio ambiente. O argumento central da ABCI é o de que os enormes e desconhecidos recursos da bacia Amazônica podem servir como uma base sólida para o desenvolvimento regional, mas são ameaçados por usos não sustentáveis associados com a agricultura, pecuária, exploração madeireira, mineração, exploração de petróleo e pesca. Essas ameaças, por sua vez, são intensificadas por outras forças, como o crescimento populacional (sic), o desenvolvimento infra-estrutural, a expansão dos mercados de commodities. (Plano Estratégico da Usaid para a Iniciativa de Conservação da Bacia Amazônica).1
Semelhante formulação interdita, de fato, qualquer perspectiva de desenvolvimento de atividades econômicas modernas na região, mantendo as populações que ali vivem em condições de pobreza extrema, ou deslocando-as sob o pretexto da demarcação ou ampliação de reservas indígenas (mesmo em áreas nunca ocupadas por eles), como tem ocorrido com freqüência. Um dos riscos envolvidos é o de que populações que aceitem tais condições terminem se opondo às próprias instituições nacionais.
A intenção é explícita:
A Usaid luta por uma Bacia Amazônica em que os povos indígenas e tradicionais, outras partes interessadas na conservação e instituições chave alcancem o comprometimento, capacidade e cooperação para serem guardiões efetivos da diversidade biológica e dos serviços ambientais de importância global da bacia.
Da mesma forma, o planejamento da agência contempla uma estratégia de ações transnacionais:
Como várias das ameaças à biodiversidade na Bacia e, portanto, as eventuais oportunidades de ação da Usaid, são transnacionais por natureza, é preciso desenvolver e negociar práticas de gestão de recursos entre os parceiros regionais. A troca de conhecimentos entre as partes interessadas e as agências de conservação terá maior eficácia se forem levadas em conta as conexões da bacia que cruzam linhas municipais ou nacionais.
O propósito é coordenar todos os programas do governo estadunidense para a região. Assim, o documento-base da Iniciativa propõe que os grupos de intercâmbio de informações do Governo dos EUA reúnam-se em nível nacional para catalisar e sustentar colaborações entre o programa da Usaid para a Amazônia e outras atividades do Governo dos EUA.
Entre as iniciativas existentes e possíveis de colaboração destacam-se o intercâmbio de informações e oportunidades de contato relacionados com a governança ambiental, fiscalização e cumprimento de leis e regulamentos, assistência técnica e treinamento, oportunidades de contato com mercados e produtores, além da diplomacia ambiental. (sic)
As oportunidades programáticas específicas de colaboração com o GEUA (Governo dos EUA - n.e.) incluem o processo de Fiscalização Florestal e Governança (FLEG), a Iniciativa Presidencial contra a Exploração Madeireira Ilegal, cooperação ambiental nos termos dos Acordos de Livre Comércio, o Programa Piloto do G-7 para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG7), gestão das áreas indígenas e capacitação, monitoramento da fauna e cobertura florestal, e gestão das bacias hidrográficas e áreas protegidas.
No tocante ao PPG7, a Usaid explorará oportunidades de integrar-se com as redes de pesquisa do subprograma de ciência (pesquisa dirigida — Ciência II) e alavancar experiências anteriores do PPG7 em, por exemplo, monitoramento e mobilização das comunidades... Em parceria com as organizações regionais, como a OTCA, a COIAB, a Aliança Amazônica e outras, a Usaid procurará implementar estes investimentos regionais com os países membros do Tratado de Cooperação Amazônica, conforme apropriado às respectivas atividades. (...) [1].
O que surpreende na ABCI não é mais uma manifestação da velha cobiça oligárquica internacional sobre a Amazônia, mas a sem-cerimônia com que um governo estrangeiro, alegando causas nobres, promove em pleno século XXI uma interferência tão ostensiva nas políticas brasileiras que influenciarão de forma decisiva as perspectivas de desenvolvimento de uma região que disputa com o Nordeste o triste título de a mais atrasada do País. A bem da verdade, isso não representa novidade na política estadunidense, uma vez que um propósito idêntico já estava explicitado no hoje célebre memorando secreto do Conselho de Segurança Nacional, NSSM-200 (National Security Study Memorandum-200), elaborado em 1975 sob a orientação de Henry Kissinger e apenas desclassificado no início da década passada.
Os autores do documento propunham o controle do crescimento populacional do Brasil e outras 13 "nações-chave", alegando que ele implicaria em um uso descontrolado dos recursos naturais nacionais - minerais, energéticos etc. -, os quais, na sua visão hegemônica, seriam fundamentais para a prosperidade futura dos EUA e seus aliados. Logo, o crescimento demográfico brasileiro representava uma "ameaça" aos interesses nacionais estadunidenses.
Mais tarde, na década de 1990, as questões ambientais passaram a integrar definitivamente a agenda de segurança nacional dos EUA, como se mostra no documento United States Security Strategy for the Americas (Estratégia de Segurança dos Estados Unidos para as Américas), publicado pelo Departamento de Defesa, em setembro de 1995.
Em 1998, o general Patrick Hughes, então diretor da Agência de Inteligência de Defesa (DIA), explicitou tais intenções no tocante à Amazônia. Em uma conferência proferida no Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT), em 9 de abril daquele ano, ele afirmou que uma das hipóteses de conflito que o Pentágono considerava possíveis nas duas décadas seguintes seria uma intervenção na Amazônia brasileira, para evitar danos ambientais que pudessem, eventualmente, provocar impactos sobre os interesses estadunidenses (diante da grande repercussão internacional de suas declarações, o general Hughes se viu obrigado a desmenti-las).
Em novembro de 2002, já em plena era das intervenções unilaterais do governo “neoconservador” do presidente George W. Bush, o então secretário da Defesa Donald Rumsfeld apresentou, na V Conferência de Ministros da Defesa das Américas, em Santiago do Chile, o conceito de “soberania efetiva”, significando a necessidade de intervenções em áreas onde o Estado nacional não pudesse, por um motivo ou outro, exercer um pleno controle territorial.
O conceito é uma variante do princípio de “soberania limitada” ou “soberania restrita”, tão prezado pelos grupos que se empenham em impor estruturas de "governança global" sobre os Estados nacionais soberanos. Afortunadamente, a sugestão foi amplamente rechaçada pelos demais participantes do encontro.
É sintomático que o programa da Usaid introduza o conceito da governança efetiva sobre regiões nas quais os Estados nacionais amazônicos tenham uma presença débil.
Na mesma linha, devem ser consideradas as declarações de autoridades de outras potências do Hemisfério Norte a respeito da soberania sobre a Amazônia, como a do então comissário de Comércio da União Européia e atual diretor-geral da Organização Mundial de Comércio (OMC), Pascal Lamy. Em 21 de fevereiro de 2005, em uma palestra realizada em Genebra, Suíça, sobre o tema “As lições da Europa para a governança global”, Lamy afirmou que a floresta amazônica e as demais florestas tropicais do planeta deveriam ser consideradas “bens públicos mundiais” e submetidas a uma gestão coletiva pela comunidade internacional.
Ainda mais escandalosa foi a proposta do ministro do Meio Ambiente do Reino Unido, David Miliband, para uma “privatização completa da Amazônia”, alegadamente, para preservar a floresta como uma proteção contra as emissões de dióxido de carbono que, supostamente, estariam provocando o aquecimento global. A sugestão, feita em uma conferência sobre mudanças climáticas em Monterrey, México, no final de setembro de 2006, envolveria a aquisição de grandes áreas da Floresta Amazônica por cidadãos e grupos privados, de modo a formar uma vasta área “protegida”, cuja administração seria confiada a uma comissão internacional. O esquema teria o apoio do então primeiro-ministro Tony Blair, porque “capturaria a imaginação do mundo” e “uniria a comunidade internacional”.
Em entrevista ao jornal Daily Telegraph (1/10/2006), Miliband admitiu que a idéia poderia suscitar questões de soberania com o Brasil: “Obviamente, existem problemas de soberania, mas o desmatamento é um assunto enorme... e qualquer plano, mesmo que seja radical, é digno de ser avaliado.”
Na ocasião, a imediata reação do Itamaraty obrigou o boquirroto ministro-ambientalista britânico a se retratar, com as tradicionais declarações de que havia sido mal interpretado pela imprensa.
Como se percebe, a iniciativa da Usaid ocorre nesse contexto de intenções ostensivas de interferência direta na Amazônia, que configura uma autêntica estratégia de guerra irregular, ou “guerra de quarta geração” (G4G), contra a soberania nacional do Brasil e seus vizinhos amazônicos.
O conceito de G4G, que vem sendo discutido entre certos círculos militares e estratégicos da América do Norte e da Europa, se refere a campanhas em que um Estado nacional se defronta com oponentes não-estatais, como organizações terroristas e/ou criminosas - ou, no caso brasileiro, ONGs contrárias ao desenvolvimento nacional.
Assim sendo, não é exagero considerar que estão em curso na Amazônia ações de “quarta geração”, nas quais os territórios não são conquistados no sentido militar clássico, mas têm neutralizado o seu pleno desenvolvimento socioeconômico e conseqüente povoamento, para, em uma fase posterior, serem eventualmente declarados como territórios sem “soberania efetiva”. Estaríamos, portanto, às voltas com uma doutrina estratégica exógena, cuja denominação não poderia ser outra senão “Pax Verde”.
Embora os métodos tenham mudado, sendo hoje muito mais sofisticados no que tange à manipulação da opinião publica ou ao controle psicológico, os propósitos são os mesmos do velho colonialismo europeu de séculos passados.
A agenda da Usaid em marcha
Em janeiro de 2007, no relatório Iniciativa para a Conservação da Bacia Amazônia - Desenho, Atividades Propostas e Resultados Esperados, a Usaid deu a conhecer o programa da ABCI, que contará com um financiamento de 65 milhões de dólares aplicados ao largo de cinco anos, em cinco frentes diferentes. Em realidade, tais recursos funcionarão como créditos iniciais para motivar a atração de mais recursos provenientes de agências governamentais, fundações e ONGs internacionais. Recorde-se que o programa visa vincular as principais redes existentes e dirigir as suas ações de forma centralizada.
Três das linhas de ações previstas para a Iniciativa visam estabelecer um "cerco verde", para conter os efeitos econômicos das grandes obras de infra-estrutura na Amazônia Ocidental, em uma vasta região que pertence ao Brasil, Bolívia e Peru. A intenção é cercar o estratégico estado de Rondônia por três frentes: a primeira, ao norte, pelo sudoeste do estado do Amazonas (Fig. 1); a segunda, ao sul, pela região do Madidi-Manu, na Bolívia e no Peru (Fig. 2); e a terceira, a oeste, pela região do chamado MAP, formado pela província peruana de Madre de Dios, o Acre e o departamento boliviano de Pando (Fig. 3).
Na primeira frente, estão inseridos o que o documento chama “Municípios Alvos no Sudoeste do Estado do Amazonas”, por ser esta uma nova “região de fronteira”, onde vários projetos importantes de infra-estrutura estão sendo planejados pelo governo brasileiro, incluindo a pavimentação das rodovias Porto Velho - Manaus e Humaitá-Lábrea, a construção do gasoduto Urucu-Porto Velho e de represas hidroelétricas de grande escala no Rio Madeira, um dos principais tributários do Rio Amazonas.
Nessa frente, o programa se propõe a “estabelecer uma barreira verde de áreas protegidas”, para conter a ocupação econômica e desenvolver redes locais com capacidade tecnológica para o monitoramento in situ do território da região-alvo, inclusive com a utilização de tecnologias de sensoreamento remoto.
O propósito inquestionável é desenvolver uma capacidade local de inteligência em tempo real, gerenciada externamente por interesses inconfessáveis.
Para este objetivo, a Usaid conta com o Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), que desde o ano 2000, vem se especializando na tarefa de organizar redes locais contra projetos de infra-estrutura, especialmente entre grupos indígenas. “O programa aumentará a capacidade das organizações indígenas de assegurar a integridade de seus territórios e o manejo sustentável dos seus recursos naturais”, diz o texto.
A criação do IEB resultou de uma iniciativa conjunta da Usaid e da seção estadunidense do WWF e a organização conta com o apoio financeiro de agências oficiais dos Países Baixos e do Reino Unido. Suas tarefas especificas são:
1. Construir capacidade local... Desenvolvimento organizacional de instituições locais em assuntos como administração, gestão financeira, e preparação de projetos, planejamento, monitoramento, e avaliação; Desenvolvimento interinstitucional através do planejamento e implementação de espaços públicos para a resolução de assuntos sócio-ambientais e através de treinamento em assuntos como gênero e equidade, resolução de conflitos, e redes de comunicação. Para aumentar os impactos, a abordagem enfatizará treinamento de líderes, intercâmbio de treinamento a curto e médio prazo, e estabelecimento de grupos temáticos de trabalho em tópicos estratégicos, como estradas, óleo e gás, e a gestão econômica de áreas protegidas habitadas. (sic)”.
2. Monitorar tendências da paisagem. Esta atividade é projetada para fornecer aos tomadores locais de decisão e ao público a informação necessária para orientar a conservação e o desenvolvimento do sudoeste do Amazonas e assim tomar decisões fundamentadas. Como parte desta atividade, o programa conduzirá um monitoramento anual de níveis de desmatamento, incêndios florestais, e abertura de estradas não oficiais para atividades madeireiras ilegais.
Para fortalecer a capacidade local para monitorar mudanças na paisagem,o programa oferecerá cursos para os líderes e técnicos sobre o uso de sistemas de informação geográfica (SIGs) e imagens de satélite. O programa também analisará os impactos sociais e econômicos de projetos de infra-estrutura no sudoeste do Estado de Amazonas, incluindo o gasoduto Urucu-Porto Velho, a rodovia BR-319, as represas hidroelétricas no Rio Madeira, e outros projetos em andamento na Bacia Amazônica que afetam o sudoeste do Amazonas. As informações geradas nesta atividade serão disseminadas on-line, em publicações, e através de seminários locais."
Bloqueando a saída para o Pacífico
O segundo alvo da ABCI é a região Madidi-Manu, que os estrategistas "verdes" vêem como um “cordão sanitário” no Peru e na Bolívia, contra a potencial extensão dos efeitos positivos dos grandes projetos de infra-estrutura em Rondônia, especialmente o Complexo do Rio Madeira, o gasoduto Urucu-Porto Velho e a conexão Manaus-Porto Velho, dois dos potenciais “corredores de desenvolvimento” para a modernização socioeconômica e a industrialização da Região Amazônica - perspectiva intolerável para a Usaid e suas redes intervencionistas.
Igualmente execrada por esses círculos antidesenvolvimentistas é a saída brasileira para o Pacífico, pela Rodovia Interoceânica, cuja ligação da BR-364 com a malha rodoviária peruana se encontra em construção e, quando concluída, permitirá o acesso aos portos oceânicos de Ilo e Mataraní.
Nas próprias palavras do documento da Usaid, o objetivo desse subprograma é avaliar e desenvolver estratégias para enfrentar os impactos de desenvolvimento de infra-estrutura em grande escala. A combinação da conclusão do trecho final da Rodovia Interoceânica e a expansão do desenvolvimento de óleo e de gás natural terá impactos profundos na região, com o potencial de destruir muitas das importantes e difíceis realizações feitas em nome da conservação e do uso sustentável de recursos naturais.
Atualmente, vários parceiros do consórcio ajudam o povo local a avaliar e a enfrentar os impactos do desenvolvimento de infra-estrutura em grande escala. O programa continuará e expandirá este processo participativo, trabalhando com atores locais, autoridades governamentais em diferentes níveis, e doadores para assegurar que o desenvolvimento de infra-estrutura irá incorporar objetivos que apóiem a conservação da biodiversidade e o uso sustentável de recursos naturais.”
Do Bolivian Syndicate ao "MAP Syndicate"
O terceiro “tampão” pretendido pela Iniciativa da Usaid está localizado na chamada MAP (Madre de Dios-Acre-Pando), ironicamente, a região onde a concessão feita pelo governo boliviano ao Bolivian Syndicate provocou, no início do século passado, o mais sério conflito fronteiriço na história das relações diplomáticas entre a Bolívia, o Brasil e o Peru. Como o próprio relatório assinala, a região de MAP é uma conexão crucial na Rodovia Interoceânica que conecta os portos do Atlântico no sudoeste do Brasil aos portos do Pacífico no Peru.
A pavimentação da componente da Rodovia Interoceânica no Acre foi completada em 2002, e atualmente a parte restante nas terras baixas em Madre de Dios está sendo pavimentada. Esta atividade faz parte de um investimento de US$ 800 milhões que inclui o melhoramento de instalações portuárias no Peru para permitir as exportações do Brasil para as economias à margem do Pacífico. Um conjunto semelhante de rodovias está planejado para unir as seções de Cobija e Riberalta no Pando a La Paz na Bolívia; os investimentos atuais reservados para a melhoria dessas estradas totalizam dezenas de milhões de dólares.
Também nas fases de planejamento avançadas está um conjunto de grandes represas hidroelétricas no Rio de Madeira e seus tributários (a um custo calculado em US$ 10 bilhões) na Bolívia e Brasil, que afetarão diretamente Pando e Madre de Dios. Além disso, companhias chinesas começaram a exploração madeireira em Madre de Dios ao longo das margens bolivianas e brasileiras.
Deve-se destacar que uma boa parte do departamento de Pando é constituída por áreas de cerrado contínuas aos campos de Rondônia e, portanto, o seu desenvolvimento agrícola moderno pode constituir-se em um importante vetor de modernização econômica para uma das mais depauperadas regiões da Bolívia. O pleno desenvolvimento do Complexo do Rio Madeira, que inclui duas usinas hidrelétricas em território boliviano (uma binacional, no rio Mamoré, e a outra no rio Beni), com a construção de eclusas (que não podem ser descartadas de forma alguma), proporcionaria uma saída para o Atlântico para o potencial produtivo daquela hoje estrangulada região boliviana. Quanto ao Acre, a Iniciativa da USAID pretende coibir até mesmo a simples prospecção de gás e petróleo no estado, onde os estudos geológicos são promissores.
Além dos aspetos geoeconômicos, o programa como um todo está sendo contemplado para “servir como um exemplo de colaboração internacional em assuntos transfronteiriços na Bacia Amazônica”, o que, precisamente, aumenta a gravidade da interferência estadunidense. Aqui, observa-se o verdadeiro sentido da proposta da USAID, de “aumentar a capacidade de governança ambiental” - que não é outra coisa senão o princípio de soberania relativa anteriormente mencionado.
O Projeto MAP já conta com financiamento do governo holandês e vem sendo executado pelo “consórcio” das ONGs WWF, Conservation International, The Nature Conservancy e a pouco conhecida holandesa Tropenbos, além do Serviço Holandês de Cooperação para o Desenvolvimento - um verdadeiro “MAP Syndicate”. Um dos objetivos diretos é criar os costumeiros entraves ambientais, como os famigerados "corredores de conservação", para dificultar esforços como a ligação da BR-364 com o Pacífico (anteriormente bloqueada no final da década de 1980, por pressões diretas do presidente George Bush pai).
Reservas transfronteiriças e "governança ambiental efetiva"
O “Projeto MAP” é apenas uma das iniciativas da Usaid para desenvolver ações em regiões transfronteiriças entre Peru-Brasil, Equador-Colômbia, Brasil-Guiana e Brasil-Guiana Francesa, todas regiões ricas em recursos naturais. Segundo o relatório da ABCI, estas terras, que aparecem como a maior mancha verde na terra quando vistas do espaço, são habitados principalmente por povos indígenas e comunidades tradicionais. A ABCI reconhece que estes povos possuem laços profundos com a terra e um legado de manejo que oferecem a melhor esperança para assegurar a conservação e o desenvolvimento sustentável da Bacia Amazônica.
Porém, ademais dessa visão romantizada, que deixa de fora os quase 25 milhões de demais brasileiros que habitam a Região Amazônica, o relatório da UsaidD deixa clara a sua preocupação central com os recursos minerais e energéticos existentes no subsolo das reservas indígenas, como se observa na “pérola” a seguir:
Embora muitos países amazônicos tenham reconhecido que os povos indígenas e tradicionais controlam áreas significativas da região, o controle de minerais e de hidrocarbonetos permanecem nas mãos do Estado ou de companhias privadas, que têm elevado em muitas áreas a exploração descontrolada e destrutiva de minérios e do transporte de petróleo e gás. Uma série de outras ameaças - incluindo rodovias, represas hidroelétricas, jurisdições cruzadas, incursões por colonos e companhias madeireiras, e conflitos constantes sobre terras e recursos naturais - flagelam os territórios indígenas em toda a região (grifos nossos).
Sobre a “governança efetiva”, diz o documento:
As ameaças ambientais diretas a muitas terras indígenas são sintomáticas de um problema mais sério: falta de governança efetiva. Organizações representativas dos povos indígenas tipicamente desempenham um papel marginal em decisões referentes aos povos e territórios indígenas. Estas organizações enfrentam problemas estruturais internos que limitam a sua efetividade no trato de assuntos ambientais e de manejo de recursos naturais, especialmente ao nível de reserva.
Apenas uma minoria dessas organizações tem sido capaz de desenvolver capacidade técnica significativa, e muitas ainda confiam em aliados "indigenistas" da sociedade civil para fornecer o apoio técnico necessário. Da mesma forma, suas práticas e procedimentos administrativos e financeiros são freqüentemente fracos. Por sofrerem de falta crônica de recursos financeiros, as organizações indígenas amazônicas tendem a ser instáveis e mostram dificuldades em alcançar seus objetivos programáticos.
Por outro lado, um número crescente de organizações indígenas amazônicas reconhece que o sucesso na luta por terra significa pouco se estas terras não forem administradas efetivamente. Por toda a Bacia Amazônica, especialmente no Brasil, vários movimentos indígenas estão sofrendo a transição da luta por terra para a administração de seus territórios, que exige uma série de competências diferentes. Este programa busca responder ao desejo das organizações indígenas amazônicas para apoio no fortalecimento de sua efetividade.
Portanto, a ação da Usaid propõe uma “gestão ambiental de terras indígenas”, especialmente nessas áreas de fronteira, para dar capacidade às organizações indígenas de determinar as políticas de “distribuição de direitos sobre os recursos naturais”. Ou seja, a intenção é que as organizações indígenas controladas pela rede de ONGs internacionais possam definir a utilização dos recursos minerais ou energéticos.
No caso, a estratégia visa fortalecer a capacidade de “pelo menos 20 federações indígenas amazônicas”. Além disto, o “treinamento in situ e a capacitação focalizarão áreas que estas organizações identificaram como estrategicamente vitais”.
Cabe perguntar: “vitais” para quem, cara-pálida?
Brasil, é hora de acordar!
Do exposto, resulta claro que o Brasil está sendo paulatinamente submetido a uma nova forma de colonialismo, com o qual a determinação de crescer e exercer plenamente a soberania sobre os seus recursos naturais e o seu território está sendo derrotada por interesses exógenos. A forma verbal “derrotada” se justifica porque as instituições nacionais como um todo, que se encontram débeis e abastardadas, abandonaram a missão de cuidar primordialmente do bem comum e o bem-estar geral da Nação.
As próprias Forças Armadas, cuja missão mais primordial é a preservação da integridade territorial do País, têm sido criminosamente sucateadas pelas crescentes restrições orçamentárias e um revanchismo “antiautoritário” irracional e irresponsável, contribuindo para deixar o País cego e indefeso diante dessas novas e mais sofisticadas formas do colonialismo.
Essa é a hora para que as forças patrióticas da Nação acordem para pelejar pela sua soberania plena, ou correrão o sério risco de despertar mais tarde da sua letargia e se defrontarem com o pesadelo de uma nação dividida ou fragmentada. Para saber mais sobre o assunto, clique aqui.
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